A tarde daquele dia foi chegando rápido e o incomodo começou em meu corpo, hoje seria lua cheia e meu lobo estava louco para sair. Terminei o serviço mais rápido esperando ser liberado mais cedo, eu precisava ir em casa e depois seguir para um lugar afastado da floresta. O medo dessa noite era tão doloroso quanto a possível transformação, ela esteve aqui. A floresta estava em silêncio desde a chacina, nem as folhas balançavam, não tinha vento, não tinha vida. Ela arrancou a vida de tudo apenas com sua presença.
Era difícil acreditar que em meio aquele caos sobrevuvesse alguma coisa, sua sombra era a morte. A lembrança do frio daquela noite sempre me fazia tremer, era como se estivesse vivendo tudo novamente. E se estiver a minha procura? Quinze anos não são nada para ela, o demônio da capa continua perseguindo alcatéias pelo mundo e está aqui, tão perto que eu sinto aquela brisa gélida sombria no ar.
- Pode ir, Alan! - não esperei que falasse novamente. Assim que o senhor Johnson me liberou peguei uma moto velha que vivia parada la na oficina, o dono já tinha desistido de concerta-la e por isso ficou a mercê dos funcionários. Minha casa não era tão distante, mas eu precisava voltar logo. O sol já começava a dança para se por.
Ent,rei naquele pequeno buraco que eu carinhosamente chamo de casa e coloquei roupas limpas em uma mochila, água e comida. Deixei uma mensagem para Billy avisando que eu não estava me sentindo bem e provavelmente chegaria atrasado amanhã no trabalho. Sem mais nada há fazer tranquei a porta e montei na moto velha. As ruas paralelas eram m eus alvos por conter praticamente nenhum policial a vista, eu tinha carteira mas esqueci totalmente do capacete, estava apressado.
Embora as ruas paralelas fossem mais distantes da floresta eu consegui chegar antes que a lua nacesse, normalmente eu espero até que ela chegue em seu ápice para começar a transformação. Estacionei a moto atrás de umas plantas altas afim de que ninguém saia me caçando mata a dentro mais tarde, junto dela deixei a mochila para me trocar pela manhã. A lua já começava a mostrar seus efeitos sobre mim, o suor acumulava no pescoço e os cachos dourados estavam lisos e presos a testa como se eu tivesse tomado banho.
Com passos largos comecei a andar para dentro da floresta procurando um lugar afastado o suficiente para que ninguém me escute. Os sentimentos começaram a chacoalhar dentro de mim como um enjôo e acabei vomitando perto de uma árvore, o medo e o nervosismo faziam isso comigo. Eu só não queria que o demônio estivesse aqui, seria tão mais fácil, tão menos doloroso. Tragicamente me lembro da minha primeira transformação, eu estava sozinho e assustado, queria parar o que estava acontecendo mas era impossível ninguém consegue parar uma transformação.
A coluna revirou e eu acabei cuspindo sangue e urrando de dor, a lua estava mais próxima. Me sentei na raiz de uma árvore grande que parecia as árvores dos mitos da vida. Minha árvore preferida em toda a floresta, toda a noite de lua cheia eu sentava aqui e esperava a dor vir. Os cortes começaram a aparecer dolorosamente em minha pele mostrando os pelos dourados por baixo dela, uma bênção? Uma terrivel maldição. Não existem princesas ou herói lobo, não existe fantasia ou um mito romântico por trás da dor, é apenas a dor. A terrivel dor.
Ele forçou a saída e os cortes foram almentando de tamanho, imagine o desespero de ver sua pele rasgando bem diante dos seus olhos, de ver pedaços seus caindo em sua frente, o que tem de romântico nisso? Não consigo ver. Os ossos revirando para se tornar idêntico ao de um lobo, uma fenda rasgando sua visão para que ojtroa olhos nascam no lugar, olhos vermelhos e intensos tanto quanto a capa do demônio. Eu comecei a retirar as minhas roupas o mais rápido que pude, embora as unhas fizessem questão de rasga-las sem querer.
Os ossos das pernas começaram a quebrar e uma dor rasgou por dentro de mim, tudo estava tomando seu lugar. Aprendi com o tempo que aceitar a dor é necessário para a transformação ser tranquila, mas era difícil aceitar isso. Lágrimas rasgavam a minha alma enquanto o lobo dourado forçava saída de dentro de mim, evitava gritar mas os urros da dor dilacerante era quase impossível de segurar. Não era bonito.
Senti a pele do meu rosto ser esticada e rasgada a um ponto que um humano comum morreria de dor, gritei até que o grito se transformou em uivo alto e estrindente de um lobo solitário. O resto de mim caia ao meu redor, toda a pele que antes me cobria agora estava no chão, não sou eu, sou ele agora. Para o ritual ser completo eu tinha que comer a minha própria carne e assim o fiz, devorando o que antes era eu e agora é só resto de algo que fui. Era uma transição, uma renovação talvez. Era a minha vida embora eu não quisesse aceitar na maioria das vezes. Só me restavam alguns minutos de consciência, logo ele tomaria tudo de mim e iria atrás do que quer. E foi nesses minutos restantes que eu senti sua presença, seu olhar sobre mim e o frio da morte que o cerca. O demônio estava aqui tão próximo de mim que aparentava ser palpável.
- Alan?
Ela lambia os lábios devagar saboreando ainda o gosto do seu último banquete, a sensação deliciosa do sangue em suas mãos, o cheiro metálico e doce que inundava seu ser de prazer, como não amar isso? Como não se apaixonar por essas sensações? O calor do líquido em suas mãos e o som dos gritos ainda em seus ouvidos a deixavam tão inerte. Estava novamente entre as árvores procurando por algum Dzeta desavisado, era noite de lua cheia estava ansiosa para mais um banquete. Foi exatamente no momento em que os uivos começaram a se chocar com os sua audição sensível que ela ouviu um em particular, um uivo conhecido do seu íntimo. Sem conseguir prender a atenção nos alvos mais faceis a capa rastejou pelas árvores tomando cuidado para que o vento estivesse ao seu favor. Ali em meio a pouca vegetação e a baixo da árvore da vida estava o lobo dourado de olhos vermelhos cintilantes, ele comia o que restou de si e parecia não notar sua
Acordei perto do lago, o dia estava clareando e eu estava totalmente sujo de sangue, tinha algum animal despedaçado perto de mim que eu fiz questão de empurrar para o lado, antes que alguém aparecesse em sua caminhada matinal mergulhei no lago para me lavar e retirar todo o sangue do corpo. Após um bom banho demorado saí a procura do lugar onde eu tinha escondido a moto, por sorte estava tudo intacto. Vesti a roupa limpa que tinha trazido e empurrei a moto até a rua, girei a chave e nada do motir ligar, era só o que faltava. Vamos, vamos! Girei novamente a chave e nenhum barulho. Merda de moto. - Ah, cuidado! - o local era uma pequena ladeira, quando ouvi o grito tentei sair da frente mas apenas consegui empurrar a moto, fui rapidamente atingido por uma bicicleta. O impacto me deixou zonzo mas eu estava realmente vendo um capacete vermelho sangue. - Que droga! Me desculpe, os meus freios... Alan?- Vermelho? - r
Tinha terminado todos os reparos da bicicleta, tinha ficado melhor do que antes, fui fazendo um pouco no intervalo de cada carro que eu ajeitava tendo a ajuda dos outros para me cobrir, afinal fui eu quem estava parado no final de uma ladeira. Comecei a limpar toda a gracha dela e dos meus dedos para coloca-la do lado de fora mas, antes que eu conseguisse terminar alguém cutuca meu braço.- Posso ajudar? - pergunto me virando, atrás de mim tem uma garota parecida com Vermelho porém, bem mais alta e as pontas do seu cabelo negro eram verdes. Seus olhos era de um castanho avermelhado que eu podia deduzir ser uma lente de contato, seu cheiro não denunciava ser uma sobrenatural.- O que está fazendo com a minha bicicleta?! - Ela praticamente gritou e aquilo não foi muito bom para minha audição extremamente sensível após uma noite de lua cheia. Balancei a cabeça para me livrar do zumbido e voltei a olha-la.- Você deve ser a
Corri em direção a voz do senhor Johnson, ele estava na calçada discando o número da emergência, o suor estava acumulado na gola da sua blusa e os dedos tremiam quase derrubando o celular. Marbos e Billy chegaram em seguida, estavam um pouco ofegantes e eu imaginei que estivessem em seu horário de almoço. Nos olhamos esperando ele dizer alguma coisa mas ele só tremia, vendo que não conseguiria ligar para ninguém eu tomei um celular da sua mão. - A...a senhora Carmem... - ele balbuciou encarando os dedos trêmulos. Sem perder tempo eu entreguei o celular para Billy.- Liga pra Polícia, agora! - ele assentiu, corri em direção a pequena casa azul céu da velha senhora. A porta estava aberta e julgava que o senhor Johnson tenha deixado assim após sair.Como meu faro era mais apurado assim que me aproximei da porta o cheiro podre me nocauteou, cheiro de Morte. Entrei na casa vendo tudo com uma fina camada de poeira, no chão d
O senhor Jhonson nos deu dois dias de folga após o enterro. Nenhum dos seus parentes estavam presentes, eles nunca tinham tempo para a pobre senhora, sempre estavam ocupados demais para visita-la, para ajudá-la ou fazer qualquer coisa que fosse. Ali, parados ao lado do caixão negro lustroso estávamos apenas o pessoal da oficina, tecnicamente os mais íntimos. A frente, alguns vizinhos que simpatizavam com a doce senhorinha que adorava cuidar do seu próprio Jardim, independente do clima do dia.A natureza sentiu sua perda. Era possível ver as ervas daninhas tomando conta do jardim antes impecavelmente colorido, rodeado de borboletas e abelhas, as trepadeiras abraçando as laterais da casa como se a qualquer momento fossem esmaga-la, estavam com saudades dela. A sensação era como se o sol não fosse se erguer novamente, não para aquelas plantas pelo menos, o luto seria eterno.Marbos e Bille choravam descontroladamente. O senhor Jhonson ten
Era noite de lua nova, as estrelas estavam pintando o céu negro com pequenas bolas brancas, lilás e avermelhadas. Ele estava ali, sentado em um galho grosso de uma árvore centenária, a árvore. A espera dos sacrifícios. Toda a noite de lua nova era sagrada para algumas bruxas, principalmente para aquela em especial, a que oferecia sangue doce, com flores. A madrugada se estendia e ela não aparecia. A capa ondulada com a brisa gélida, a floresta estava tão quieta diante da sua presença que era impossível não ouvir caso alguém se aproximasse. Mas naquela noite ela não veio. Deixou que a noite passasse, o dia raiasse e novamente a madrugadavoltasse, nada dela. Irritado, o demônio da capa vermelha atravessou a floresta, para quem visse aquela cena, da pequena criatura
As viaturas estavam posicionadas da forma que impedisse demais veículos de passarem por ali, como se fomos um bando de assaltantes ou algo do tipo. Não sabia quem tinha ligado, mas as lanternas e o barulho da janela sendo quebrada foi motivo suficiente para qualquer vizinho chama-los. Não os culpava por isso, teria feito a mesma coisa. Várias pessoas tinham saído de sua casa em plena madrugada para ver quem eram os arruaceiros que tinham invadido a casa da doce velhinha. Não sei se foi decepção ou surpresa o que vi nos olhares das mulheres agarradas aos seus robes que saiam na porta de casa e logo depois retornavam.— Eu já disse que não roubei nada... ei, não coloca a mão no meu saco! – Bille estava passando nesse exato momento pela revista, revoltado por estar sendo tocado ele esbravejava. O policial olhou para ele desconfiado. — Eu só tenho um não me olhe como se eu fosse uma aberração.Não sei como ele não recebeu um soco do policial, pr
Ao final daquele dia tortuoso eu estava morto. E isso se quer se dava ao fato de ter feito boa parte do trabalho sozinho, as ideias e planos maquinando em minha cabeça me deixaram psicologicamente exausto. Tivemos uma pausa para o almoço e uma para o lanche, mas meu corpo esyava inquieto demais para poder se quer relaxar. Marbos recebeu folga, o que tinha duplicado a carga de afazeres, e aparentemente os carros escolheram exatamente esse dia para quebrar. O senhor Jhonson estava muito satisfeito, além de não pagar ao Marbos, nós dois estávamos devendo a ele por ter nos salvo da polícia, e segundo ele, isso era o mínimo que podíamos fazer para retribuir.Queria dizer que ter resistência sobrenatural deixava tudo mais fácil, grande mentira. Mas me ajudou muito hoje. Ser um lobo solitário era péssimo, ser um lobo alfa solitário era como ter sido abandonado por quem mais se ama, era uma dor terrível e latente. Eu tinha sorte, não ter enlouquecido ainda, já outr