Era por volta das dez horas da manhã quando Cida avistou sua casa. Nessa época do ano, mesmo sendo inverno no Brasil, a região onde ela morava ainda ficava quente em horários mais específicos e o frio aparecia apenas mais no final do dia, por conta do rio que passava próximo ao pequeno povoado. Normalmente não havia vento, nem mesmo a brisa fresca os alcançava naquela hora da manhã. O suor em sua testa escorria e, misturado ao cansaço de tanto andar, ela só pensava em cair na cama e dormir o restante do dia. A vila estava vazia, pois provavelmente a maioria das pessoas curtiu até o amanhecer, com a explosão dos fogos e o cessar do fogo que queimava a madeira. As bandeirolas ainda estavam lá, mas nem se moviam, pois o vento parecia não querer fazer visita ao local, o deixando ainda mais abafado. Ao longe, nuvens indicavam que provavelmente choveria, mas nada certo, já que geralmente as nuvens sempre se esvaziavam antes.Cida entrou em casa indo direto para seu quarto sem nem ao menos c
— Tudo bem. Cida, minha querida, ajeitamo a data pra ocê se casar com Zé daqui um mês. Já vamo começar a ver as coisas pra deixar tudo pronto.Cida não respondeu de imediato. Um gosto amargo tomou conta de sua boca, suas pernas tremeram e parecia que o cansaço havia dobrado, pois seu corpo estava ainda mais pesado. Ela não imaginou que o ‘depois do São João’ seria rápido assim.— Oh de casa! — de repente, alguém gritou na porta. Cida aproveitou o momento para ir atender, mas Zé a segurou. — Oh seu Antônio, teria como o senhor ir ver quem é? Queria ficar um tempo a sós com Cidinha pra gente prosear um pouco e ir se conhecendo melhor até pro dia do casamento num é? Palmas ardidas soavam casa adentro e a pessoa que chamava parecia estar apressada. — Oh Cidinha! Seu antônio? Bora levantar que a festança acabou. Cês tão tendo peixe aí? O senhor, ao ouvir que seria uma venda, correu pra porta, deixando o casal a sós.Cida, depois de esperar o pai sair, puxou o braço que Zé segurava, sa
Quando o São João acaba e a festança acaba, a cidadezinha volta ao seu ritmo normal, ao falatório de sempre, às fofocas e ao trabalho, muito trabalho. Cida estava vestida num vestido velho, sentada na porta de casa com uma grande bacia de peixe entre as pernas e um pano sobre o colo, tirando as escamas da pescaria do dia de seu pai e limpando os peixes para que pudessem conservá-los no sal e na gordura alguns e venderem outros. Enquanto a faca afiada cortava a carne, a mente da menina estava longe. Por ali ninguém passava a não ser que fosse comprar peixe com seu Antônio e isso lhe dava liberdade para ficar mais relaxada, apenas fazendo seu serviço e pensando na vida, exatamente como agora. A ameaça de Zé não saiu de sua cabeça, a forma como ele apertou seu pescoço e o ódio em seu olhar, tudo aquilo apavorou Cida de formas à não deixá-la dormir desde então. Fazia quase uma semana que não via o homem, mas ele ainda assombrava seus sonhos, sua vida. Do jeito que as coisas andavam, o
Beto não tinha paz, não desde o São João. As coisas nas fazendas estavam mais que boas, o gado estava saudável, as plantações estavam dando mais cedo naquele ano e tudo ia bem, mais que bem na verdade. Mas ele não se sentia bem, pelo contrário, só conseguia pensar no cheiro doce de flores e na pele macia da garota com quem havia tido a melhor noite de sua vida. Cida não saía de seus pensamentos, e aquele era o pior momento para se enrabichar com uma mulher. Só conseguia pensar nela, chegava até a ouvir sua voz gemendo ao seu ouvido sempre que fechava os olhos e a essa altura tinha medo que jamais fosse esquecê-la. — Se eu soubesse dessa porra, não ia nem ter encostado nela — respongou ele, ajeitando o chapeu sobre sua cabeça e desabotoando um dos botões de sua camisa, tentando amenizar o calor que se espalhava por sua pele. Havia levantado bem cedo, afinal, mal havia dormido na noite anterior, rolou na cama por horas enquanto pensava nela, sentindo seu pau duro e pulsando, estava
Beto suspirou, tentando por a cabeça no lugar, o assunto casamento sempre o irritou, mas agora o havia tirado do eixo mais que o normal. Ele arrancou o chapéu da cabeça, passando a mão livre nos cabelos e os puxando para trás enquanto olhava para o grande jardim a sua frente. A casa central da fazenda era bem grande e tinha tudo o que o ano de 2016 poderia oferecer, TVs enormes que não eram vistas em outras casas, celulares, linhas telefônicas e internet da melhor qualidade. Mas nada daquilo enchia os olhos do fazendeiro que, naquele momento, queria apenas cuidar de suas terras até esquecer que sua noiva chegaria à fazenda no dia seguinte. Beto colocou o chapéu de volta e saiu do jardim, seguindo em direção ao estábulo enorme que ficava há uns bons metros de caminhada da casa. Ele pegou um dos cavalos em seguida, tocando o animal em direção ao pasto mais próximo. O caminho o levou a um ponto onde podia ver as casas dos funcionários e capatazes, pequenas casinhas bem feitas que abri
Quando o avião finalmente pousou, Lucia sentiu um alívio imenso, afinal, estava cansada de ficar sentada naquela poltrona desconfortável. O voo foi rápido não mais que uma hora e meia de viagem e agora que estava na capital, sabia que haveria um carro esperando-a para levá-la até a fazenda Santana. A loira caminhou arrastando sua mala em direção ao desembarque, andava de forma elegante e usava saltos agulha que deixavam suas pernas em evidência. Lucia tinha belos cabelos loiros longos que caiam por suas costas, seus olhos eram claros bem como sua pele, os traços de seu rosto eram finos e seu nariz arrebitado lhe dando ainda mais um ar de garota convencida. Ela sequer olhava para os lados, apenas seguia em direção ao lugar onde deveria estar, como se as demais pessoas por ali fossem irrelevantes. Não demorou muito para chegar ao portão de desembarque e, assim que se aproximou, viu um rapaz com um chapéu de vaqueiro e calças surradas levemente empoeiradas, ele estava olhando para os
Quando ele se foi, as mulheres entraram para a casa e Lúcia começou a falar animadamente. — A gente passou por uma vilazinha, lugarzinho humilde, né? — ela perguntou, torcendo o nariz levemente. — Vocês interagem com o pessoal de lá?— A maioria dos funcionários veio da vila, mas os ribeirinhos não ficam por aqui, aquele povinho não tem o que fazer na minha casa — Norma falou, puxando Lucia em direção as escadas. — Vamos, vou te mostrar seu quarto. As duas subiram as escadas e logo chegaram a um corredor com algumas portas Norma abriu uma delas e mostrou um quarto elegante e com uma grande cama de casal forrada com um lençol elegante e bonito, tudo cheirava a lavanda e as grandes cortinas estavam abertas. — Olha, minha filha, queria que a gente subisse logo pra conversar com você — Norma sentou na cama, chamando Lucia para fazer o mesmo. — Meu filho tem andado estressado, então eu vou te dar alguns conselhos, entendeu? A loira balançou a cabeça, prestando total atenção na mulher q
Semanas se passaram desde que Cida e Sandrinha conversaram sobre o casamento. Cidinha estava cada dia mais angustiada com a data se aproximando, a essa altura, faltava apenas uma semana pra que o casório acontecesse. Seu pai estava trabalhando dobrado para poder fazer uma bela festa, e ela só conseguia pensar em Beto. O rosto do rapaz não saíra de sua mente nem um dia, até durantes seus sonhos ela pensava nele e o via chegar para salvá-la de todo o mal que acontecia em sua vida, ou revivia o sexo que haviam feito. Geralmente, depois deste último sonho, Cida acordava extremamente excitada e sempre tomava um banho gelado para poder focar no trabalho e, nesse dia, não foi diferente. Ela se levantou e, após o banho, seguiu sua rotina, mas seu coração parecia estar ainda mais agoniado do que antes. Chovia bastante e ela se preocupava muito com seu pai, pois o rio nessa época subia muito de nível, o que ajudava na pesca dos peixes, mas também trazia outros animais para perto da comunidade.