Nos dias de recuperação que sucederam a cirurgia, Raul fazia fisioterapia e exames que constataram o bom êxito da cirurgia. Ele voltou a sentir novamente os movimentos dos membros inferiores e até chegou a dar alguns passos. Na segunda-feira, pela manhã, o médico compareceu no quarto para passar o boletim médico: “Sr. Trajano, se tudo continuar bem, amanhã mesmo o senhor terá alta e precisará ser acompanhado por um profissional fisioterapeuta.” Mais uma vez Dona Quitéria agradeceu ao médico pelos esforços na cura do seu filho. Finalmente Raul deixou o hospital e Dona Quitéria chamou um táxi. Ele não teve outra alternativa a não ser acompanhar a mãe e voltar a morar com ela, a esposa e a sogra. Chegou em casa com o auxílio de duas muletas. Adentrou observando tudo. Tudo muito limpo e aconchegante, do jeito que ele tinha deixado. Dona Salete, juntamente com a irmã e a filha, preparou uma refeição nutritiva. Felícia estava serena, com o olhar sério e o filho no colo. Permane
“Certo.”Felícia amamentou o filho até ele dormir e o colocou no bercinho. Ela se dirigiu até o quarto do marido e calmamente perguntou:“Você me chamou, Raul?”“Sim, entre e se sente.”Os dois estavam tensos e ansiosos. Ela sentou na outra cama, apoiou as mãos sobre as coxas e cruzou os dedos. Ele estava deitado em uma cama de solteiro com vários travesseiros apoiando o seu tronco. Logo quebrou o clima perguntando:“Como você está?”“Estou bem!” “E sua família, como está depois da morte do seu pai?”“Estão bem. Dionísio está cuidando das coisas na fazenda e minha mãe continua aqui comigo, me ajudando a cuidar do nosso filho.”“Que bom.”Ele mal conseguiu olhar para ela conforme falava:“Preciso saber porque resolveu me ajudar e me recebeu aqui com gentileza depois de tudo o que aconteceu entre a gente. Pois essa casa é sua, está no seu nome.”Ela respondeu segura e sem ressentimentos: “Porque no dia em que nos casamos prometi ser fiel, na alegria e na tristeza, na saúde e na doenç
Ele se encostou na pia conforme conversava com ela. “Estava tentando lembrar, onde estávamos no seu aniversário do ano passado?” “Não se preocupe, mesmo sem saber você me proporcionou uma tarde maravilhosa há exatamente um ano atrás.” “Naquele dia que te encontrei chorando debaixo do pé de jabuticaba?”“Sim, foi um dos nossos melhores momentos juntos.”“Que bom! Se você tivesse me lembrado, teria providenciado um bolo para comemorarmos.”“Já passou e, além disso, sei que sua família não tem apreço em comemorar aniversários, por isso não falei nada. Seu aniversário também passou e eu nem lembrei.” Em clima lisonjeiro e carregado de gentileza, Raul a abordou com outro assunto:“Você mudou tanto! Suas atitudes, seu comportamento e compostura. Você está serena, com jeito de mulher madura. A maternidade te transformou, Felícia. Espero que a gente se entenda logo.” “Aconteceram tantas coisas que fui obrigada a me reinventar.” Ele continuava a elogiá-la:“Sua aparência está muito mais
Ela se aproximou enquanto ele lia seu jornal na varanda, sentou em outra poltrona e sem hesitar o parabenizou: “Estou feliz por você pelo emprego!” “Obrigado.”Ele a agradeceu com um leve sorriso e um brilho de esperança nos olhos. Ele sugeriu:“Agora que vou trabalhar, você pode ficar em casa e cuidar do menino.” Ela retrucou respeitosamente: “Eu gosto do meu trabalho, não quero pedir demissão. Meu chefe me autorizou a levar Antônio caso precisasse, pois lá tem berçário.”“Tudo bem, faça o que for melhor para você e nosso filho.”Mesmo não concordando, ele aceitou para agradar a mulher.Depois que Raul começou a trabalhar, Dona Quitéria voltou para Santa Rita para visitar as filhas.Felícia começou a levar o filho para o trabalho, o menino ficava no berçário da própria escola enquanto ela era professora auxiliar de outra turma. Após uma semana trabalhando com o filho, no final do expediente bateu uma tremenda chuva. Felícia permaneceu na escola esperando a chuva passar.Seu chefe
Na capital, Raul continuou sua rotina de trabalho, sentindo saudades da mulher e do filho. Era a semana do Natal. Um dia antes de viajar para Santa Rita, ele teve um sonho revelador. Acordou atordoado e disse ofegante: “Lembrei! Eu lembrei onde está o testamento. Vou recuperar minha herança.” O testamento fora registrado em um cartório na capital. Era madrugada e ele não conseguia pregar os olhos depois do sonho. Às sete da manhã, levantou, fez um café e esperou o cartório abrir para recuperar uma cópia do meu testamento, pois ainda estava muito cedo. Às sete e trinta, ele partiu para o cartório cheio de expectativas. Raul chegou ansioso no balcão do cartório e, sem hesitar, explicou a situação para o atendente. Com pouca burocracia, o funcionário adentrou o interior do cartório, voltou com um documento e entregou a Raul. Ele olhou e respirou fundo, com o semblante carregado de emoção. Saiu do local e se dirigiu de imediato ao escritório do advogado. “Que bom que o s
Nessa ocasião, Felícia sentia um misto de sentimentos: raiva, tristeza, alívio. Se ela não estivesse tão sensibilizada com a ruína da mulher em sua frente, já teria lhe esbofeteado sem piedade. Ludmila continuava a desabafar:“Ele estava bêbado, não lembraria de nada daquela noite que me deixou em casa. Eu já estava grávida de outro homem e premeditei aquela história só para ele assumir meu filho.”Felícia balançava a cabeça em reprovação ao desabafo da mulher.“Que Deus tenha piedade de você, Ludmila.” “Eu fui pervertida e depravada, estou pagando cruelmente por tudo que fiz. Não quero morrer com esse pecado, preciso que me perdoe para eu partir em paz.”Ludmila soltou uma lágrima genuína e clamou:“Por favor, me perdoe por todo mal que lhe causei.” Felícia suspirou fundo e respondeu:“Eu te perdoo, Ludmila, espero que você encontre a paz.” “Muito obrigada! Espero que você seja feliz com a sua família.”Felícia perdoou a mulher e se foi, sentindo um tremendo alívio na alma por s
Depois, revelou com entusiasmo:“Mãe, eu encontrei meu testamento!” Dona Quitéria deu um tremendo suspiro e cruzou os dedos em um gesto de agradecimento. “Que notícia maravilhosa, meu filho! E agora? O que vai acontecer?” “Entreguei o documento para o advogado, agora é só esperar a audiência. Ele me pediu três testemunhas: a senhora e mais duas que participaram do caso.”“Vamos conseguir, meu filho.”Bibiana perguntou:“Você vai passar a noite de Natal com a gente, irmão?”“Prometi a Felícia que iria passar o Natal com a família dela. Agradeço o convite, Bibiana.”Raul almoçou com a família. À tarde, saiu para o centro da cidade. Entrou em uma loja de carros e escolheu um modelo não muito caro. Ficou de retornar para pagar o carro com o dinheiro do médico. Conforme tinha combinado com o médico, ele passou no hospital. O médico estava na recepção, carrancudo e com uma aparência fria, esperando com dois cheques em mãos.Ele se aproximou com compostura e fisionomia intim
“Como você sabe disso? Quem te falou isso?”“A própria Ludmila, eu a encontrei no hospital hoje, aqui em Santa Rita. Ela revelou que te enganou, que nunca dormiu com você. Ela já estava grávida de outro homem quando você passou a noite embriagado na casa dela.”Raul sentia ódio com a revelação da mulher. Ele serrava o punho com um olhar de indignação e raiva.“Ela vai me pagar.” Murmurou entre os dentes serrados.“Sim, ela já está pagando. Com certeza, em pouco tempo estará debaixo da terra.”“Como é que é?” Felícia relatou toda conversa que teve com Ludmila e sua situação atual.“Lamentável! Ela teve o que merecia. Espero que tenha se arrependido de verdade.”Ele olhou firme para ela e continuou a insistir:“Fui um idiota, me perdoe! Agora que você já sabe a verdade, podemos nos entender?”“Raul, você não foi só um idiota, você me magoou demais. Foi muito sofrido o tempo que passei ao seu lado naquela fazenda.”“Eu sinto muito! Já te pedi perdão um milhão de vezes. Por favor, vamos