FELIPE ..A noite caía, e o silêncio no hospital pesava como uma nuvem sobre meus ombros. Não havia som que abafasse as cenas que ecoavam dentro da minha cabeça, como se o terror daquela noite estivesse gravado na minha pele. O rosto pálido de Marina, amarrada e indefesa, cada expressão de medo de Nicole, os gritos, o estalo dos tiros, tudo se repetia sem parar, uma memória cruel e implacável.Sentado num banco frio, cobri o rosto com as mãos, tentando afastar a culpa que me consumia. Nicole estava próxima, enrolada em uma manta que o policial lhe havia dado para cobrir os vestígios da humilhação que havia sofrido. Eu me sentia um fracasso. Deveria tê-las protegido. Deveria ter sido forte o suficiente para impedir que tudo isso tivesse acontecido.Um médico se aproximou, trazendo notícias de Marina. Meus olhos foram de imediato para o rosto dele, em busca de uma resposta, de um milagre, mas antes mesmo que ele abrisse a boca, eu já sabia o que diria. Seu tom era suave, cuidadoso,
O amanhecer trouxe uma luz fraca e insensível. Eu acordei com um peso nos ombros, ainda com a cabeça deitada ao lado de Nicole, segurando a mão dela como se aquilo fosse a única âncora que me mantivesse à tona. Quando o médico entrou no quarto e anunciou que Nicole seria liberada, olhei para ela, com um alívio misturado à culpa que ainda me consumia. Era difícil aceitar que, apesar de tudo, ela estava viva e segura, enquanto tantas outras coisas haviam se despedaçado de maneira irreversível. Olhei para o médico, hesitante, com uma pergunta que ele parecia já saber que eu faria. — E Marina? Sussurrei, sem forças para encarar a resposta. O médico assentiu e disse que eu poderia vê-la. Nicole apertou minha mão uma última vez antes de soltá-la e disse, com a voz fraca: — Vai. Eu espero você aqui, Felipe. Sei que é algo entre vocês dois. Eu balancei a cabeça, agradecendo com um olhar, e segui o médico pelos corredores frios do hospital. Cada passo parecia pesar toneladas, co
NICOLE . . Eu nunca imaginei que um hospital pudesse ter um silêncio tão opressor, tão cheio de memórias e temores que se escondem nas paredes, nos ruídos leves dos monitores. O Felipe estava ali, ao meu lado, mas parecia que ele havia se exaurido ao ponto de não conseguir ficar acordado. Eu o observava na poltrona, sua expressão cansada, como se o peso de tudo o que havia acontecido fosse demais para suportar. No entanto, ele não saía do meu lado, e isso era o que me mantinha firme naquele momento. Foi então que o policial entrou no quarto, e por um segundo meu coração disparou. O homem se aproximou em passos firmes, o olhar sério, e eu sabia que ele trazia notícias, aquelas que poderiam significar o fim de tudo ou um novo começo. Eu chamei pelo Felipe, como se quisesse que ele acordasse para ouvir o que viria, mas ele estava completamente entregue ao cansaço. — Senhora Nicole? O policial perguntou, a voz baixa, respeitosa, como quem carrega um fardo pesado e não q
A porta do hospital se abriu, e antes mesmo que eu pudesse respirar o ar lá fora, senti o impacto das luzes, das câmeras e das vozes me cercando como um enxame faminto. Uma chuva de repórteres estava ali à minha espera. Eram como urubus em torno de uma carniça, ansiosos por um pedaço de escândalo, de tragédia, não importava se eu estava em outro estado, urubus existiam em todos os lugares.Eles estavam em busca de qualquer coisa que pudessem agarrar para vender a próxima manchete.A polícia tentou nos escoltar até o carro, mas eu sabia que aquilo não ia adiantar. Esse era um capítulo que eu precisava fechar com as minhas próprias palavras. Eu parei, me virei para encarar aquele mar de rostos e microfones, as mãos que empurravam, as câmeras que tentavam me capturar de todos os ângulos.— Nicole, como você se sente após ter sido humilhada diante de milhares de pessoas? A voz de um repórter me atingiu como um tiro, fria e direta.Eu encarei aquele homem sem desviar o olhar. Eu já tinha
UM ANO DEPOIS ..FELIPE ..Acordei devagar, o quarto ainda escuro, mas já iluminado pela luz suave do amanhecer. Ao meu lado, Nicole dormia serenamente, a respiração tranquila e o rosto relaxado. Eu observei cada detalhe dela, a beleza tranquila de quem, por um segundo, parecia ser feita de sonhos. Não resisti e deixei meus dedos percorrerem a linha do seu ombro até a cintura, sentindo a suavidade de sua pele sob o tecido fino do short de seda que ela vestia. Ela se mexeu um pouco, mas não acordou.Minha mão desceu um pouco mais, e eu meti minha mão dentro do short dela, e comecei a masturbá-la, até sentir seu corpo responder ao meu toque. Ela abriu os olhos devagar, e a vi sorrir preguiçosamente, embora com um brilho de ironia.— Felipe, você é um tarado. Ela murmurou, enquanto se esticou levemente. — Mal abri os olhos e você já está me invadindo.— Preciso disso pra conseguir trabalhar, amor. Passo o dia inteiro pensando em você.Respondi, subindo em cima dela e retirando sua
NICOLE ..Um ano. Exatamente um ano desde que tudo virou de cabeça para baixo. Se eu pudesse voltar atrás, claro, evitaria algumas dores. Mas olhando para onde estav, para tudo que conquistei... talvez não mudasse nada.Depois que Renata partiu, voltei a morar no apartamento que Felipe havia me dado. No início, parecia um refúgio, uma maneira de me reorganizar. Era um espaço só meu, onde eu podia me reinventar em silêncio, onde eu não era mais só “a ex-garota de programa perseguida”, mas alguém que tinha planos, ambições, sonhos.Voltei à faculdade, ainda faltavam dois anos até me formar. Coloquei tudo em ordem e organizei meu tempo como se cada segundo fosse precioso. Estudar de manhã, me dedicar à empresa à tarde, e à noite, Felipe. Ah, Felipe. Ele foi meu pilar em tudo, meu incentivo, meu maior apoio. Mesmo nos dias em que minhas inseguranças voltavam a bater, ele sempre sabia o que dizer.Peguei todo o dinheiro que juntei na época em que trabalhava como acompanhante e investi
FELIPE . . Grávida. Aquela palavra ecoou na minha mente como uma onda que se espalha e cresce, até que uma lágrima escapou dos meus olhos. Eu sentia um peso leve, uma mistura de incredulidade e felicidade que me tirava o chão. Olhei para Nicole, esperando mais uma confirmação. — Tem certeza disso? Perguntei, tentando conter a explosão de alegria que ameaçava vir à tona. Nicole sorriu, mas me pediu calma. Ela disse que ainda precisava fazer um teste para ter certeza e que eu não deveria me decepcionar caso não fosse o que esperávamos. Eu sabia que deveria manter meus pés no chão, mas o que ela acabara de dizer acendeu uma esperança que há tempos eu achava apagada. A ideia de ter um filho, ainda mais com a mulher que eu amava, trazia uma sensação de plenitude que eu não conseguia controlar. Em um impulso, a peguei no colo, a levando pra cama com cuidado, como se ela fosse algo precioso. Ela riu e disse que eu não precisava exagerar, já que ainda não havia confirmação.
NICOLE..De frente pro espelho, vestida de noiva, eu me sentia estranhamente calma. O vestido branco abraçava meu corpo de uma forma que parecia simbolizar mais do que um casamento: Era a prova de que eu tinha vencido. Passei a mão pela barriga, ainda discreta, mas já carregando o maior amor que eu poderia sentir. Fechei os olhos e deixei que uma lágrima solitária escorresse pelo meu rosto enquanto memórias invadiam minha mente.Vi flashes de quem eu era e do caminho que percorri para chegar até aquele momento.O cheiro do lugar onde trabalhei como prostituta parecia ainda estar impregnado na minha memória, um lugar onde os risos forçados mascaravam a dor de muitas mulheres, inclusive a minha. Foi lá que vi Felipe pela primeira vez. Ele era diferente. Não apenas pelo terno caro ou pelo sorriso confiante, mas pela maneira como olhou para mim naquela noite, como se enxergasse algo além da minha máscara.Lembrei do dia em que fui expulsa de casa pelos meus pais. Minhas escolhas, por ma