Liana foi conduzida até o seu quarto e preparada como as mulheres se preparam para o casamento. Com um banho prolongado, foi massageada e coberta por pétalas de flores. Ela revirou os olhos inúmeras vezes. Não entendia o motivo daquela palhaçada, já que o casamento não passava de um arranjo. Tudo era uma farsa.
— Betânia.
— Sim?
— Por que ele está se casando comigo? Eu não consigo entender. Entre tantas mulheres no mundo, arranjar compromisso com a minha meia-irmã não seria uma ideia mais inteligente?
Com um sorriso gentil, Betânia sentou-se ao seu lado na cama.
— Álvaro sempre foi o filho rejeitado, deixado de lado. O bilionário Eduardo Belmont nunca o reconheceu como filho de verdade. Tudo piorou quando a cicatriz se formou em sua face. Álvaro foi tratado como um monstro, e até hoje isso distorce os sentimentos dele.
— Você ainda não me respondeu. Por que se casar? Por acaso ele tem medo de ficar só? Hm. Com certeza é isso. Ninguém se casaria com um monstro... com uma cicatriz horrorosa, uma alma escura e um olhar perturbador.
No mesmo instante, Liana olhou para a porta. Álvaro acabara de sair. Uma leve sensação de desconforto validou todos os pensamentos dela. Ela apenas subiu os ombros e ignorou.
— Melhor deixarmos esse assunto para outra hora. Você deve se arrumar, seu casamento será em poucos minutos.
— Infelizmente.
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O vestido era deslumbrante.
Camadas de tecido esvoaçante formavam uma cascata branca que contrastava com os cabelos loiros de Liana. O corpete ajustado realçava sua silhueta, deixando seus seios em evidência. As joias discretas brilhavam sob a luz do espelho.
Ela estava magnífica. Mas não feliz.
— Está pronta, querida? — Betânia perguntou, ajustando um dos broches do vestido.
— Não tenho escolha, tenho? — Liana respondeu, sua voz carregada de ironia.
Betânia suspirou, mas nada disse.
O casamento aconteceria no jardim da mansão Belmont. Os pais de Álvaro, assim como todos os seus parentes, estavam no altar. Parecia um momento especial, mas não para ela. Quando chegou, todos se viraram para olhá-la. Um sussurro coletivo percorreu os convidados.
Liana não se enganava. Não era emoção. Era surpresa.
E talvez um pouco de pena.
Com passos firmes, começou a caminhar até o altar. Não faria cena. Não demonstraria fraqueza. Se queriam uma noiva perfeita, ela seria.
Mas seus olhos, involuntariamente, encontraram Álvaro. Ele estava ali, esperando por ela. Seu terno negro ajustado realçava sua figura imponente. O coque ligeiramente desalinhado deixava alguns fios rebeldes caírem sobre a testa. A cicatriz marcava sua pele como uma lembrança cruel do passado, mas, ainda assim, ele possuía uma beleza bruta e inegável.
Liana desviou o olhar. Não queria reconhecer aquilo.
Finalmente, chegou ao altar. Álvaro estendeu a mão, mas não a tocou de verdade. Ela pousou os dedos sobre os dele com relutância.
A cerimônia seguiu seu curso. Palavras distantes ecoavam pelo jardim. Liana respondeu mecanicamente, sentindo-se cada vez mais desconectada da realidade.
— Eu os declaro marido e mulher — disse o padre. — Pode beijar a noiva.
O silêncio foi absoluto.
Os olhos de Liana se arregalaram quando percebeu o que aconteceria. Apertou os lábios e inspirou fundo. Não queria se sentir constrangida, então inclinou levemente o tronco para beijar o marido.
Álvaro não correspondeu ao movimento.
O constrangimento foi instantâneo. Um murmúrio correu entre os convidados, olhares perplexos se cruzaram.
Liana sentiu o rosto arder.
Ele a rejeitou.
Não que ela quisesse aquele beijo, mas a recusa, diante de todos, doeu mais do que deveria. Sem outra opção, girou nos calcanhares e saiu do altar, sem se importar com os olhares ou com a etiqueta.
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De volta ao quarto, removeu o véu com raiva.
Cada detalhe daquele casamento era uma farsa, mas o que mais a incomodava era a atitude de Álvaro. Por que ele se recusou a tocá-la?
Antes que pudesse afundar em seus pensamentos, ouviu batidas na porta.
Era tarde da noite quando Ágata entrou sem ser convidada.
— Agora que são oficialmente casados, deveria ir até seu marido.
— O quê? — Liana franziu o cenho.
Ágata sorriu com desprezo.
— Ou prefere esperar que ele venha até você… e talvez não tenha escolha?
O sangue de Liana gelou.
Álvaro não lhe deu sinais de que se aproximaria, mas… ela não o conhecia de verdade. Não queria ter relação alguma com ele, mas, de algum modo, o relacionamento que estavam construindo a perturbava. Álvaro estava escondendo algo, e ela estava doida para descobrir.
Mordendo o lábio, respirou fundo.
— Eu vou.
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O escritório era amplo e iluminado pela lareira acesa. Álvaro estava sentado atrás de uma mesa de madeira maciça, absorto em um copo de uísque que girava entre os dedos.
Quando Liana entrou, ele levantou os olhos.
— O que faz aqui?
Ela fechou a porta atrás de si.
— Somos casados agora. Achei que deveríamos… conversar.
Ele arqueou a sobrancelha, mas não respondeu.
Liana se aproximou devagar. O ambiente estava carregado de tensão.
— Por que não me beijou? — A pergunta escapou antes que pudesse segurá-la.
Álvaro contraiu a mandíbula.
— Isso te incomodou?
Ela cruzou os braços.
— O que você acha? Todos ficaram murmurando. Novamente, eu estava constrangida.
Ele soltou uma risada baixa, sem humor.
— Não gosto de ser tocado.
Liana inclinou a cabeça, intrigada.
— Por causa da sua cicatriz?
Álvaro pousou o copo sobre a mesa com força. Aparentemente, a jovem não tinha travas na língua. Falava o que pensava. Ele gostava disso.
— Você acha que sabe algo sobre mim, mas não sabe nada, Liana.
Ela hesitou, mas então, sem pensar muito, caminhou até ele. Estendeu a mão, tocando de leve a lateral de seu rosto.
A reação foi imediata.
Álvaro segurou seu pulso com força, afastando-a bruscamente. Os olhos dele estavam sombrios, perigosos. Como se estivesse diante de seu pior inimigo.
— Nunca me toque.
O coração de Liana
disparou. Não de medo.
Mas pelo mistério.
Havia algo errado com ele. Algo que ia além da cicatriz.
E ela precisava descobrir.
Álvaro era um menino tímido que cresceu em um orfanato em Washington. Sua mãe o havia deixado para trás, pois, para ela, essa era a única alternativa para fugir com seu grande amor, o milionário César Strong. Estar em um ambiente onde todos o observavam o deixava constrangido. As inúmeras visitas de famílias que poderiam adotá-lo apenas aumentavam sua dor. O êxtase de acreditar que seria escolhido e, posteriormente, ser deixado de lado fez com que o pequeno Álvaro criasse uma armadura que o impedia de sentir amor e empatia. Afinal, ele sequer sabia o que era isso. Somente aos 16 anos foi adotado pela família Belmont. Ester, sua mãe adotiva, precisava de um herdeiro. Não conseguia engravidar, e esse fardo estava acabando com ela. Então, junto de seu marido, decidiu adotar Álvaro. O bilionário Eduardo Belmont aceitou, pois não via outra alternativa. Até que, inesperadamente, Ester engravidou, e finalmente o filho legítimo nasceu. ---Ele a encarava como se quisesse feri-la. Liana
Liana sabia que havia sido descoberta. Com os olhos fechados, implorando a Deus e à Luna para que o castigo não fosse tão grande, ela sentiu seus braços serem puxados para fora da mesa. A força que Álvaro aplicava era maior do que da outra vez. Ele estava com uma feição diferente, constrangido e, ao mesmo tempo, furioso. Talvez ele não quisesse ter descoberto dessa maneira tão estúpida. — Você é um mentiroso. — O que estava fazendo aqui? — Não interessa! Você vem enganando pessoas. Como pode? A minha avó é uma das mulheres que estão sendo lesadas por pilantras como você! Álvaro apertou os lábios. Ele não suportava o fato de uma mulher gritar com ele. Quanto mais ela falava, mais a raiva subia dentro do seu corpo. A vontade era pegar o corpo franzino da jovem, arrebitar o seu bumbum e estapeá-lo. Seria pouco para ela. — Eu tenho nojo de você. Nojo de estar casada com um homem que, além de ser um farsante, usou a doença da minha avó para se casar comigo. É tão feio assim que n
Na pacata cidade de Felington, a cidade dos lobos cinzas, o maior casamento de todos os tempos iria ocorrer. Liana estava feliz por finalmente casar-se com o amor da sua vida Enzo Williams. A jovem sempre foi terrivelmente apaixonada, e tudo se intensificou quando no mês anterior, embaixo de um pinheiro ele a pediu em casamento. O seu coração mal coube no peito e o "sim" saiu suavemente. Correndo, ela quase arrebentou a porta para contar a novidade para Amélia, sua meia irmã com traços idênticos ao dela. Com as sobrancelhas arqueadas observou a felicidade que Liana trazia aos lábios. Ela não gostou. "— Enzo, o maior e o melhor partido dessa cidade, me pediu em casamento. E você será minha madrinha irmã. Estou tão feliz por finalmente ele me aceitar. "Amélia rodeou os braços na cintura da irmã. Com um sorriso falso nos lábios, mostrou sua alegria forçada, enquanto seus olhos avaliaram cada detalhe da felicidade de Liana. "— Isso é… maravilhoso, irmã. Você realmente merece ser feli
— Eu não vou me casar com ele! Após a cerimônia, todos estavam em uma sala reservada no fundo da igreja. Henrique, o pai das irmãs, estava nervoso. Afinal havia prometido Amélia para o filho do homem mais rico da cidade, a família Belmont, reconhecida por seus atos impiedosos. Ele ajeitou a gravata, imaginando o seu pescoço fora da cabeça no exato momento que dissesse que o acordo estava cancelado. — Entenda, a sua irmã me implorou para se casar com Enzo. O que eu iria fazer? Interromper o romance deles em troca de um casamento que ela não queria?Henrique indagou. Ela estava indignada, claramente o seu pai preferia Amélia e não escondia de ninguém. Seus olhos, no exato momento encheram de água, seu peito esquentou com a remota possibilidade de se casar com um homem por obrigação. — Então o senhor encobriu a traição da sua filha preferida, me escondeu todo esse lixo, e agora quer que eu substitua a minha irmã nesse casamento arranjado? Nunca! Eu não irei fazer isso. — Nem para sal
Uma criança fragilizada, como se seus pais a houvessem esquecido na escola. Era assim que Liana estava. Com os joelhos dobrados sobre o estofado, deixou a testa descansar neles, enquanto as lágrimas caíam incessantes. Seus pensamentos eram rápidos e confusos. Preocupava-se com a vida de sua avó, com o sacrifício que ela havia feito e, principalmente, com o fato de estar sentada ao lado de um homem desconhecido. O simples pensamento de que ele pudesse tocá-la lhe causava arrepios, mais ainda do que olhar para sua cicatriz enorme. Ele não era um homem feio; pelo contrário. Talvez a cicatriz causasse espanto à primeira vista, mas Álvaro era um dos homens mais bonitos da cidade. Todas as mulheres o desejavam, até que, em uma batalha, uma marca foi deixada em seu rosto, transformando o homem cobiçado em um monstro enjaulado. — Não quero mais ouvir seus lamentos. Comprei você do seu pai, não para que chorasse como uma criança rebelde, mas para que estivesse ao meu lado na posição de min