Bruno ainda estava pensativo sobre a reunião, sobre a pequena derrota que sofreu. Sentia o gosto amargo de ter sido colocado no lugar, de ter perdido o controle da situação.Mas, antes de tomar qualquer decisão precipitada, uma daquelas que ele sabia que se arrependeria depois, pegou o celular e, digitou uma mensagem para Ester."Oi. Eu não queria ser tão protetor com você, mas algo dentro de mim passa à frente da minha razão, e eu não sei como negar ou reprimir isso..."Respirou fundo antes de enviar.O que estava tentando dizer, afinal?Ele sabia que estava exagerando. Sabia que a forma como reagiu à nova posição de Ester não tinha sido justa. Mas, mais do que isso, sabia que havia algo nele que não conseguia aceitar a ideia de vê-la tão próxima de Laura.No setor de qualidade, Ester estava concentrada em mais uma pilha de papéis quando sentiu o celular vibrar sobre a mesa. Pegou-o sem muita pressa, mas ao ver o nome de Bruno na tela, hesitou por um segundo antes de desbloquear a te
Júlia perambulava pelo prédio como se não tivesse obrigações, como se o trabalho fosse apenas um detalhe irrelevante em seu dia.A verdade? Boa parte das pessoas se perguntava como ela ainda mantinha o emprego.Mas Júlia sabia exatamente o que estava fazendo.Ela sempre soube.E agora, enquanto cruzava o corredor do RH com passos silenciosos, seu olhar estava fixo num único objetivo.Ao contrário de outros setores, onde fazia questão de ser notada, ali ela movia-se com discrição. Passou pela mesa de Letícia, vazia, como previa. Provavelmente estava em alguma reunião, o que lhe dava tempo suficiente para o que queria.Parou diante da porta do supervisor do RH e bateu três vezes.Batidas pausadas. Conhecidas.Uma voz rouca respondeu do outro lado.- Entre.Júlia abriu a porta e deslizou para dentro, fechando-a atrás de si com um clique suave.- Oi, amor - disse, um sorriso jogado nos lábios. - Estava com saudades.O homem atrás da mesa ergueu os olhos do computador, e um sorriso lento s
Ester voltou para o escritório no carro de Bruno, mas saiu antes que ele pudesse estacionar no prédio. Precisava de um momento para si, para recompor a expressão antes de atravessar aqueles corredores e encarar o que quer que estivesse à sua espera.Ainda sentia o gosto do beijo dele nos lábios.E o peso da decisão nos ombros.Já estava quase se acostumando com essa sensação, o arrependimento silencioso que vinha depois de cada escolha impulsiva. Mas saber que teria que encarar Laura pelo resto da tarde fazia tudo parecer ainda pior.Ao chegar à sua mesa, tentou se concentrar, mas o telefone tocou antes mesmo que pudesse abrir um único documento.O visor mostrava o ramal de Laura.Ester fechou os olhos por um segundo antes de atender.- Sim?Ela tentou soar neutra, mas sabia que seu tom entregava algo. Algo errado.E Laura, percebeu.- Na minha sala. Agora.A ordem veio rápida, firme, sem espaço para discussão.A ligação foi encerrada antes que Ester pudesse responder.Ela suspirou, p
Ester caminhou de volta à sua mesa sem realmente enxergar o que estava ao seu redor. Seu coração ainda batia rápido demais, o corpo carregava a tensão do que havia acontecido na sala de Laura.As palavras dela ainda ecoavam em sua mente."O que aconteceu hoje?"Ester apertou os lábios, sentindo o peso daquele olhar que parecia atravessá-la sem esforço. O pior de tudo era saber que Laura não tinha feito uma acusação direta. Não precisava. Apenas insinuava, pressionava, deixava no ar a dúvida que fazia tudo se embaralhar dentro dela.Sentou-se e respirou fundo, tentando se concentrar nos documentos à sua frente. Mas suas mãos estavam trêmulas.Ela se sentia exposta.- Precisa de um minuto?A voz veio de um ponto próximo, e Ester ergueu os olhos rapidamente, surpresa.Ricardo estava ali, encostado de leve na lateral da mesa, com uma expressão neutra, mas com os olhos atentos demais para alguém que apenas passava por ali.- O quê?Ele inclinou ligeiramente a cabeça, como se estudasse sua
Júlia já sabia há tempos que informação era poder na GT Corporation.Não importava se era um simples boato ou um fato concreto. No final, tudo podia ser usado da maneira certa para conseguir o que queria. Uma frase fora de contexto, um olhar mal interpretado, uma aproximação inesperada... Qualquer detalhe poderia se transformar em vantagem, se usado com inteligência.E, naquele momento, ela tinha em mãos algo que valia ouro.De onde estava, recostada contra a bancada da copa, no canto da sala, quase escondida, observava Ester e Ricardo sentados próximos, em uma conversa que claramente ultrapassava o simples profissionalismo.Ester estava visivelmente tensa, os ombros rígidos, os dedos inquietos sobre a mesa, a expressão carregada de algo que Júlia não via com frequência nela. Insegurança? Preocupação? Um segredo não dito?Mas Ricardo...Ricardo parecia saber exatamente como fazê-la falar.Ele mantinha a postura relaxada, um dos braços apoiado casualmente na mesa, o corpo levemente inc
Letícia estava na sala do RH, terminando a análise de registros quando algo incomum chamou sua atenção.Um pedido de análise de pessoal do setor de TI.Isso, por si só, não era estranho. A GT Corporation fazia reavaliações periódicas para garantir eficiência nos departamentos. Mas o que a fez parar foi o nome listado como possível realocação: Ricardo.Ela franziu a testa.Isso não faz sentido.Ricardo tinha sido transferido há pouco tempo e já havia resolvido inúmeros problemas técnicos que antes ficavam pendentes por semanas. Seu desempenho era excelente, e ela sabia que a matriz não estava com problemas de orçamento para justificar cortes.Curiosa, Letícia acessou os registros internos e verificou as métricas de produtividade do TI. Os números eram claros:Ricardo era essencial para a equipe.Ele não estava sobrando. Ele estava incomodando alguém.Apertando os lábios, abriu o histórico do pedido, procurando saber de onde essa solicitação havia partido.Rolou a tela com calma, seus o
Letícia não gostava de se envolver em problemas que não eram seus.Mas algumas coisas simplesmente não podiam ser ignoradas.Até por que Bruno estava se envolvendo em setores que ele não tinha propriedade.Agora que sabia o que Bruno estava tentando fazer com Ricardo, deixar Ester no escuro não era uma opção.E no dia seguinte respirando fundo, ela seguiu em direção ao setor de qualidade, onde sabia que encontraria Ester.Ester estava sentada à sua mesa, folheando alguns relatórios quando ouviu passos determinados se aproximando.Ao levantar os olhos, encontrou Letícia parada à sua frente, os braços cruzados e uma expressão séria no rosto.- Podemos conversar?Ester franziu a testa.- Claro. Algum problema?Letícia puxou uma cadeira e sentou-se ao lado dela.- Eu sei que talvez não queira ouvir isso, mas achei que devia saber.O tom dela fez Ester largar a caneta, sentindo um leve aperto no peito.- O que aconteceu?Letícia respirou fundo antes de continuar.- O Bruno esta tentando ti
Apos a conversa com Leticia, Ester cruzou os corredores da empresa com passos rápidos, ignorando os olhares curiosos de alguns funcionários ao passar.Seu coração batia forte, mas não era nervosismo. Era de raiva.Ela não sabia o que a incomodava mais: o fato de Bruno ter tentado manipular a situação pelas costas ou a arrogância com que ele sempre acreditava que estava no direito de fazer o que bem entendesse.Respirou fundo quando chegou à porta da sala dele.Sem bater, girou a maçaneta e entrou.Bruno estava sentado atrás da mesa, analisando alguns papéis, mas ergueu os olhos assim que a viu.Seu olhar avaliativo percorreu seu rosto, e um meio sorriso surgiu nos lábios dele. - Ah, Ester - disse, recostando-se na cadeira. - A que devo a vizita?A calma dele só alimentou ainda mais sua irritação.Ela fechou a porta com mais força do que o necessário.- Não se faça de desentendido.Bruno arqueou uma sobrancelha, ainda com aquela maldita expressão despreocupada.- Não faço ideia do qu