Rita não aceitava a ideia de deixar Esther enfrentar tudo sozinha. Ela insistia que precisava estar ao lado da amiga para protegê-la. Mas Esther, consciente de suas próprias responsabilidades, acreditava que esse era um desafio que deveria enfrentar sozinha. Mesmo entendendo o desejo de Rita em ajudar, ela sabia que não podia permitir que a amiga sacrificasse seus próprios planos por sua causa.— Rita, você tem uma vida para viver. Não precisa se preocupar comigo. Quando escolhi esse caminho, eu estava ciente de que podia me virar sozinha. — Disse Esther, firme, enquanto olhava diretamente nos olhos da amiga.Rita conhecia bem a determinação de Esther. Quando a amiga tomava uma decisão, era praticamente impossível fazê-la mudar de ideia.— Certo, não vou discutir com você agora. — Respondeu Rita, tentando esconder sua inquietação.Apesar de parecer concordar, Rita já tinha decidido que encontraria um meio de se manter por perto. Ela não conseguiria ficar longe de Esther, especialmente
O garoto, com um jeitinho tímido, parecia um filhote frágil, encolhido contra o peito de Esther. As mãozinhas repousavam sobre ela, firmes, mas com delicadeza, como se ele temesse ser afastado.Quando ela pensou em afastar as pequenas mãos, uma voz doce e baixa quebrou o silêncio:— O som do seu coração me acalma...Sem qualquer aviso, ele a apertou com mais força, como se encontrasse segurança naquele abraço.Durante os cinco anos trabalhando em zonas de guerra, Esther já havia encontrado muitas crianças, mas aquele menino tinha algo especial. Havia uma ternura em sua voz que parecia atingir diretamente o coração dela, algo que ela não conseguia explicar.Com cuidado, ela o ergueu nos braços e começou a caminhar em direção à saída. O vento carregava areia pelo ar, tornando o ambiente ainda mais inóspito. Apesar disso, ela encontrou um jipe militar do País B e se aproximou.— Comandante, será que poderia nos dar uma carona até a embaixada?— Claro.O motorista notou o crachá de jornali
O cabelo do menino estava desalinhado, com mechas curtas misturadas a fios mais longos. Se ele não tivesse enfrentado a guerra e perdido o convívio com os pais, talvez fosse agora uma criança cheia de alegria.Esther, com cuidado, passou a mão sobre a cabeça dele e perguntou:— Você pode me contar o seu nome? Você não quis ficar na embaixada por causa dos seus pais?— Eu nunca conheci meus pais... — Murmurou o menino, desviando o olhar para o chão. A voz grave e carregada de melancolia parecia carregar anos de sofrimento.Durante os cinco anos que Esther trabalhou no País S, presenciou muitas tragédias, desde pequenos conflitos até catástrofes devastadoras. Saber que aquele garoto jamais tinha tido contato com os pais só confirmava que ele era realmente órfão.Esther suspirou baixinho. Que destino cruel para uma criança tão jovem!— Então você não tem um nome? — Indagou ela, pegando uma garrafa de água e enchendo um copo para oferecer a ele. Depois, se abaixou para ficar na mesma altur
Estélio, com as mãos pequenas, pegou o pedaço de batata-doce que Esther entregou a ele. Ele não devorou com pressa, mas comeu devagar, mastigando com calma. Enquanto isso, Esther encheu mais um copo com água e colocou perto dele.— Se não for suficiente, fala comigo, tá bom? Eu pego mais pra você. — Esther disse com um tom que mesclava carinho e preocupação.Estélio ergueu os olhos por um breve segundo, balançou a cabeça negativamente e voltou a se concentrar no pedaço de batata-doce. Havia uma espécie de barreira silenciosa nele, uma resistência quase instintiva em se comunicar mais do que o absolutamente necessário.Esther desviou o olhar, dando espaço a ele. Enquanto começava a arrumar os poucos pertences na barraca. De repente, o som cortante de uma corneta ecoou ao longe. Era a convocação para uma reunião. Algo importante estava acontecendo com a tropa.Antes que Esther pudesse reagir, Estélio colocou a batata-doce de lado e se levantou em um movimento rápido e preciso. Ele assum
Esther tinha o hábito de ajudar aqueles em situação de vulnerabilidade. Sempre levava comida para os necessitados e até preparava porções extras para distribuir. Quem trabalhava na cozinha conhecia bem essa generosidade.Estélio apertava a mão de Esther com tanta força que ela sentiu o suor na palma dele.— Diga, você gosta de alguma dessas roupas? — Perguntou ela, segurando duas peças de roupa para ele escolher.Uma era camuflada, a outra era azul-clara. Esther havia pensado em roupas práticas, pois sabia que as brancas ficavam sujas com facilidade em tempos de guerra.Carregar muitas coisas não era uma opção por causa da longa distância a ser percorrida. Por isso, ela planejava deixar algumas dessas roupas com Estélio antes de levá-lo para a embaixada, caso sua identidade fosse confirmada.No entanto, o garoto nem levantou os olhos para as roupas. Seu olhar estava perdido, e havia um tom de temor em seu rosto pálido.Sentindo o desamparo dele, Esther o envolveu em um abraço caloroso.
— Esther. — Uma voz interrompeu os pensamentos de Esther, chamando sua atenção.Ela se virou instintivamente e viu um homem de uniforme militar parado na porta. Era um companheiro de sua equipe.— Me chamou? — Esther indagou, ajustando o tom casual.— Sim, chegou um carregamento significativo de suprimentos de Iurani, e pediram para você assinar a entrega.— Certo, já estou indo.Durante os últimos cinco anos, Iurani nunca deixou de enviar grandes carregamentos de suprimentos, independentemente da localização de Esther. Com o tempo, outros representantes assumiram essa tarefa, já que Bernardo e o Faraó haviam desaparecido das entregas.Mesmo assim, mensalmente, uma quantia expressiva de dinheiro era depositada na conta dela. Os suprimentos facilitavam sua missão de ajudar os mais necessitados. Além de alimentar os soldados, ainda atendiam também à população mais carente, o que fazia com que Esther jamais recusasse o apoio. Ademais, ela não precisava encontrar Bernardo e o Faraó.Esthe
— Você sabia que, em todos esses anos, Gustavo nunca chegou a morrer? — Bernardo pausou por um momento, respirando fundo antes de prosseguir. — Ele é movido pela ambição e acabou sendo manipulado por outros. Preciso da sua colaboração com uma questão.Esther se manteve em silêncio por alguns instantes antes de perguntar:— O que exatamente você quer que eu faça?Se Bernardo estava ali pedindo algo, era porque sabia que ela tinha capacidade para resolver. Ele jamais faria um pedido em vão.— Desde que Sofia assumiu a sua idendidade, Gustavo quase conseguiu tomar controle total de Iurani. Quero que volte comigo. Com sua presença lá, tenho certeza de que ele vai aparecer. — Enquanto falava, Bernardo mantinha o olhar firme em Esther, como se tentasse prever sua resposta. Ela, porém, não deixou transparecer nenhum sentimento e manteve a serenidade. Quando ele começou a achar que ela recusaria, Esther finalmente respondeu, num tom baixo:— Certo, eu vou com você.A lembrança do passado, das
O médico militar examinou Estélio com rapidez, administrou o tratamento de emergência e, ao terminar os exames, se aproximou de Esther com um semblante sério.— O garoto tem asma. Vai precisar manter medicamentos por perto o tempo todo.A palavra "asma" ecoou na mente de Esther como um alarme distante. Ela estremeceu levemente. Conhecia bem essa condição. Podia surgir de predisposição genética, nascer com a pessoa ou ser adquirida ao longo da vida. Também sabia o quanto podia ser perigosa se não tratada adequadamente, especialmente em situações de emergência.Um pensamento perturbador atravessou sua mente: se Estélio não estivesse com ela naquele momento? Se tivesse sofrido sozinho, sem ninguém para socorrê-lo?Enquanto refletia, a pequena mão de Estélio ainda segurava a dela com força. Aquele gesto simples trazia uma mistura de fragilidade e necessidade que apertava seu coração. Ela se lembrou das poucas palavras que ele disse outro dia, quando mencionou, com esforço, que não queria i