LUIZ FERNANDO
― Beber não é seu forte não é mesmo? ― Disse uma loira ao meu lado no bar.
― Não!
― Dá pra perceber, ou você odeia esse copo de vodca, ou está com muita raiva de alguém.
Não respondi, mas ela estava certa. Depois que sai da casa dos meus pais, precisava me acalmar antes de ir pra casa, passei em um bar, para pensar, mas a minha irmã não saia da minha cabeça. Liguei pra ela, e mandei mensagens, mas ela não me respondeu. Me doía a alma saber que Sarah com apenas dezessete anos estava passando por alguma coisa que eu não fazia ideia.
Virei todo o líquido na boca, deixei o copo no balcão colocando uma nota de cinquenta ao lado, e me levantei para ir embora, sem dar atenção para o que ou quem estava ao meu redor.
Mil coisas giravam em minha cabeça, no estacionamento entrei no carro pisando fundo. Mari deveria estar louca de preocupação, mas não queria que ela me visse com raiva, porque nunca me viu assim antes e não seria agora que ia conhecer esse lado horrível.
Deus que me perdoasse, mas a raiva, o ódio que sentia dos meus pais excedia o limite, era fora do normal. Suas palavras asquerosas contra minha mulher, aquele luxo todo. Nunca tive vocação alguma para assumir aquele império, não era meu, não tinha nada a ver com quem eu era, com o que eu amava fazer.
Mas eles insistiam demais, até no exterior eu a via tentar manipular minha vida, como se eu fosse um fantoche, coisa que eu não deixaria fazer novamente.
José, esse sim era meu herói. Ele sempre foi muito leve, sempre carregando a vida como uma pluma. Desde quando era pequeno eu o venerava, desejava ser igual a ele. Em muitos momentos eu o imitava, suas roupas, sua vida.
No exterior, eu não esbanjava o dinheiro que eu tanto odiava, trabalhava para poder me manter, fazia bicos em restaurantes em food track. Nunca depois dos dezoito gastei um centavo do que vinha deles. Isso eu agradecia, pois já estaria sendo obrigado pagar cada centavo com trabalho naquele maldito lugar.
Voltei minha atenção para o trânsito, que a uns minutos atras estava fazendo fila. Quando trânsito começou aliviar, pisei no acelerador, queria chegar até minha mulher logo. Além disso uma dor chata de cabeça já começava a me irritar. Além de estar exausto e muito sono.
No banco do passageiro meu celular apitou com uma mensagem, como a pista estava tranquila pego para ver.
“Irmão, não deveria estar contando nada disso. Mantenha segredo por favor... Nossa mãe arranjou um encontro para que eu saísse com Robson, um investidor da empresa. Eu não gostei dele Fer, juro que nunca mais o teria visto se nossa me não tivesse me obrigado. Mas ela obrigou, saímos mais vezes e ele é terrível, estamos noivos por culpa de nossa mãe, ele me bate, me obriga a fazer coisas que eu não quero. Um dia ele abusou de mim, depois que fiquei embriagada em um jantar e, nossa mãe disse que é normal, eu o odeio, sinto nojo dele. Fer, me ajuda”
Meu sangue congelou e em segundos, correu como nunca em minhas veias, me deixando louco e cego. Eu ia matar o desgraçado, ia matar minha mãe e meu pai junto.
Soquei o volante, encarei a tela do meu celular para responder minha irmã. Às vezes você não sabe quanto tempo tem, não sabe quando e o último dia que vira a mulher que ama, ou sua irmãzinha...
Estava a quase duzentos por hora, foi uma fração de segundos, foi muito rápido. Desviei os olhos da pista para discar a chamada para Sarah e quando voltei meus olhos para rua eu já estava entrando na contra mão. Pisei no freio tentando amenizar o impacto, os faróis me cegaram e a força e velocidade estavam contra minha vontade de viver, meu carro começou capotar.
Vi em câmera lenta, os vidros se partindo, e o carro girando, e girando. Eu não sentia nada, mas Mariana vinha em minha mente... linda estendendo a mão para mim alcança-la, queria pegar em sua mão, mas ela foi sumindo e tudo foi apagando, até se tornar completo breu. E tudo havia acabado.
MARIANA
Um dos motivos de eu querer que Luiz fizesse as pazes com os pais era por eu não ter os meus mais aqui comigo. E a gente ia seguir, não importava a opinião deles sobre mim e a nossa relação. Talvez a mãe dele me odiasse, vi sua cara de nojo quando me olhou dos pés a cabeça, mas o que importava era o que Luiz pensava e não a família.
Depois de um banho, resolvi ir ler um pouco no terraço. Mas eu amava ler enquanto beliscava algum doce, desci até a cozinha e estava pegando um pedaço delicioso de bolo quando Leticia entrou na cozinha.
― Mariana do Céu… o que aconteceu com você? ― Perguntou Leticia passando a mão no meu rosto.
― Nada! Por quê?
― Não te vi o dia todo, soube por aí que você está noiva é isso mesmo?
Passei as mãos pelo meu coque mal feito e sorri. Sim, com tanta bagunça na minha noite anterior eu simplesmente não me lembrei de contar a ninguém sobre o pedido de Luiz
― Sim. ― disse mordendo o lábio e mostrando meu anel, ela era uma boa amiga, estava sendo uma das melhores pessoas.
― Mentira! ― soltou seu gritinho de felicidade, que doía até a alma. ― E posso saber quem será as madrinhas?
― Lê confesso que nem pensei em nada disso ainda. Estou mega nervosa, um monte de coisas aconteceu... só preciso aliviar os pensamentos um pouco.
― Ok, então vamos ali no meu quarto que eu vou te fazer relaxar tá.
Peguei meu bolo e um copo de suco, se ela ia me contar suas histórias malucas eu precisava comer. Era minha ansiedade falando ansiedade talvez.
― Tudo bem.
Segui ela escada acima, o quarto era no primeiro andar, assim que passamos porta adentro ela trancou, geralmente de domingo a pensão fica fazia, todos os hospedes e pensionista saiam. Então ela ligou a caixinha de som e a música invadiu o silencio. Me sentei em sua cama e dei a primeira garfada no bolo.
Leticia era bem maluquinha, mas era também absurdamente linda, começou a cantar as primeiras palavras
Jovem,
Me faltou ar, mas quero bis
Me sinto jovem
Só de fazer você feliz
Finge
Que a Pedra da Gávea é um vulcão
'Erupçando' sobre o pecado
E o Leblon
E é na segunda parte da música que ela começou a dançar feito uma maluca.
Eu vacilei na primeira regra do rolê
Fiquei doidão
Liguei pra você
Mas quem um dia irá dizer
Que o nosso amor
Precisa se esconder
quase me engasguei, de tanto rir, porque ela fazia umas dancinhas engraçadas, e quando menos esperava Leticia me puxou pela mão, comecei a imitá-la nós duas dançando meio piradas no meio do quarto.
Ela sempre foi a doida de todas nós, a que tinha as melhores histórias, a que chorava quando estava triste, mas que ninguém conseguia notar sua tristeza, porque se tinha algo que ela fazia melhor que ninguém era esconder sua dor atrás do sorriso.
Assim que a música acabou nós duas caímos de costas na cama, e de repente o riso se foi, fiquei encarando o teto. Fiquei quietinha tentando acalmar meu coração que por algum motivo estava acelerado e apertadinho. Sim... podia ser por que estava dançando, mas era algo a mais, eu não me sentia bem, desviei os olhos para o relógio na parede acima da porta, eram quase oito da noite e Luiz ainda não tinha chegado.
― Amiga, tem alguma coisa errada com você não é mesmo?
Sim, tinha algo de errado, mas eu não conseguia saber porquê.
― Me conte sobre o seu dia... ― pedi voltando novamente meus olhos para o teto.
Ela entendendo o recado desviou do assunto, me respeitando. Era tão bom, estar ao lado de alguém que conseguia respeitar o tempo e espaço do outro.
― Sabe, hoje eu desmarquei com um cliente, porque nós sempre saímos e talvez deixou de ser trabalho. ― falou espontânea
Virei meu o rosto para olhá-la, mas ela permaneceu encarando para o teto, então voltei a posição de antes.
― Como assim?
― É complicado, mas acho que nós estamos apaixonados e… é contra todas as regras!
― Mas Lê, é super normal se apaixonar.
― Não, não nessa profissão.
Soltei um suspiro longo e pesado. Eu nunca soube o que ela era antes de tudo acontecer na vida dela, nunca perguntei sobre sua família, ela não falava sobre isso então pensei que não era meu direito tocar nesse assunto. Eu nunca faria nada para magoar alguém, muito menos as pessoas ao meu redor.
Segurei sua mão e me virei para ela, e ela se virou de frente para mim. Seus olhos azuis estavam marejados, e seu sorriso vacilante
― Lê, será que não é a hora de sair dessa vida? Não tenho nada contra garotas de programa…, mas sinto que é uma vida muito sofrida. ― Falei
― Não sei, é o que eu gostaria de fazer, mas não consigo emprego e não tenho mais ninguém para me ajudar.
― Eu sei disso.
― Mari, o meu sustento vem disso. Pago minhas contas, o meu alimento. Não posso simplesmente largar tudo. Ganho bem, vivo bem.
Leticia estava mentindo, isso notei assim que as palavras “vivo bem” saíram de seus lábios
― Me perdoe, não queria me intrometer.
― Relaxa, sei que fala isso pro meu bem.
― Ele gosta de você ou é apenas sexo? ― Perguntei
― Na quarta quando saímos, ele disse que me amava, por isso desmarquei o programa de hoje, não pode ter sentimentos ou pode acabar destruindo tudo!
― Nossa Lê, sinto muito por isso.
― Tudo bem, eu consigo superar uma paixonite. Mas me diga e como você se sente agora que está noiva?
Aquela era uma pergunta que nem eu sabia responder. Quer dizer, era para eu estar pulando de alegria, mas estava deprimida, me sentindo... triste com um peso em meu coração.
― Me sinto estranha, mas amo Fernando e nós dois somos muito compatíveis. Bom preciso ir, se quiser conversar mais tarde estarei no quarto. ― falei fugindo do assunto.
Entrei no meu quarto e me tranquei. Deitei na cama e o cheiro do meu amor invadiu meu nariz. Ele tinha saído a muito tempo, estava com saudades, angustiada. Peguei o celular, faltava pouco para as onze horas, não havia mensagem ou ligações perdidas. Onde Luiz Fernando tinha se metido, eu desejava desesperadamente que a porta se abrisse e ele entrasse, carregando sacolas com comida para nós dois terminar aquele dia estranho de uma vez.
MARIANA―Mariana... segura minha mão! Não consigo sozinho.― Luiz gritava do escuro.Eu não conseguia enxerga-lo, estava muito escuro e muito frio. Meu coração estava acelerado, arrepios corriam por meu corpo, aquele lugar era assustador eu só queria achar e pegar em sua mão. O vento forte estava começando me arrastar para longe, eu precisava achar Luiz.― Meu amor,
MARIANAUma noite inteira sem dormir, com a cabeça borbulhando com tantas perguntas que podia apostar que tinha fumaça saindo de mim. Eu deveria decidir logo, mas o medo de partir e não ajudar minha amiga com o bebe me deixava com dor na consciência.Mas no dia seguinte quando sentei frente a frente com oSrRodrigo e propus que se eu fosse ele teria que arcar com os custos da minha faculdade, pensei que ele diria não e passaria a procurar outra pessoa.
Luiz FernandoSete anos depois!Depois de tudo que passei, a única coisa que podia fazer para agradecer a minha mãe e a meu pai por nunca terem me abandonado era assumir a presidência da empresa.Assumi a cinco anos atrás, e a empresa cresceu muito depois disso. Eu era o realmente bom naque
MARIANAMinha pequena menina ficou como um anjo durante o voo, sem chorar. Em alguns momentos quando estava com fome ela dava seus resmungos. Mas foi muito tranquilo. Luiz FernandoMeu despertador começou a gritar ao meu lado, mas já estava a um tempo acordado. Todos os dias era a mesma coisa, tinha pesadelos com o maldito acidente.Eram cincoe meia da manhã e já me sentia exausto. Sai da cama devagar para não acordar Joyce, ela andava meio estranha ultimamente.Capítulo 11
MarianaÀsvezes eu me lembrava de como eu era antes de conhecer Luiz Fernando, sim mesmo fingindo que não, assim que pisei na pensão todas as lembranças me atingiram com força, mas silenciei minha mente para não parecer que era real, que eu voltei e que as lembranças impregnadas em cada canto daquele lugar voltaram, ou talvez nunca tivessem ido embora.Eu não queria lembrar dele, porque toda a minha atenção e toda a minha energia estavam na
MarianaA semanapassou rápido, maltive tempo de fazer tudo que precisava. Guilherme chegaria mais tarde, para resolver as questões da empresa.Eu e minha tia já havíamos contratado a equipe que iria fazer a reforma, tanto engenheiro, quanto o arquiteto que contratamos tinham ótimas referências. Frederico começou o trabalhocedinho também, ele ia me levar para a Alencar. E por falar nisso, tive que comprar dois carros, um para mim e outro para Fred dirigir.
Luiz FernandoÀsvezes, eu gostaria de ir trabalhar até aos sábados. Joyce não me dava um minuto de paz. Desde nossa briga, ela insistia que eu não a amava, e que por isso não queria ter um filho com ela. Mas ela tinha razão, eu não a amava. E também sentia que nãopodia serum bom pai.Último capítulo