Ele ficou ali estarrecido, confuso e aturdido com tudo que estava presenciando, sentiu o coração bater à boca, um frio na espinha delatava seu medo. Ofegante andava de um lado para outro tentando entender ou encontrar uma resposta razoável sobre tudo que estava acontecendo. virou-se para olhar o ônibus e a lanchonete, viu que seus companheiros de viagem estavam retornando para o veículo em fila indiana. Ele se aproximou e ficou frente à frente com Helvis.
_O que está acontecendo?
_Ora! Uma viagem para São Paulo. – A resposta foi cínica.
_Você sabe que não é a isso que me refiro.
_Tudo se trata dessa viagem à São Paulo, entre logo para não perdermos tempo. – Helvis falou e sem esperar a resposta de Arthur foi entrando no ônibus.
O Chofer manobra o veículo com brutalidade e displicência, aos trancos ele ganha o portão de entrada e saída gerando uma grande tensão em Arthur que ainda não vira a possibilidade de passarem pelo desfiladeiro, tentou avisar o Chofer e depois Helvis, entretanto ambos o ignoraram e o ônibus seguiu bravamente em frente, ao passar pelo portão Arthur sentiu um frio na barriga, um solavanco e em seguida a “maciez” da rodovia.
Arthur se recostou na poltrona, seu coração ainda pulsava forte, sua mente estava em frangalhos, não conseguia ver a lógica em tudo que estava acontecendo, a única hipótese viável pouco conveniente seria o fato dele estar morto e seguindo um longo caminho do purgatório ao inferno. Estes pensamentos o torturaram por muitos minutos, a angústia e o medo dominaram seus pensamentos e quando já não suportava mais foi salvo por Helvis.
_Quer desabafar?
_Não! – Arthur estava irritado com tudo que passara. _Quero explicações, caso contrário me deixe aqui no meio do caminho.
_Certo, vou tentar explicar, mas acredite, poucos entendem. – Helvis então começou a explicar parte do que era tudo aquilo. _Nós somos um transporte diferente, estamos entre a realidade, o imaginário e o mundo espiritual. – Ele conseguiu a total atenção de Arthur. _Não somos do bem nem do mal, apenas temos o dever de lhe passar tudo que demais importante aconteceu em sua vida, os pontos impactantes que foram determinando sua caminhada ao longo da vida.
_Então eu morri? – Arthur fala com aflição.
_Não! Ainda não. – Antes que Arthur interrompesse novamente, Helvis ergueu seu dedo indicador em riste pedindo silêncio enquanto explicava. _Depois de tudo que vermos e falarmos nesta viagem é que será decidido se você morrerá ou não.
_Como assim? Eu quero viver. _Arthur segue aflito com a ideia de morrer, afinal havia acabado de abster-se da morte para fazer aquela viagem.
_Meu caro, depois do que fez naquele quarto imundo e deprimente, você perdeu totalmente o pouco poder que tem sobre sua vida.
Neste momento uma imagem assustadora invadiu a mente de Arthur como um pesadelo cheio de sentimentos verdadeiros, ele retornara em seu quarto, horas atrás, e estava sufocando pendurado em sua própria forca, os olhos já esbugalhando e seus membros espasmando. Em seu último suspiro de força conseguiu soltar um grunhido tentando pedir socorro, totalmente arrependido do que estava fazendo, assim neste sentimento de quase morto ele retornou a realidade.
_Pare este ônibus! Quero descer! – Arthur entrou em pânico, a incerteza de estar vivo ou não, de estar falando com sua imaginação ou com algum espírito, lhe deixava apavorado.
_Acalme-se. – Helvis segue sereno. _Como eu disse, aqui não tem certo ou errado, céu ou inferno, absolvição ou condenação, apenas fazemos um levantamento sobre os fatos impactantes que aconteceram em sua vida. Nem sempre buscamos todos os acontecimentos, alguns reclamam que faltou um ou outro momento marcante, a verdade é que ninguém tem a capacidade de analisar a si mesmo, é como você querer corrigir seu próprio texto, sempre passa algo despercebido. No seu caso os fatos apresentados foram apenas o início.
_Não quero mais isso.
_Te entendo, entretanto, as coisas aqui acontecem independente do que você deseja ou não.
_Não acredito em você e em nada do que diz, isso certamente é um sonho.
_Helvis passou sua mão próximo ao rosto de Arthur, lentamente seus dedos alongados, tatuados e cheios de anéis com unhas enormes fizeram Arthur fechar seus olhos morosamente até que entrou em um sono profundo.
O tempo passa e a estrada parece não ter fim, a neblina se dissipa e agora é uma chuva torrencial que assola a rodovia, o ônibus segue balançando devido ao vendaval da tempestade, de repente Arthur acorda e solta um berro de horror, pois dá de cara com um rosto sinistro lhe encarando.
_Meu Deus! – Ele se segura na poltrona e tenta se recompor com os olhos arregalados. _Quem é você?
Antes que aquela pessoa pudesse lhe responder sua mente começou a trabalhar e o tele transportou para o passado, ficou em uma espécie de transe de olhos fechados com a cabeça balançando de um lado para outro devido ao chacoalhar do ônibus na estrada. Ainda adolescente, já vivia sinais de revolta com a vida e com o sistema, conversava com um amigo em uma rua estreita, eles estavam combinando como seria o fim de semana enquanto tocavam a bola de futebol de salão de pé em pé um ao outro, como um treino sem compromisso e na época esse modelo de bola era pequena e dura. Um garoto mais jovem estava passando de bike pela rua em alta velocidade, “tirando fina” dos adolescentes, passou uma vez, duas vezes, na terceira vez Arthur se enfureceu e avisou ao garoto que não passasse mais por ali. A advertência não resolveu a situação e o garotinho parecia estar afrontando os rapazes, quando ele vinha mais uma vez em alta velocidade Arthur apenas rolou a bola lentamente na frente da bike, quando o pneu dianteiro acertou a bola dura a frente da bike ergueu jogando o garoto para longe e fazendo ele se estatelar no chão. Arrebentou a bike toda e o garoto também, que foi embora com uma fratura no braço esquerdo socorrido por vizinhos.
Aquela lembrança feriu o peito de Arthur como uma navalha, o arrependimento foi grande, e suas lágrimas escorreram pelo rosto, ao abrir os olhos viu que aquele rosto pavoroso era do garoto e outra imagem lhe veio à mente, esta não era lembrança e sim uma informação da consequência do que havia feito. Novamente fechou os olhos e como flashes, ele viu o garoto crescendo entusiasmado com o esporte, jogando basquete na escola, com arremessos precisos em seguida viu ele confidenciar a sua mãe que um dia se tornaria um grande jogador de basquete, reviu o acidente e na sequência o parecer do médico informando o garoto e aos pais que o braço dele jamais voltaria a ser como antes devido à demora no atendimento, o membro do garoto ficou torto e jamais conseguiu desempenhar uma boa performance para entrar em um time de basquete ou praticar qualquer outro esporte que tenha a habilidade dos braços como principal recurso. O fato do acidente causado por Arthur desencadeou uma consequência negativa na vida daquele jovem, destruindo seu sonho e tornando-o uma pessoa doente e depressiva.
Ao reabrir os olhos aquele rosto já não estava mais na sua frente lhe encarando, Arthur sentia-se terrivelmente esgotado, olhou para o lado e viu Helvis sereno em sua poltrona apenas observando o que estava acontecendo. Ele sentiu uma presença e olhou para frente novamente, e lá estava outro rosto, tão sinistro quanto o anterior. Imediatamente ele mergulhou nas lembranças funestas de seu passado, algumas luzes e de repente ele estava caminhando por um parque com um amigo de mesma idade, porém tinha a aparência diferente de Arthur, era magro, alto esguio com cabelos longos, todo de preto com correntes penduradas nos bolsos da calça, no pescoço e no pulso, carregava uma mochila nas costas onde era possível ver a ponta de dois porretes de madeira que não couberam por completo na bolsa. Arthur ao seu lado de bermudão e tênis iate carregava um saco de estopa que sacudia freneticamente e quanto mais aumentava o barulho de grunhido com o farfalhar do saco, mais eles aceleravam os passos. Quando estavam bem longe em um local isolado do parque entre árvores e arbustos, jogaram o saco no chão e cada um com seu porrete passou a espancar o pacote que continha um gato adulto. Foram muitas pancadas e grunhidos até que uma mancha de sangue pôde ser vista e o que estava lá dentro ficou quieto e imóvel. Banharam o saco com álcool e atearam fogo, mesmo longe do local era possível sentir um cheiro ruim do estava sendo queimado. No mesmo dia a pequena Mariana, vizinha dos jovens, procurava seu gatinho de estimação, o Pitico, sem sucesso. Os garotos sentados na calçada tomavam refrigerante e riam da cena, eles sabiam que a menina jamais voltaria a ver seu gato. Arthur berrou e abriu os olhos arregalados, ele reconheceu aquele rosto, era Mariana e começou a se desculpar freneticamente. Um baque em sua mente o jogou para trás na poltrona do ônibus e as imagens da consequência começaram a ser transmitidas em sua mente. Mariana amava seus pets de estimação e sonhava em ser veterinária, porém tempos depois de terem encontrado seu Pitico torturado e queimado ela se revoltou com a vida, passou a ver nas pessoas somente o ódio gratuito que carregavam dentro si, se isolou de tudo e de todos tornando-se uma adulta amarga, rancorosa e triste. Não fez faculdade de veterinária e nem uma outra, trabalhou de garçonete em uma lanchonete no centro obscuro da cidade e se tornou uma mulher fácil e drogada.
Arthur acorda todo grudento de lágrimas e secreção nasal, atordoado sem saber exatamente aonde estava olhou para todos os lados de forma rápida como alguém que está sendo espionado. Não havia mais nenhum rosto assustador lhe olhando com os olhos acusadores em uma fisionomia mórbida. Respirou fundo e limpou seu rosto esticando a camiseta que usava, enquanto se acalmava da experiência negativa que passara olhou para o lado e lá estava Helvis, com seu sorriso sereno. Olhou para frente e viu que a chuva estava quase cessando por completo e no horizonte algumas nuvens começavam a se dissipar dando espaço para um céu claro de fundo azul. Conforme foi retomando consciência da situação percebeu que havia viajado a noite inteira e isso lhe causou um novo desconforto dando-lhe um aperto nas tripas. Exausto e um pouco desorientado, Arthur se senta em um banco de janela onde se recosta e passa a observar o passar rápido das faixas de sinalização no asfalto. O trepidar do ônibus fazendo sua cabeça dar rápidas e repetidas batidas no vidro não lhe incomodam, era como se o torpor escorresse junto pelo asfalto desafogando sua tensão. No horizonte as listras avermelhadas e alaranjadas por entre nuvens anunciavam mais um dia frio de outono, o relevo montanhoso parecia estar coberto por um véu de noiva, uma névoa densa que logo se dissiparia com o nascer do sol.
Ele olhou para o lado e viu Helvis lhe encarando.
_O que quer? – Os olhos de Arthur esbugalhados encaravam Helvis, os nervos lhe saltavam pelo pescoço, ele estava à beira de um colapso.
Tranquilamente seu opositor e educado companheiro de viagem sorriu.
_Não tenha um fim trágico antes da hora, muita coisa ainda acontecerá, talvez até boas.
_Seu idiota, me deixe em paz.
_Logo tudo acabará e você não mais terá o prazer da nossa presença.
_Por que não chegamos nunca? – Arthur falava esfregando as mãos, o desespero e o nervosismo estavam a flor da pele. _Diga a verdade. - De forma insana ele gritou desesperado. _Estou morto?
_As pessoas têm uma grande dificuldade em entender que tudo tem seu tempo.
Arthur sentiu náusea e voltou-se para a janela, não suportava mais as palavras de Helves, eram como navalhas lhe cortando a alma. Agora seu estômago doía de desespero em querer ver sua netinha, porém sua mente estava em dúvida se ele realmente estava ou não morto. Pensar na possibilidade de não estar vivo lhe tirava toda a esperança de rever sua amada Lalinha, somente por vê-la já valeria a pena seguir vivo neste mundo infame. Sua pequena “maçãzinha”, como costumava chamá-la, era a melhor lembrança de sua amada esposa, a pequena tinha os olhos e o sorriso da avó.
Após alguns minutos finalmente o ônibus começou a reduzir a velocidade dando a entender que estaria estacionando em outra parada, Arthur viu esta possibilidade como uma grande oportunidade de fugir daquela situação escalafobética que estava vivendo.
Assim que o veículo deu seu último solavanco chacoalhando todos com brutalidade em seus bancos e liberou o ar comprimido dos freios como se fosse um apito de fábrica, a porta abriu imediatamente em um grande baque. Arthur se manteve em seu lugar apenas observando, esperava a melhor oportunidade para fugir.
Todos desceram e Arthur foi o último, ressabiado com os olhos arregalados observava tudo, desceu lentamente os degraus do ônibus e para sua surpresa Helvis o esperava ao lado da porta.
_Tramando algo espertinho?
_Me deixe em paz seu nojento. – Arthur se afastou olhando rapidamente ao redor tentando encontrar um ponto de fuga, foi em vão, ao redor de onde estavam era só neblina apesar do sol forte sobre suas cabeças.
Arthur entrou na lanchonete, estava tudo obscuro, apenas algumas tarantelas iluminavam o local, o ambiente era no estilo anos 60, e na juke in box tocava Johnny Rivers – A Whiter Shade of Pale e no centro do salão um globo prateado lançava feches de luz no teto nas paredes e no chão, abaixo da iluminação estava um casal dançando apaixonadamente, eram Arthur e Claudia, eles comemoravam a gravidez tão esperada que chegara após quatro anos de casados. Ao redor do casal haviam alguns amigos e muitos estranhos que frequentavam o bar, todos maravilhados com a paixão que fluía entre o casal, assoviavam, batiam palmas e cantavam, uma cena linda repleta de emoção que encheu os olhos de Arthur de lágrimas enquanto relembrava um momento tão especial de sua vida, era sua música favorita e ele podia sentir o perfume de sua amada enquanto no meio do salão o “Arthur” do passado a rodava em seus braços lançando pelo ar os cabelos castanhos mais lindos que já vira. A música chegava ao fim, baixando o volume lentamente, as luzes do globo foram diminuindo e a imagem do casal apaixonado dançando foi se dissipando. A esta altura Arthur já se encontrava aos prantos, ele pôde sentir a presença do seu amor, sentiu seu cheiro, seu corpo flutuou como se estive realmente ali, dançando com ela. Sua vida inteira ao lado dela passou diante de seus olhos, chegou a esticar a mão como se pudesse tocar o seu amor, até que tudo escureceu.
Ele fechou os olhos em desapontamento, seu peito doía de saudade, esfregou os olhos enxugando as lágrimas e quando os abriu novamente a lanchonete estava em seu estado normal, pouca iluminação, barulho da chapa quente fritando bacons e um cheirinho de hamburguer feito na hora, girou sobre o assento de couro do balcão e debruçou no balcão arrasado.
_Ela era uma gatinha hein!? – Helvis falou pousando a mão fantasmagórica de unhas imensas e amareladas no ombro dele.
_Como se atreve a falar dela? – Arthur sacudiu rispidamente o ombro tentando esgueirar-se daquele ser funesto.
_Ah! Então é assim, lhe proporciono um momento agradável e você me trata com asco. – Helvis o provoca sentando-se ao seu lado. _Já que não gostou voltarei com os casos desastrosos de sua vida infame.
_Não! Por favor! Pare com tudo isso. – Era possível sentir o desespero no tom de voz de Arthur. _Preciso descansar, não aguento mais.
_Ora, ora! E como pretende escapar de nós tão cansado assim?
Aquelas palavras de Helvis deixaram claro que Arthur não tinha opções, era impossível escapar de seu destino, por mais obscuro que fosse.
O tempo na lanchonete de beira de estrada parecia uma eternidade, o cheiro da gordura de fritura já começara a embrulhar o estômago de Arthur aumentando seu mal-estar psicológico e físico. O atendente se aproximou do balcão, Arthur estava de cabeça baixa, entretanto sentiu a presença do funcionário da lanchonete e antes que este lhe perguntasse o que iria comer ou beber ele se antecipou ao pedido. _Uma dose de Whisky por favor. – Antes que o atendente se afastasse ele completou. _E sem gelo por favor. _Bêbado!A voz rouca e acentuada veio do seu lado esquerdo. Arthur já sabia a quem pertencia aquela voz funesta, ergueu os olhos lentamente para confirmar e constatou o que sua percepção já lhe antecipara, era o Chofer._Me de
Uma forte pontada no frontal de sua cabeça o faz acordar, era a ressaca de uma garrafa de whisky, estava deitado ocupando dois bancos do ônibus, por alguns momentos sentiu-se perdido até que conseguiu sentar-se e erguer a cabeça com sua visão alcançando a estrada pelo para-brisa. Para seu desespero, além daquele sentimento horroroso de ressaca que já não sentia há mais de quinze anos, percebeu que tudo seguia como antes, uma estrada úmida, escura e embrenhada em uma névoa sem fim. _Seja bem-vindo de volta meu caro. Aquela voz rouca parecia rachar seu cérebro ao meio, como quando se engole uma bola de sorvete inteiro de uma só vez. _Não enche.&
Sentindo sua energia se esvair, Arthur está exausto na plataforma de embarque da linha vermelha na estação Praça da Sé do metrô sentido zona leste de São Paulo. Esgotado, sem forças para se mexer, sente mãos rígidas o pegarem pelos dois braços e imediatamente ele percebe seu corpo ser erguido e em seguida é colocado sentado de volta em um dos bancos. Ao abrir os olhos, Arthur vê que se trata de dois seguranças do Metro. _O senhor está bem? – Um deles perguntou de forma simpática e preocupada. Buscando se encontrar nos fatos Arthur deixa escapar um sorriso amarelo. _Não sei dizer, acho que estou sim.&n
Uma semana antes da fatídica viagem de Arthur ao mundo sobrenatural, os dias seguiam insuportáveis, seu tédio e depressão o amarravam no quarto deixando-o isolado do restante do mundo em um profundo poço escuro e sem fundo. A imersão no silêncio caótico é quebrada pelo ruído de arranhões na porta de vidro da sacada, Arthur contrariado se levanta da cama e vai suportando a dor latejante de seu joelho direito atender a um pedido de socorro, se arrasta pelo quarto levando consigo as dores do corpo e a tontura de uma forte ressaca que por vezes o visitara nos últimos dias. Chegando próximo a sacada o som das arranhadas ficam mais intensos e um miado longo deixa claro quem está fazendo aquele alarde, era Baltazar, seu amigo cinza. Arthur abriu a cortina de cor vinho que deixava o ambiente da sala em penumbra, a claridade afetou-lhe os olhos.&n
Uma brisa gélida toca o rosto de Arthur que acorda preguiçosamente, sente as pálpebras pesadas e um sentimento de “ter que abrir os olhos contra a própria vontade”, o cansaço o dominava por completo adicionado a um amargor na garganta e um pontada sequencial na parte anterior da cabeça, metade de sua consciência insistia em despertar e seguir em frente a outra o forçava a fechar os olhos e continuar em sono profundo. A brisa se transformou em um vendaval repentino que assustou Arthur fazendo-o dar um salto e ficar sentado no banco de madeira, ainda sonolento e agora sentindo uma ansia, percebeu que estava em frente a um restaurante de beira de estrada, mais precisamente na saída da cidade de Barueri-SP, era fim de tarde no crepúsculo as nuvens do horizonte estavam pintadas com manchas escarlate, ele ficou ali contemplando aquele raro momento de paz quando um piar de gavião o trouxe para a realida
Fortes solavancos chacoalham os passageiros do Meteoro bruscamente de um lado para outro, o Chofer mantém sua total atenção na estrada com os olhos esbugalhados e o suor escorrendo em seu rosto; a tempestade os alcança e o vento por vezes tenta empurrar o ônibus para fora da rodovia, à frente troncos de árvores caem no meio da pista obrigando o Chofer a mostrar todo seu talento ao volante, suas mãos seguram o volante com firmeza e segurança e alavancado pelos longos braços que correm por cima da direção realiza curvas precisas de um lado a outro com a precisão de motoristas dublês em filmes de ação, desviando de um lado para outro, tirando fina dos obstáculos e do guardrail. Arthur apesar de estar em desespero assim como todos ali, ele fica por um momento paralisado, como se sonhasse acordado olhando para o nada, sua mente viajava por toda a sua linha tempora
Um espasmo vibrou o corpo inteiro de Arthur, seus olhos estavam pesados e aos poucos foi sentindo um amargo na boca que descia pela garganta através de um tubo, ao longe o som de um bip ia constantemente e gradualmente entrando em sua mente como se alguém estivesse tentando hipnotiza-lo com algum tipo de dispositivo mecânico. A visão embaçada lhe permitia ver apenas manchas e vultos em um ambiente pálido, em meio a um leve desespero não tinha forças para se mexer ou emitir algum ruído. Aos poucos a sensação de fobia foi lhe tomando, bem como a razão foi entrando nos eixos. Tentava se manter calmo para entender o que acontecera, ao passo que uma sonolência lhe tomara quase que por completo fazendo-o fechar os olhos e voltar ao seu estado de inércia. Vinte e quatro horas depois seus olhos voltaram a reagir, A
As luzes da cidade deserta distorcem seus reflexos por entre as águas da chuva que caem torrencialmente em uma noite fria de outono. Próximo ao centro, em uma esquina de construções do século XIX onde um dos prédios com três andares chama a atenção pelo seu estado de deterioração. No terceiro andar, em uma janela que tem a visão da avenida principal, um quarto escuro está iluminado apenas pelos flashes de ferozes relâmpagos e pelo neon do bar Trago Nosso De Cada Dia, dentro do cômodo é possível ver uma corda com nó de forca pendurada acima do batente superior da porta e apenas o vulto de Arthur Flammer sentado à beira da cama olhando pela janela a chuva cair incessante na noite fria com seu rosto paralisado recebendo as cores rosa, verde e branca do neon, um ambiente propício para executar seu último ato, aquele que en