— Posso acreditar, é uma coisa absurda — comento sorridente.Percebo que nenhum dos dois me dá passagem para o apartamento. Estão bloqueando a porta.— Preciso do meu tablet. Esqueci no seu escritório — minto já que estamos de mentirosos esta noite.— É? Não o vi, nem... — menciona Mateo confuso.Interrompo sua confusão enquanto abro espaço para entrar no apartamento. Bancando a boba e a desentendida, entro.— Tenho certeza de que deixei aqui. Preciso procurar por conta própria...Entro no apartamento sem que Mateo possa me impedir, meu caminho até o escritório dele não revela nada estranho. Tudo em ordem. A única coisa que não está é a irritação de Mateo ao se fechar comigo em seu escritório. Finjo que procuro o tablet que nunca deixei aqui.— Precisava usar a desculpa do tablet para entrar no meu apartamento? Limpam diariamente este escritório, não me falaram de nenhum tablet que não seja meu, Marianne — o escuto às minhas costas.— E você precisava colocar uma mulher no seu apartame
Narrado por Luciano BrownFiz o que devia fazer. É o que repito constantemente para não recair em arrependimentos inúteis. Não escolhi um caminho fácil, poderia ter escolhido, mas não o fiz. Assim era a vida, você sacrificava, apostava e podia ganhar ou perder. Que eu estivesse disposto a perder tudo e de repente mudasse de opinião por causa de Marianne, não estava nos planos. Agir espontaneamente acabou estragando tudo há quatro longos anos.Nunca deveria ter me fixado em Marianne, nunca deveria ter me casado com ela, nunca deveria tê-la amado, nunca deveria tê-la colocado em tal risco. Agora estou pagando as consequências disso. A noite está chuvosa, as ruas molhadas e os vidros do meu carro embaçados.Mesmo assim, posso vê-la, Marianne do outro lado da rua descendo de um táxi. Está usando roupa de escritório, e curiosamente as gotas pararam de cair enquanto ela entra no edifício de Mateo. Hoje é quinta-feira, o primeiro dia em que ela se encontrará com ele desde a briga pela propost
— Canibalização de empresas. Acontece o tempo todo — comenta como se fosse evidente.— Não é muita coincidência que eles também colaborassem conosco?Antes do escândalo da Belmonte Raízes, os Nichols tinham informação privilegiada sobre a SMB que foi fornecida por nossas agências. Foi uma troca de favores. Essa foi a razão pela qual para fechar o acordo da New Century, Mateo solicitou remover a cláusula de associação com a SMB.— Sobre os negócios dos superiores, nem você nem eu temos assunto nisso...— Mas se meu ressentimento fosse mais que ressentimento, fosse a verdade, não te interessaria expor tais associações? Não seria benéfico para você? Você tem grandes ambições, Julia, e também está cansada de receber ordens de corruptos sem um pingo de moral.Julia não me responde, escuto sua respiração agitada, sei que a convenci. Se há algo que sei sobre ela é que não costuma se contentar com a injustiça.— Vou aprofundar nos acordos que tiveram. Não será fácil. Vou precisar da sua ajuda.
Narrado por Luciano BrownPor mais que os anos passassem, algo que não havia mudado em Marianne era sua capacidade de me surpreender. Tê-la ao meu lado no carro não estava programado, pensei que ela me insultaria nas próximas cinco vezes que me visse, mas não. Estou dirigindo para o hotel onde estou hospedado.— Gostaria de levá-la a um lugar melhor, mas é o mais seguro que me ocorre a esta hora e nestas circunstâncias — comento com "indiferença".— Tudo bem. Não importa. Não quero ir para o meu apartamento — menciona abatida.Marianne por si só é uma mulher peculiar, no entanto, sua peculiaridade costuma ter um motivo de ser. Ela tem divagado em silêncio tanto, que já estou chegando ao hotel. Estou trazendo-a para um hotel, e ela não protesta ou me faz algum comentário sarcástico. Deve ter brigado com o babaca.Não aprofundo na ferida, não peço explicações ainda. Simplesmente me dirijo ao meu local de estadia por estes dias. Digo dias porque mudei três vezes de hotel desde que cheguei
— Pode ser que a sensação de que ela estivesse crescendo foi o que te machucou — sirvo novamente, menos que da última vez.— Uma parte de mim sabia — sorri com tristeza — Não é como se Amanda tivesse se desentendido de sua filha. Nunca a tinha visto tão motivada por ninguém antes. Sinto que demorou uma eternidade e, ao mesmo tempo, muito pouco.Eu sabia que isso aconteceria desde que Amanda deu à luz. Muito tola e jovem para ser mãe, América criou uma mulher em um mundo irrealista de caprichos e aparências. Poderia ter funcionado se Amanda tivesse se interessado por outro empresário que buscasse uma linda esposa troféu, não pelo namorado da irmã que acabou na cadeia.Com a morte de Sergio, a fuga de América, a prisão do marido, Amanda ficou desamparada, e tal como previ, Marianne veio ao resgate dessa menina. Ela termina de beber a dose. Deve ter sido forte o que quer que tenha acontecido naquele edifício para também detonar seu comportamento.— Você está assim por algo mais que a meni
Narrado por Luciano BrownOdiava Mateo com um afinco e uma repugnância inauditas. Odiava imaginar o tempo que viveu com Marianne, odiava pensar nos beijos que compartilharam, odiava saber que ela o deixou entrar em seu corpo. Mas, sobretudo, odiava sequer vislumbrar que ele fosse seu marido ou o pai de seus filhos.Isso não podia acontecer. E se acontecesse, seria por cima do meu corpo frio. Marianne ainda não compreende, me olha como um bicho estranho, depois ri muito. Tanto que sua cabeça vai para trás, suas risadas devem chegar a cada canto deste quarto de hotel.— Você não pode me dizer com quem estar ou não. Ou quer que eu me torne freira? Assim seu ego estará em melhor estado? — zomba de mim.— Não, mas gostaria que procurasse um homem alheio ao complô empresarial no qual esteve envolvida. Alguém mais seguro, chato e capaz de te dar estabilidade — resumo com o punho formigando pelas características do próximo parceiro de Marianne.Ela ri mais, e eu bebo mais da garrafa. Cada gole
O álcool é uma espécie de escape, uma forma de desabafar seus sentimentos, e aqueles desejos que estão reprimidos no mais profundo, vêm à tona com uma bebedeira. Ou seja, seja lá o que tenha acontecido ontem à noite, provavelmente eu mesma provoquei.Mal acordando posso perceber um par de coisas. Uma delas é que não amanhecei no meu apartamento, e a outra que a dor de cabeça vai me matar. Para meu azar, baixo minha cabeça para constatar que estou nua debaixo deste lençol branco.Sento-me na cama com dificuldade, esfregando minha testa dolorida. Abraço minhas pernas para encontrar um ponto de equilíbrio de tão tonta que ainda estou. É quando meus olhos sonolentos percorrem o lugar onde estou, parece um quarto de hotel, e que ontem houve um desastre aqui pelas roupas no chão.Posso avistar meu uniforme amassado em um canto, e uma calça preta com uma camisa com a mesma cor que Luciano usava ontem à noite.Luciano.Meus olhos se abrem completamente e sinto a presença de alguém ao meu lado
— Do que... do que você queria falar comigo? — digo um pouco trêmula. — Quão grande foi a briga que você teve com o Mateo para se vingar dele dormindo comigo? — questiona com um toque de tristeza e auto-desprezo.Pela primeira vez desde que me levanto penso em Mateo. Em como o "tempo" dele será um rompimento definitivo. Não sei como terminará minha história com Luciano, mas dormi com ele e sei que provavelmente ele com sua "prima". Não havia nada para salvar ali, ainda mais considerando que rejeitei seu pedido de casamento.— Como você consegue ser tão certeiro e tão errado ao mesmo tempo? — digo irritada com ele. Espeto a salada de frutas com raiva.Ele se surpreende com minha resposta.— O que você quer dizer?— O nosso relacionamento está praticamente acabado, e o que aconteceu entre nós foi a última cartada — explico.— Você descobriu? No que ele estava metido? — pergunta muito empolgado.Reviro os olhos porque isso não podia ser verdade.— Você também sabia que ele estava me tra