Sophie Williams
Depois que os convidados foram embora, senti meu peito travar, como se o ar se recusasse a entrar. Meu coração falhou uma batida no instante em que me virei para subir as escadas e uma mão forte segurou meu braço, puxando-me sem aviso. Antes mesmo de processar o que estava acontecendo, uma ardência cortante se espalhou pelo meu rosto.
— Quem você pensa que é para escolher alguma coisa? As decisões serão minhas, tudo sairá conforme a MINHA vontade! — Victoria vociferou, suas unhas cravando minha pele.
O impacto das palavras doía quase tanto quanto o tapa. Engoli em seco, tentando manter a voz firme.
— Desculpe, Sra. Victoria, não foi proposital. Apenas imaginei que agir daquela forma fosse agradar a mãe do meu noivo. — A palavra queimou em minha língua. Noivo. O gosto amargo da realidade se instalou em minha boca. Casar com Mikhail Volkov significava entregar meu destino a um homem que escondia sua verdadeira natureza por trás de um terno impecável.
Mídia e sociedade o viam como um CEO respeitável, mas eu sabia o que se escondia sob essa fachada. Seu olhar afiado, sua postura predatória, o silêncio carregado de autoridade. Ele não era apenas um empresário. Ele era um homem da máfia, um homem que fazia o medo se espalhar como veneno. Como eu poderia conviver com isso? Como poderia viver ao lado de alguém cujo mundo era regido por sangue e violência?
— Não me interessa o que você pensa. Quem é você para pensar alguma coisa? — A histeria de minha mãe soava como um chicote, cortante e impiedosa.
Deveria querer agradá-la. Afinal, era minha mãe. Mas uma parte de mim se perguntava se um dia ela olharia para mim com algo além de desprezo.
— Sophie. — A voz firme de James ecoou no hall, seu olhar gélido fixo em mim. — Aja da maneira que sua mãe mandar. Ela decidirá tudo. Apenas aceite o seu destino e não discorde de nada, ou será punida novamente.
Havia um tom de desdém em suas palavras, um prazer frio na forma como me lembrava de que eu não tinha escolha. Para ele, eu não era uma filha. Era um investimento. Uma peça no tabuleiro que ele movia conforme sua conveniência.
— Você deveria agradecer por essa oportunidade — ele continuou, com um sorriso que não chegou aos olhos. — O casamento com Mikhail Volkov garantirá que tenhamos o que merecemos. Dinheiro, status, influência… Todas as mulheres sonhariam em estar no seu lugar, mas você? Você tem essa mania insuportável de se achar dona do mundo, aceite calada as decisões que tomarmos.
Meu estômago revirou.
— Sim, senhor. — Murmurei, observando-os se afastarem.
Subi as escadas, sentindo o peso da noite em meus ombros. Assim que alcancei meu quarto, fechei a porta e troquei toda a roupa de cama, tentando me livrar da sensação sufocante que sempre me acompanhava. No banho, esfreguei a pele com força, como se pudesse apagar tudo o que aconteceu. Mas a verdade era que as cicatrizes da alma não saem com água.
Por anos, desejei ter uma família amorosa como as das minhas amigas da escola. Nunca soube o que era sentir dedos gentis penteando meus cabelos ou uma voz carinhosa me guiando antes de uma apresentação de balé. Meu pai nunca esteve presente nos meus aniversários, e quando apareceu nas minhas formaturas, levou tempo até que eu entendesse: não foi por mim, foi pela imagem. Para o mundo, eu era Sophie Williams, a modelo internacional e herdeira do império que Victoria e James construíram. Mas, por dentro dos muros dessa mansão, eu não passava de um fantoche de luxo.
Deitei-me na cama, fitando o teto, perdida em pensamentos torturantes. O que me aguardava nesse casamento? Seria feliz? Amada? Descobriria, enfim, o que é ter uma família? Ou tudo não passaria de uma ilusão frágil, prestes a se despedaçar na primeira oportunidade?
Não se iluda, Sophie. Você não é digna de tanto. — Minha consciência sussurrou, cruel e impiedosa, silenciando qualquer esperança.
Fechei os olhos, exausta. O sono veio, mas não trouxe descanso. Mais uma noite atormentada por sombras e memórias.
Acordei antes do amanhecer, como sempre. Levantei-me e segui o ritual de me preparar para o dia. Vesti a melhor máscara que aprendi a usar e esperei. Esperei pela autorização para sair do quarto. Assim que a tivesse, daria minha desculpa e seguiria para o ensaio fotográfico com uma revista renomada.
Porque, no final, eu era apenas isso. Uma imagem. Uma ilusão.
E logo, seria a esposa de um homem tão perigoso quanto fascinante, um homem cuja presença me arrepiava a pele – não pelo desejo, mas pelo medo do desconhecido.
— Senhorita Sophie, o senhor Williams requisita sua presença no escritório.
— Obrigada, Jhow, estou descendo.
Ofereci um sorriso genuíno. Ele foi o único que, durante toda a minha existência, tentou cuidar de mim. Deixava remédios, pomadas, e, algumas vezes, me trazia refeições escondido quando eu estava de "castigo".
— Senhorita? — A voz de Jhow me parou já no corredor.
— O que aconteceu? — Perguntei ao notar sua expressão preocupada.
— Não o irrite, por favor.
Assenti, sorrindo triste.
— Irei pedir que preparem suas panquecas.
— Obrigada, Jhow. Por tudo.
Saí dali sem esperar resposta e segui para o escritório. Ao parar na frente da porta, bati e entrei após receber autorização.
— Bom dia. Mandou me chamar?
James estava sentado atrás da mesa, folheando um documento. Seu olhar levantou lentamente até mim, carregado com aquele ar de superioridade que nunca o abandonava.
— Mandei cancelar sua sessão de hoje. Irina está vindo tomar café com sua mãe, e você precisa estar presente. Mas lembre-se: não importune sua mãe. Ela tomará as decisões, e você só irá concordar.
Mordi a língua para conter o incômodo.
— Sim, senhor. Mais alguma recomendação? — Minha calma fingida nunca vacilava.
— Fale apenas o necessário. Se questionada sobre ser da sua vontade se casar, confirme. Se houver um erro, por menor que seja, farei você se arrepender de me envergonhar.
O tom calculado, a ameaça disfarçada de conselho. Isso era tão típico dele.
— Sim, senhor.
Balancei a cabeça em concordância e permaneci em silêncio. Afinal, nada é mais seguro do que o silêncio — e isso, eu sabia suportar.
Logo após terminar de falar tudo o que queria, e me ameaçar a cada duas frases — James me liberou. Saí do seu covil — digo, escritório — e segui para onde ele informou que Irina e minha mãe estavam. No caminho, ensaiei um sorriso animado, mas sem exageros. Não via necessidade de fingir tanto com Irina. A mulher carregava um carisma raro e, depois de anos convivendo com falsidade, aprendi a reconhecer quando alguém estava sendo genuíno. Ao entrar na sala de estar, vi as duas sentadas à mesa, saboreando o café da manhã impecavelmente servido. Irina, elegante como sempre, vestia um azul-claro sofisticado que realçava seus olhos avelã. Já Victoria, com a postura impecável e expressão meticulosamente controlada, parecia satisfeita. Ou satisfeita comigo, cumprindo meu papel. — Bom dia, Irina. Mamãe. — Cumprimentei, removendo o sobretudo e apoiando-o no encosto da cadeira antes de me sentar. — Bom dia, querida. — O leve sotaque russo de Irina me lembrou Mikhail. — Você está deslumbrante
Mikhail Volkov O clima frio da Itália me envolve assim que desço do jatinho. Um carro me espera, e, sem trocar palavras, Andrei e eu seguimos em silêncio. Sabemos que não seremos bem recebidos. Os Giordano tiveram problemas com a Bratva e a destruíram, assim como todo o legado Petrov, restando apenas Aurora Petrov... ou melhor, Giordano. — Sabe, eu realmente espero que não tenhamos problemas. Não dormi bem e gostaria que pudéssemos resolver esse assunto tranquilamente — resmunga Andrei, sentado ao meu lado, enquanto meu segurança coloca o carro em movimento pelas ruas de Milão. — Impossível resolver tudo com cem por cento de tranquilidade. Matteo odeia os russos no geral. A família dele sofreu um inferno por culpa de Nikolai e Maxim — respiro fundo. Sei que a primeira coisa que ele fará será apontar uma arma para minha cabeça... Ele ou seu fiel escudeiro, Lorenzo Ricci, seu consigliere e cunhado. — Não consigo imaginar como aqueles desgraçados tiveram coragem de sequestrar a irmã e
Quinze segundos. Foi o tempo exato que Matteo encarou Lorenzo antes de se levantar abruptamente da cadeira e lançar seu copo contra a parede. O vidro estilhaçou com um estrondo seco, espalhando cacos pelo chão. — Maledetto, miserabile, traditore, figlio di puttana! — Os xingamentos saíram cuspidos como veneno de seus lábios, carregados de um ódio palpável. O nome de Pavel Vasilievsky era o bastante para incendiar algo incontrolável em seu peito. Agora, Matteo tinha um motivo a mais para querer a queda da Bratva, não era apenas uma questão de poder ou vingança, mas de proteger sua família e destruir o desgraçado que ousou traí-los. Ele passou a mão pelos cabelos, tentando conter a fúria que borbulhava em suas veias. Inútil. — Lorenzo, chame meu pai. Agora. — Sua voz era uma ordem afiada como lâmina. O consigliere não hesitou. Saiu da sala às pressas, deixando um rastro de tensão no ar. Matteo continuava de pé, o peito subindo e descendo em um ritmo descompassado. Do meu lado, And
Sophie Williams Os últimos dias foram agitados. Escolhemos tudo que faltava: os últimos detalhes sobre músicas, comidas... e tudo ficou perfeito, digno de um noivado de um Pakhán—como descobri que Mikhail é nomeado. É estranho imaginar que viverei uma realidade diferente, com um mafioso que pode ser igual ou pior que o casal que me colocou no mundo. Elena, minha cunhada, tem me ajudado a organizar os detalhes, mas Victoria sempre tem a última palavra. Até pareço uma criança na frente das outras pessoas, pois preciso perguntar o que ela acha das opções. — Sophie. — Sou tirada dos meus pensamentos quando a porta do quarto se abre. Sei que é hora de sair. Me autorizaram. Respiro fundo e sigo até a porta, sentindo o tecido do vestido deslizar suavemente pelo meu corpo. O azul metálico reflete a luz do lustre, criando um brilho quase hipnotizante. O corte sereia do tecido fino abraça minha silhueta, e a fenda lateral revela a pele em um detalhe equilibrado entre sofisticação e ousadia.
Mikhail Volkov A movimentação ao nosso redor diminui por um instante quando avançamos pelo salão. Os olhos se voltam para Sophie, e os olhares masculinos são impiedosamente óbvios. Alguns tentam ser discretos, avaliando-a com um interesse silencioso, enquanto outros simplesmente se perdem na visão dela. As mulheres, por sua vez, analisam cada detalhe de seu vestido, algumas com admiração, outras tentando encontrar falhas que não existem. Ela está deslumbrante. Uma perfeita princesa da máfia, mesmo sem ter sido criada nos seus costumes. Sua postura exala uma elegância que parece ter nascido com ela, e seus olhos, tão frios, carregam uma sombra de desafio que só uma mulher forte poderia sustentar. Roman ergue a taça, lançando um olhar satisfeito para Sophie, como se estivesse celebrando a vitória de tê-la na família. — É um prazer recebê-la na família, Sophie. — Sua voz soa como uma sentença inevitável, carregada de uma solenidade quase imponente. — Sei que essa transição pode ser d
Sophie Williams Chegou o momento!Estamos no centro do salão, após Irina anunciar que é hora de formalizar o pedido. Ensaiar meu discurso de felicidade foi uma exigência da minha mãe, e passei toda a semana me preparando para isso.Contudo, ao olhar para todas essas pessoas que me observam como se eu fosse uma figura incomum, sinto-me sem palavras. Mikhail acaricia minha mão, e, à primeira vista, isso parece um gesto de carinho. Mas, na realidade, é uma ordem silenciosa para que eu me recomponha e mantenha a compostura que minha posição exige.Fixando meu olhar nas íris avelãs que me observam com desdém, faço um esforço para esboçar um sorriso breve, sinalizando que estou pronta — embora saiba que ele, de fato, não se importe.— Boa noite a todos. Gostaríamos de agradecer imensamente a presença de cada um de vocês neste momento tão significativo para nós. — Mikhail diz, fingindo uma felicidade que, se eu não soubesse da verdade, faria com que eu acreditasse. — Esta noite é especial,
Mikhail VolkovA raiva cresce em mim a cada risada e sorriso trocado entre Andrei e Sophie. Eu vejo claramente o que está acontecendo. Eles estão ali, no centro do salão, dançando como se fossem velhos amigos, trocando murmúrios e sorrisos cúmplices. Isso me tira do sério. Não posso deixar passar em branco.Ouço a voz do meu pai, interrompendo meus pensamentos.— Quer que eu pegue um guardanapo? — Ele pergunta com aquele sorriso de quem sabe exatamente o que está acontecendo. — Você está quase babando de raiva só porque seu irmão está dançando com Sophie.Respiro fundo, tentando controlar a raiva que só cresce.— Ele está brincando com a sorte, pai. Minha paciência não é grande coisa, e ele sabe disso. Mas resolveu testar, claro — resmungo, e meu pai me encara, rindo de forma quase zombeteira.É impossível não me sentir um idiota nessa situação. Meu irmão, lá, dançando e rindo com a minha noiva, e meu pai rindo da minha cara. A sensação de isolamento só aumenta, a irritação crescendo.
Sophie WilliamsMais um degrau.Mais um gemido sufocado.Mais um minuto em que meus olhos ardem, minha pele queima e o couro cabeludo pulsa de dor onde Victoria puxou meu cabelo sem piedade. Nunca está satisfeita. Nunca.Hoje, a razão foi Andrei. Segundo ela, eu o seduzi com sorrisos e gestos. James concordou, como sempre. Deixou que ela descontasse a raiva em mim. E eu, ingênua, achei que não seria tão ruim quanto quando é ele quem o faz. Engano meu.O primeiro tapa veio tão forte que senti o gosto de sangue. Depois fui jogada ao chão, e os chutes começaram. Costelas. Pernas. Braços.Tudo em mim dói.Mas é claro que ela só fez isso porque meu querido noivo não estará aqui pelas próximas duas semanas. Tempo suficiente para eu me recuperar.— Não se esqueça, filhinha — a voz de Victoria ecoa do meio da sala, carregada de desdém e satisfação. Ela está recostada em uma poltrona de veludo, cruzando as pernas com elegância, a taça de vinho equilibrada entre os dedos. Seus olhos azuis, frio