CAPÍTULO 1

“O amor não se vê com os olhos, mas com o coração...”

William Shakespeare

O PEQUENO DONOVAN ouviu baterem na porta de sua casa, saiu correndo e gritou entusiasticamente:

          –– Deixa que eu abro... deixa que eu abro...

          É o meu pai... tenho certeza que é o meu pai...

          O mordomo apareceu do nada, como se fosse a sua própria sombra, o segurou gentilmente e o afastou ao seu lado dizendo:

          Desculpa, senhorzinho Donovan, mas as ordens do seu pai foram claras quanto a isso, precisamos conferir primeiro quem é antes de abrir a porta, pode ser algum estranho querendo nos fazer algum mal.

          Donovan bufou de frustração, mas acompanhou feliz o mordomo até a porta com seu sorriso cativante de criança como se absolutamente nada tivesse acontecido, ele se deixou levar pelo fato de que iria ver seu pai novamente. Parecia que tinha sido ontem que ele o tinha tomado nos braços e dizia que em breve retornaria repleto de medalhas no peito para dar a ele.

          O mordomo abriu e sentiu um frio gutural romper pela sua espinha dorsal, aquele era o último emissário que alguém gostaria de receber em sua casa, ainda mais em um momento sinistro na história da humanidade como aquele, eles estavam em plena Segunda Grande Guerra e o pai de Donovan havia sido convocado para lutar na linha de frente.

          Alguma coisa ruim deve ter acontecido com o senhor Mayers...

          Ele engoliu uma saliva antes de ter qualquer reação.

          –– A quem devo anunciar? – Finalmente conseguiu dizer, mesmo que seu corpo todo estivesse entorpecido por antever a terrível notícia que receberia.

          O Coronel prestou continência.

          Donovan aproveitou a brecha que o mordomo deu e conseguiu visualizar o oficial militar na porta prestando continência para o mordomo.

          O coronel olhou para o garoto, se agachou e o cumprimentou.

          –– Você é amigo do meu pai? – Disse o pequeno Donovan ainda com o mais sincero sorriso no rosto.

          O militar retribuiu o sorriso afetuoso.

          –– Seu pai era o meu melhor amigo.

          –– Ele vai voltar logo para casa? Estou com saudades dele.

          –– Tenho certeza que ele também está morrendo de saudades suas.

          O coronel ajoelhou-se diante dele e o abraçou.

          –– Ele sempre esteve e sempre estará aqui.

          –– O militar cutucou o peitoral frágil do garoto fazendo menção ao coração.

          Donovan deu outro sorriso.

          –– Está na hora de você voltar a brincar  no  seu  quarto, filho – disse a mãe tentando conter a emoção do momento já imaginando a terrível notícia.

          Donovan saiu correndo.

          –– Obrigado, Charles.

          Charles ficou de frente à esposa de seu melhor amigo e pôr fim a abraçou solícito.

          –– Desculpa ter sido eu a trazer a notícia, Christie, mas seu marido morreu em combate, tentava salvar uma criança alemã e foi atingido covardemente pelas costas por soldados nazistas que tinham armado aquela emboscada.

          –– Era do feitio dele fazer algo desse tipo.

          O Coronel começou a chorar, até tentou se segurar, mas não conseguiu.

          A Sr. ª Mayers o abraçou.

          –– Fica em paz, Charles, meu marido sabia que não voltaria da guerra.

          Ele olhou para ela incrédulo.

          –– Daria a minha vida para que ele estivesse aqui agora com seu filho.

          –– Ele fez isso por outra família, aquela criança voltou para os braços dos pais, isso deixa o meu coração mais confortado, nossa missão como seres humanos é garantir um futuro para nossos filhos e se possível os filhos de alguém.

          –– E foi exatamente isso que ele fez.

          Ela assentiu um pouco constrangida pelo ato heroico do marido.

          Coronel Charles entregou uma bandeira e uma caixa com as medalhas pós mortem do marido.

DONOVAN  NÃO  ESTAVA  entendendo  nada  do que estava acontecendo, seu pai estava deitado e não abria os olhos.

          –– Se despeça do seu pai, querido.

          O garoto não sabia o que fazer, era a sua primeira experiência com a morte, e justamente com a pessoa mais importante em sua vida.

          –– Porque ele não abre os olhos, mamãe?

          –– Porque seu pai está conversando com Deus, querido.

          –– Por isso que quando oramos fechamos os olhos?

          Ela acariciou o seu rosto e o reconfortou em seu peito envolto de um abraço do qual jamais deixaria de sentir seu calor.

          –– Fechamos os olhos, mas abrimos o coração.

A CHUVA INSISTIA EM CAIR enquanto o caixão descia, ao que Donovan se lembra, aquela era a primeira vez que a mulher mais forte do mundo chorava.

          Sem que ele percebesse, suas vidas mudaram completamente daquele dia em diante...

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