Meu aniversário estava chegando, e mais uma vez eu o passaria longe de casa. Sentia muitas saudades da minha mãe, da minha avó e da senhora Salinas, com quem já fazia um bom tempo que eu não falava.— Lunna, vai fazer o quê no seu aniversário? — Kim perguntou enquanto almoçávamos no nosso restaurante preferido.— Nem sei por que ainda pergunta. Você sabe que ela vai passar com o Romolo e vai nos deixar mais uma vez — Jully comentou, bebendo seu suco e me encarando como se quisesse me desafiar com o olhar.— Não é bem assim, meninas!— Claro que é! Então, não programe nada, porque iremos ter o nosso dia de amigas — Kéfera disse, endireitando-se na cadeira. — Temos um presente para você, então comece a preparar as malas. Aproveitaremos o recesso da faculdade.— Tenho escolha? — perguntei, olhando para as três, que se entreolharam.— Você tem três opções — Kim disse, mostrando os dedos. — Um: você vem conosco de livre e espontânea vontade.— Dois: amarrada e amordaçada — completou Kéfera
— Estamos quase chegando, então iremos te vendar — diz Jully, se aproximando.— Isso não é justo! Vocês não me deixaram olhar pela janela, não ouvi o piloto dizer nada, e agora também não posso ver?— É surpresa, então aceite! — ela diz, me vendando. — Vou me sentar, porque já vamos pousar. E fique aí quieta, o Adam vai te ajudar a descer do avião.Quando eu ia protestar, sinto o avião pousar. Ouço uma voz baixa bem próxima ao meu ouvido:— Relaxa, não vou fazer nada que você não queira.Meu coração dispara e minha pele se arrepia. Ouç
Abro os olhos e vejo um teto branco. Movo a cabeça lentamente para o lado e observo várias máquinas, percebendo que estou em um quarto de hospital. Mas o que aconteceu? Tento me sentar, mas não consigo. Meu corpo está pesado, como se algo estivesse me segurando na cama, e essa sensação é horrível. Minha garganta está seca, e não consigo engolir. Sinto uma vontade imensa de chorar. O que houve? Onde está minha filha? Meu marido? Uma lágrima escorre pelo meu rosto.Mexo a cabeça lentamente e olho para frente, onde vejo a porta do quarto. Quero gritar, levantar, quero entender o que está acontecendo. Então olho para minha barriga, e o desespero me atinge. Não vejo minha barriga de grávida. Tento me levantar de novo, mas é inútil. Meu corpo é como chumbo. Começo a chorar, desesperada.Não sei por quanto tempo fico ali sozinha, chorando em silêncio, sem ninguém ao meu lado.— Olha quem acordou! — A voz surge de repente, e percebo uma enfermeira bem na minha frente. Eu estava tão distraída
Respiro fundo, fecho os olhos e confirmo com a cabeça.— Quando chegou ao hospital, a senhora estava inconsciente. De acordo com o que nos foi relatado, caiu da escada. Consegue se lembrar de algo?Balanço a cabeça em negação, incapaz de recordar qualquer coisa.— É normal não lembrar agora, mas acredito que, com o tempo, as memórias possam voltar. Voltando ao início: a senhora chegou aqui inconsciente devido a uma queda, que causou um traumatismo craniano. Isso levou a um coma de três semanas. Uma das vértebras rompeu, resultando na perda de sensibilidade e movimentos abaixo do quadril.Enquanto ele falava, sinto uma dor incomum no peito.— Houve também um deslocamento da placenta, o que causou a morte do bebê que a senhora esperava. Ele ficou muito tempo sem oxigênio. Sinto muito pela sua perda.Olho para ele, incrédula, e me viro para encarar minha sogra, que está tão devastada quanto eu. As lágrimas escorrem pelo rosto dela. Volto a atenção para o médico.— A dor de perder um filh
Minha vida não é fácil. Sinceramente, estou pensando em desistir dos meus sonhos. Não quero deixar mamãe e vovó sozinhas. Naquela noite terrível, perdi minha irmãzinha e meu pai. Sei que ele estava apavorado com tudo o que estava acontecendo, e foi muito difícil, mas a vovó está conosco, nos ajudando em tudo. Ela tem sido a nossa base.O homem que era meu agressor foi preso meses depois e condenado à prisão perpétua. Outros abusos foram descobertos, e até que ele matou algumas pessoas. Também contabilizaram como tentativa de homicídio o que ele fez com minha mãe e como assassinato o que fez com Milena, além de nos causar danos psicológicos. Após um tempo, a vovó descobriu que ele foi queimado vivo na cadeia.Depois disso, saímos de Cuba e agora moramos em Granada, na Nicarágua.Olho mais uma vez para o papel em minhas mãos e sinto minhas pernas bambas. Se eu não estivesse sentada agora, estaria de cara no chão.— E aí, Luna? Você não abriu ainda? — pergunta a Sr.ᵃ Salinas enquanto lim
Sorrio e a abraço novamente. Assim que a solto, arrumo a cadeira que havia caído e saio correndo da confeitaria. Atravesso a rua e paro no portão de casa.Meu coração está acelerado, e o desespero me toma. Tenho certeza de que o sorriso que estava em meu rosto desapareceu. Nunca contei a elas que queria fazer faculdade, nem que faria a prova online para ganhar a bolsa. Quando terminei a escola, comecei a trabalhar em tempo integral com a Sr.ᵃ Salinas para ajudar nas despesas da casa e não causar problemas para minha mãe com questões de gastos. Mas agora, ao pensar nisso, sinto que fui egoísta e fiz algo errado ao esconder delas algo tão importante para mim.Me assusto quando sinto braços envolvendo meus ombros. Estava tão perdida em meus pensamentos que nem percebi a Sr.ᵃ Salinas se aproximando.— O que você está esperando para entrar? — Ela olha para mim e, ao perceber minha expressão, o sorriso desaparece de seus lábios. — O que aconteceu?— Não contei nada a elas. Fui egoísta, pens
Alguns dias se passaram e faltava pouco para embarcar rumo ao desconhecido. Olho meu reflexo no espelho mais uma vez e me sinto diferente, não só porque estou completando dezoito anos, mas porque sei que finalmente sairei do meu casulo. Sorrio para minha imagem e saio do banheiro, indo em direção à porta do quarto. Desço as escadas e me assusto quando ouço gritos.— Surpresa! — sorrio ao ver a vovó, a mamãe, a senhora Salinas e seu marido, alguns vizinhos e até os clientes da confeitaria.Vovó e mamãe se aproximam, a abuela segurando um bolo com algumas velas acesas em cima.— Faça um pedido — mamãe diz, com os olhos brilhando.— Eu já tenho tudo que preciso, mãe, eu só… — fecho os olhos e sopro, vendo as chamas se apagarem. — Só tenho a agradecer.Sorrio e caminhamos até a mesa.Mamãe corta o bolo e distribui os pedaços. Ela sabe que não gosto dessa parte, porque não tenho uma “preferida” ou “pessoa especial”. Claro que amo minha mãe, mas todos me ajudaram tanto que seria egoísmo dar
— Te amo, abuela, e te amo, mamá — digo em nossa língua materna, fazendo com que ambas me olhem com espanto. Mas logo sorriem. Me afasto e caminho até o portão de embarque, respirando fundo, deixando para trás as pessoas mais importantes da minha vida e indo em busca de uma vida melhor para elas.Olho para trás uma última vez e ambas acenam em despedida. Ando até onde preciso fazer o check-in e começo os procedimentos para entrar no avião. Passo pela inspeção e segurança, me dirijo ao portão de embarque. Com o cartão de embarque em mãos e a mochila dentro das normas da companhia aérea, concluo a vistoria e já tenho acesso imediato à área de embarque. Verifico mais uma vez o horário e o portão de embarque nos monitores espalhados pelo aeroporto, pois sei que tanto o horário quanto o portão podem mudar a qualquer momento. Isso seria trágico, pois é a primeira vez que viajo sozinha.— Atenção, senhores passageiros! Esta é a última chamada para o voo para Boston. Caminhe até o portão de e