Capítulo 3
Após o jantar, fui chamada no escritório do Felipe.

Dentro daquele ambiente, ele já não parecia o empresário implacável que todos conheciam, mas alguém sereno e gentil. Com voz mansa, ele questionou:

— Ângela, você sempre gostou do Luiz desde criança. Ainda sente algo por ele?

Balancei a cabeça tão rápido que até os músculos do rosto protestaram.

Foram sete anos alimentando esse sentimento, sete anos de submissão, sete anos de sofrimento, e mesmo assim não aprendi. Por isso mesmo acabei colhendo essa vingança cruel. Agora, não me permitia nem um pingo de afeto pelo Luiz.

Felipe absorveu minha resposta e, após um instante reflexivo, suspirou profundamente, quase como se tivesse pena de mim.

— Ah, entendi. Você não pode virar minha nora, mas sempre será considerada minha filha. É uma moça tão boa, tão bonita... Luiz é quem não soube valorizar. — Da gaveta, ele retirou um cartão bancário e estendeu para mim. — Isso é o que seus pais deixaram. Quatro milhões. Pediram que eu guardasse até você amadurecer, para usar como dote quando casasse.

Quatro milhões? O mesmo valor do resgate.

Durante o cativeiro, cheguei a ressentir meus pais por não me levarem junto, por não me protegerem. Mas agora entendia que eles já tinham garantido minha segurança, me amavam mais do que imaginava.

Levei o polegar à boca, segurando as lágrimas.

— Obrigada, Felipe. — Sussurrei.

Ao sair do escritório, o relógio marcava oito da noite. Caminhava para meu quarto quando esbarrei no Luiz. Ele percebeu meu destino e, surpreendentemente, falou com brandura:

— Camila vai ficar no seu quarto hoje. Você vai para o quarto de hóspedes, do lado do meu.

Era por causa dela.

Concordei com um aceno e virei os calcanhares. Quando me mudei para casa da família Garcia, Luiz, que me detestava, havia escolhido o quarto mais distante possível: leste contra oeste.

Meu espaço tinha sido desenhado por um designer renomado, enquanto o de hóspedes era bem mais simples. Porém, como tudo ali pertencia à família Garcia, se ele pedia, eu obedecia.

Mal dei dois passos quando sua voz me alcançou:

— Ângela, nunca te vi tão dócil assim...

Me virei e encontrei seu olhar mesclando ironia e uma ponta de inquietação.

— Eu... Desculpe... — Gaguejei. Além de pedir perdão, não sabia mais o que dizer para ele.

— Terceira vez que se desculpa hoje. Está estranha. — Ele comentou, se aproximando até encostar a mão em minha testa.

Recuei como se tivesse levado um choque, me agarrando ao corrimão enquanto as pernas ameaçavam ceder.

Ele me encarou como se eu fosse uma doida, a impaciência tomando seu rosto.

Tentei conter o tremor na voz:

— Eu... Eu vou embora amanhã. Já avisei Felipe. Vou morar fora.

Esperava alívio em sua reação, mas para meu espanto, ele se exaltou:

— Embora? Por quê? Só pedi para Camila ficar no seu quarto! Ela é nossa convidada, não consegue ceder isso?

— Não é por isso. — Sacudi a cabeça com veemência.

De semblante fechado, ele avançou e agarrou meu pulso com força, me arrastando para o cômodo mais isolado da casa.

— Vem comigo. Precisamos conversar.

O medo me envolveu como um manto. Com voz entrecortada, fisguei da bolsa o cartão que Felipe me havia dado:

— Por favor, tenho dinheiro agora! Não me bate!

Repeti em desespero:

— Tenho dinheiro, não me machuca!

Luiz se voltou surpreso, me encontrando sentada no chão com meu pulso ainda preso em sua mão.

— Ângela, que diabos está falando?

Meu lábio já estava roxo de tanto morder. Ao ver seu rosto se aproximar, as palavras dos sequestradores ecoaram: “Cadela da família Garcia, se agarrando ao dono.”

— Luiz... Digo, Sr. Luiz. Não vou mais te perturbar. Nunca mais.

Luiz finalmente notou que algo não ia bem comigo. Seus gestos ficaram mais delicados quando me puxou num abraço, me erguendo levemente.

A súbita sensação de desequilíbrio me fez agarrar instintivamente seu pescoço, e notei até sua expressão carrancuda suavizar um pouco ao me ver menos tensa.

— Ângela, não é que eu não queira você por perto, só que... — A frase morreu no ar quando a porta do corredor estalou secamente.

Camila surgiu no batente, a luz forte do quarto iluminando o corredor como holofote. Ela levou a mão à boca em falso susto.

— Sr. Luiz! Srta. Ângela!

Ele franziu o cenho, irritação escancarada.

— O quarto já é seu. O que mais quer?

Camila respondeu com voz melosa:

— Videoconferência urgente com a filial americana. Exigem sua presença pessoal.

Luiz me mirou, suspirou contrariado e me soltou. Fiquei dura como estátua, sem reação.

— Vai para o meu quarto esperar. — Mandou seco, avançando rumo a Camila. Entrou no meu quarto e fechou a porta com clique decisivo.

A luz invasora sumiu, me deixando imóvel no corredor como sobrevivente de furacão. O suor frio já encharcava minhas costas.

Eu sabia que ele não voltaria. Camila sempre puxava essas jogadas. Aniversários, formaturas... Sempre havia um chamado urgente. Talvez ele até preferisse assim.

Precisava sumir antes que ele voltasse. Cada minuto perto dele era um risco para minha sanidade.
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