O café Santin ficava em um shopping sofisticado da cidade. Sam provou o expresso sem açúcar, e saboreou a mistura de grãos gourmet. Rita Velasquez falava sobre a seleção de modelos para a campanha, ela decidiu usar uma agência a parte, separada da Cosmus. Sam não poderia culpá-la. A agência de modelos usada pela Cosmus mantinha um casting padrão de mercado. Dificilmente encontrariam o conceito natural e diversificado que Rita estava procurando. - O que você acha de uma reunião na próxima terça-feira, para apresentar a campanha? – Sam perguntou? - Preciso verificar os meus horários. Minha secretária entrará em contato para marcar, tudo bem? - É claro. Se não for possível terça, nós vamos verificar o que pode ser conciliado. - Perfeito. Agora me fale um pouco de você. Falar só sobre trabalho, pode se tornar massivo. Eu gosto de conhecer meus colaboradores a fundo. - Claro. – ela sorriu – Eu tenho vinte e oito anos, sou solteira, sem filhos. Comecei minha carreira cedo, e a C
Alberto Há mais de duas horas que a equipe médica da Clínica Portuguesa atendia Samanta. Esse era o lugar que confiava para cuidar dela quando ela passava da conta com a bebida. Portanto, essa não era a primeira visita. Amélia achava que ele sempre fazia Samanta beber, só porque ela buscava a prima em algumas ocasiões. Mas a verdade é que na maioria dos episódios, era ele quem cuidava dela, e a trazia para essa clínica privada para receber glicose e ser assistida de perto. Ele sabia que o corpo de Sam não aguentaria essa situação por muito tempo. Mas ela o afastou, e agora cuidar dela se tornou mais difícil. A sala de espera adjacente ao quarto 28, lhe pareceu claustrofóbica, apesar do amplo espaço aconchegante e a varanda aberta, onde se podia ver a avenida movimentada. Alberto se levantou pela enésima vez, andando de um lado para o outro. Que diabos estava acontecendo, para demorar tanto? Nesse momento a porta foi aberta pelo Dr. Pires. O mesmo médico que vinha acomp
A madrugada se arrastava como um lamento prolongado, e a sala de espera da Clínica Portuguesa já não parecia tão aconchegante. As poltronas de couro bege tornavam-se um cárcere silencioso onde Alberto Darius contava os segundos, ouvindo o leve tique-taque do relógio pendurado na parede, que mais parecia zombar da sua impaciência. Lá fora, a cidade dormia sob um véu de neblina, indiferente à dor que lhe corroía o peito. Com os cotovelos apoiados nos joelhos e as mãos trêmulas entrelaçadas, ele se sentia à beira do colapso. O cigarro acabou a muito tempo, mas não trouxe nenhum relaxamento. Tudo em sua mente girava em torno de Samanta, do corpo frágil repousando em algum leito além daquela porta, da criança que crescia em seu ventre e que ele mal conseguia conceber como real. Mas era real. Era deles. Num ímpeto, puxou o celular do bolso e discou para Tiago. — Diga que tem alguma coisa — disse assim que ouviu o clique do outro lado. — Tenho. Você vai querer sentar pra isso, chefe —
SamantaO quarto estava em silêncio. O ar era impregnado por um cheiro de lavanda e antissépticos, mesclado com algo sutilmente doce, talvez as flores brancas sobre a mesa de canto, ou o perfume de alguém que ficou por muito tempo ali. Samanta abriu os olhos lentamente, como quem emerge de um sonho pesado demais para carregar. Tudo ao redor parecia borrado, como uma tela de aquarela lavada pela chuva. A luz suave que entrava pelas cortinas entreabertas lhe agredia as retinas, forçando-a a piscar várias vezes até que os contornos do mundo voltassem a fazer sentido.Ela estava deitada. Sentiu o lençol engomado sob suas mãos, o leve peso de um cobertor aquecido por um corpo que vigiou aquela cama a noite inteira. O colchão era firme, o travesseiro, denso. Uma máquina suave apitava ritmicamente ao lado esquerdo, e foi ali que ela viu o cateter preso ao dorso de sua mão. Havia um curativo ali. E outra pulseira plástica com seu nome completo. “Samanta de Bastos”.A mente, enevoada, tentou
AlbertoA voz do médico soou como um eco abafado no meio do furacão que varria os pensamentos de Alberto. As palavras vinham com o peso de um veredito, mas o rosto do homem à sua frente tentava suavizar o impacto da realidade com uma empatia comedida.— A situação da Samanta ainda é incerta, senhor Darius. Precisamos aguardar a avaliação do oncologista. Ela vai realizar novos exames amanhã pela manhã.Alberto cerrou os punhos, controlando a vontade de explodir. Sua mandíbula retesava como aço, mas seu olhar permanecia fixo no médico, absorvendo cada sílaba como se sua vida dependesse disso. E, de certa forma, dependia.— Devo contar a ela sobre o tumor? — perguntou com a voz rouca, como se as palavras lhe arranhassem a garganta.O médico balançou a cabeça negativamente, com um suspiro breve.— Não, sinceramente, não recomendamos contar agora. Samanta está emocionalmente instável. O risco de um colapso nervoso ou mesmo de um aborto espontâneo é real, senhor Darius. Seria imprudente sub
GabrielGabriel ajustou a luva de couro branco na mão esquerda, medindo com os olhos a distância até o buraco. O campo de golfe do Clube Helvétia era imaculado. A grama cortada com precisão milimétrica, os lagos espelhados refletindo o céu pálido daquela manhã de primavera, e os caddies se movimentando em silêncio coreografado, respeitando o clima de concentração dos jogadores abastados. Um santuário para aqueles que podiam se dar ao luxo de brincar com o tempo.Ele girou o taco lentamente nos dedos antes de executar a tacada perfeita. A bola riscou o ar, com uma leve curva à direita, e rolou até parar a centímetros do buraco. Um sorriso discreto desenhou-se nos lábios dele. Nada mal para um encontro conspiratório.Laura Martins se aproximou logo em seguida, com a elegância clássica que dominava desde os tempos em que reinava na semana de moda de Milão. Estava impecável, como sempre. Calça social branca, blusa azul de linho, cabelos castanhos perfeitamente alinhados no corte chanel e
Laura MartinsLaura observava seu reflexo no espelho da penteadeira Luiz XV, sob a luz suave das arandelas douradas que delineavam sua silhueta com precisão. Os dedos longos e cuidados deslizavam com familiaridade pelos frascos de cosméticos franceses, escolhendo com exatidão os cremes e séruns que aplicaria em sua pele já perfeitamente preservada pelos tratamentos mais modernos. O rosto que encarava do outro lado do vidro era uma escultura de disciplina e vaidade.Traços finos, angulosos, sem rugas visíveis; o pescoço firme, o colo liso. A camisola de seda cor marfim moldava seu corpo esguio, e Laura sorriu para si mesma com aquele ar que mesclava orgulho e poder silencioso.Era uma mulher impecável. Sempre foi. Desde jovem, sabia onde queria chegar. E agora, tão perto de assumir o império da família Martins, bastava apenas resolver um detalhe maldito. Samanta.Pensar na filha bastarda ainda lhe causava uma leve pontada no estômago. Não de culpa, Laura não era mulher de se consumir
Samanta Samanta Bastos é uma jovem publicitária de vinte e oito anos romântica e sonhadora, que desde criança sonhava com um casamento de princesa, uma família grande cercada de carinho; almoços de domingo recheados de risadas e feriados barulhentos e alegres. No entanto, o silêncio que a recebia nesse momento ao entrar em casa, era a sua triste realidade. Sam depositou as chaves do carro no aparador da sala e rumou para a cozinha em busca de uma garrafa de vinho. No caminho suas roupas sujas de terra ficaram largadas no chão. O barulho da rolha saindo do gargalo da garrafa se propagou pela cozinha silenciosa. Ela levou a garrafa a boca e se sentou no chão somente de calcinha e sutiã. Seus pensamentos bagunçados se alinharam em uma única pergunta. Como foi que chegou a esse ponto? A lembrança ainda queimava dentro dela, tão vívida e cruel como se estivesse acontecendo novamente. Flashback on Com o rosto banhado de lágrimas, Samanta viu Alberto Darius, o homem que durant