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Uma carona inesperada

Ethan

— Me levar? E como você pretende me levar?

— Com o meu carro — Ela respondeu — Está no estacionamento.

— E você sabe o caminho? — Eu ergui uma sobrancelha — Como?

— Eu moro aqui. É esperado que eu saiba o caminho.

— Você não mora na Pennsylvania? — Franzi a testa.

— Da onde você tirou essa ideia? — sua expressão se tornou confusa enquanto pegava a sacola que o jovem atendente lhe oferecia.

— Vinte e cinco dólares — O rapaz nos encarou.

— Onde está sua carteira, Ethan? — Ela sorriu, me atordoando por um momento por sua beleza, e de certa forma, pela raiva que seu atrevimento despertou em mim.

— Eu só preciso saber como eu posso alugar um carro — Eu murmurei, decidido a não aceitar aquele absurdo — se você não sabe, eu posso me informar.

— Você está falando sério? — Ela me encarou — Prefere gastar quatro vezes mais em um carro do que me pagar alguns doces? Eu posso dividir com você, sabia?

— Você é louca — Eu murmurei.

— E você é um contador chato — Ela desafiou.

— Publicitário — Estreitei os olhos.

— Que seja, é chato da mesma maneira — Ela deu de ombros, se virando para o atendente — Você vai ter que esperar eu procurar a minha carteira na bolsa.

Ela apoiou a bolsa em cima de suas duas malas, a revirando em busca da carteira, enquanto o atendente a media de maneira descarada.

— O que você está esperando para ir atrás do seu carro de aluguel? — Ela ergueu os olhos em minha direção — Vamos, como eu tenho um bom coração, eu prometo dar uma volta na ilha amanhã quando acordar. Eu posso te achar perdido em algum buraco.

— Eu posso me virar muito bem, mesmo perdido em um buraco — revidei.

— Sabe, você não precisa se preocupar com isso — O rapaz decidiu, atraindo nossa atenção — Os doces são por minha conta... se você quiser mais alguma coisa.

— Quanta gentileza — Dess sorriu, se endireitando — Como é o seu nome?

— Kaleo — O sorriso do rapaz aumentou — E o seu?

Ela vai passar a me ignorar por alguns doces agora!?

Eu peguei minha carteira no bolso da calça, tirando trinta dólares de dentro, colocando em cima do balcão.

— Aqui está, você pode ficar com o troco Kaleo — Eu murmurei recebendo um olhar curioso da garota — Vamos logo, Dess...

— Achei que você preferia se perder — Ela provocou.

— Você vai me levar ou não? — perguntei impaciente.

— Vamos Ethan — seu sorriso foi vitorioso — Você pode trazer minhas malas.

— Virei seu carregador agora? — Eu murmurei, arrumando uma maneira de carregar todas as bagagens e segui-la.

— Não reclame, estamos quase chegando — Ela pediu, se dirigindo ao carro.

Nós caminhamos pelo estacionamento do aeroporto até um jeep wrangler cinza. Dess destrancou o carro para que eu guardasse as malas.

— Esse é o seu carro? — Eu a encarei um pouco surpreso.

— Presente do meu pai — Ela deu de ombros — Ele achou que combinaria com o Hawaii e... O que foi?

— Apenas estou surpreso — Eu dei de ombros, me concentrando em guardar as malas — Você não parece o tipo que dirigia um Jeep.

— Bem, eu preferia uma Lamborghini, mas seria impensado ter uma nessa ilha — Ela deu de ombros, indo até a porta do motorista — Vamos?

— Claro...

Nós nos acomodamos dentro do carro prestes a começar nosso trajeto, todo o cansaço daquela viagem me acometeu, já fazia quase 24h desde que embarquei em Boston e ainda não tinha conseguido dormir. Eu precisava mesmo de um descanso.

— O hotel fica muito longe? — Eu questionei depois de alguns minutos em silêncio.

— Nós temos cerca de uma hora de viagem — Ela sorriu — O hotel fica quase do outro lado da ilha, para sua sorte, é perto de onde eu moro.

— Mesmo? — Eu pisquei atordoado.

— Serei sua acompanhante pela próxima hora, Ethan — Ela me encarou — E eu acho que vou precisar dos meus doces.

Eu abri a embalagem que ela me entregou assim que entramos no carro, ela pegou uma espécie de muffin, se ocupando em comer enquanto dirigia.

— Você não deveria fazer isso — Eu adverti.

— Está com medo, Roberts? Você deveria experimentar um desses, eu adoro — Ela me provocou mordendo mais um pedaço do doce.

— Estou falando que não é sensato dividir sua atenção entre a comida e a estrada — Eu revirei os olhos.

— Claro, é um perigo com todos esses carros — Ela apontou a estrada totalmente deserta — Sei que você está acostumado com grandes cidades, mas nessa ilha as coisas são um pouco diferentes.

— Sim, aqui é o fim do mundo — Eu murmurei.

— Estou oficialmente ofendida — Ela afirmou apesar de sustentar seu sorriso — É uma pena que estejamos fazendo esse trajeto às três da manhã, dessa forma você não consegue apreciar a beleza do lugar. Se conseguisse, tenho certeza que gostaria de viver nesse fim de mundo.

— Eu estou bem em Boston, obrigado.

— Boston... Já estive lá uma vez com minha mãe — Ela prosseguiu — Não vi nada de especial naquela cidade.

— É especial o bastante para mim — Ela não pode apenas dirigir?

— Você deveria experimentar o cupcake de abacaxi — Ela indicou — E o que torna Boston tão especial? Seus pais moram lá?

— Não...

— Vive sozinho em Boston então? Apenas você e o emprego entediante? — Ela me observou com o canto do olho.

— Eu posso ter uma esposa, filhos — Eu respondi, não gostando muito do fato de ela ter acertado.

— Você não usa aliança — Ela negou

— Eu posso ter tirado — Insisti

— Não existe nenhum sinal de que você algum dia tenha usado alguma aliança, Ethan.

— Você é algum tipo de especialista em alianças?

— Não, mas sou especialista em cafajestes que tentam me passar a perna — Ela respondeu com diversão — Você não se enquadra no perfil.

— Por que não? — perguntei intrigado.

— Eu passei mais de uma hora tentando puxar assunto com você dentro do avião e você sequer me olhava — Ela começou a enumerar — Eu consegui descobrir seu nome após quase sete horas, em nenhum momento você tentou conseguir meu telefone ou algo do tipo.

— Então você queria a minha atenção dentro do avião? — decidi provocá-la, apesar de estranhar um pouco a sua maneira objetiva e despreocupada.

— Não se sinta tão convencido, eu apenas odeio o silêncio.

— Eu estou sendo convencido? Você decidiu que eu não sou um cafajeste apenas por não demonstrar interesse nenhum em você.

— Falar que não demonstrou interesse nenhum, é exagero — Ela gargalhou — além disso, apenas falei que você não se enquadra no perfil de cafajeste. E o fato de você estar tentando provar que eu estou enganada, apenas comprova o meu ponto.

— Você não tem um ponto — eu a interrompi — Você não sabe do que está falando.

— Então me fale da sua esposa, Ethan. Como ela é?

Aquela pergunta me pegou desprevenido, me deixando sem palavras por alguns instantes.

— Ela..

— Não existe — Dess cantarolou.

— Você é sempre tão inconveniente? — Eu questionei.

— Você é sempre tão sério? — Ela me deu mais um de seus olhares travessos — Admita que ela não existe e eu te deixo em paz.

— Que seja, eu não tenho uma esposa — Eu revirei os olhos.

— Nem filhos — Ela insistiu.

— Isso é impossível que você saiba — Eu apontei.

— Sim, é impossível... Mas se você tiver algum filho ele estará crescendo sem a presença de um pai e isso é triste — Pela primeira vez o sorriso sumiu de seu rosto, sendo substituído por certa melancolia.

— Eu não seria ausente na vida do meu filho — Eu exclamei com indignação, notando o sorriso voltar ao rosto dela.

— "Seria"? Isso significa que seu suposto filho também não existe? — Ela me provocou.

— Não importa, eu seria presente — Eu insisti, um pouco incomodado por aquela ideia.

— Claro, você seria presente enquanto não atrapalhasse seu trabalho — Ela tentou forçar um sorriso — Mas sua carreira sempre estaria em primeiro lugar, você usaria a desculpa que precisa trabalhar para dar o melhor para ele enquanto perdia todos os momentos importantes.

— Não seria assim — Eu pisquei atordoado.

— Se você tivesse uma importante viagem a trabalho e o aniversário do seu filho fosse na mesma semana, você deixaria de viajar? Correndo o risco de perder uma promoção? — Ela supôs

— Eu acho que não faz sentido imaginar algo que não está nem próximo de acontecer — Eu murmurei, sem saber como responder aquela pergunta.

— Acho que você já tem a sua resposta — Ela deu de ombros.

Nós seguimos em silêncio depois daquela estranha conversa, eu torcia para que estivéssemos próximos ao hotel para que pudesse enfim descansar e esquecer que um dia conheci aquela mulher.

— Olha, minha casa fica no fim dessa estrada — Ela apontou uma estrada de terra pouco iluminada.

Será que não é perigoso que ela vivesse ali?

— O hotel fica muito distante daqui? — Eu fiquei preocupado com o tanto que ela teria que voltar depois.

— Não muito — Ela me tranquilizou, voltando a ficar em silêncio.

Menos de vinte minutos depois, nós chegamos ao resort. O lugar era muito bonito e os hóspedes ali pareciam ter muito dinheiro. Escolhemos bem o local.

— Está entregue, Ethan — Destiny sorriu enquanto eu descia.

Eu tirei minha mala do carro e voltei até a porta do motorista, me inclinando sobre a janela aberta.

— Muito obrigado pela carona, Destiny — Agradeci.

Não tinha certeza se teria conseguido cruzar a ilha sozinho.

— Carona? — Ela gargalhou — Pode ter certeza que eu vou cobrar isso em outra oportunidade, querido.

— Pensei que os doces tivessem sido o pagamento — Não pude evitar de sorrir.

— Os doces serviram para me encorajar a suportar a sua chatice — Ela se aproximou ainda sorrindo. — Eu te vejo por aí...

— Nós não vamos nos ver, Dess — Eu avisei.

— Nós estamos em uma ilha, vai acontecer — ela me desafiou.

— Eu não pretendo sair do hotel enquanto estiver aqui.

Ela se limitou a sorrir e se afastar apenas para pegar um de seus cupcakes e estender em minha direção.

— Você precisa provar isso — Ela mordeu o lábio em meio a um sorriso — Até depois, Ethan.

Eu aceitei o doce me afastando de seu carro, observando ela manobrá-lo com rapidez, se afastando.

E então, eu estava livre dela, amanhã com certeza terei um dia comum.

Com esse pensamento, mordi o cupcake e segui até a entrada do hotel.

Em uma coisa ela tem razão, isso é delicioso.

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