Podia ver o rosto expressivo dele pela luz tênue que vinha lá de fora, ajudada pela luz do abajur no canto do quarto.
Jamais esqueceria esse rosto. Seus olhos castanhos estavam vidrados, com uma cor brilhante como mel, a boca apertada, a respiração agitada.
Perfeito.
Carlo pensou que poderia morrer agora só para não ter que vê-la se afastar. Ele estava cego por ela. Sentiu ser puxado pelas profundezas cálidas do corpo macio dela e se abandonou ao melhor sentimento que tinha agora.
Logo seus pensamentos o abandonaram.
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Ambos ficaram enrolando quando acordaram. Ela o tinha ajudado a preparar o café, mas não conversaram muito.Ela parecia preocupada, um pouco desligada. Ele estava na mesma, só não queria perguntar. Tinha medo de ouvir algo que não gostasse.Os dois eram a cara da procrastinação.Ela tinha que voltar á nave para continuar o trabalho e ele tinha que entrar em contato com a faculdade. No entanto, os dois continuavam sentados á mesa, remexendo na comida que deixaram no prato.Ele estava ficando maluco. Suspirou devagar. O amor o pegou e agora não sabia o que fazer direito. Precisava encorajá-la para que se animasse a continuar sua tarefa.
_ Por que está tão nervoso? _ O que acha? - gesticulou _ Eles não podem saber sobre a nave. _ Verdade - mordeu o polegar _ Mas, tudo bem, é só inventar uma história. Eles vão embora depois, não é? _ Aí é que está. Meu pai resolveu ficar aqui um tempo. _ Essa não... Temos que ter cuidado até que eu possa ir. Ele travou um pouco. _ E, você já sabe... Quando vai? - seu coração parou uma batida. _ Posso ir depois de amanhã. “Tão cedo assim”?
Puxou o ar fundo, com um pensamento perigoso. E se ele e Amina tivessem uma história para contar de quando seus filhos eram pequenos? E se os dois estivessem juntos á noite, na varanda, olhando o céu, embalando seu bebê? Isso era um pensamento triste. Para formar uma família ele precisaria ter uma vida inteira com ela e tudo o que tinha eram dias, poucas horas. Depois ela iria embora e ele ficaria ali, sozinho, como antes. Mas a família dela deveria estar aflita sem saber o que acontecera com ela.Talvez estivessem até sofrendo pela ausência. — Bom, o papo de vocês vai longe - Gisele levantou — Vou para o quarto descansar um pouco.
Horas mais tarde, Clóvis estava boquiaberto com tudo o que havia visto. Até sua pressão se alterara ao ver a nave de Amina entre as árvores onde caíra. Ele entrou na nave, meio que atordoado e arrastado pelos dois, um de cada lado. Era algo que jamais imaginara ver na vida, apesar de gostar muito de ler e ver filmes de ficção que mostravam coisas assim. Só que aquilo era real. Amina lhe mostrou os arquivos de sua queda e ele saiu com Carlo para olhar a nave enquanto ela fazia novas avaliações e conversava com uma voz masculina que se chamava Hallo. Era como um sonho andar pelos corredores. Tinha até medo de tocar em algo. Quem sabe o que poderia acontecer?
— O que foi, pai? - se afastou dela. — Talvez Gisele tenha ouvido demais - apertou as mãos, preocupado. — Como assim? — Ela sabe que Amina não é exatamente o que diz ser - puxou o ar fundo e soltou devagar. — E por que? - Amina cruzou os braços. — Bem, ela descobriu sua moto lá fora - gesticulou — Claro que não sabe o que é mesmo, mas está querendo chamar a polícia. — Ela não pode - Amina arregalou os olhos — Não posso ser descoberta, isso vai causar um grande problema - abriu os braços, nervosa — Para mim e para vocês também. — Pai, eles não
Ele já esperava por isso e levou duas lanternas. Acendeu a dele e passou a outra para o pai. — Sei que é estranho, mas precisa manter a mente aberta - Clóvis viu a cara de susto e de dúvida de Gisele. — Vamos descer com cuidado - Carlo segurou a mão dela. Gisele não conseguia desviar os olhos daquela coisa, enfiada entre as árvores, algumas tombadas, outras queimadas. Havia terra espalhada e parecia uma coisa dos filmes que ela tinha visto, em um formato diferente. Não era redonda como um disco voador, parecia mais moderna. Se aproximaram e a rampa de trás se abriu e ela viu Amina aparecer. Ela ficou assombrada com o tamanho da nave e seus pés travaram.
Amina tinha percebido a urgência, o medo e também o amor no modo como ele a beijou e a levou para a cama. Estavam no quarto acertando como seria a partida dela, quando ele a agarrou, fazendo um som primitivo e de modo exigente capturou a boca dela e depois seu corpo. Ambos foram tomados de assalto por esse sentimento de amor e perda e isso os levou ás carícias urgentes, como se o mundo fosse acabar agora. As emoções dele refletiam nas dela e eles se uniram. Naquele momento não havia mais ninguém no mundo, só eles dois e queriam eternizar essa sensação na memória. O poder unido ao medo eram afrodisíacos fortes. Ela sabia que seria uma despedida e isso lhe causava medo.
Parecia ironia. Quando ela chegou ali chovia muito e agora em sua partida o alvorecer começava com chuva também. Foi para a sala de comando e sentou na cadeira, prendendo bem os cintos, depois ajustou o capacete. — Módulo de partida pronto. A voz metálica de Hallo soou na cabine. Ela apertou o botão e a rampa foi recolhida. As portas se selaram, fez a checagem e a luz verde acendeu. Estava pronta para ir. — Hallo, dê início ao voo padrão. Trave a rota orbital e comece a contagem. Lá fora Clóvis teve que puxar o filho para que se afastasse das turbinas que logo foram acionadas. A chuva aume