SarahSamuel e eu circulamos pelo salão, ambos tensos demais para sequer tentar fingir algum sorriso. Esperamos o dono da festa começar a discursar sobre os diversos projetos e saímos do evento.Samuel anda ao meu lado, seu marchar rígido e maxilar travado. Nós nada dissemos quando entramos no carro e também nada dissemos durante toda a viagem.Eu sequer imaginava que Lucas e Samuel tinham um avô e muito menos que era um homem tão insuportável. Silos nunca o mencionou e o conhecendo por menos de dez minutos já imagino o motivo.Nós chegamos à mansão de fachada de cores brancas e detalhes em preto, com estilo moderno. Saio do carro, admirando como o jogo de luzes na fachada dá um toque especial.Samuel sai andando a minha frente e sinto que seu humor não é dos melhores.Sigo-o, vendo que ele segue o caminho que se eu me lembro bem da na biblioteca. Ele entra, se jogando na poltrona em frente a mesa. Vejo sua respiração pesada e fecho a porta as minhas costas, admirando brevemente a en
SarahOlho pelo restaurante em que paramos, a cacofonia dos sons me deixando um pouco perdida. Samuel me acordou hoje cedo, em meu último dia aqui, antes do nosso oficial casamento. Eu estranhei a sua disposição matutina, pois até onde me lembrava, Samuel sempre fora um homem que tinha um péssimo humor pela manhã. Ele me disse que tinha uma surpresa e sabendo que quando ele teimava com algo, era quase impossível fazê-lo desistir, eu me arrumei, ficando pronta em poucos minutos para sairmos.Isso se desenrolou em uma viagem de mais de quarenta minutos, comigo no carro perguntando a cada oportunidade sobre o que era a suposta surpresa.Ele obviamente não me contou.Agora, nós fazemos uma pausa merecida em um restaurante de estrada, mas olhando para a decoração temática de piratas e o som estridente das crianças, eu me pergunto se não era mais fácil ter parado em um posto e comprado alguns salgadinhos.Eu realmente gosto de crianças, mas depois de uma noite inteira mal dormida, após ter
SarahSinto meus lábios se abrirem em surpresa, com a mansão que se ergue a minha frente. Tem cerca de cinco minutos que Samuel parou o carro e me disse com tranquilidade.“Essa será a nossa casa pelos próximos dois anos.”Desde então, eu encaro a fachada de pedras claras, o telhado e detalhes das janelas em um preto fosco, uma luz amarelada vindo de lá de dentro.O tamanho, além de desproporcional para duas pessoas, também se encaixa perfeitamente na mata que cerca a propriedade, dando-lhe um aspecto mais isolado e mágico do que eu penso ser possível.É demais... é linda.— Sam... você alugou essa casa, só por causa de Xerez? — pergunto, não crendo que ele possa ser real.Samuel se aproxima, o olhar avaliativo na fachada.— Eu não aluguei, comprei. — Ele me corrige, indicando com a mão a densa camada de árvores que envolve a casa. — Fiz o meu dever de casa com um pesquisador ambiental e ele me disse que essa área é repleta de pequenas presas, ideais para o apetite duvidoso de Xerez e
SarahEncaro o vidro a minha frente como se ele de alguma forma pudesse fazer desaparecer toda a vergonha que ameaça me engolir agora. Eu sei que os acontecimentos de minutos atrás deveriam ser vistos como normais na visão de qualquer um, mas eu ainda não consigo crer que gozei sem reservas nos dedos de Samuel Scott.Daqui a poucos dias seremos casados e terei ainda mais situações como essa... céus...considerando todo aparente apetite sexual de Samuel, eu diria que essas situações não chegam nem perto.— Sarah... olhe para mim. — Ele pede, o tom suave.Meus ombros travam, a vergonha me fazendo agir com uma timidez que não me é comum.Viro-me, um pouco farta disso tudo.Eu havia decidido por ele, certo? Então não há motivo para isso.... bem mais fácil na teoria.Miro em seus olhos ímpares, vendo uma compreensão carinhosa neles.— Eu te fiz sentir mal em algum momento? — ele pergunta, os dedos retirando um fio persistente da frente dos meus olhos.Respiro fundo, sabendo o quão dramática
SarahMinha visão passeia pela sala da minha casa, a mesma sensação que tive ao visitar Samuel dias atrás retornando.É como se eu nunca mais fosse voltar aqui.Concordei com o locatário em não manter o contrato de aluguel por mais meses, pois eu sabia que minha vida a partir de hoje será uma incógnita.Eu estou com medo... merda, estou aterrorizada, mas minha mãe merece mais, muito mais do que já recebeu até hoje e se eu puder fazer alguma coisa, vou fazer.Aprumando meus ombros e esperando que meu coração esteja blindado até os últimos recantos, eu olho para Nina, que se aproxima como uma gaiola grande e de um material reforçado.— Certo... como faremos isso? — ela me pergunta, a voz baixa.Olho para Xerez, que já começa a se mover impaciente em torno do sofá.Isso pode se tornar complicado.— Deixe que eu tento, não posso te levar no hospital, logo hoje. — Brinco, mas vejo como o rosto dela empalidece um pouco.— Muito sensata. — Ela retruca, se afastando alguns passos.Pego a gaio
SarahÉ claro, que Samuel escolheria o exato momento em que estou abraçada a Lucas, para entrar.Seus olhos, uma das suas características mais significativas, miram os braços que Lucas, envolve em minha cintura.Por breves segundos, é como estar de volta aquela festa da faculdade, onde ele me pegou tentando beijar ao Lucas, onde eu o magoei e uma barreira pareceu se formar entre nós dois, uma barreira que ainda perdura até hoje.Tento me afastar, mas o braço de Lucas me segura no lugar, os olhos indo até Samuel com intensidade.Troco um olhar assustado com Silos, o medo de que ambos os irmãos, se desentendam logo hoje, me acometendo. Eu entendo o ponto que Lucas está querendo delimitar, só não sei ainda, se é uma boa ideia provocar Samuel em um dia tão importante.Vejo a forma com que Silos encara seus dois filhos, a expressão indo de preocupada a resignada. — Nina meu anjo, quer ir experimentar alguns dos aperitivos caros da festa, enquanto os três aqui, resolvem o elefante branco n
Sarah— Muito prazer. — A voz nos cumprimenta e mesmo em meu estado catatônico, eu percebo que tem algo errado na voz, pois com toda certeza não é a mesma — Creio que ainda não fomos devidamente apresentados, pode me chamar de Demétrio Rigns e quando soube que minha única sobrinha iria se casar, tive que vir.Pisco, o medo fazendo um caminho estranho por minha pele. Sobrinha? Do que diabos esse homem está falando?— Que brincadeira é essa? — Rosno, começando a chamar atenção de alguns convidados — Eu nunca soube que tinha um tio.Demétrio ou o que seria uma cópia exata do meu pai sorri, a fileira de dentes brancas, me fazendo perceber que existem algumas diferenças. Meu pai quando vivo, era tão dependente do álcool e cigarros, que era sempre uma versão meio doentia de si mesmo.Esse homem a minha frente é a cara da saúde.— Sua mãe não nos deu a chance de nos conhecermos, não é mesmo? — Demétrio se inclina, a voz soando conspiratória — Infelizmente meu irmão foi brutalmente assassina
Sarah“Eu estava cansada, muito cansada. Existe um perigo real em mentes cansadas. Meu pai dormia tranquilamente no sofá, uma garrafa quase vazia de gim em seu colo, enquanto eu me encolhia no canto, as partes doloridas em meu corpo ardendo como um lembrete.Desviei o olhar e vi minha mãe fitar o ponto onde meu pai dormia, o mesmo olhar vazio em seu rosto machucado. Era sempre a mesma expressão.“Não deveria ser assim...” eu pensava.Ela veio para onde eu estava, seus passos já conhecendo o ponto exato onde eu me escondia, depois que ele finalmente se cansava de mim.“Não deveria ser assim.”Eu senti seus dedos finos pegarem em meus braços e me levantarem, só para depois me firmarem.Eu estava destruída. Cada poro meu, pedia por descanso. “Não deveria ser assim.”Quando chegamos ao quarto dela, eu a vi fechar a porta com um cuidado extremo para não fazer barulho, o rosto se voltando para o meu, me olhando de verdade.Ela só me olhava desse jeito quando estávamos sós, nunca com ele.