Novata

== 2 Dias Atrás... ==

 

“Pô, o treino hoje foi pesado! Como você tá tão animada aí? Minhas pernas tão parecendo gelatina”, resmungou Amanda do banco do motorista, segurando o volante como se fosse escapar das mãos dela a qualquer momento. Angelina riu.

 “Não foi tão ruim assim.”

Sempre me diverte ver como a Amanda age quando tá com fome e ela sempre fica faminta depois do treino. Essa garota é praticamente uma criança de vinte anos.

“A competição tá chegando em algumas semanas, a gente tem que treinar mais forte que o normal se a gente quiser ganhar.”

“Ai, nem me lembra disso.” Reclamou Amanda. “Você tava toda empolgada porque dançou com aquele gato do Dário dessa vez.”

“Isso não é verdade!” Angelina rebateu, suas bochechas ficando vermelhas. E isso não passou batido por Amanda.

Um sorrisão zombeteiro estampou o rosto dela.

“Ahã, claro. Eu acredito totalmente em você. Quando é que você vai chamar ele pra sair?”

 “Não começa!” Angelina adorava a amiga, mas a Amanda podia ser bem intrometida às vezes.

Juro, Amanda devia ter virado detetive em vez de entrar na faculdade de arte.

As duas se deram super bem logo no primeiro semestre da faculdade. Faziam o mesmo curso e tinham o sonho de virar coreógrafas. Angelina não tinha amigos verdadeiros no colégio. Conhecer a Amanda foi uma sorte pra ela.

“Ah, para! Você tá caidinha por ele desde sempre.” Pressionou Amanda.

“Não importa. Você sabe que eu nunca vou chamar. Ele tá muito fora do meu alcance.” As palavras de Angelina foram sumindo quando ela viu sua casa ao longe.

“Hein? Seu pai comprou um carro novo?” Amanda perguntou, enquanto o carro dela se aproximava cada vez mais da casa de Angelina.

“Até onde eu sei, não.”

Um SUV preto com vidros escuros estava estacionado na entrada da garagem. Por algum motivo, Angelina sentiu um mau pressentimento quando viu aquilo, que deixou o coração dela afundado.

Por favor, que não seja mais problema, pensou ela.

“Quer que eu vá com você?” Perguntou Amanda quando parou o carro vermelho dela na frente do jardim. Preocupação estava nas palavras dela, e Angelina não a culpava. Ela sabia do mau hábito do seu pai. E aquele carro estranho parado ali, não era um bom sinal.

"Não, não se preocupe." Angelina deu um sorriso fraco. "Tenho certeza que é só algum amigo dele que eu não conhecia."

A expressão da Amanda deixava claro que ela não estava convencida, mas também não insistiu.

"Tá bom. Me liga se acontecer alguma coisa, ok?"

"Vai ficar tudo bem. Te vejo amanhã." Angelina fechou a porta do carro e respirou fundo, quando se viu sozinha na frente de casa.

Seus passos nervosos a levaram até a porta da frente. Ela estava entreaberta.

Um arrepio desconfortável percorreu sua espinha enquanto ela entrava na ponta dos pés. Angelina não sabia ao certo porque estava andando na ponta dos pés, ela só estava seguindo seu sexto sentido.

"O tempo acabou."

A garota congelou ao ouvir a voz grave desconhecida de um homem vinda da sala de estar.

"O chefe foi paciente com você, mas ele quer o dinheiro de volta." Outra voz acrescentou, com um tom de ameaça.

Inconscientemente, Angelina cobriu a boca com a mão, encostando suas costas na parede. Ela então, reuniu coragem e espiou com cuidado atrás da parede.

Foi aí que ela viu aquela cena. Três homens grandes vestidos de preto cercavam seu pai, que estava todo machucado. A mesa de centro de vidro estava quebrada e ela conseguia ver pequenos pontos de sangue no chão misturados aos pedaços de vidro. Eles o fizeram se ajoelhar diante deles, tremendo de medo.

“Não, eu consigo o dinheiro! Juro! Só preciso de mais tempo.” O apelo do pai dela foi interrompido por um soco poderoso em seu queixo. Ele quase tombou no chão, a mão levando ao rosto machucado. Angelina tapou a boca para não gritar de horror, lágrimas começando a cair dos seus olhos.

“Eu disse que SEU TEMPO ACABOU!” O gangsta rugiu, fazendo as paredes tremerem.

“Já te demos tempo demais para pagar sua dívida, seu velho idiota. Agora vai pagar com a sua vida.” O outro homem sacou uma arma que estava escondida atrás da jaqueta, apontando-a para a testa do pai dela.

Angelina viu o dedo daquele homem no gatilho, ameaçando destruir a vida do seu pai ali naquele momento, então, movida por uma força desconhecida, Angelina agiu por impulso.

“Não!!”

Seu grito ecoou pelo cômodo e  todos os olhos se viraram instantaneamente para ela.

Só então ela percebeu o que tinha feito e o terror tomou conta do seu corpo.

“Pensei que não tinha mais ninguém aqui”. Um dos criminosos olhou para baixo, a boca aberta em horror e choque, torcendo o rosto de forma estranha.

Claramente, o pai dela não esperava e nem queria vê-la ali. Ele tinha uma esperança ingênua de que ela estaria em casa muito mais tarde.

“N-não, não machuquem ela, por favor. Ela não tem nada a ver com isso.” Ele implorou, o desespero crescendo a cada segundo.

“O chefe não gosta de testemunhas e nós também não.” O homem com a arma se virou para ela. Apenas um único olhar dele a fez dar um passo para trás, tomada pelo medo.

“Pena matar uma coisinha tão bonita”, comentou o segundo homem.

“Você não precisa fazer isso!” Angelina engoliu o nó na garganta “Eu posso pagar essa dívida.”

O capanga armado jogou a cabeça para trás, rindo de maneira perversa.

“Haha, é mesmo? E como você vai pagar 100 mil dólares?”

A quantia fez sua cabeça girar.

Meu Deus! Pai! O que diabos você fez?!

“P-por favor. Eu vou conseguir o dinheiro.” Seu pai implorou novamente, só para ser silenciado por um empurrão violento do criminoso que estava atrás dele.

“Calado, velho.” Ele rosnou.

“Sinto muito, queridinha. O tempo dele acabou e o seu também.”

O coração dela parou quando viu a arma apontada para sua cabeça.

“Nada pessoal. Você só está no lugar errado, na hora errada.”

Em momentos assim, a mente para. Aquela arma, o terror absoluto no rosto de seu pai e toda a sua vida passou como um raio diante dos seus olhos.

Ela não conseguia se mover nem para salvar sua própria vida. Mas ainda havia algo que ela podia fazer...

“Posso trabalhar para vocês.” Angelina disparou, seu próprio cérebro tentando entender o que tinha acabado de dizer.

O mafioso com a arma parou, segundos antes de seu dedo apertar o gatilho. Intrigado, ele observou a jovem tremendo.

“Trabalhar para nós? Além de uma boa foda, não tem nada que você possa nos oferecer, garota.” Ele riu sombriamente. “Se bem que eu não recusaria isso também”

Angelina deu um passo para trás quando o homem começou a se aproximar dela, a olhando dos pés a cabeça de forma nojenta.

 “P-por favor, não...” Seus olhos se arregalaram, ela nem tinha pensado nas coisas que eles poderiam fazer com ela. Coisas piores que a morte.

“Espera.” O terceiro homem, que estava em silêncio o tempo todo, falou. Ele estava sentado na poltrona, com as pernas cruzadas e uma expressão entediada no rosto. De alguma forma, ele conseguia dar mais arrepios do que o cara com a arma. Seus olhos gelados pousaram em Angelina como se pudessem ver através de sua alma.

“Uma garota recentemente... desistiu. O chefe está procurando uma nova.” Ele declarou calmamente. Havia um ar de poder sobre aquele homem, ele comandava o ambiente sem se mover um centímetro. Era como se a cena não o incomodasse nem um pouco. Um homem sangrando ajoelhado no chão, uma mulher sendo ameaçada com uma arma; parecia que ele já tinha visto tudo aquilo e muito mais.

“Ela serve para o trabalho.”

 

== Tempo presente... ==

 

As cortinas vermelhas e aveludadas foram abertas, revelando um grande salão agitado. As batidas de som alto que balançavam até a alma explodiam nos alto-falantes, enlouquecendo a multidão. Garçonetes sem blusa entregavam bebidas, rindo dos clientes que as tocavam sem vergonha, e mais algumas garotas os conduziam para as partes mais escuras do clube.

O ar tinha cheiro de sexo, nicotina e bebida forte.

“Boa sorte,” murmurou Zoe, empurrando Angelina para um palco com um pole dance.

A garota mal teve tempo de reagir ao ambiente antes de se encontrar no centro da atenção de todos. Uma nova música começou e os aplausos selvagens ecoaram pelo salão, apitos e palavras obscenas lançadas em sua direção de todos os lados.

Muitos homens, chapados do que quer que tenham tomado, gritavam para ela tirar a fina lingerie e se aproximar mais deles. Todo o seu ser gritava para ela sair daquele palco. Não havia uma única célula em seu corpo que não estivesse desconfortável fazendo aquilo.

Mas se ela escapasse significava morte para seu pai e até para ela mesma. Naquele dia, ela havia selado seu destino e agora só tinha que...

Aguentar tudo aquilo e rezar para que acabasse logo.

Com o primeiro movimento de seus quadris, a multidão abaixo do palco enlouqueceu. Ela tentava não olhar e ignorar as mãos esticadas tentando agarrá-la de todos os lados. Em sua mente, ela estava em um estúdio de dança vazio, ensaiando sua coreografia para a competição.

Seus movimentos eram afiados e precisos, ela se aproximava da borda do palco. Seus quadris se moviam no ritmo da música e suas mãos percorriam seu corpo sedutoramente. Ela não tinha a menor ideia de como trabalhar no pole dance, mas tinha visto filmes o suficiente e tinha experiência suficiente em dança para tentar.

Angelina agarrou a barra metálica bastante grossa, deixando o impulso levar seu corpo em um giro.

"Quero mais!"

"Quero ver sua bunda!"

"Vem mais perto, Angel!"

Seus olhos se fecharam, seu corpo se torceu em volta do poste de ferro.

Ignorar... ignorar... igno-

Então, ela viu. Olhos firmes a observando à distância. Olhos que eram diferentes daqueles dos clientes excitados se empurrando aos seus pés. O olhar daquele homem a comandava, como se quisesse que ela olhasse para ele.

E ela olhou.

Seu olhar encontrou dois poços cinzentos. Eram como fumaça soprando ao vento, vindos de um fogo que queimava tudo até o chão. O calor dos olhos cor de gelo dele poderia incendiar seu corpo.

Então, como se sofresse um curto circuito, Angelina paralisou.

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