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— Infelizmente vossa excelência não se pode fazer mais nada. O câncer se espalhou, várias partes do corpo já estão tomadas pelas metástases.

Para ele, tudo o que estava ouvindo era surreal. Não estava acontecendo. 

Um pai não enterra seu próprio filho. Isso não deveria acontecer.

Ele pensava transtornado.

   — Você precisa fazer alguma coisa! — Esbravejou fora de si.

   — Não há mais nada a ser feito meritíssimo. Nesses três anos Sofia já passou por dezessete ciclos de quimioterapia, ressecção do tumor, tratamento diário de radioterapia. Já fizemos todo o possível, ela está sofrendo, seu corpo está fraco. Nesse exato momento ela precisa do pai.

Ele não podia aceitar.

   — Não, eu vou procurar outra opinião. — Disse desesperado, nem conseguia olhar nos olhos da sua mãe, e tão pouco ficar,no quarto e ver a sua filha definhando.

Gideon saiu sem olhar para trás.

   — Vovó cadê o meu papai? — A pequena Sofia perguntou, com dificuldade.

Mariana estava sem forças para fazer alguma coisa e seu filho estava louco, atrás de um alento. Procurando uma solução que pudesse ajudar a sua filha. Uma que evitasse que tirassem a sua menininha dele. 

Os pensamentos dele estavam tão atribulados que se questionava.  

O que adianta ser rico? O que adianta ter tanto dinheiro se não posso ajudar minha única filha?

Ao telefone ligava para seus contatos querendo uma solução. 

   — Eu estou com medo vovó. Quero o meu papai. — A menina pediu chorosa.

A doutora Stevens, não aguentava mais ver a tristeza nos olhos da menina, então saiu em busca do pai. Ela precisava tentar convencê-lo a ficar perto da criança antes que o pior aconteça.

   — A vovó está aqui pequena, seu papai já volta meu amor. — Mariana respondeu limpando uma lágrima, de sua face.

   — Não quero ficar sozinha, eu quero meu papai comigo!

Isobel ouviu antes de sumir pelos corredores. A médica sentiu tanta dor. Não era a primeira criança que a mesma via morrendo, no entanto, a forma com que tudo se desenrolou a tocou muito. Ela encontrou Gideon próximo à saída da pediatria.

   — Senhor Russell não podemos fazer mais nada. 

Ele interrompeu a doutora, e a mesma suspirou triste.

   — Eu disse não, não irei desistir. Vou conseguir um médico em Miami. Ele dará uma olhada na minha filha. Que vergonha doutora Isobel, que vergonha. Como pode desistir assim da minha filha? Como?

   — Senhor, eu não estou desistindo. Olhe, por favor, me escute. Não há mais tempo, sua filha está morrendo. Ela tem horas, ou minutos. A pequena pode morrer nos braços da avó, em meus braços ou nos braços de alguma enfermeira. Ou simplesmente pode achar o descanso em seus braços, nos braços do pai dela. — Disse, sendo dura nas palavras.

   — Eu não posso desistir. — Murmurou para si mesmo, inconformado.

   — Não está desistindo senhor, só não há mais tempo. Precisa se despedir dela. Se não o fizer, poderá se arrepender pelo resto da sua vida.

Gideon voltou correndo para o quarto. Tudo lhe parecia tão sombrio e aterrorizante, mesmo assim não desistiu. É a sua única filha ali, deitada imóvel naquele leito frio. Aproximou-se da cama e tomou o seu lugar, de direito, ao lado da sua pequena sereia, ele deitou e abraçou o corpo frágil, lhe passando o seu calor.

   — Papai nós vamos viajar?— Disse esmaecendo.

   — Vamos sim filhinha. — Exprimiu com dificuldades,por causa do choro.

A doutora sentou na poltrona ao lado de dona Mariana segurando as mãos da senhora, que enxugava as lágrimas que transbordavam em sua face.

   — Podemos viajar amanhã papa? É que estou cansada... Me abraça, estou com frio. — Sofia disse sorrindo.

Ela sabe o que vai acontecer, só não quer deixar seu papa sozinho, ele ficará muito triste.

   — Não tem problema filhinha, viajamos amanhã. Vamos a praia ver o pôr do sol, brincar, fazer casinha na areia. — Falou sufocando o choro com a mão esquerda.

   — Eu pedi ao papai do céu para o senhor não ficar sozinho. Que ele trouxesse uma boa moça para cuidar e lhe dá muito carinho…

   — É mesmo filhinha? — Expressou, não conseguindo esconder o choro dela.

   — É sim papa, só não espanta ela tá bom. Foi muito difícil, mas o papai do céu disse que vai conceder o meu pedido.

   — Eu não irei espantar meu amor.

Ele alisava os cabelos da sua pequena princesa de cabelos ruivos, a sua pequena sereia. Chamava por causa de seus cabelos ruivos, que puxará os da mãe, e o lembrava aquele desenho infantil.

Pelo menos para isso a cobra serviu. Para lhe dar o seu tesouro.

   — Eu te amo papai. Nunca se esqueça disso. Você é o melhor pai do mundo.

Antes mesmo que Gideon se preparasse, as máquinas começaram a apitar, avisando que sua filha não estava mais entre eles. 

Ele chorou com tanta dor, tanta, que todos no corredor da Ala Pediátrica ouviram o seu lamento.

   — Meu bebê não... Não... Eu também te amo minha pequena sereia... Eu...

Houve muita comoção neste dia. Todos se sensibilizaram com a dor do pobre homem.

(...)

Passaram-se três anos, desde a morte da sua menina, tudo mudou. Ele se transformou. Ficou mais frio e sem nenhuma empatia. Nada passa por ele e se passar o lobo estraçalha com seus dentes. Não sobrou nada que o tornasse ele mesmo. Pelo menos, assim ele pensava. 

Nada que o fizesse sorrir, até sua mãe e seus amigos mais próximos sofrem com seu desprezo, com sua raiva.

   — Mariana, já resolveu a questão da minha cozinheira? — Perguntou a sua mãe com descaso.

   — Eu já disse pare de me chamar pelo nome, eu sou a sua mãe moleque.

   — Que seja, por favor, responda a minha pergunta,não tenho o dia todo.

A frieza dele matava-a aos poucos. Não sabia mais o que fazer. Suspirou triste, querendo gritar, só não o fez por saber que não adiantaria, só serviria para deixá-lo, ainda com mais raiva do que já demonstrava.

   — Sim, ngela resolveu isso para mim. A moça chega amanhã.

   — Certo. E os antecedentes criminais? 

   — Claro meu filho. Eu sei dos seus critérios. A moça não tem nenhuma passagem pela polícia. Há mais uma coisa, ela é estrangeira. — Falou respirando fundo.

Gideon virou para sua mãe, com a face, bastante contrariada.

   — Não gostei nadinha dessa história. De que país essa mulher é?

A dama tentou buscar em sua mente as informações do que ngela lhe passou.

   — Há sim, ela vem do Brasil!

Ao ter ciência do que perguntara,retorceu ainda mais sua face.

   — Piorou, as mulheres brasileiras são um tanto vulgares...

Mariana interrompeu seu filho chateada.

— Não acho que deva abranger a todas. Você está sendo preconceituoso e intolerante meu filho. Não esperava isso de você. Um homem culto.

Em resposta o mesmo bufou. Levantou-se e se dirigiu a porta de saída, não dando a mínima para a opinião de sua mãe.

   — Tudo bem Mariana, mas se ela sair da linha será demitida.

Ele não esperou a resposta dela. Saiu rumo ao seu trabalho. Sem olhar para trás ou para tudo que está perdendo por ter se fechado para o mundo. 

O que Gideon não sabia era que a sua vida estava prestes a dar um giro de 180 graus. Se isso vai ser bom ou ruim, na verdade, só o tempo dirá.

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