Lucas Park Às vezes, durante o dia, deixo minha mente correr livremente, sem me importar com o que será transportado para a superfície. Na maioria das vezes, me pego pensando em como será meu futuro ao lado dela. Deixo minha mente vagar pelas possibilidades de um futuro nem tão distante assim. Acordaríamos cedo todas as manhãs; eu prepararia o café da manhã para ela, e seguiríamos juntos para algumas das empresas — tanto faz qual delas. Desde que estivéssemos juntos, não importava em qual ramo ela decidisse seguir. Almoçaríamos juntos, participaríamos de reuniões, e voltaríamos para casa à tarde. Provavelmente assistiríamos algum filme, compartilharíamos histórias de nossa infância, e adormeceríamos lado a lado, depois de nos amarmos loucamente em nossa cama. Em alguns anos, teríamos nossos filhos e dividiríamos nosso tempo entre eles e nossas ações. Tudo o que eu queria era a tranquilidade de um relacionamento repleto de calor e paixão e, acima de tudo, de complet
Lucas Park — Faltam algumas semanas para o aniversário dela — iniciei uma estratégia arriscada. — Talvez possamos fazer algo especial nesse dia. — É uma ótima ideia, querido — transmitiu Leslie. — Gabrielle nunca teve uma festa de aniversário desse porte antes — disse Jullian, fitando-me diretamente. — Talvez possamos fazer um evento inesquecível, não apenas para os convidados, mas também para ela. Ele não precisa dizer mais nada. Eu entendi, pelo modo como me olhou, exatamente a que ele estava se referindo. Jullian era estratégico e eficiente. Nem precisávamos combinar nossas falas ou criar um plano mirabolante. A conversa se encaminhou naturalmente para o ponto desejado, sem que ninguém percebesse. Mas Leslie não estava tão alheia à nossa conversa silenciosa quanto eu imaginava. Ela lançou um olhar para Jullian, e um sorriso contido escapou de seus lábios. Talvez ela estivesse tão preocupada com o cumprimento das metas quanto a nós. Cada um de nós tinha moti
Lucas Park Aquela inquietação não me permitia dormir. Toda vez que tentava fechar os olhos, a imagem dela, coberta apenas pelo fino tecido da camisola, tomava minha mente. E, quando conseguia afastar esses pensamentos, lá estava o jantar, repetindo-se em um ciclo incessante — o momento em que ela concordou em se casar comigo. Eu não conseguiria dormir enquanto não encontrasse uma maneira de tirar sua imagem da minha cabeça. Claro, eu poderia simplesmente levantar, bater na porta ao lado, tomá-la em meus braços e me perder em sua pele. Mas sabia que, a cada minuto que passávamos, caminhávamos perigosamente em direção ao nosso ponto de inflexão. Era como se carregássemos uma bomba-relógio que poderia explodir a qualquer momento. Se eu a tocasse agora, nem o testamento, nem o passado, nem qualquer acordo entre nossas famílias importariam. E talvez fosse exatamente isso que me assustava. Vesti uma roupa confortável e corri para o jardim. Estar a apenas uma parede de distânc
Lucas Park Foi só quando a vi desacelerar que percebi onde estávamos. Ela estacionou de qualquer forma, atravessando três vagas sem se importar. Havia poucos carros ali, como sempre. Essa era a razão de ser meu bar favorito: silêncio e anonimato. Parei a moto do outro lado da rua, nem precisei me esconder entre os arbustos que circundavam o estacionamento. A iluminação fraca me garantia que ela não me veria ali. Desci, pousei o capacete no tanque e me encostei na lateral. Eu gostava de observa-la. Outro carro parou logo depois, próximo ao dela. Um modelo comum, de passeio — nada que combinasse com os frequentadores da elite que comandava a cidade. Quando vi quem desceu, franzi o cenho: Alice, a recepcionista da matriz de projetos. Alice usava um vestido chamativo e justo, mas o tecido brilhante fazia sua pele parecer ainda mais pálida e seu corpo mais magro do que eu lembrava. Ela era bonita e tinha um sorriso encantador, que, por várias vezes, havia me lançado sem
Lucas Park Eu não sei dizer o que me deixou mais puto: ser interrompido pela ligação ou me irritar por ter sido impedido de... Merda! Tinha alguma coisa errada com meu cérebro. E finalmente percebi aquilo que eles sempre martelaram na minha mente, e não fez com que eu gostasse mais daquele cara do outro lado da linha. — Por que pergunta? — ele retrucou com uma gargalhada debochada. — Me daria se eu pedisse? — Vai se ferrar! Meu humor foi de um extremo a outro em questão de segundos. Como ele conseguiu estragar aquele momento tão facilmente? Ouvir sua gargalhada só acrescentou mais peso à minha raiva. O fato de ele nem perceber o quanto me afetou apenas lhe dava mais poder para me irritar. — Está ficando cada vez mais ousado, senhor Park — zumbiu Castillo. — Devo ter interrompido algo importante. Ligo mais tarde, se preferir... De fato, ele interrompeu um dos momentos mais reveladores que já vivi. Naquela noite, tive a benção (ou a maldição) de descobrir f
Gabrielle Durante algum tempo, tentei ser outra pessoa. Por um breve período, ignorei minhas origens e reprimi meus sentimentos – ou a falta deles. Queria me encaixar, pertencer a algo, qualquer coisa. Tentei tanto fazer parte de algum lugar, de qualquer conexão que me oferecesse significado, que acabei me tornando vazia. O esforço foi inútil. Bastaram alguns poucos dias para que eu percebesse a quão catastrófica foi essa tentativa de ser alguém que não sou. A verdade é que não se pode ter tudo o que se deseja. Para algumas pessoas, falta dinheiro. Para outras, afeto. Muitas carecem até mesmo de comida. Eu, porém, nunca precisei de nada material. O que me faltava – e sempre faltou – era a aceitação de quem eu sou. A busca pelo autoconhecimento é brutal. Exige um preço alto, um sacrifício ao qual você precisa se entregar por completo. Mas o que acontece quando o pagamento exigido não é algo seu? O que fazer quando a ausência de sentimentos embota qualquer reflexão sobre ess
Gabrielle Aceitei o café, sabendo que não teria escapatória daquela conversa. O gosto amargo e frio escorregou pela garganta, e me forcei a não fazer careta — embora soubéssemos que o café não era o verdadeiro motivo do meu desconforto. Jullian percebeu, esboçando um sorriso breve, mas se conteve ao encontrar meu olhar. — Pode me dizer a razão de ter quebrado sua promessa? — Jullian começou, a voz fria, mas com uma ponta de frustração subjacente. — Qual delas? — perguntei, com um sorriso despreocupado. — Onde foi depois do jantar de ontem? — Ele estreitou o olhar, desconfiado. — E não adianta usar o jovem Park como escudo. Coitado, ele passou a noite toda discutindo os detalhes da festa com Leslie. — Sabemos onde estive e o que fiz. — O interrompi, cansada da encenação. — Pode pular a introdução e ir direto ao ponto. — Por que fez aquilo? — Ele perguntou calmamente, embora a tensão fosse palpável. — Pensei que tivesse gostado dela. — Sim, Alice foi u
Gabrielle Depois daquele jantar desastroso, saí para tentar esquecer — sem sucesso — o absurdo de que eu havia concordado com Leslie. Antes que percebesse, já estava estacionado na frente do bar onde Lucas me levou. Alice me viu sair do esportivo branco ― o mesmo que Lucas costumava usar para ir até a empresa ― se apressou para vir ao meu encontro. Apesar de ser uma noite quente, sua escolha de roupa era vulgar, até mesmo para meus padrões. O vestido era de lamê turquesa, era tão apertado que parecia que uma brisa mais forte rasgaria as costuras. Não tinha decote profundo, mas as costas estavam completamente nuas. Ela era bonita, mas de uma beleza padronizada: rosto redondo e inexpressivo, lábios carnudos, nariz arrebitado e cabelos pretos no corte chanel. Sua magreza excessiva a faz parecer com as garotas de revista, todas iguais, sem uma única peculiaridade que a destacasse. Talvez fosse esse o motivo da escolha da roupa. Ela sabia que não era chamativa por