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Capítulo 06

 Theo Albuquerque

Eu não queria nenhum tratamento com fisioterapia, estava frustrado e não tinha porque continuar tratando a maldita lesão no meu joelho. Todos sabiam que eu não passava de um invalido manco! Um aleijado como a última fisioterapeuta havia falado. Me senti ofendido, claro, por isso acabei cometendo uma loucura ao pegar a pistola que guardava como segurança na gaveta do criado-mudo. Apenas queria calá-la das barbaridades que falava de mim, não era minha intenção realmente lhe dar um tiro.

A única coisa que constantemente deixava-me ligado a vida era minha família, não queria fazê-los sofrer. Muitas vezes pensei em tirar minha vida, acabar com todo meu sofrimento, porém, era injusto com aqueles que me amavam. Passei por muitos psicólogos durante muito tempo, na tentativa de sair da depressão que me encontrava. Mas nada adiantava porque era mais profundo do que qualquer coisa. Evitava abrir meu coração para desconhecidos, principalmente aqueles que estavam avaliando minha saúde mental.

Meus amigos acabaram desistindo de mim após o acidente. Quem quer ser amigo de um doente? Nunca culpei eles por esse ato. Não conversava com Rodrigo desde nosso acidente de moto. Ele era um dos meus melhores amigos e estraguei sua vida. Tudo que consegui fazer foi pedir desculpas no hospital, e nunca mais nos falamos por escolha minha. Envergonhado fiquei cada dia mais recluso.

Na hora em que minha mãe veio com a notícia que tinha conseguido uma nova fisioterapeuta disposta a me tratar, não aceitei muito bem, assim iniciamos uma discussão, a insistência dela me deixou irritado. Dona Vera era teimosa, seguiu com sua decisão firme e forte. Por dentro acabei cedendo aos seus caprichos, mas era orgulhoso demais pra falar sobre isso, ela entendeu que tinha vencido a batalha com meu silêncio.

O que posso dizer do momento em que conheci a tal fisioterapeuta? Bem, não quis acreditar que uma mulher tão jovem fosse realmente uma fisioterapeuta. Quando Anabel trouxe-a pensei ser uma das suas amigas, usando um dos coletes dos nossos seguranças. No entanto, bastou minha irmãzinha fechar a porta que conheci de verdade quem era aquela mulher louca. Em uma apresentação regada a exigências fiquei enfurecido.

Ela era uma mulher de pele alva e cabelos castanhos escuros que caiam como cascata por seus ombros. Assim como minha irmã era de estatura baixa e o seu corpo de poucas curvas me fez confundi-la com uma adolescente. Nunca uma mulher tinha me olhado com tanta raiva como ela antes. Seus olhos negros penetraram os meus, como se conseguisem arrancar tudo de mim, completamente tudo. As coisas acabaram fugindo do controle e precisou minha mãe invadir meu quarto com os seguranças pra tudo voltar ao suposto normal.

Suposto por quê? Porque minha fisioterapeuta me tirou do conforto da cama quando minha mãe saiu do quarto! A contragosto obedeci suas ordens de mulher mandona. Subi um pouco a perna da calça do pijama pra mostrá-la minha lesão no joelho, em seguida ela me fez deitar de bruços no carpete. Não questionei, pensei ser um procedimento normal, porém, não era.

— O que é isso? — perguntei, pedindo arrego. Ela tinha sentado nas minhas costas e começou a puxar minha perna para trás! — Responde, sua doida! Isso machuca!

Soquei o chão sentindo dor. A experiência estava sendo péssima de todas as formas possíveis!

— Bebê chorão! — debochou, apertando um ponto sensível no meu pé. — Cala essa boca! E me deixa cuidar direitinho de você!

Cuidar? Parecia mais que ela queria tirar minha perna fora! Continuei pedindo arrego até que ela parou. Sentei no chão suado pelo sufoco que havia passado por culpa dela. Ela sequer falava comigo formalmente, tratava-me de igual pra igual, não éramos íntimos para tal liberdade.

— Nunca vi ninguém tratar ninguém assim! — resmunguei, gesticulando com as mãos. — Onde você se formou? Em um ringue de luta? Se bem que desse tamanhinho não é uma boa...

Arrastei minha bunda pelo carpete, recuando depois do que tinha falado. Ela era assustadora quando me olhava semicerrando os olhos! Juro que ela parecia possuída por um espírito do mal!

— Minha nossa... — proferiu, aproximando-se de mim. — Você tem medo de mim! — afirmou, dando um sorrisinho de canto de boca.

Quem não ficaria com medo de alguém agindo daquele jeito? Com certeza, ela precisava de mais tratamento do que eu, no caso dela em um hospício!

— Vai se ferrar! Convencida do caralho! É desse jeito que trata seus pacientes? Vou te demitir! Para de sorrir desgraçada! Estou falando sério! — meu sangue ferveu e falei tudo que senti vontade.

Ela poderia simplesmente ter feito como as outras, me dizer grosserias e sair pela porta, entretanto, não foi desse jeito que aconteceu. O sorriso antes que estava em seus lábios murchou.

— Você deveria ser grato por ter alguém que topou cuidar do seu tratamento! Theo, quer reclamar do meu jeito de trabalhar? Tudo bem, reclame! Eu sou o que você tem, não acredito que tenha escolha! Foi você que contratou meus serviços? Não, não foi! Sua mãe ficou dias me procurando desesperada pra que eu ajudasse-a com seu filho. Me recusei todas as vezes porque sabia que não seria bom para mim. Qual é, você baleou uma mulher! Depois disso, quem gostaria de vir até aqui? Ninguém!

Suas palavras tiveram impacto imediato. Não pensei que minha mãe estivesse tão desesperada ao ponto de procurá-la muitas vezes. Baguncei os cabelos um pouco antes de levantar com a maldita dor na perna.

— Não tem porque ninguém insistir tanto na minha recuperação! Minha mãe tem uma esperança boba de me ver fora desse quarto, outra vez. Mas não sou mais aquele Theo que era admirado e requisitado. Você não entende porque não me conheceu antes, estou no fundo do poço. Não sou alguém que vale a pena ficar insistindo. Cedo ou tarde todos vão perceber e me deixar em paz! — desabafei.

Eu não queria ter uma conversa tão séria como aquela com uma estranha, não que fosse diferente dos psicólogos que também eram, contudo, bateu o arrependimento. Caminhei até a cama, sentando em silêncio, como um garotinho constrangido.

— O fundo do poço tem solução. — disse ela, atrevendo-se a sentar do meu lado. — Não tem porque continuar assim, estudei sua lesão, acredito que não esteja caminhando corretamente porque está com o emocional abalado. Sua insegurança e medo está prejudicando seu corpo físico. Apesar de você não estar com boa aparência continua sendo o mesmo de antes. Por que quer deixar a depressão traçar seu destino? Você tem tudo, Theo. Sua família te ama, claro que todos vão insistir em trazer de volta quem um dia você foi. Somente você e sua força de vontade pode fazer um milagre acontecer.

Aquele papo significava apenas uma coisa, que ela sentia pena de mim, assim como todos os outros.

— Preciso descansar. Gostaria que saísse do meu quarto. — pedi olhando pro outro lado. — Amanhã continuamos com a tortura, está bem?

Observei-a pegar sua bolsa de cima da poltrona e sair pela porta sem retrucar. Eu era um inútil digno da pena de todos. Não queria ajuda daquela mulher e nem de ninguém. Ela precisava desistir do trabalho assim como as anteriores, diferentes das outras, ela não demonstrava ter medo de mim. Isso tornava-a perigosa pro restante da sanidade que me restava.

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