— Leonardo. — A voz de Omar me arranca de meus pensamentos. Ele fala com um sorriso de canto, leve e disfarçado, mas que não esconde o desprezo em suas palavras. — Jonas me disse que você tem uma oficina mecânica?Percebo a tentativa de desqualificar minha profissão, o julgamento implícito em seu tom. Uma sensação de desagrado se instala em mim. Ele não sabe o quanto eu abomino esse tipo de atitude, essa tendência de inferiorizar minha categoria. É um preconceito que ressurge sempre que alguém imagina um mecânico, como se eu fosse um simples trabalhador sujo de graxa, parado no tempo. E o que é mais irritante: essas pessoas, que vivem cercadas de tecnologia, ainda carregam essa imagem ultrapassada.As coisas mudaram. O tempo dos carros simples já passou. Hoje em dia, eu só me sujo de graxa com carros mais antigos. O resto, os carros modernos, eu conserto com tecnologia de ponta, com equipamentos avançados. Minha profissão evoluiu de maneira exponencial, e os outros não fazem ideia do
De repente, Omar não era mais o centro da conversa.Meus olhos se tornam maiores e a minha sobrancelha arqueia enquanto Leo inicia o que só posso descrever como uma verdadeira aula de mecânica para o meu pai. É impossível não sentir um leve constrangimento. Descubro ali o quanto eu mesma sabia tão pouco sobre a profissão dele. Mas não é só isso. Ele não está apenas explicando; está transformando as nossas ideias, como se dissesse que subestimamos o que faz. Sua segurança é tão natural que mais parece uma lição de moral disfarçada.— Você deve usar equipamentos bem avançados e caros. — o meu pai comenta, tentando sondar o quanto aquilo realmente exige.— Sim, são avançados, mas não caros. A tecnologia hoje está mais acessível. — Leo responde com a tranquilidade de quem domina o próprio universo.— Que equipamentos você usa, meu jovem? — o meu pai se inclina para frente, claramente intrigado.— Osciloscópios, que me permitem analisar sinais gerados pelos sensores e componentes dos siste
Ele me olha com um sorriso nos lábios.— Ótimo. — Ele responde, ainda tentando se recompor.Relutante, olho para ele mais uma vez.— Leo... Depois do almoço, quero que me espere no seu quarto. Quero um momento só para nós, sem ninguém nos olhando. — Murmuro, sentindo minha ousadia me surpreender.Os olhos de Leonardo brilham, uma intensidade viva nele ao me ouvir.— Combinado. — Ele responde, a voz rouca, cheia de promessas.Engulo em seco, uma onda de nervosismo me atinge, mas, com um impulso, saio da piscina. Pego minhas roupas do chão e sigo em direção à minha espreguiçadeira. Pelo canto dos olhos, vejo Omar me observando com atenção. O que ele está pensando? O homem não desiste nunca?Bola para a frente! Foi isso que eu fiz!Um pensamento me atravessa: Leonardo, eu, e ele no quarto, sozinhos. Um sorriso involuntário se forma em meus lábios enquanto me enxugo rapidamente e coloco minhas roupas.Meu pai tenta puxar conversa com Omar, mas ele não responde. Está estático, os olhos fix
Eu congelo. Meu irmão deve dinheiro? Meu pai foi ameaçado? E onde Omar quer chegar com isso?— Eu irei ajudar. Mas você terá que ser minha.O quê?Aquelas palavras me atingem como uma lâmina afiada. Sorvo uma grande quantidade de ar, tentando controlar minhas emoções. Olho para o homem à minha frente, que agora me observa como se já fosse dono de tudo, até mesmo da minha vida.— Então, se você pode ajudar meus pais com essa dívida, você só o fará caso eu me renda a você? — Pergunto, tentando manter a calma, mas a indignação já transborda de mim.— Exatamente. — Ele diz, com uma expressão satisfeita.— Não precisamos da sua ajuda, então, por favor, saia do nosso caminho. Eu dou um jeito. — Respondo, mas minha voz tremula com a incerteza.Omar ri, como se o que eu dissesse fosse irrelevante.— Sua casa é alugada, seu carro é velho. Como você vai pagar cinquenta mil reais?Eu o encaro, completamente em choque.— Cinquenta mil? — A palavra parece um peso na minha boca.O valor parece pequ
— Vem, vou te levar ao médico. Agora! — Leonardo diz, sua voz carregada de urgência, enquanto as suas mãos fortes seguram o meu braço com firmeza. Ele começa a me puxar, como se não quisesse dar espaço para argumentos ou desculpas. Os seus olhos verdes, normalmente calmos, agora brilham com uma preocupação tão genuína que é impossível ignorar.Minha primeira reação é resistir, um reflexo instintivo de quem quer manter o controle da situação, mesmo quando tudo parece desmoronar ao redor. Com um gesto firme, puxo o meu braço de volta e tento enfrentá-lo com palavras que não chegam a soar tão convincentes quanto eu gostaria.— Não. Não quero ir. Acho que estou com pressão baixa. Daqui a pouco ficarei boa. — Minha voz tenta transmitir uma segurança que eu não sinto, mas não sei se isso é suficiente para enganá-lo.Leonardo estreita os olhos, analisando-me com cuidado. Há algo no olhar dele que me desnuda, como se conseguisse enxergar cada detalhe do que estou tentando esconder. Ele cruza
Observo Sofia dormir. O rosto dela está tranquilo agora, finalmente em paz, depois de um dia turbulento. Seus traços relaxados, quase angelicais, contrastam com o tormento que parecia dominá-la mais cedo. É um alívio vê-la assim, tão serena, como se o sono tivesse levado embora o peso que ela carrega nos ombros.Talvez tenha sido apenas o cansaço acumulado. Talvez o calor do dia, a comida, ou até mesmo as férias que, ironicamente, deveriam trazê-la descanso, mas parecem estar carregadas de tensões ocultas. E Omar... Esse homem. Só de pensar nele, meu corpo se enrijece. Ele está sempre por perto, uma sombra que parece pairar sobre ela, e não consigo afastar a sensação de que ele é mais do que apenas uma pedra no caminho dela. O olhar de Sofia sempre muda quando o nome dele é mencionado. Há algo ali, algo que ela não diz, mas que transparece em sua expressão, nas entrelinhas do seu silêncio.Mas agora, aqui, ela está calma. Serena. Isso deveria ser suficiente para me tranquilizar, mas n
SofiaDesperto com o som ritmado das cortinas balançando ao vento, como uma melodia suave que me puxa do mundo dos sonhos para a realidade. Uma brisa leve entra pela janela entreaberta, trazendo consigo o cheiro fresco de lençóis limpos e o calor ameno de uma manhã que parece prometer tranquilidade.Abro os olhos lentamente, piscando para me ajustar à claridade que banha o quarto, e meu olhar pousa sobre Leo. Ele está ali, ao meu lado, dormindo profundamente. Meu coração dá um salto involuntário, uma mistura de nervosismo e encantamento ao vê-lo tão perto, tão vulnerável.Deito-me de lado, tentando não fazer barulho, e deixo os meus olhos passearem pelo rosto dele, que está virado para mim. Os cílios longos e escuros criam sombras delicadas sob seus olhos fechados. A sua respiração é tranquila, seus lábios ligeiramente entreabertos. Ele parece tão em paz, tão diferente do homem cheio de energia e intensidade que conheço quando está acordado.Cada detalhe do rosto dele é fascinante. Su
São seis horas da tarde, e entro na sala com passos hesitantes. A atmosfera parece suspensa, como se o tempo tivesse parado por um momento para nos observar. O ambiente está silencioso, mas há uma leveza no ar, como se todos estivessem se recuperando de um descanso necessário.O meu pai está sentado no sofá, com o rosto levemente amassado de sono. Os seus olhos semicerrados denunciam que ele ainda não despertou completamente, mas um sorriso tranquilo brinca nos seus lábios, como se um sonho bom ainda o acompanhasse. Minha mãe, ao lado dele, parece mais revigorada. O rosto sereno e os gestos despreocupados mostram que, pelo menos por ora, ela encontrou algum alívio.— Parece que marcamos a hora, não é? — o meu pai comenta, o humor leve em sua voz quebrando o silêncio. — Todo mundo acordou agora.Omar é a exceção. De pé junto ao bar, ele segura um copo de uísque, girando lentamente o líquido âmbar. O tilintar dos cubos de gelo parece ecoar pela sala, quase como uma trilha sonora descone