Por volta do almoço todos já haviam ido embora, deixando o galpão pronto para mais um dia de trabalho. Despedi-me de Alan, como se nunca tivesse ouvido sua conversa com Bia, combinando nosso encontro para logo mais à noite, apesar de não estar mais com um pingo de vontade de jantar com ele. Porém, algo me dizia para ir, e tentar obter algumas respostas para as minhas perguntas. Preparei uma macarronada com almôndegas para mim e Nick, aproveitando para puxar assunto sobre a querelante, já que pensava em voltar a São Paulo na manhã seguinte.
— Então, o que temos em mãos, Nick? Ela lhe deu alguma prova de que vivia com seu pai? Recibos de aluguel, certidão de nascimento do menino...
— Não! Ela apareceu na fazenda se dizendo mulher de meu pai. No começo pensei que fosse algum engano, já que meu pai estava sempr
Subi as escadas correndo, deixando-o na sala, e me atirei na cama. Acho que nunca me senti tão impotente como naquele momento. Nada fazia sentido. Por que ela me fizera sonhar com pastas que pensava conter provas que me levasse ao seu assassino (ao menos eu pensava que fossem provas) se não havia nada ali? De repente comecei a ficar com dor de cabeça de verdade. Acabei tomando um analgésico e depois de um tempo, peguei no sono.Ela se ncontrava sentada em frente à mesa do escritório, com o celular na mão, e um sorriso nos olhos negros.— Tiago? É Marilia. Como vai? — Perguntou feliz.— Ah, oi Marilia.— Já pedi para o Dr. Alan separar o material genético do Meia-Noite. Quando posso te entregar?— Hum...— Algum problema? Se n
Esforcei-me para esquecer o assunto, enquanto deixava a água quente cair em meus ombros, entretanto não foi tão fácil assim. O que mais me intrigava era o motivo de Marília não ter confiado a Nicolas suas suspeitas. Não seria o certo a fazer quando se ama e se respeita alguém? Seria o temperamento dele que a refreava? Ao mesmo tempo em que se mostrava doce, era rude o suficiente para perder a cabeça diante de uma situação daquelas. Talvez Marilia temesse perdê-lo em um embate com os criminosos. Ou o motivo seria o que aquela voz sinistra insistia em sussurrar em minha mente? Num momento de fraqueza quase desisti de tudo. Seria tão simples voltar à rotina do meu trabalho. Seria, se não me conhecesse. Sempre que pegava uma causa me dedicava a ela até a exaustão, esquecendo-me até de me alimentar. Aquele assunto nã
Marilia estava em frente ao computador, em sua sala, olhando para a lista. Números piscavam incessantemente no monitor — 000.193-52. Bia entrou na sala, fazendo-a minimizar o arquivo.Ela estava deitada, com os olhos fechados, na mesa fria, pálida e imóvel, coberta por um lençol branco, dobrado até a altura dos seios. Ele se aproximou, ainda com as roupas cirúrgicas, e passou a mão por seus cabelos.— Tudo poderia ter sido diferente, doçura — disse, com a voz rouca — Mas não se preocupe. Terei um souvenir para me lembrar de você — puxou com força a corrente do seu pescoço, fazendo cintilar na luz branca um pingente de cabeça de cavalo, levando-o até a altura dos olhos, admirando-o. Seus olhos sorriram triunfantes.Acordei co
Um bom advogado precisa pensar rápido e relacionar o assunto proposto por um cliente com seu conhecimento sobre as leis que regem o País. O cliente sempre está à espera de uma resposta que o acalme. Muitas vezes intuímos o que se passará com uma ação impetrada. Naquele momento, sentia que estava perto de encontrar algo. Sentia-o em cada partícula do corpo e no frio que corria para a espinha, toda vez que explorava o mistério que envolvia a morte de Marília. Encarava a tela do notebook, na verdade sem enxergá-la. Algo remoía minha mente, porém sem que eu chegasse ao fio da meada. Estava prestes a deixar o assunto de lado, fechando a tela, quando algo me ocorreu. Acessei o Google em buscas de mortes misteriosas naquela região de Ribeirão Preto. Entrei em alguns sites, porém não havia nada que chamasse atenç&atild
Não foi tão fácil assim encontrar a Clínica de Alan. Talvez por ter na cabeça a imagem de Nicolas golpeando meu coração, acabei dando voltas na cidade. Tenho a tendência, quando estou com raiva, de reprisar várias e várias vezes o assunto que me deixou furiosa. Numa espécie de exorcismo. Ensaio respostas, rumino e só depois lavo a alma. Mas até que esse processo passasse, fiquei com ele na cabeça. É incrível a canalhice de um homem. Eu me abri para ele. Contei-lhe coisas íntimas que jamais expus nem para minha melhor amiga, sobre meus sentimentos quanto à cirurgia que me mantém viva. Senti-me usada. Não era mais uma garotinha que pudesse dizer que havia sido seduzida, entretanto, sou uma mulher. Carente! Machucada! Magoada! Mas iria superar. É assim que agimos. Subir no salto e usar a máscar
Respirei profundamente ao me sentar ao volante do carro. Já estava virando uma rotina tentar me acalmar inspirando e expirando. Aquele possível homem não se encaixava na estória que tentava formar sobre Marilia. Estaria tão errada sobre os fatos? Não conseguia acreditar que ela pudesse ter se envolvido com alguém. Mas então, por que a certeza de Alan de que Nick os pegara juntos? Talvez devesse começar a interpelar a família de Marília e alcançar uma luz sobre seu desaparecimento. Precisava ter acesso às cartas que a mãe disse ter recebido da filha. A letra poderia dizer muito sobre o suspeito. Talvez se perguntasse por aí, alguém me indicaria o caminho, já que não consegui através do Alan. Antes, porém, ligaria para meu amigo, Francisco. Ele me aconselharia.— Delegado Francisco falando! &m
Não precisei procurar muito pela casa. Eu seguia o caminho como se soubesse exatamente aonde ir e, ao olhar para ela, uma sensação de tristeza me invadiu, quase me fazendo desistir de bater palmas. Meus olhos anuviaram ao me defrontar com o muro com grade baixa e o reboco com manchas negras que cobriam as paredes da casa. Havia tanta simplicidade na estrutura, entretanto, a vida vibrava pela porta aberta que sinalizava para uma rua calma e tranquila. Relutante, fui em frente. Uma garotinha me atendeu.— Olá! Você mora aqui? — Perguntei à garota de aproximadamente uns dez anos.— Minha avó mora. — Respondeu desconfiada.— Ela está? Posso falar com ela?— Vô chama a vó — esperei aflita, olhando para os lados, enquanto a menina desaparecia pela porta.— O vô tá vind
Sabia que mais cedo ou mais tarde teria que enfrentar Nick. Deixei a fazenda intempestivamente. Sentia-me horrível, mas não gostaria de deixar que ele soubesse o quanto sua rejeição havia me afetado. Não queria que me achasse uma deslumbrada, uma carente e desesperada por afeto. Gostaria que me visse como uma mulher forte, livre, feliz e independente. Uma mulher que entendia e não sofria por uma romântica e única noite de paixão. Para ele poderia ter sido apenas sexo, mas para mim, foi um pouquinho mais. Cheguei até a acreditar que seu jeito de me tratar fosse medo de se envolver com outra pessoa.Protelando o máximo que podia, entrei em uma padaria no centro da cidade, em busca de uma boa xícara de café e de um pão na chapa. Estava faminta. Havia me esquecido de almoçar, com tantas coisas na cabeça. Fiquei ali por quase quar