Nice que era uma abreviação carinhosa de Eunice, a adorável mãe de Lucy, (era como se fosse uma Lucy um pouco mais velha, ou Lucy fosse uma Nice mais nova) começou a perceber uma mudança súbita em Lucy. Agora quando ela levava Lucy para comprar roupas e, principalmente, quando Lucy estava nas lojas de lingerie, antes ela apenas escolhia peças que fossem confortáveis, não ligava muito para combinações. Às vezes ela usava um soutien preto com um lingerie vermelha ou um lingerie azul e um soutien branco, mas agora havia escolhas minuciosas, as cores deveriam combinar. Outra coisa que Nice percebeu foi que Lucy estava descartando soutien com bojo, escolhia soutien com rendas principalmente as transparentes, e as lingerie além de transparentes bem sensuais; e Nice a indagou:
– Lucy, o que está acontecendo?
Durante o trajeto Gabriel ficou atento a uma oportunidade de fuga, os barracos acima eram no mesmo estilo que os da parte baixa, e Gabriel foi empurrado até o topo do morro, onde havia um plano, muita cinza e arame de pneus queimados. Ele sabia o que era aquilo, era conhecido na malandragem como micro-ondas, onde os condenados pelo tráfico eram colocados amarrados dentro de pneus e depois ateado fogo; Gabriel foi empurrado para dentro de uma casa de alvenaria incrustada no terreno íngreme, passando por uma cozinha, um corredor com um banheiro, depois um quarto sem janela onde a porta foi substituída por uma grade de ferro extremamente grosso. Um dos marginais cortou a algema e o empurrou para dentro da cela, trancando a porta, em um canto uma pequena parede, atrás um buraco no chão servindo como privada e um cano logo acima para servir de chuveiro, em outro canto um irris
Gabriel estava dormindo, mas acordou de um sobressalto quando dois elementos fortíssimos, um branco outro negro, invadiram sua cela. Eles foram muito rápidos, Gabriel agora estava de pé e sendo pressionado contra a parede, a mão de um deles estava em sua garganta, e os dedos contorcendo seu queixo, e seus braços imobilizado pelo outro elemento, olhos vermelhos estavam bem próximos dos olhos de Gabriel, e um odor de tabaco e cachaça ardendo em suas narinas:– Agora, rapazinho, você vai nos dizer onde está o arsenal do Betão! Vamos, comece a falar, senão nós vamos estragar essa sua carinha! – Vamos! – Vociferou o elemento, afrouxando um pouco a mão na garganta de Gabriel. Gabriel, bem s
Eles saíram, trancando a cela, Gabriel tentou se arrastar até o colchonete mais a dor foi tremenda e ele apagou de verdade. Ele não saberia precisar se por minutos, horas ou dias. Acordou sentindo novamente a dor nas costelas e ele encolhia-se por causa da dor. Alguém o colocou no colchonete, quando ele abriu os olhos depois de ouvir vozes, parecia uma mulher loura vestida de branco, talvez fosse uma visão, ele sentiu um aparelho de medir pressão no braço, outro para ouvir seu coração, sentiu uma mão feminina segurar seu rosto e abrir sua boca, a mulher que estava de cócoras se levantou depois que saiu da cela ele a ouviu dizer:– Se não for hospitalizado logo, vai morrer, perdeu muito sangue por causa do dente, tem costelas quebradas, está desnutrido e também tem febre! Padrinho quando ainda criança viu seu pai implorar para não ser assassinado por causa de uma dívida contraída em jogos de baralho, mas os assassinos não o perdoaram – pelo contrário, tiraram-lhe a vida na maior das brutalidades possíveis. Padrinho guardou uma mágoa dentro do peito em relação a marginais, sua mãe lutava para sobreviver e cuidar dele, mas as condições eram adversas, eles foram morar em um barraco na favela, então ele começou com outros amigos de rua a vender doces nos trens que saiam da central do Brasil, com o pequeno lucro ele ajudava sua mãe. Na adolescência ele vendia os doces nos trens de dia e se esforçava para estudar à noite, foi quando ele se inscreveu para o concurso da PM, e, com muito esforço, ele foi aprovado. Seu sonho era alugar uma casa na cidade e cuidar de sua mãe, mas ela foi contaminada por uma doença rara, e não resistiu. Padrinho passou a ter horror de favelas por causa das lembranças de sua Capitulo 30
Foi duro terminar aquele dia, quando padrinho chegou a seu quartinho, sentou-se desorientado na cama. Ele nunca havia chorado em sua vida, nem mesmo quando viu seu pai de joelhos implorando para que seus algozes não o matassem, quando sua querida mãe partiu, mas agora um nó terrível se instalou em sua garganta, e as lágrimas rolaram por longo tempo no seu rosto. Ele tinha se esforçado ao máximo, além da ginástica obrigatória no batalhão, ele treinara artes marciais e montanhismo, tudo para servir melhor a sociedade, ele pensou, estavam perseguindo ladrões, assassinos, e eles não entraram em área proibida por negligência, fora um acidente que custou a nobre vida de um companheiro, ele não esperava elogios do comandante, mas pelo menos uma satisfação por vê-lo vivo ele passou uma noite inteira mergulhado naquele mangue fedorento para salvar a sua vida e parecia que se ele tivesse morrido no carro seria menos problema para os seus
Padrinho viu que havia potencial em Lucy e ensinou com prazer tudo sobre artes marciais, tiro ao alvo, manejo de armas brancas, além de ensiná-la também sobre montanhismo. Agora, passados cerca de dez anos, ele estava sentado no mesmo salão de ginástica, olhando a jovem que um dia lhe devolveu a razão de viver, arrumando seus apetrechos para ir se suicidar.– Qual é o plano? – Insistiu padrinho. – Eu, eu estou pensando em dar uma fugidinha para escalar umas montanhas, sabe, pra espraiar um pouco a cabeça! – Lucy! Exclamou padrinho, arrastando o nome, em um gesto indicando que ele sabia perfeitamente o que
Lucy deitou-se apesar de ser alta madrugada não conseguiu dormir. Betão estava acarretado de problemas para resolver, seu tempo estava escasso, mas ele desejava ter uma conversa seria com Gabriel, gostaria de saber quais a verdadeiras intenções, porque dependendo de Lucy ele percebeu que ela estava totalmente apaixonada. Quando Nice e Lucy estavam prontas para sair em direção ao hospital, Betão anunciou que as seguiria em seu automóvel, e depois seguiria para os seus compromissos. Chegando ao hospital, como era particular, eles apenas receberam crachás de identificação, entraram no elevador, seguiram, tendo Lucy à frente. Nice, segurando o braço de Betão, orientava Lucy, ora dizendo à direita, ora dizendo à esquerda. Depois de um extenso corredor, Betão alertou a Lucy que seria o quarto trinta e três, quando chegaram à porta do quarto estava semiaberta e ouviram vozes vinda do interior. Assim que olharam para dentro avistaram do
Lucy virou as costas, saiu passando pela porta pisando duro e seguiu pelo corredor em direção à saída do hospital, sendo seguida em passos largos por Nice. Betão permaneceu no mesmo lugar e ouviu Gabriel em uma chupanga como se fosse um animal feroz ferido.– Merda, merda, merda, droga seria melhor não ter se esforçado tanto e ter morrido lá! O silêncio que se instalou foi estarrecedor, Betão resolveu entrar no quarto para ver o que estava acontecendo, e viu Gabriel quase sentado na cama, com o travesseiro nas costas, encostado à cabeceira da cama, o enorme cabelo em total desalinho, as lágrimas escorrendo pelo rosto umedecendo a espessa barba. Betão o cumprimentou: – Oi, e aí, tudo bem?