Depois do pôr do sol, Lucas decidiu que queria fazer algo especial. Não era apenas um jantar qualquer. Não era apenas uma noite comum.
Ele queria que Jordani soubesse.Que sentisse.Que entendesse que não era mais um contrato, não era mais um jogo.Era real.Ele preparou tudo enquanto ela tomava banho. Acendeu velas na varanda, deixando a mesa iluminada apenas pela chama bruxuleante e pela lua cheia no céu. O barulho das ondas ao fundo criava a melodia perfeita, e o vinho já estava servido em suas taças.Quando Jordani apareceu, usando um vestido leve que moldava seu corpo perfeitamente, Lucas sentiu o ar escapar de seus pulmões.Ela parou por um momento, observando o cenário, surpresa.— O que é isso? — perguntou, um pequeno sorriso nos lábios.Lucas aproximou-se, estendendo a mão para ela.— Um jantar para nós.Jordani aceitou sua mão e sentou-se à mesa. O clima estava diferente. AinO som dos saltos de Jordani ecoava pelo corredor da empresa, em sintonia com o bater das portas e o burburinho da manhã. Ela estava elegante como sempre — cabelo preso em um coque firme, maquiagem impecável, e uma expressão que misturava segurança e mistério.Lucas vinha logo atrás, de terno escuro e olhos atentos, mas havia um detalhe que ninguém deixava de notar: o sorriso dele, ainda que discreto, tinha algo diferente. Algo… apaixonado.Ao passarem pela recepção, os olhares se voltaram sutilmente para eles. Comentários silenciosos, sorrisos trocados. Algo estava no ar.Assim que entraram na sala de reuniões para uma conferência com os diretores, Jordani já sentiu a tensão velada. Bitra Miller estava entre os presentes, com uma postura impecável, mas os olhos afiados cravados nela.Lucas percebeu, e por um breve instante, seus olhos e os de Bitra se encontraram. A frieza dele foi nítida. Bitra engoliu seco.A reunião prosseguiu, e Jordani se manteve profissional, como se a noite ant
As luzes da cidade dançavam refletidas no vidro do escritório enquanto Jordani mantinha os olhos presos à tela do computador. Os dados do garoto Ian estavam ali — cada vez mais evidentes, cada vez mais parecidos com os fragmentos de lembrança que ela mal conseguia nomear.Mas naquela noite, algo estava diferente.Ela levou a mão à testa. Um leve enjoo subiu de repente, junto a uma vertigem passageira. Suspirou fundo, tentando afastar o mal-estar.— É só o estresse, pensou. Tenho dormido pouco, comido mal. É natural…Mas aquela sensação persistia há dias. O cheiro do café, que ela tanto amava, agora a incomodava. E pela terceira manhã consecutiva, acordara com náuseas. Não queria pensar demais sobre isso. Não agora.Ainda assim, algo sussurrava dentro dela. Um instinto primitivo. Algo que seu corpo já sabia… antes mesmo que ela aceitasse.Enquanto isso…Lucas observava o relatório de Jin Ho em silêncio. O nome da clínica
— Vamos fugir daqui? — Lucas perguntou de repente, pegando Jordani de surpresa enquanto ela digitava, concentrada, no laptop.Ela arqueou uma sobrancelha.— Tipo… sumir?— Tipo dar uma escapada da rotina. Só hoje. Você tá pálida, eu tô mal dormido… a gente precisa respirar.Ela hesitou por um instante. Estava com mil coisas na cabeça: o bebê, Ian, Yamazaki, Kyra. Mas quando ele estendeu a mão e sorriu daquele jeito que só ele conseguia sorrir — aquele meio riso torto que parecia prometer o mundo —, ela simplesmente disse:— Tá. Vamos fugir.Mais tarde, na estrada litorânea…Eles pararam em uma cidadezinha charmosa, cheia de casinhas coloniais, feiras de rua e cheiro de comida boa no ar. Lucas levou Jordani para almoçar num restaurante com mesas na varanda, vista para o mar.Eles comeram camarão, riram de um garçom estabanado, experimentaram entradas diferentes e, quando o garçom ofereceu o vinho da casa, Lu
2 semanas depois …O apartamento alugado por Lucas estava silencioso, exceto pelo zumbido distante do ar-condicionado. Do lado de fora, o céu de São Paulo estava encoberto. Chovia fino, como se o tempo também soubesse do peso daquela reunião.Bruno chegou primeiro. Alto, de fala arrastada e olhar atento. Jogou a jaqueta molhada sobre a cadeira e abriu a pasta com documentos.— Tem coisa estranha rolando por aqui, Lucas. A casa escondida que vocês encontraram? Está em nome de uma empresa laranja, que já foi vinculada a transações com a Yamazaki BioSystems. Nada direto, claro. Mas as coincidências… estão ficando grandes demais.Lucas assentiu. Os olhos estavam mais fundos nos últimos dias. A paternidade, o bilhete ameaçador, o medo constante — tudo o consumia.Minutos depois, Jin Ho entrou. Vinha do Japão, direto do aeroporto, e mesmo exausto, parecia alerta. Trazia no bolso interno do blazer um pendrive. E no olhar, uma verdade desconfortá
Campos do Jordão os recebeu com uma neblina densa e constante, como se a própria cidade não quisesse revelar o que guardava. A estrada serpenteava por entre pinheiros altos, o silêncio cortado apenas pelo som do motor do carro e o bater ritmado da chuva fina no para-brisa.Lucas mantinha as mãos firmes no volante. Jordani, ao lado, consultava as anotações de Bruno. O nome era antigo, quase esquecido: Dr. Masato Ishikawa. Bioengenheiro-chefe. Desaparecido há mais de dez anos.— Segundo o Bruno, o endereço não aparece mais no GPS comum. Só foi achado por rastreamento de uma conta de luz antiga em nome falso. — disse ela, sem tirar os olhos do papel. — A casa foi construída como “retiro de pesquisa”. Tem gerador próprio, sistema de segurança e zero sinal de internet.— Ótimo — murmurou Lucas. — Só falta ter uma placa na entrada escrito “ENTREM E MORRAM”.Jordani riu baixo, mas o nervosismo estava ali, no canto da boca, nos olhos que varriam a pa
A clínica era pequena, discreta, no alto de uma rua tranquila. Nada que chamasse atenção. Era exatamente o que precisavam.Lucas estacionou o carro sem dizer nada. Ainda sentia o peso da noite anterior nos ombros — o tiroteio, as revelações, a foto. Mas quando olhou para Jordani, com a mão sobre o ventre ainda discreto, ele soube: precisava estar ali, inteiro.Entraram de mãos dadas.A recepcionista sorriu, sem saber quem eles eram ou tudo o que carregavam.— Doutora Camila vai atendê-los já, fiquem à vontade.A sala de espera era silenciosa. Um casal olhava uma revista velha. Uma mulher mexia no celular. Tudo parecia comum… mas o coração de Jordani batia acelerado. E não era só por causa dos traumas.Era real agora. Tão real que doía.— Você ainda tá com medo? — Lucas perguntou, a voz baixa, os olhos nela.Ela hesitou, depois assentiu com a cabeça.— Muito. E se esse bebê… for como eu? E se ele fo
A noite mal havia começado quando Jin Ho decidiu se infiltrar na rede da Yamazaki BioSystems. O computador portátil dele emitia uma luz azulada no canto escuro da sala, o único som era o teclar rápido dos dedos e os estalos leves da madeira antiga da casa segura.Lucas observava, braços cruzados, inquieto. Bruno estava do lado, lendo de novo a ficha do irmão da Jordani, como se pudesse encontrar uma nova pista nas entrelinhas já gastas.— Isso aqui não bate — Bruno murmurou. — A ficha do Ismael termina em 2013. Mas encontrei uma nota interna de 2016 mencionando um “Paciente X” com o mesmo padrão genético.Lucas se virou na hora.— Você acha que ele pode estar vivo?Bruno deu de ombros, mas o olhar era sério.— Ou… mantido. Em algum lugar.Antes que pudessem falar mais, Jin Ho bufou.— Conseguiram apagar quase tudo, mas deixaram rastros. E… — ele parou, ampliando uma das janelas na tela — olha isso.A imagem era granulada, provavelmente de uma câmera de segurança antiga. Mas mostrava u
Casa segura – 12h19Jordani se afastou da janela lentamente. O coração batia como o som de um tambor apressado dentro do peito.Do lado de fora, passos. Rasteiros. Precisos.Ela pegou o celular novamente, mas continuava sem sinal. Correu para a cozinha, abriu a gaveta — uma única faca de cozinha. Era pouco. Mas era o que tinha.O barulho do portão sendo forçado ecoou pela casa.Ela respirou fundo, encostada na parede.Do outro lado da porta, um sussurro:— “Paciente A. Confirme o estado gestacional. Iniciar protocolo de extração.”Ela congelou.Eles estavam ali por ela.Por ele.Pelo bebê.Subsolo do laboratório – 12h21— Jin… você disse que esse projeto foi cancelado, certo? — Lucas perguntou, andando até o fundo do corredor de concreto velho.— Oficialmente, sim. Mas a verdade é que ele só foi… rebatizado. Quando o nome de um projeto muda, os rastros quase