O peso daquela simples confissão ainda pairava sobre ele, mas, pela primeira vez, Kaito se sentia pronto para enfrentá-la.Era para ser só um exercício, mas a raiva explosiva de Kaito transformou tudo em um treinamento físico ofensivo.— Como vou ter coragem de falar tudo isso para ela? Como se fosse algo tão fácil… — Ele murmurou, atirando uma pedra na direção de Kael.— É simples, diga o que sente. — Kael respondeu, cortando a pedra ao meio com a mão, como se fosse papel.— Não é tão fácil, capitão.— É sim, você que está complicando tudo. — A voz calma de Kael só fez Kaito ficar mais irritado, e ele avançou sobre o amigo com um golpe.— Está agindo como uma criança. — Kael disse, bloqueando o ataque e segurando o pescoço do amigo. O impacto deles no chão foi sentido até em casa.Kaito ficou caído, enquanto Kael se levantava.— Ser humano é difícil quando você não sabe nomear o que sente e não entende de onde esse sentimento vem. Então simplifica. Diga a ela: "Eu amo você". S
Kael seguiu o conselho de Yoran: uma mente cheia não tem espaço para manipulação. E, para sua sorte ou azar, sua mente estava ocupada apenas com Andrômeda. Ninguém jamais poderia usá-la contra ele. Ao entrar no covil, um silêncio opressor o envolveu. Algo estava errado. O cheiro de sangue impregnava o ar, mesclando-se à umidade das paredes de pedra. Mas além disso o que chamava atenção era o cheiro familiar mas quase imperceptível no ar, era cheiro de lírio. Tochas trêmulas lançavam sombras distorcidas pelo corredor estreito, como se figuras espectrais os observassem. Kael respirou fundo, o odor metálico e denso provocando uma tensão inquietante em seus músculos. Seus passos ecoavam pelo chão irregular, acompanhados pela presença vigilante de seus companheiros. Atrás dele, Yoran segurava firmemente sua lâmina, olhos atentos a qualquer movimento. Boldar caminhava com segurança, confiante de que poderiam lidar com qualquer coisa. Ordan protegia Alinna, que batia as asas em um
Kael apertou os braços ao redor dela e saiu do covil, sua mente fervilhando de perguntas. Ela estava viva. Mas ele a viu morrer. Como aquilo era possível?— Capitão? Está me ouvindo? — A voz de Alinna o trouxe de volta ao presente.— Sim. O que houve?— Temos um problema — ela disse, preocupada.Kael continuou carregando Andrômeda enquanto voltavam ao interior do covil. Ele a segurava como se fosse parte dele, recusando-se a soltá-la.Ao entrarem em um dos quartos, a cena diante deles foi um choque.Ágata estava ajoelhada sobre um corpo, chorando como uma criança enquanto tentava curar a pessoa.— Por favor, acorde. Abra os olhos, Rarim. Por favor... — sua voz era de puro desespero.O som do choro cortava o ar, deixando Kaito inquieto. Ele segurou as mãos de Ágata, tentando acalmá-la.— O lugar influencia. Vamos levá-la para casa. Sua irmã vai ficar bem.As palavras de Kaito deixaram Kael surpreso. Mas ele ainda era o capitão.— Boldar, leve-as de volta para casa. Kaito, vá
Kael esperou a chegada da guarda real e escoltou pessoalmente alguns dos escravos mais feridos até eles — talvez estivesse fugindo de si mesmo.— Capitão, devemos voltar agora. Não é seguro deixar Ágata e Boldar sozinhos, e Yoran precisa de cuidados — disse Ordan, observando a carruagem de escravos se afastar.— Sim, vamos — respondeu Kael, sem olhar para ele.Ele entrou sem pressa no quarto, que, por ora, era o único lugar disponível para tratar Andrômeda. Rarim estava mais ferida e precisou de atendimento urgente no laboratório, Yoran repousava em seu próprio cômodo, e Boldar e Leon apenas queriam dormir um pouco. Nada mais. Se o rei ordenasse, Kael se mataria sem hesitar. Afinal, sua vida não tinha mais sentido. Acomodou-se, então, no que antes era seu quarto, mas que agora se resumia à varanda.Ele olhou para Andrômeda com um turbilhão de emoções. Felicidade por tê-la ali, medo de que, ao acordar, ela não fosse mais a mesma, e desespero por vê-la assim, intocável. Seus olhos s
— Por favor, Kaito, traga ela de volta, como fez comigo! Por favor! — Ágata gritava, os joelhos cravados no chão, as mãos tremendo enquanto seguravam a bainha da roupa de Kaito.Ele se ajoelhou diante dela, os olhos sombrios refletindo a dor que compartilhavam.— Agui, não funciona assim. A Rarim... ela não está ferida da mesma forma. A dor dela é diferente. Eu daria minha vida para trazê-la de volta, mas agora, ela tem que querer voltar. Algo prendia você aqui, você queria se curar... Mas ela desistiu.Ágata balbuciou palavras ininteligíveis entre soluços.— Não... não... Rarim, eu voltei! Rarim, acorda, por favor!Uma voz inesperada interrompeu seu desespero.— Eu posso ajudar. — Andrômeda surgiu, caminhando com dificuldade, apoiada em Kael. Seu rosto estava pálido, e o corte profundo em sua barriga mal havia parado de sangrar.Ágata levantou a cabeça, a esperança tingindo seus olhos molhados.— Você pode trazê-la de volta?Andrômeda apoiou-se mais firmemente em Kael e sorr
Assim que seus pés tocaram o chão, Andrômeda sentiu o peso do próprio corpo e vacilou. Rarim estendeu a mão para ajudá-la a se erguer.Kael, por outro lado, não teve tanta sorte. Yoran o carregou até a cama, onde ele se contorcia em agonia. O suor escorria por sua pele, seu corpo tremia, e a dor parecia devorá-lo pouco a pouco.— Ninguém toca nele. — A voz de Ágata cortou o silêncio, firme e decidida.Os outros hesitaram, observando Kael sofrer.— Ele precisa sentir isso. — explicou Ágata. — Há anos, tomei metade da alma dele... depois que ele perdeu alguém muito importante.O silêncio pesou no ambiente. Rarim desviou o olhar para Andrômeda e, num gesto discreto, apontou para a porta, sugerindo que era hora de sair dali. Mas, antes que pudesse tocá-la, sentiu uma mão segurando a sua.— Como alguém tão calma se tornou tão imprudente? — Leon murmurou.Rarim soltou a mão dele e o encarou.— Se quer continuar sendo prisioneiro, fique. Eu vou morrer tentando ser livre.Leon suspir
A noite caiu. Andrômeda se moveu furtivamente pelo corredor, seus passos leves como o vento.Kael estava deitado, suando frio, o corpo tremendo. Andrômeda se aproximou e segurou sua mão.— Saray disse que eu devia confiar em você. Disse que cuidaria de mim.Ela fez uma pausa, seus olhos observando o rosto vulnerável de Kael.— Eu não preciso que faça isso. Mas... gostaria muito de me sentir segura em algum lugar. Então, se puder se esforçar para voltar... eu ficaria muito grata.Sem perceber, adormeceu ao lado dele.Kael abriu os olhos e a encontrou ali, serena. Por um momento, não se moveu. Era a visão mais linda do mundo.Lembrou-se da primeira vez que a viu... O vento bagunçando seus cabelos, sua risada tornando qualquer melodia sem graça. Nunca vira nada brilhar mais do que os olhos dela. Qualquer estrela sentiria inveja daquele brilho.Ela era a mulher mais linda do mundo.E ele rejeitaria tudo — o trono do inferno, todo o poder que carregava — só para tê-la outra vez nos braços.
Ágata caminhava de loja em loja, um sorriso travesso nos lábios, arrastando Andrômeda e Rarim como duas bonecas de pano para experimentar roupas.— Não precisa ser necessariamente um vestido, não é, capitão? — Kael perguntou, olhando para Andrômeda com um brilho nos olhos.— Não, algo confortável já serve. Olha esse tecido, bem macio — respondeu, deslizando a mão sobre a roupa de Andrômeda... e seus seios.Antes que pudesse se dar conta, um espartilho atingiu seu rosto com força.— TIRA A MÃO, SEU SAFADO! — Rarim e Ágata gritaram juntas.Kael apenas riu, enquanto Andrômeda ajeitava a roupa, o rosto ruborizado.— Kaito, gostou desse? — Ágata perguntou, girando diante do espelho.Ele nem levantou os olhos do livro que lia com fervor, um presente de Yoran: "A Arte de Atrair Mulheres".— Difícil dizer, Ágata... Você ficaria linda até sem nada. Mas devo admitir que esse vestido exalta sua beleza de uma forma quase indecente. Até um cego veria o quanto você é deslumbrante — disse, f