Capítulo Dois

Parte 1

Quando Vitor chegou na casa principal, Juliana já tinha saído.

Ele antes já tinha jantado com a família, mas agora, como futuro marido dela, isso parecia um pouco estranho.

O jantar corria bem, estavam falando sobre o trabalho na fazenda, até que Analice o perguntou por Juliana e porque não estava ali com eles, reunida como era de esperar.

_ Ela tinha um compromisso.

_ E qual seria? - Joel questionou.

_ Era algo que ela já tinha marcado antes, com as amigas - limpou a boca com o guardanapo de tecido.

_ E você não foi com ela porque?

_ Porque ela pode muito bem andar sozinha - apertou os dedos.

_ E você confia nela? - Analice falou.

Briana fechou o cenho. Não gostou do modo como ela insinuou algo de errado.

_ Claro que ele confia - disse _ Juliana não faz nada de errado. Porque motivo não iria confiar nela?

_ Não estou dizendo isso - Analice ficou sem graça diante do olhar dela _ Apenas acho que como noivo ele tem que ter mais cuidado com a Ju, só isso.

_ Sei... Ela também sabe - mexeu a cabeça _ Não se preocupe.

Vitor também não gostou e pediu licença para se retirar, mas antes de sair Joel falou alto:

_ Vitor, só porque vai se casar com minha irmã, não quer dizer que as coisas vão mudar - uniu as mãos sobre a mesa.

_ Eu sei disso e nunca pensei diferente.

Ele se aborreceu pelo tom de voz.

_ Juliana está mal acostumada. É melhor você ficar ligado no que ela faz ou pode virar apenas um brinquedo e ser jogado de canto quando ela enjoar.

_ Por que diz isso? - ergueu a sobrancelha.

_ Porque eu a conheço... Melhor do que você - se inclinou para trás _ A Ju foi muito mimada e quando quer algo enche o saco. Depois que consegue ela abandona.

Vitor percebeu o olhar de Jessé. Ele concordava com o irmão. Como sempre, nenhuma novidade.

_ Bem, agradeço o aviso, mas não acho que seja esse o caso agora. Boa noite!

Ele saiu antes que dissesse uma besteira e foi para o celeiro. Se jogou em cima dos fenos e ficou olhando para o telhado alto de madeira, pensando no que Joel dissera.

Se tinha algo que ele não queria, era errar em um novo casamento. Mas se fazia isso, era para ajudá-la.

Os irmãos tinham ideias fechadas sobre Juliana, mas ela não parecia com o que ele insistiam em dizer.

Será que só ele não via? Ou talvez a família é que nunca a valorizou de verdade?

“Ah... Deus, eu não quero errar de novo, não posso errar”.

Ficou pensando, jogado em cima do feno e avaliando sua vida até ali. O que nem sempre fazia.

Nunca tinha pensado nela de modo diferente até a noite em que ficaram juntos, mas agora, era como se fosse normal estar ao seu lado e mesmo sendo contra um casamento, ele estava insistindo em manter sua palavra.

Insistiu tanto que a convenceu a se casar. E não havia bebê. Ela não estava grávida. Ele apenas queria continuar a farsa e tornar isso real. E ela agora também queria.

Seriam parceiros na nova vida.

O complicado seria manter a palavra de não ter sexo no relacionamento.

Como diabos ele faria isso, se só o pensamento daquela boca já o deixava aceso?

Só podia ter ficado louco. Era só revelar a verdade e pronto. Se o mandassem embora ele iria. Poderia sobreviver em outro lugar. Não era um incapaz, sabia fazer muitas coisas.

“Para onde ela tinha ido”?

Levantou. As palavras de Joel ficaram em sua cabeça. Precisava falar com ela ou ficaria com a pulga atrás da orelha.

Iria até onde ela estava, mas dessa vez teria cuidado para não chegar de surpresa. Da última vez ela quase o deixou cego.

Pegou o celular e ligou. Depois da quarta vez ela atendeu.

_ O que quer, Vitor?

_ Falar com você.

_ Já está falando. Diga, estou ocupada.

Ele ouviu vozes ao fundo e barulho de talheres, carro...

_ Onde você está?

_ Na igreja.

_ Igreja? Com esse barulho?

Ela fez um som de aborrecimento.

_ Estou atrás da catedral, no estacionamento - parou e falou com uma amiga _ E estou muito ocupada mesmo. Pode esperar até eu voltar?

_ Não... Quero falar com você agora.

_ Então venha até aqui.

_ É algum bar novo?

_Não, muito ao contrário. Venha. Estamos no fundo da cetedral, no estacionamento. Vai achar fácil.

Ela desligou sem se despedir. Ele não lembrava de tê-la ouvido falar que era religiosa.

*******

Quando ele parou o carro do outro lado da rua, viu que o estacionamento atrás da catedral estava cheio.

Duas filas grandes que iam até a esquina, com pessoas que pareciam necessitar de ajuda. Homens, mulheres e crianças.

Ele desceu e andou devagar até o local, olhando em volta e procurando por Juliana. A viu atrás de uma mesa grande com uma touca nos cabelos e luvas.

Estava servindo comida às pessoas.

Ficou parado um momento a observando. Foi algo bonito de se ver e que nunca soube que ela fazia. Nem mesmo seus irmãos haviam comentado sobre isso.

Duas mesas grandes estavam montadas com vários pratos, talheres, copos e panelas.

Viu quando ela retirou a concha da panela funda e entregou para um rapaz ao lado, pegando outra panela com cuidado. Parecia pesada e a colocou em cima da mesa, voltando a servir ao homem parado em sua frente.

Flor a cutucou e apontou para Vitor parado próximo. Juliana fez sinal com a mão o chamando para perto.

_ Não sabia que fazia esse tipo de serviço - disse ao ouvido dela.

_ Não se preocupe - sorriu _ Está perdoado - brincou _ O que quer falar? Não posso sair daqui agora.

Ele se sentiu reconfortado de certa forma. Nada tinha a ver com as ideias de algo errado que o irmão dela havia insinuado.

Era um ato de bondade, isso sim.

_ Posso ajudar?

_ Deve - ela lhe deu um beijo rápido sem perceber, só por impulso _ Coloque as luvas e a touca e venha aqui ao meu lado.

Ele fez como ela disse e se colocou ao lado dela, fazendo um pacote com biscoitos e sanduíches, juntando com uma embalagem de suco e água.

_ Vai colocando ali do lado. A Miranda repassa para o pessoal certo.

_ Ok.

Foi uma coisa diferente e que ele gostou muito de fazer. Sentiu o coração aquecido por poder estar ali.

De vez em quando eles se olhavam e sorriam. As mãos às vezes se tocavam e acabavam se encostando, em cumplicidade.

Ela o apresentou aos amigos e viu quando as duas amigas piscaram o olho, rindo.

_ Suas amigas estão lhe dando dicas?

_ Não - riu baixinho _ Estão admiradas por você não ser um peão feio, barrigudo e careca... Por enquanto, né?

_ Ah, vá... Eu me cuido bem.

_ Eu sei - sorriu de modo descarado.

Ele não prestou atenção e nem sentiu o tempo passar. Estava fazendo algo que nunca tinha feito antes e estava gostando.

As pessoas nas filas eram tão agradecidas e humildes que ele sentiu que isso seria uma coisa boa de se fazer outras vezes.

Quando tudo terminou ele participou da limpeza e organização, ajudando a guardar tudo no fundo da catedral.

Autora Ninha Cardoso

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