HAFIQDecido deixar um pouco de lado a minha miséria pessoal e vou verificar o motivo de Tônia se demorar tanto no banho, a porta está só encostada, ela sabe que eu não gosto que tranque, em caso de necessidade, eu posso protegê-la ou socorrê-la mais rápido.Sigo o som do seu choro baixinho e me deparo com Antônia, encolhida embaixo do chuveiro aberto, esfregando a bucha pelo corpo.A pele marrom ficando cada vez mais avermelhada de tanto friccionar a bucha na pele.Ela chora copiosamente e eu nunca a vi desolada dessa forma, ela só pode estar em um transe histérico.Esfregando e chorando e esfregando e chorando, a pele já deve estar arranhada, eu preciso tirá-la dessa histeria, entro no chuveiro mesmo de cueca e arranco a bucha das suas mãos.Tônia me encara e eu vejo nos olhos de gato que eu tanto amo, uma dor, uma tristeza extrema.Ela só repete palavras humilhantes, totalmente sem sentido, “cadela vadia”, “
Os músculos dos meus braços tremem, mas eu mantenho-a firme, grudada na parede.Tônia ainda me fita com as unhas fincadas em minhas costas e os dentes pequenos cravados em meu ombro.Após nos recuperarmos de nossa foda avassaladora, ela desliza por meus quadris, mantendo-se em seus próprios pés e continuamos abraçados, nos beijando fundo e com calma, até que nossas bocas se desgrudam pouco a pouco, abro o chuveiro e a lavo rapidamente, tirando- a logo debaixo da ducha.— Venha que eu vou te enxugar, você está se enrugando tal qual uma ameixa debaixo desse chuveiro.Visto-a com um roupão e pego uma toalha para secar os seus cabelos. Enquanto enrolo uma toalha na cintura, Tônia deposita beijinhos macios e molhados em meu peito, em meus braços.A minha felina hoje está preguiçosa e manhosa como uma gatinha dengosa, por vezes tão doce e tão feroz, mas tão minha.Tônia descansa deitada de lado, com a coxa enroscada entre as minhas pernas, brincando com alguns pelos que circundam os meus ma
ANTÔNIAHoje Manusha está com tudo, espinafrando a torto e a direito em todo mundo, os lojistas sofrem como Judas na cruz, com todas as suas exigências e reclamações.Após rodar e rodar pelo comércio, e praticamente voltar de mãos vazias, ela me leva até a sua casa para tomarmos um chá.A casa de Anusha, se é que esse palacete pode ser humildemente chamado de casa, reflete muito a sua personalidade.A arquitetura é austera, com a decoração clássica e tradicional, alguns objetos de arte visivelmente caros, mas não há nenhuma ostentação ou exagero em seus objetos pessoais, tudo muito limpo, organizado e reto como ela, direta como uma flecha.— Eu sei que você tem muitas perguntas, pois eu lhe digo logo, esqueça! De mim você não terá respostas, menina.— Eu só precisava entender certas coisas, não sei como posso ajudar Hafiq, ficando no escuro é um pouco difícil.— Hafiq está certo quando discordou de Karim manter certos
ANTÔNIAMais até do que eu deveria, pois quando eu perdê-la, um pouco de mim também se perderá, assim como quando perdi Aziz.— Ajudo, mas com duas condições.— Diga, veremos se você é boa negociante.— Vai ser tudo do jeito que você quiser Manusha, mas eu quero ir a todas as consultas médicas e me faça um favor, nada de ir ao mercado muito cedo, eu preciso das minhas horas de sono.— Só isso? Você é péssima negociadora, menina.Eu tento não engasgar com o nó em minha garganta e pergunto, falando em voz baixa.— O que você quer fazer de agora em diante, o quê tem em mente? Levanto o rosto e ela continua a secar as minhas bochechas úmidas.— Nada de incrível e específico, só essas maluquices que você gosta, eu preciso de um pouco de sua ousadia, aceito sugestões.Eu forço um sorriso para aliviar o peso do momento.— Então começaremos com um novo cabelo, não há nenhum motivo de uma rainha, uma mulher bonita e vaidosa como v
ANTÔNIAEle abre lentamente os olhos e me sorri preguiçosamente daquele seu jeito despretensioso e irresistível.— Oi habibi, demorou tanto, o quê Anusha queria?Eu tenho que mentir pra ele, Anusha confiou o seu drama pessoal a mim, eu não trairei a sua confiança.— Nada demais, o de sempre, compras e uma manhã de overdose de chás.Ele gargalha e ajeita Kaled no seu colo, apertando-o forte em seu peito, Kaled envolve o pescoço de Hafiq ainda cochilando e balbucia.— Papai.Fingindo não perceber que eu congelei no caminho ao ouvir essa palavra, Hafiq continua seguindo em direção à varanda, alisando os cabelos de Kaled.— Ainda tá com sono, abni?Kaled fecha os olhinhos novamente e enterra o rosto no pescoço de Hafiq. Após colocar Kaled no quarto e assegurar-se que ele continua dormindo.Hafiq me encontra no quarto, sentando-se na cama, observando divertido me ver lutar em vão, tentando desembaraçar e domar os meus cabe
ANTÔNIAEu nunca pensei muito sobre as diferenças de um casal até encontrar Hafiq, o fato é que nós somos muito diferentes, praticamente água e azeite.Ele é controlador, autoritário, racional e organizado, enquanto eu sempre admiro a beleza de ser levada pelo destino, além de ser muito passional e incomodamente desorganizada.Essas diferenças se revelam à medida que a intimidade da convivência se apresenta e só aumentam com o passar do tempo, apesar do amor também aumentar na mesma proporção.Hoje mesmo, eu me viro de um lado para o outro tentando ainda despertar, mas não sou forte, a preguiça me tomou.Não consigo entender como o sacana desse homem já acorda tão animadinho, cheio de fôlego e energia, enquanto eu ainda tento achar um pedaço do meu cérebro que funcione nas primeiras horas da manhã.O dia nem bem raiou e ele já tomou banho e agora lê os e-mails e as anotações em seu Macbook Pro.O pique todo desse sujeito
ANTÔNIANossa! A minha cara está péssima. Eu vasculho e encontro na gaveta do lavabo uma pastilha de alka seltzer que eu tomarei depois.Hafiq me aguarda no quarto, andando de um lado pro outro e eu me jogo de volta na cama, encolhendo-me entre as cobertas macias. Ele está prestes a fazer um buraco no chão do quarto, latindo ordens para Samyr.— Samyr, eu quero uma médica aqui na minha casa imediatamente, Antônia não está se sentindo bem, parece ser algo estomacal, eu quero a melhor especialista, entendeu Samyr? E rápido, só o tempo de esfriar um atay.— Eu disse que não precisava Hafiq, não é nada demais, só uma indisposição boba.— Me dê cinco minutos, vou mandar Ranya fazer um atay pra você, você vai se sentir melhor.Eu tomo o alka seltzer e ele volta para o quarto depois de alguns minutos com uma bandeja de chá na mão.— Prontinho, beba bem devagar que está quente, é um chá digestivo de hortelã e especiarias, v
Ela sentou-se no sofá ao meu lado e em um ímpeto que sempre foi meu, eu esqueci-me de todos que estavam a nossa volta, sentei-me no chão e coloquei a minha cabeça em seu colo.Anusha não esperava o meu gesto ousado, mas não me expulsou ou reclamou como eu presumia.Ela enterrou os dedos magros na minha cabeça, afagando os meus cabelos e por fim, colocou o meu coração em uma bandeja ao me dizer:— Você me fez rir bastante, isso é muito bom quando a gente está morrendo, obrigado menina.— É uma honra.— Anusha?— O quê?— Com essa confusão que você arrumou, nós nunca mais seremos bem vindas aqui.— Você que se engana, todo mundo me adorou, todas essas meninas me amam.— Você é uma vovozinha bem malvada, Manusha. Eu pude ouvir o seu riso.— Eu sei menina, eu sei.E sem que eu quisesse, os meus olhos se encheram de lágrimas.Mas que merda! Por que ela tinha que ser assim, tão megera e tão adorável. A cada dia que passa, eu detesto e amo mais Anusha, como isso é possivel?Vê-la ir embora