Tive um sono agitado, então, eu estava morrendo de sono na manhã seguinte, mesmo assim, me arrastei para fora da cama, apesar de querer dormir um pouco mais, contudo, não podia, já que estávamos entrando na fase final de preparação da nossa grande exposição e a inauguração estava próxima, por isso havia muito trabalho a fazer. Assim, logo que cheguei ao museu e comecei a trabalhar para despertar e afastar a preguiça, tinha que catalogar algumas peças que chegaram recentemente, Helena estava me ajudando nesta tarefa, ao meu lado.
— Diana, eu quase morri de ódio, por não ir ontem a noite de autografo de Samuel Zargo. – Helena como sempre era muito exagerada. – Como é que foi lá? Encontrou com Gabriel?
— Foi legal. Samuel Zargo é muito simpático, até me deu um livro de presente — contei, sem muito entusiasmo.
— Jura! E eu perdi isso por causa de um maldito assalto! – reclamou, com raiva. — E Gabriel, ele estava lá?
— Sim, ele estava – respondi de forma casual, dando de ombros, tentava me concentrar no meu trabalho.
— E aí? – Ela não desistia.
— Ele foi muito atencioso e educado, me deu carona até em casa.
— E ele pediu seu telefone? – Ela estava muito interessada, não iria me deixar em paz até saber de todos os detalhes.
— Sim, pediu. – Não consegui mentir.
— Isso, garota! – Helena comemorou, socando o ar com em um gol.
— Não quer dizer que ele vai ligar – rebati, pessimista, ou melhor, realista, talvez, fosse melhor assim.
— Acho que ele vai ligar sim – ela reafirmou, confiante.
— Bom dia, meninas. – Suzana, nossa supervisora, se aproximou de nós sorridente. — Quero apresentá-las a Hélio, ele é representante do museu, que nos emprestou a estátua do deus dourado e outras peças para nossa exposição, e que veio auxiliar na montagem do nosso evento. – Anunciou, quando erguemos as cabeças, avistamos um belo homem alto com cabelos levemente ondulados louro e belos olhos verdes escuros, talvez com a minha idade, e que mais parecia um modelo de anúncio de perfume italiano do que alguém que trabalhava em um museu. Eu percebi um certo ar de surpresa passar pelo olhar dele, quando nos cumprimentamos, principalmente, depois que Suzana falou meu nome. Logo em seguida, eles continuaram sua excursão de reconhecimento pelo museu.
— Você viu aquilo? Que gato! Isso é uma boa média, dois homens bonitos em menos de 24 horas, apesar desse aí parece ser um tanto convencido. – Helena era muito engraçada. – E não usa aliança.
— Como você reparou isso tão rápido? – perguntei, espantada com a capacidade dela de notar este detalhe tão depressa.
— Prática! Depois de tantas roubadas, você fica atenta a isso. Você, também, reparou, Diana? Ele tem os cabelos da mesma cor que os seus, a tonalidade da pele e os olhos de vocês também são bem parecidos, até parecem irmãos.
Eu apenas sorri para Helena, em resposta ao seu comentário, pois ela não tinha ideia de como essa observação mexia comigo, apesar de que quase ninguém soubesse que sou adotada, por isso, quando falavam que alguém se parecia comigo, pensava se essa pessoa poderia ser, realmente, meu parente.
Não sei nada sobre minha família biológica. Meus pais adotivos me acolheram, depois de vários anos tentando ter seus próprios filhos, mas nunca conseguiram. Não haviam pensado em adoção até o momento que soubera da existência de um bebê recém-nascido, cuja mãe morreu no parto, e a família não tinha condições de criá-la, por isso, viajaram para outro estado para me buscar e me registraram como filha legítima deles. Eles só me contaram a verdade, quando comecei a perceber nossas diferenças físicas, já que eles são morenos, pequenos e de cabelos escuros, enquanto eu sou alta, ruiva e com olhos esverdeados, depois disso nunca mais falamos sobre nesse assunto. Só algumas poucas vezes, tive curiosidade de conhecer minha família biológica, mas não quero entristecer meus pais. Era da minha mãe biológica o cordão com a pedra turquesa que uso quase o tempo todo.
Passado algum tempo, Suzana e Hélio voltaram de sua excursão.
— Hélio ficará aqui com você, meninas, ajudando a catalogar as peças que vieram do museu dele. Vocês vão tirar algumas fotos para a documentação e o catálogo. – Suzana nos informou. – Vou deixar vocês agora. Tenho alguns e-mails para responder e m****r. Hélio, verei você depois. Com licença. –Suzana sorriu de um modo sedutor para ele e se retirou, tive a impressão que estava flertando com o nosso visitante, o que não era típico dela.
— Você vai tirar as fotos agora – indaguei, tentando ser prestativa.
— Sim, estou com minha câmera – respondeu, tirando uma ótima câmera profissional da mochila que carregava.
— Eu estava falando com Diana, como a cor dos cabelos de vocês é parecida, apesar de ser muito comum – Helena comentou, sempre indiscreta.
— Essa cor é herança da minha família que tem origem europeia – Hélio explicou, superficialmente. – E você, Diana?
— Eu não sei não conheço a origem da minha família. Vamos continuar o trabalho. – Mudei de assunto, olhando para Helena, antes que ela começasse a fazer um interrogatório com Hélio. Então, vesti minhas luvas de algodão, peguei uma das peças, que colocamos sobre a bancada mais cedo, após terem sido retiradas da caixa em que viajaram, acomodadas entre bolinhas de isopor e plásticos bolhas, abrindo o pano enflanelado em que estava envolvida com delicadeza.
— Olhe, Helena! É linda! – exclamei, mostrando a bela taça de ouro com pedras semipreciosas incrustadas e belos desenhos em alto-relevo. – Imaginando como o valor daquilo era incalculável. Agora, entendia porque a segurança do museu havia sido tão reforçada, parecia quase como se trabalhássemos em um cofre de banco.
— É linda mesmo! – Helena confirmou, a olhando de perto admirando seus desenhos.
— Ela é inestimável. Essas peças foram descobertas junto com o deus dourado em uma escavação na Mesopotâmia, foram datadas em mais de dois mil anos. – Hélio explicou, parecia não estar muito satisfeito. – Preferia que elas não saíssem do nosso museu, acho muito perigoso, esses objetos estarem viajando por aí, mas fui voto vencido no conselho.
— Mas, eu garanto que seremos muito cuidadosos com suas peças, nossa segurança foi extremamente reforçada. Nada de mal irá acontecer com elas. – Quis tranquilizá-lo.
— Então, você veio como um guardião? – Helena perguntou de modo sério, como sempre, o que vinha a cabeça.
— Pode se dizer que sim, que sou um guardião – Hélio confirmou, com um sorriso cínico.
Continuamos trabalhando, sem parar por toda a manhã, desembrulhando as peças, as catalogando e fotografando com a ajuda de Hélio.
— Estou com fome! – Helena declarou no fim da manhã – Vamos almoçar?
Eu também estava com fome e, por educação, convidei Hélio para nos acompanhar e para minha surpresa, ele aceitou. Quando saímos, o segurança trancou a porta da sala em que estávamos e fomos ao mesmo restaurante de sempre.
— Espero que goste, Hélio? É simples, barato e, principalmente, perto do nosso trabalho. – Helena explicou a ele, enquanto sentávamos com nossas bandejas. Eu me peguei, olhando em volta, procurando por Gabriel, mas ele não estava ali, hoje.
— Eu estive pensando sobre essa coincidência engraçada, pois, além de vocês serem parecidos, tem nomes dos deuses que são irmãos gêmeos. Não é engraçado. – Helena falava, achando graça da própria piada, tive que rir.
— Helena, seriamos irmãos gêmeos, mas teríamos nascido em tempo e países diferentes, pois Hélio é o deus-sol grego, é mais velho e sua irmã era Ártemis, a deusa da caça e da lua. Já Diana é romana e seu irmão seria Apolo – expliquei.
— Na verdade, Hélio é filho dos titãs Heperione e Teia e seus irmãos são Selene, a lua e Eos, a aurora, mas com passar dos tempos, ele foi cada vez mais confundido com Apolo, mas quem se importa com esses detalhes, é só é mitologia, e cada povo tem a sua, e todos levam a mesma entidade com nomes diferentes. – Ele me corrigiu, dando os ombros. – Assim como Diana e Selene também se confundem, mas, no final, sempre serão uma só – conclui, dando de ombros.
— Eu sei, mas mesmo assim, é uma tremenda coincidência. E você sabe muito sobre mitologia greco-romana. – Helena não deu o braço a torcer, e continuou – Hélio, você disse que era da Europa, mas da aonde?
— Eu disse que minha família veio da Europa. Eu nascia lá, mas me mudei, várias vezes, quando era jovem.
Helena desistiu de Hélio, talvez, por achar que não seria muito fácil conseguir tirar nada dele naquele momento, então ela se voltou para mim.
— Diana, conte mais sobre ontem à noite? Qual é o nome do livro? – Helena me indagou. – Ontem, Diana foi a noite de autógrafo do novo livro de Samuel Zargo – esclareceu para Hélio.— Não sei, acho que é “Mundo que não vemos” ou algo parecido – respondi, com dúvida— “O mundo que está a nossa volta – A guerra que não conhecemos” – Hélio complementou.— Você gosta de Samuel Zargo? – Helena perguntou, entusiasmada.— Não diria exatamente que gosto, mas tenho interesse no que ele escreve, ele tem uma visão bastante interessante sobre alguns fatos antigos.— Diana não acredita em nada disso, ela é totalmente cética – Helena explicou meu desinteresse.— Você não acredita em nada, Diana? – Hélio
Voltei para casa tarde, estava exausta, nunca estive tão cansada assim antes, imaginei se estava ficando doente, me deitei no sofá, antes de me arrumar para sair, porém quase desisti, peguei meu telefone para desmarcar meu encontro com Gabriel, mas entra uma ligação de Helena.- Diana, eu tinha me esquecido do jantar de hoje, se arrume para ir bem poderosa. – Ela me incentiva.- Helena, acho que vou desmarcar, não estou me sentido muito bem, acho que devo estar ficando gripada. – Revelei, desanimada.- Nada disso! Tome um banho e coloque uma roupa bem bonita, um salto e um pouco de maquiagem e vá à luta, garota! – Helena insistiu.- Não sei, não, amanhã temos que começar cedo, há muito trabalho para fazer – Dei outra desculpa.- Diana, enlouqueceu
- Isso não rola, a gente mal se conhece. Não sei se quero me envolver com alguém, que amanhã não estará mais aqui. – Expus meus receios para ele e para mim também, tinha que ser racional agora para não sofrer depois.- Eu entendo suas dúvidas, você não sabe quem eu sou, mas darei um tempo para descobrir. Por enquanto, boa noite, Diana – Pegando minha mão e beijou a palma dela, e eu tive vontade de voar para cima dele e beijá-lo, mas me contive, sai do carro e dei boa noite, rapidamente, antes de mudar de ideia.Entrei rapidamente no meu prédio, sentindo ele me observar até desaparecer da sua visão, e quando cheguei ao meu apartamento, precisava de um banho para relaxar e conseguir dormir. Foi o que fiz tomei um banho longo e morno, sentindo me sonolenta, deitei e quase imediatamente adormeci.
Gabriel chegou no horário marcado no museu, que ainda estava aberto para visitação, havíamos combinado nos encontrarmos bem na entrada, pois seria mais fácil.- Então é aqui que você trabalha? – Ele me perguntou, parecendo interessado.- Sim, é um dos melhores do país. – Disse, orgulhosa.- Posso conhecê-lo? – Ele pediu.- Claro que pode! Vamos, você nem precisa pagar. – Estava empolgada, pois adorava mostrar o que fazíamos lá.Para isso, andamos pelas salas de exposição, eu entusiasmada, falava sobre tudo, como havia sido montada cada uma das salas e as histórias das peças expostas.- Estou sendo uma chata. – Confessei, quando dei conta da minha tagarelice- Não, eu estou gostando. Continue. – Ele me animou.- Você está sendo gentil, vamos embora.
- Mas são histórias antigas, ainda bem que você estava por perto. – Ao ouvir ele falar assim, lembrei que Gabriel falou algo parecido. – Não quero que tenha uma má impressão de mim.- Claro que não, Hélio. Isso é apenas relativo a você e a Gabriel, não tenho nada a ver com isso. – Falava, olhando para Gabriel, que não estava com uma cara boa.- Por isso quero me redimir, podemos almoçar amanhã? – Hélio me convidou.- Almoçar amanhã? – Repeti o convite, surpresa, os olhos de Gabriel ficaram negros de raiva.- Sim, seria um sinal de boa vontade. Você aceita? – Hélio insistia, e eu não sabia o que fazer.- Jantar! – Gabriel falou baixinho.- Que tal jantar, amanh&at
Passei a amanhã de domingo toda, lutando contra mim mesma para não ligar para Gabriel, mas ele ligou.- Tem certeza, que não quer almoçar comigo? – Ele insistiu, mais uma vez.- Tenho. – Estou indecisa.- Não senti muita convicção na sua voz. Reconsidere, será somente um almoço. – Gabriel não desistia.- Somente um almoço. – Concordei, não foi uma batalha muito difícil de ser ganha.- Ótimo! – Ele exclama, feliz – Passo aí em quinze minutos.- Não, preciso de tempo para me arrumar! – Reclamei.- Então, em uma hora. Até mais tarde.Tomei um banho, escolhi um vestido, arrumei meus cabelos e, por fim, coloquei o meu cordão com pingente de turquesa, em menos de uma hora estava pronta e ansiosa, quando Gabriel chegou.- Vou levá-la a um dos meus l
- Na verdade, eu acho toda esta história muito interessante. Você já pensou que algumas crenças têm milhares de anos. Que os seres humanos estão sempre procurando explicações ou respostas por caminhos desconhecidos para acalmar seus medos, mas, talvez haja um fundo de verdade em tudo isso.Não queria começar uma discussão filosófica sobre crenças e fé com ele, não era esse o motivo do nosso jantar, por isso logo após pedirmos os nossos pratos, ele começou a falar.- Sei que foi lamentável a cena que você presenciou ontem no museu, gostaria de me desculpar.- Desculpas aceita!- Não via Gabriel há muito tempo, tivemos desavenças muito sérias no passado – Justificou.- Foi por causa da sua irmã
O sono fez pesar meus olhos, mal conseguia mantê-los abertos, já era bem tarde, precisaria de algumas horas de descanso, antes do trabalho no dia seguinte. Fechei o livro, fui para o meu quarto, apaguei a luz e fechei as cortinas da janela, porém tive o estranho pressentimento que lá embaixo, na rua, em algum lugar na escuridão, Gabriel me observava.Naquela noite, sonhei com uma batalha, sobre muralha muito alta, eu vestida como uma guerreira com meia armadura e capacete, trazia um arco e aljava com flechas nas minhas costas e na minha mão havia uma espada, lutava ferozmente para me defender dos muitos guerreiros que me atacavam. Olhei para o lado, Gabriel estava vestido como um guerreiro oriental com turbante e calças largas e o peito protegido por uma malha de ferro, também, lutava bravamente, mas haviam muitos soldados a nossa volta, estávamos perdendo a batalha, e só havia uma saída.- V&a