Laura“A primeira lembrança que tenho vem de um lugar muito escuro e que me acompanhou por muito tempo depois que percebi o que era: um quarto.Apenas uma das lâmpadas funcionava e o banheiro que era agregado a ele era pequeno, me permitindo dar alguns passos apenas.Eu odiava aquele lugar. Eu amava aquele lugar.Ali eu aprendi a falar, a ler e a escrever. Uma única pessoa entrou naquele quarto por mais de treze anos. Logo no começo da minha tenra idade, eu gostava da atenção, pois era a única que eu recebia.Eu não via nada de errado no único prato de comida que recebia por dia, eu não via nada de errado no fato do homem sempre ficar me encarando como se esperasse algo de mim.Eu não via nada de errado em estar ali sozinha com ele. Quando eu percebi ter algo de errado, já era bem tarde.Começaram com pequenos gestos, pequenos olhares.Eu tentei dizer que eu não queria aquilo, mas essa foi a minha primeira lição de que existem humanos piores que os monstros que eu lia nas minhas histó
Capítulo 47 – Pedaços Samuel A casa está uma loucura só. A notícia de que o caso de Laura seria revisto, foi tão bem recebida por Sarah, que ela parece reluzir de tão feliz. Silos e Lucas, já estenderam as suas estadias na casa, sua presença sendo um bônus, que parece animar ainda mais a Luci e Rui, que dizem que uma casa tão grande, precisa de convidados. Nina já me ligou e disse estar a caminho. Dylan me disse estar preparando um relatório e que mais tarde ele estaria aqui. Eu espero uma grande reunião, com todos que se importam com ela, que torcem por ela, ao seu redor. Sarah merece isso. Ainda existem muitos pontos estranhos nessa história, mas eu vou tentar curtir essa vitória e depois pensar nas adversidades. Vejo Luci vir em minha direção, o papel que já sei o que tem e que ela vai tentar me fazer ler pela quarta vez. É algum tipo de cardápio que ela quer que eu aprove. Eu já lhe disse, que não importa se ela vai servir lagosta, caviar ou tofu, pois os amigos que prete
Sarah“O sol jogava sob nossas cabeças um calor agradável da manhã. Minha mãe me vestira com o meu melhor vestido azul, cheio de listras pretas, penteara meus cabelos para trás, as ondas que estavam um pouco crescidas desde a última vez que ela mesmo tinha cortado. — Podemos mesmo sair, mamãe? — eu perguntei a ela, ao olhar para a casa com a fachada descascando.As mãos de minha mãe tremiam tanto que meu pequeno braço se movia junto. Eu não entendia o motivo de ela estar tão nervosa ou a nossa saída apressada, desde que meu pai saíra pra trabalhar bem cedo.— Devemos. — Ela me respondeu, ajeitando a bolsa pesada no lado esquerdo do seu corpo.Mais uma vez, eu fiquei confusa. Eu tinha apenas seis anos, mas eu sabia que algo estava acontecendo, só não sabia ainda o que.Nós começamos a caminhar e quando chegamos a uma esquina movimentada, eu senti a minha mãe travar no lugar, a mão que segurava o papel que lia, tremendo mais ainda agora.Eu não entendia o motivo dela estar tão nervosa,
SarahHá uma cacofonia insistente em meus ouvidos. Eu cubro meu rosto com o travesseiro, mas mesmo fechando os olhos com força e me concentrando, nada me faz sair disso.É horrível. É assustador. E é o que me faz não partir de vez, o fino fio que me liga a realidade nesse momento.Faz uma quantidade razoável de tempo, que eu corri para o meu quarto e me tranquei nele. Eu ouvi Samuel me suplicar para abrir a porta, para deixa-lo ficar comigo, mas a única resposta que consegui lhe dar foi: “— Por favor Sam, eu só preciso de um tempo.”Ele não insistiu após aquilo. Samuel me conhece bem o suficiente para saber que eu estava lhe dizendo a verdade.Morta. A palavra começa a perder o sentido, de tantas vezes que eu já a repeti em minha cabeça. Eu nem consegui perguntar a Dylan, o que aconteceu ou como aconteceu. Minha única reação foi ficar lá, plantada e vendo que o desespero no rosto do jovem advogado, só poderia prover da realidade horrível em que estamos.Tento fazer com que as lágri
SarahA pele dela foi limpa, maquiada e preparada para ser tão bela quanto já foi um dia. Estou em pé, aqui nessa sala esterilizada, vendo a mulher que me ensinou o melhor e o pior que eu poderia conhecer, estou aqui a cerca de meia hora.Minhas mãos trêmulas tocam em seus cabelos escuros com carinho, cada sentimento que antes se mantinham a margem, agora borbulhando para fora, me estimulando a permitir sentir tudo, cada pedaço.Duas mãos fortes seguram com força meus ombros, me mantendo ali, me dizendo que está tudo bem desabar agora.As lágrimas começam a descer finalmente e aos poucos. Cada armadura que minha mente havia criado para não me permitir sentir, agora ruindo. A raiva que antes eu nutria com esperanças de me manter firme, agora se desfazem como um banco de areia.Ela realmente se foi. Depois de mais de dez anos, essa é a primeira vez que eu a toco e sua pele está tão fria quanto meu mundo sem a sua presença.Meu pacotinho...Ela adorava me chamar assim... como se eu fosse
Sarah Os cavalgar de Patrono é selvagem. Sei que meus músculos inferiores das coxas vão estar em frangalhos amanhã, mas eu aprecio essa distração que o cavalo poderoso me propõe. A saudade constante em meu íntimo, a ideia crua de que agora eu não terei nem as chances parcas de vê-la uma vez ou outra e a certeza de que alguém armou isso tudo tem me atormentado a semana inteira. Eu sei que o luto é um processo longo e cruel, pois eu mesma já auxiliei muitas famílias nessa situação, mas de alguma forma todo o conhecimento que tenho se torna um pouco inútil, quando os sentimentos a serem trabalhados são os meus. Estar sobrecarregada com tantos sentimentos ruins é como estar sob um constante mira. Tenho tentando processar coisa por coisa, fase por fase. Samuel, Silos e Lucas tem estado comigo essa semana, me acompanhando em cada passo. Amanhã eles terão que voltar para seus empregos, entretanto. Por um lado, eu estou triste, sabendo que a saudade deles de alguma forma será mais um go
Sarah Paro o meu Mustang em frente ao grande centro hospitalar da cidade, sem entender muito bem. Após o meu banho apressado, encontrei Silos e Samuel me esperando no hall da casa. Confusa, eu fitei Samuel, que só deu de ombros. A decisão de vir no meu carro, foi puramente minha, pois eu estava com saudades de dirigir meu carro. Fui seguindo o caminho que Samuel me indicou e demorei a perceber que estávamos nos encaminhando para o centro médico. Que diabos de surpresa é essa? — Muito bem... seja lá qual for o segredinho entre vocês dois, eu espero ser atualizada e já. — Alerto. Ao meu lado Samuel sorri, como se ele gostasse de me ver despejando ordens. — Mandona, não é? — Silos brinca, se dirigindo ao filho. — Só um pouco. — Samuel retruca, uma piscada cretina para mim. Meu centro pulsa em resposta, o desejo permeando meu corpo, ao entender que ele claramente faz uma menção aos nossos momentos a sós. — Gente! — Ralho com os dois, quando recupero a minha capacidade de racioci
SarahA nossa trajetória de volta para a mansão começa silenciosa e acredito que muito disso se deva a carga emocional que foi posta em nós quando saímos daquele hospital.Samuel encantou as senhoras daquele lugar por motivos além de óbvios. Já Silos espalhou gentileza por eles como uma onda de calmaria. Em minha mente jovem, eu já cheguei a acreditar que esse homem é algum agente divino nessa terra. Poucas vezes na minha vida, eu tive essa sensação com as pessoas e Silos sempre fora um dos raros que cruzaram meu caminho, só com a boa vontade de ajudar.Um sorriso lento vai se espalhando por meu rosto, quando vejo uma daquelas cafeterias cheias de pompa na esquina que adentramos. Silos finge que não gosta, mas ele é aficionado naqueles cafés de abóbora. Vou parando o carro devagar e Samuel me fita, parecendo entender o que se passa em minha cabeça. Silos levanta a cabeça do celular e olha em volta, um brilho feliz iluminando seus olhos azuis.Céus... como é fácil agradá-lo.— Quer a