— Eu gosto de você, Vitor.
Foi uma frase apenas, poucas sílabas, mas suficientes para interromper a forma como o tempo transcorria. Bem, pelo menos para mim.
Eu pisco para a pessoa ao meu lado, olho para cima, para baixo, tento supor se ouvi errado, abro e fecho a boca simultaneamente, tudo isso em um instante rápido. E ele continua me olhando casualmente, seu rosto tão simplório que custo a acreditar na verdade que sua voz carregava. Não, não foi uma piada, Miguel falou sério.
E eu ainda estou calado, certo? Tenho que dizer alguma coisa agora, qualquer coisa... Ei, cérebro estúpido, não consegue bolar nada para eu falar? Vamos lá, não posso só ficar quieto com cara de idiota na frente de uma declaração amorosa, posso?
Posso?
Meu Deus, o que eu digo?
— Ehrr... Você...
E se eu disser algo errado agora? É mesmo necessário dar
O que há com esse olhar distraído? Suas pálpebras pareciam tão pesadas que mal conseguiam se manter abertas, ocultando quase completamente os olhos castanhos nebulosos. Havia um tom vermelho sobre sua face, forte o suficiente para se destacar na pouca luz da sala. Seu corpo talvez lhe parecesse mais leve? Bem, é de se esperar, após ignorar meus conselhos para não beber demais, algo assim iria acontecer, não? Jovens são previsíveis e patéticos. Como podia um adolescente que perturbou todo o campus da universidade cair perante um pouco de álcool? Bom, com toda a certeza guardarei qualquer bobagem que esse pirralho fizer hoje, poderei usar contra ele depois. Mas posso compreender os sentimentos de Danilo, não era todo dia que se gabaritava uma prova dificílima. Ele conseguiu belos resultados desta vez, depois de estudar como um condenado, por isso, após ele beber tanto, o trouxe para o nosso quarto no campus. Eu não bebi nada, é claro, só d
Cretino filho da puta, você acha isso engraçado, não é? Qual diabos é o seu problema? Fingindo se importar, olhando-me como se eu fosse uma miserável desolada... Para o inferno com seu jogo ridículo de manipulação, não me considere um de seus joguetes estúpidos! Eu vejo através da sua máscara, Fabiano, não há nada além de escárnio no seu olhar e nada além de pena no seu sorriso. Você já viu esse cenário tantas vezes, não é? Observando pessoas se quebrarem diante dos seus pés, cada uma com um passado pior, desesperadas para se agarrarem a algo. É do seu feitio apreciar o desastre, assim obtém sua diversão, certo? Deve ser hilário o que vê em sua frente agora, então. Esse projeto miserável de mulher revoltada com o mundo, uma adulta que quase se matou inúmeras vezes para sanar caprichos sentimentais esdrúxulos: eu — em termos simples —, que já tive um grande nome, agora, agarro-me as suas roupas, com o rosto afogado em seu peito, tentando me fazer entender no me
— Eu sou egoísta, não sou? — Não, não é. — Eu me sinto como um egoísta se sentiria... — Está enganado então. — Todos os dias eu pareço ter problemas mais insignificantes... Dar atenção a eles é ser egoísta, certo? — Acho que não. — Mas veja... Ela continua balbuciando coisas sem sentido, verdadeiramente posso dizer que não estava se escutando, talvez só queira ouvir a própria voz e ter respostas para questões pequenas. Tudo bem, eu vou dar atenção a cada sílaba, como sempre. Gabriela encara o teto, fazendo caretas para seus próprios pensamentos, eu a olho atentamente, pois se tornou um passatempo divertido acompanhar suas linhas de raciocínio confusas. Deitados um ao lado do outro, sobre o chão frio do meu quarto, horas se passam, dobradas por divagações simples e superficiais. É
Quantas horas se passaram desde que comecei a olhar para esses blocos de madeira? Talvez dias, pois, para mim, o tempo é tão significante quanto uma folha que cai de uma árvore qualquer. Acho que vi o céu se colorir de azul, laranja, roxo e preto consecutivamente por intermédio das portas da varanda, então presumo já ter se passado um tempo considerável, porém de nada me adiantou, pois nem uma única fagulha de inspiração surgiu. Antigamente era tão simples para mim criar esculturas com uma vasta gama de materiais, afinal, não é à toa que me consideravam um gênio. Porém, agora, olhar minhas ferramentas enfileirados a minha frente não é o suficiente para me animar. Antes eu adorava a textura da madeira e a variedade notável dos muitos tipos que se pode encontrar por aí, até mesmo o cheiro levemente incômodo da serragem era bem-vindo. Eu me orgulhava de ter sempre as melhores ferramentas e em perfeito estado; claro, era um pouco ciumenta com minhas coisas também,
— Vai sim!— Já disse que não!— Não seja estraga prazeres, essa é sua grande chance de ser notada por algum garoto.— Eu já disse que não tenho interesse nisso!De um lado, estava Mirela, nitidamente emburrada enquanto mastigava alguns palitinhos de queijo, do outro, escancaradamente irritada, Luiza continuava olhando com desprezo as folhas de papel em sua frente, organizadas ao lado de envelopes bonitinhos, adesivos e canetas coloridas.Em plena véspera de Dia dos Namorados, após conseguir fugir várias vezes de Mirela, Luiza acabou ficando sem desculpas e agora estava presa naquela situação. Na verdade, conhecendo a amiga, ela sabia que Mirela realmente só queria companhia, mas exigir que Luiza fizesse uma carta de amor para alguém estava fora de cogitaç&ati
Toda a noite ele estava ali, sentado em frente aquela branquidão, horas perdidas a esmo só observando atentamente um pedaço de linho cru. Nada, nem uma única nesga de criatividade lhe dava as boas-vindas. Por fim, seus olhos começavam a arder, pedindo descanso, mas a mente continuava tentando buscar cenas ou motivos que preenchessem aquela tela como sempre fez com naturalidade. Seu erro era continuar no habitual? Seria bom desenhar apenas alguma banalidade? Florestas? Animais? Pôr do sol? Nada, nada lhe apetecia o paladar, deixando apenas a indigestão de um estômago vazio. E ele vagava, em loop, do quarto à pia do banheiro, do quadro branco ao espelho, do pincel à água gelada; até que seu corpo não soubesse mais outro caminho. Movimentando-se como uma espécie de zumbi, ele só iria parar quando alguém — aquela pessoa — chegasse novamente, igual fazia todas as tardes, também tão robótica quanto o próprio rapaz. Seus
Por um segundo, Sandra pôde sentir um golpe de dor em algum lugar de seu corpo, porém, quando seus olhos se abriram, tudo parecia normal. Bem, talvez "normal" não fosse a melhor palavra, pois ela não se recordava do quarto onde acordou. Estava deitado sobre uma cama grande e espaçosa e o chão era de tatame liso e claro, tudo tinha um ar de comodidade, sem sons altos e banhado pela luz que vazava pelas janelas. Isso era estranho, Sandra se lembrava de estar na faculdade para fazer um trabalho que vinha adiando há um tempo, porém o ambiente não carregava o mesmo frio que os corredores da universidade guardava. Na verdade, algo marcante circulando aquele local era o forte aroma de chá. De repente, um som alto atrapalhou os pensamentos da jovem. Havia alguém mais ali? Se aquilo era uma hospedaria, então provavelmente deveria ser um de seus amigos? Quem sabe ela desmaiou de cansaço após fazer o trabalho e seus colegas a levaram para um motel
De costas, não se vê nada de mais em você; é só uma garota — mais uma estúpida garota — no auge de todo o estrogênio, tão inocente quanto uma noviça. Mesmo de frente, não há muito o que apreciar, é só outro belo rosto, nem seria motivo de disputa em botequinho, muito menos digno de causar uma guerra entre a Grécia e Tróia, pois beleza até uma meretriz tem. Meretriz, que sinônimo eufemístico para descrevê-la. Você é uma puta, com todas as letras: P-U-T-A. Ah, estou errado? Que outra classe de mulher se deixa tocar por qualquer tipo de homem? Esse é seu problema: vestida — seja de frente ou de costas — é só mais uma mulher, mas quando suas roupas caem, essas bocas e dentes impressos na sua pele a entregam e a condenam. Condenação feita às pressas — até por mim mesmo —, sem embasamento, pois nessas cicatrizes não há nada de vergonhoso. Estou me contradizendo, mas já aprendi que sentimentos confusos são normais para você, então por que não mais alguns? &nb