4 Sem nome…

Alana não conseguiu dormir mais nada depois de ouvir aquelas palavras, cada peça daquele quebra-cabeças só deixava tudo mais confuso e sentia como se estivesse diante de um poço sem fundo, o que poderia ser considerado cômico se não fosse tão dramático.

O dia amanhecia quando percebeu que realmente não conseguiria voltar a dormir, então, foi para a biblioteca e enquanto procurava por algo do seu interesse, se perdeu em pensamentos. De repente, se lembrou do longo sermão que a irmã Joana havia lhe dado quando a encontrou lendo algumas de suas leituras “tortas”, e riu se questionando o que a mulher teria dito se a visse lendo O Retrato de Dorian Gray.

Eram suas pequenas rebeldias.

         Foi tirada de seus devaneios quando ouviu uma respiração ofegante e passos apressados às suas costas, a menina se virou, assustada e ainda pensando que talvez aquela casa fosse assombrada, mas se deparou com uma Olivia pálida e ofegante.

– Não faça isso! A mulher exclamou depois de tomar algum fôlego. – A senhorita não pode passear por aí, ainda mais operada.

O incômodo na face dela era óbvio. E enquanto ambas retornavam ao quarto, a ama tornou a explicar à menina sobre o cuidado que precisava ter com suas ações. 

– Esteja ciente de que quando sair por essa porta, precisará estar perfeitamente saudável, ou aparentar estar! Explicou exasperada, em sua mente, não havia como uma jovem de quatorze anos compreender ou aceitar tal instrução, mas precisava ensinar, era seu trabalho afinal.

Alana parou, pensativa e a encarou por longos minutos, cogitando suas possibilidades. Na verdade, ela já havia pensado sobre isso ao ouvir a conversa estranha entre sua tia e os irmãos, mesmo sendo uma adolescente, ela conseguiu identificar a dor presente nos olhos da mulher, mas admirou seu posicionamento frio.

Não tinha certeza se poderia fazer aquilo, mas precisava, então, no fim, balançou a cabeça, murmurando que entendia. Quando parou em frente à porta de seu quarto, olhou para a ama por sobre o ombro e deu um sorriso de canto, tentando quebrar o clima pesado.

– Aliás, porque tudo nesse quarto é branco? Indagou arqueando uma sobrancelha, aquilo a incomodava já há um tempo.

– Quer mesmo saber...? Olivia devolveu a pergunta com um sorriso cúmplice, e dando uma piscadela. – Então terá que descobrir por conta própria…

Alana franziu o cenho, achando aquilo um absurdo, mas balançou a cabeça positivamente, fechando os olhos e concordando, era obediente, afinal.

Algumas horas se passaram e logo, estava de banho tomado e novamente sobre os sapatinhos pretos de fivela. Caminhou pelos corredores, ciente de que, a qualquer momento, acabaria se encontrando com os outros membros da família, mas para a sua surpresa, foi com Lorenzo que se deparou primeiro.

– Era justamente você que eu estava procurando... – Ele comentou quando seus olhos se encontraram, e então, apontou as portas de mogno do escritório, indicando que precisariam de mais privacidade. – Tenho que conversar contigo.

Alana o seguiu de perto, sentindo seu coração acelerado, atravessou as pesadas portas e se sentou numa poltrona de frente para a dele, apertou as mãos sobre o colo enquanto esperava para ouvir o  que ele tinha a dizer.

– Seus novos documentos chegaram... – Lorenzo explicou com seu costumeiro tom sério, então, abriu a maleta que trazia consigo e entregou um envelope à jovem. – A partir desse momento, você se chamará Mona Vacciani, e deverá sempre atender por esse nome!

A menina balançou a cabeça positivamente, concordando com o que lhe era dito, mesmo que internamente achasse um absurdo ter que mudar seu nome apenas pelo que imaginava ser a origem dele, ou pior, como uma forma de mostrá-la que não possuía nada inteiramente, nem mesmo seu nome.

 – Mona, preciso que preste atenção! Lorenzo tornou a exclamar com seriedade. – Esteja ciente de que sua estadia nesta casa será complicada, como já deve ter percebido, não é a única menina nessa mansão, e Pietra não tolera a existência de outra herdeira.

– Estou ciente disso... – Ela murmurou abaixando a cabeça, sentindo as dores que continuavam em seu corpo, e que, de repente, pioraram.

– Pelo visto, a cirurgia já foi feita... – O advogado mencionou, mais para si mesmo do que para a garota, parecendo desconfortável com aquele assunto.

         O semblante dele era imitado por Olivia, mas sem dizer nada.

Lorenzo checou seu relógio de pulso, e em seguida, voltou seus olhos a Alana, se lembrando da outra questão que precisava tratar com ela.

– Há um horário marcado para você no salão agora… – Explicou erguendo-se de seu lugar, pegou a maleta, fechando-a e se dirigiu à porta, dando-lhe as costas, pronto para ir embora. – Seus cabelos serão escurecidos, para ficar mais adequada ao fenótipo da família,

         A menina que havia perdido seu nome, sentiu como se tivesse perdido o chão ao ouvir aquilo. Não podia acreditar que sequer a cor de seus cabelos poderia manter, era mais uma de suas características que seria usurpada, mas novamente não disse nada, e apenas abaixou sua cabeça, tentando segurar o choro. 

          A hair stylist era uma mulher jovem de cabelos tingidos de vinho, ostentando um belíssimo corte channel que a deixava ainda mais bonita, era claramente a dona daquele lugar, mostrando o poder que aquela família possuía, fluindo mesmo nos detalhes.

         A tinta quase não tinha cheiro, e escurecia gradativamente seus fios dourados, dando à menina uma aparência que desconhecia. Fitou seu reflexo no grande espelho e então percebeu que, naquele ponto, somente seus olhos eram os mesmos.

         Olivia, que havia saído de fininho, retornou trazendo consigo uma caixinha de trufas feitas com o chocolate daquela região, algo relativamente simples, mas que demonstrava o quanto se esforçava para animar a menina.

– Obrigada! A moça, que agora se chamava Mona, agradeceu baixinho, provando uma das trufas, mas antes, encarou intensamente a ama. – Por favor, não me magoe, pois confio muito em você…

A confissão saiu em forma de fungado, abafado pela mastigação, mas que foi o suficiente para a ama se sentir péssima por pensar que a menina era outra peste, e com um sorriso tranquilo, a puxou para perto, abraçando-a.

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