As luzes vermelhas piscavam. Ficamos até tarde na cena do crime, observando os peritos fotografarem pela segunda vez o local e documentar os novos achados. Remy reclamou a plenos pulmões que esse tipo de erro não podia acontecer e eu vi os homens ficarem encolhidos como se fosse a pior coisa do mundo levar um sermão dele.
A clareza foi súbita. O que eu sabia de Remy Bergeron senão as migalhas de pistas que ele me deu? Fiquei saboreando seu comportamento, o interesse na cena e como seu cérebro funcionava. Remy precisou se encostar em um carro policial e sacar o celular, onde anotou todas as coisas. Eu acendi um cigarro, mantendo-me ao lado de Victor que não se importava em ficar comigo, mas meus olhos estavam nele, em Remy, como se o desgraçado fosse um ímã magnético.
— Esse detetive que está cuidando do caso é mesmo bom
Segurei o pacote de gel congelado e coloquei sobre o rosto, na parte superior da bochecha esquerda, onde Dylan me acertou com seu punho pesado. Não estava doendo tanto assim, mas fiz um som de desconforto para chamar atenção.— Desculpe. — Remy disse, fechando a porta da saleta atrás de si.Não vou entrar nos detalhes de como foi caminhar para dentro da delegacia e ser recebido com olhares desconfiados dos outros guardas. Conferiram minha tornozeleira, recarregaram as pilhas e agora eu estava sentado em uma cadeira de plástico barato e sem conforto em uma saleta cheia de papéis. Era em Brume Peak, então eu sabia que não era o ambiente de trabalho de Remy, porém, uma foto dele em um barco de pesca com Dylan Vasseur estava me olhando. Odiava seu sorriso, o peixe grande e o braço pelos ombros do meu Remy.
Deitei na cama ao lado de Remy. Coloquei sua cabeça sobre meu ombro e sua mão no meu peito. Fiquei um tempo apenas curtindo sua presença do meu lado, seu corpo quente, a respiração calma e sua mão, tão morna, debaixo da minha.— Você sabe que é perfeito? Encaixa-se no meu braço como se tivesse sido feito para mim. — Deslizei a mão pela nuca, dei um beijo na lateral de seus lábios — Hm, gostoso isso. — Sofreguei. — Mal posso esperar para poder beijar você.Deslizei o rosto com o dele fazendo um carinho e com a outra mão, deslizei por sua nuca, enroscando os fios macios de seus cabelos nos meus dedos. Ele tentou balbuciar algo, mas estava muito dopado, até mais do que eu gostaria que ele estivesse. Dei um tempo para ele se acostumar com o remédio e perdi um precioso tempo apena
O avançado estado de decomposição da vítima atrapalhava os peritos mais dedicados. A polícia tinha pouca informação para trabalhar nos casos.A primeira vítima era uma mulher por volta dos trinta anos, acima do peso, uma prostituta que foi rapidamente identificada pelas digitais. Já tinha passagem pela polícia por uma discussão envolvendo dois outros homens, aparentemente seus clientes, que não quiseram pagar por seus serviços. Ela se chamava Katia Genet, não tinha filhos e morava em uma pensão na qual alugava um quarto na parte mais pobre da cidade de Brume Peak, ao lado de um rio fedorento, um esgoto a céu aberto. Os vizinhos e outros moradores relataram em depoimento que Katia Genet vivia sem excentricidades, mas que tinha um histórico de relacionamentos abusivos e portanto, aparecia com marcas pelo corpo e olhos roxos. Seu
O telefone tocou de madrugada. A voz de Remy parecia seca quando ordenou que eu me trocasse e encontrasse com ele em quinze minutos. Vesti roupas em tempo recorde: calça de inverno, casaco e jaqueta de couro. Nem penteei os cabelos cacheados. Espiei as janelas. A madrugada seguia escura e com uma densa névoa. Abri a porta, peguei o elevador sozinho.Onde estavam os guardas? Nem mesmo Victor havia aparecido essa noite e tudo bem, eu imaginava que Remy os dispensou para ficar sozinho comigo, mas agora parecia muito suspeito que não viessem me escoltar. Encontrei com Remy no exato local indicado. Ele estava de sobretudo de lã, suéter cinza claro de gola rolê, levemente apertado no pescoço como eu gostaria de por minhas mãos e calça jeans escuras, calçando botas de inverno.— Oi amor.Nem me olhou.—
Empurrei a porta da cafeteria e o aroma logo me invadiu. Olhei para Remy que esfregava os olhos cansado enquanto se dirigia para a fila. Fiquei bem atrás dele, mas não tive humor para conversar. Eu estava com aquela sensação ruim atrás da nuca desde que saímos das margens do rio e cá entre nós, não tínhamos andado para muito longe. A cafeteria ficava em um posto situado alguns metros do local e estava, naquela manhã, cheia de policiais, o que captou a atenção dos moradores do bairro mais nobre.Parece ridículo pensar que entrei na cadeia e saí para encontrar uma Brume Peak totalmente diferente daquela que eu conhecia e que transformei no meu parque de diversões. O rio sempre dividiu a cidade em duas áreas, uma mais pobre e uma mais nobre, mas não dessa forma. Agora os mais ricos que andavam de carros importados, moravam
“Se o Demônio de Brume Peak cometeu todos os crimes da forma que diz como cometeu, a prática do canibalismo adquirida com a evolução de seu método de assassinato, foi apenas um meio de livrar o réu de provas que pudessem ligá-lo aos crimes. No entanto, em depoimentos transcritos nesse livro, o leitor pode acompanhar que as práticas antropofágicas foram descritas com grande acuidade e um detalhamento assustador, capaz de mexer com as mentes mais sãs. Porém é notável, e causador de um grande incômodo, o fato de que Simon Louic nunca descreveu o gosto ou a sensação digestiva de seus atos.”Fechei o livro e suspirei. Era assim que Remy Bergeron terminava sua dissertação sobre mim, ou mais pr
O homem era como a maioria das minhas vítimas. Olhos azuis grandes e que concediam-lhe um ar de inocência. Os cabelos castanhos e lisos, até a altura do ombro, que contrastavam com sua pele extremamente clara, quase como uma flor de lírio. E por causa disso eu sabia que ele era a perfeita armadilha.Eu estava com as mãos algemadas em uma mesa de metal fria e lisa. A sala estava gelada, escura, com apenas um foco de luz incandescente em cima de meus olhos, que buscavam bloquear a visão. Sentia a boca seca e o corpo dormente, a simples visão daquela face harmônica trazia memórias que eu buscava bloquear noite após noite mal dormida na prisão.— Pode nos deixar a sós? — Sua voz tinha um tom amável, suave, mas de um jeito diferente, uma breve rouquidão quase morosa que me deixou extremamente desconfortáv
Estiquei o corpo, olhei a fotografia e peguei na mão. A mulher estava em cima de uma cama e tinha a barriga dilacerada. Ela estava nua, com a calcinha arriada nos joelhos e havia alguma coisa enfiada em sua vagina, grande o suficiente para causar um estrago e pequena demais para eu reconhecer o objeto.— Que tipo de jogo bizarro o assassino estava fazendo? — Perguntei sem querer. Lembra o que eu disse antes sobre não me impressionar? Aquilo me impressionava. O cenário era sujo demais para que ele não tivesse deixado marcas, pistas, qualquer coisa.— Eu pensei que era um jogo também. — A voz de Remy chamou atenção. Ele mordiscou os lábios pensativo, com a mão no queixo. — O que você acha que é o objeto?— Alguma coisa ofensiva. Religiosa. Não me surpreenderá que a mulher seja