2. CLARIS LUMINA

As náuseas me assaltaram novamente enquanto organizava os documentos na minha mesa. Era a terceira vez naquela manhã e eu já não conseguia disfarçar. Corri para o banheiro, sentindo o olhar penetrante do meu chefe seguindo cada um dos meus movimentos. Ao passar por ele, pude ver como ele enrugava o nariz com aquele gesto de desgosto que tanto o caracterizava.  

Depois de três meses trabalhando nesta cidade perdida, conhecia bem essa expressão. O senhor Kieran Thorne, um homem rabugento com rotinas, e qualquer alteração o perturbava visivelmente.  

— Preciso sair mais cedo hoje — anunciei ao voltar, limpando discretamente o suor da minha testa —. Tenho uma consulta médica.  

Ele mal levantou os olhos de seus papéis, mas pude notar como seus ombros se tensionavam. Depois de um silêncio que pareceu eterno, assentiu secamente.  

Caminhei apressada, olhando meu relógio com medo de me atrasar. Enquanto esperava, suspirei pensando que não era hora de ficar doente agora. Minha mãe e minha pobre irmã doente dependiam de mim; como quem diz, acabamos de chegar a este lugar. Não tínhamos ninguém que nos estendesse a mão.  

— Senhorita Claris — a voz do médico me tirou de meus devaneios —, tenho seus resultados.  

— E então? Que tipo de vírus eu tenho? — perguntei com um suspiro.  

— Não é um vírus — fez uma pausa, ajustando os óculos —. Você está grávida. De aproximadamente seis semanas.  

Uma risada histérica e nervosa brotou da minha garganta antes que eu pudesse contê-la. O som ecoou nas paredes do consultório, fazendo com que a enfermeira espiásse a cabeça com curiosidade.  

— Grávida? — consegui articular entre risadas nervosas —. Doutor, deve haver um erro. Está me dizendo que isso é como um nascimento virginal? Porque lhe asseguro que não estive com nenhum homem em mais de cinco meses. E até onde sei, não sou a Virgem Maria.  

O médico me olhou com uma mistura de compaixão e algo mais... Enquanto continuava dizendo que os resultados dos exames eram conclusivos.  

— E devo lhe dizer que... — parou, como se hesitasse em continuar. — Não há erro nos resultados. Você vai ser mãe e quanto antes aceitar isso, melhor será para você e para o bebê.  

Um calafrio percorreu minha espinha. Que diabos ele queria dizer com isso? As náuseas voltaram, mas desta vez não tinham nada a ver com a gravidez. Eu não tinha tido relação com ninguém; o único que havia examinado ali embaixo havia sido ele mesmo. Corri para o banheiro sem conseguir aguentar mais; não podia ser, tinha que ser um erro.  

Ao voltar, o médico abriu a boca para responder, mas o estridente som do meu telefone nos interrompeu. Era uma mensagem do meu chefe:  

— Espero você em meu escritório quando terminar sua consulta. Sem desculpas. — Olhei a hora: já passava das seis da tarde. O escritório deveria estar fechado há meia hora. O que poderia ser tão urgente?  

Sem ouvir o médico, pois não acreditava em nada do que ele me dizia, levantei-me apressada. Isso não podia estar acontecendo comigo; era impossível. Devia haver um erro; com certeza era um problema hormonal devido às mudanças. Enquanto me dirigia ao meu escritório, as lembranças me assaltaram de golpe da tarde em que tomei a decisão de vir para este lugar:  

Havia fechado a porta com um golpe, tremendo de raiva. As palavras de Ricardo ainda ressoavam em meus ouvidos:  

— Podemos ser amantes, mas não posso me casar com você... sua mãe... sua reputação...  

— Que se dane ele e sua família distinta! Como ele se atreveu a me pedir para abandonar minha mãe e irmã para ser "aceita" por seus pais? — gritei com fúria.  

— Filha, você deveria considerar o que ele estava pedindo; ele é um bom rapaz — mais uma vez minha mãe se sentia culpada, mas isso só aumentou minha fúria.  

— Não comece, mãe! Não preciso de nenhum homem! Você me entende? Estou farta de ser menosprezada por ser sua filha! — me virei para ela, suavizando meu tom —. Sei por que você fez isso. Aquele desgraçado te ameaçava com nos fazer mal. Mas não vou me arrastar diante de ninguém nem abandonar você para agradar aquelas pessoas.  

— Me perdoe, minha filha, me perdoe — soluçava minha mãe, com as lágrimas fluindo livremente.  

— Não há nada que perdoar, mãe! Você fez o que era necessário para nos proteger, a mim e à minha irmã. Estou muito agradecida a você por ser tão corajosa e por não nos abandonar — a abracei com força. — Vamos sair daqui, iremos para o campo, sim, isso mesmo. Vamos nos instalar em uma cidade pitoresca onde nossos rostos sejam desconhecidos.  

— Mas, meu amor, você deveria encontrar um homem decente e formar sua família. Esqueça de mim, eu me virarei como puder. Vão para algum lugar distante onde meu passado seja desconhecido — suplicou incessantemente minha mãe.  

— Mãe, não podemos te abandonar — protestei, com a voz entrecortada pela emoção. — Somos uma família, nos mantemos unidas. Começaremos de novo juntas. Um novo começo, uma nova vida, é o que precisamos.  

Minha mãe me olhou desesperada, com seu olhar cheio de arrependimento e medo. Mas também com um vislumbre de esperança.  

— Uma nova vida — a ouvi murmurar com um suspiro. — Começar de novo em um lugar desconhecido.  

— Mãe, pare de se preocupar, tudo vai ficar bem enquanto estivermos unidas. Se eu tiver que ficar sozinha a vida toda, que assim seja. Nunca mais vou me apaixonar por um cara. Só vou me casar se aparecer um que seja um homem-lobo que saiba de lealdade e sacrifícios, ha, ha, ha... — ri divertida ao ver a expressão assustada dela.  

— Pare de dizer bobagens, você sabe muito bem que homens-lobo não existem — riu nervosamente minha mãe —, que monte de sandices você diz. Você é jovem e bonita, não deve se sacrificar como faz.  

— Tudo vai ficar bem, mãe, você vai ver. Um dia aparecerá um homem que não se importará com nada. Passarei minha vida com ele perto de vocês. Agora vamos antes que aquele desgraçado apareça — disse, colocando tudo na van.  

Minha mãe não disse mais nada; sabia que não queria se separar de nós, mesmo que sua vida passada nos causasse dor e vergonha. Talvez em um lugar distante, longe de tudo que conhecíamos, estaríamos melhor. Ela começou a me ajudar enquanto me observava decidida a me seguir como sempre.  

— Para onde iremos desta vez? — perguntou minha mãe.  

— Para a Reserva Natural Thorne. Comprei uma casa lá — disse, mostrando com orgulho uma foto em um jornal. — Esta, está vendo? No meio do nada, viveremos felizes para sempre, confie em mim, mãe.  

Este era nosso começo, neste lugar perdido no meio do nada. Como agora eu me encontrava nesta situação? Tinha que ser um erro!

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