Marcos chegou cedo à Central apesar de ter saído tão tarde na noite anterior. Estava preocupado por não ter conseguido contato. Queria checar novamente o sistema pra ter certeza de que o problema não estava nele. Apanhou um café e entrou em sua sala. Não eram oito horas e, portanto, o expediente não havia começado. Ligou os equipamentos e iniciou uma batelada de testes. Antes que pudesse concluir o primeiro, o telefone tocou:
— Alô!
— Marcos?
— Fredy? O que houve? Caiu da cama?
— Oi! Bom dia Marcos, respondeu Fredy em tom alegre e despreocupado. Estou ansioso por notícias da equipe. Falou com eles ontem à noite?
Marcos silenciou por um instante.
— E então? insistiu Fredy. Estou curioso! Está tudo bem, não está?
A pergunta foi feita como se ele já soubesse a resposta. Como escreveu o fil&oa
O telecomunicador foi desligado e a equipe retrocedeu para o túnel. Estavam famintos. Juntaram a ração que cada um tinha em suas mochilas e fizeram a distribuição de forma racionada. O mesmo destino foi dado à água. Enquanto comiam, pensando cada qual em suas suposições, Henrick fez uma observação que já havia incomodado a todos, mas que ninguém se atreveu a comentar. — Pai! Acho que estou ficando surdo! Willdson virou-se para o garoto tentando interpretar melhor o comentário. — Surdo? Por quê? Não está me ouvindo? — Você sim. Aliás, a todos vocês e muito bem. O que eu não estou ouvindo mais é o barulho lá de fora. O barulho das folhas das árvores, dos passarinhos... Willdson abaixou a cabeça. — Então você também? Eu pensei que fosse só eu... — Não é não, interviu Ramon. Isso está acontecendo com todos nós. O som foi desaparecendo gradativamente desde que saímos do túnel. Aliás, não poderia ser diferente. A origem dele
Marcos ainda tinha uma hora antes do próximo contato. Incansável no seu trabalho, resolveu checar novamente as imagens. Passou pausadamente analisando cada frase até chegar na última cena. Aquela em que Willdson sai da frente da câmera, deixando pequena parte do cenário visível. Parou a imagem instantaneamente. — Fredy. Observe essa imagem. — O que tem ela? — Está vendo esses arbustos atrás de Ramon? Fredy sorriu. — Não é muita coisa, mas estou vendo sim. O que têm eles? — Sem brincadeira, Fredy. Eles são diferentes. — Diferentes? Diferentes como? — Lembra-se da foto que analisamos do Júlio? — Claro que lembro. E o que tem a ver? — Como Willdson ocupou todo o campo de visão durante quase todo o tempo, não percebemos antes. Mas agora, analisando melhor, os arbustos têm uma nitidez mais apurada que Willdson e Ramon, mesmo com a compensação do sistema. — Pelo amor de Deus, Marcos. Você não está quer
A equipe penetrava no túnel afoitamente. Sabiam, os seus integrantes, que se houvesse uma solução estaria em algum ponto daquela trajetória. O caminho era igual a cada passo. Reto. Totalmente reto. Estavam andando há quatro horas, portanto, duas horas além do último ponto conhecido. Os relógios continuavam marcando a hora segundo seus próprios relógios biológicos. A bússola era consultada constantemente, apenas para ter certeza de que a direção magnética permanecia a mesma. Oeste. Ramon determinou a primeira parada para que pudessem angariar forças. Dez minutos seriam o bastante. — Até quando vamos andar? perguntou Henrick. Não houve resposta, e nem precisava haver. O retorno não os levaria a nada e eles sabiam disso. Portanto, andariam até enquanto suas pernas aguentassem. Parar significava morte certa. Assim, se tivessem que morrer, que morressem tentando. Willdson acendeu seu penúltimo cigarro. — Bem, Ramon, disse ele, só tem mais u
PARTE III Ramon sentiu-se meio tonto. Anestesiado era a palavra exata. Abriu os olhos com cautela. Estranhamente estava em pé. Olhou para si próprio vagarosamente e ainda teve tempo de ver seu corpo se formando. Como se estivesse se materializando. Aguardou alguns segundos e só então tateou alguns passos. Analisou o cenário e, apesar da familiaridade, alguma coisa estava confusa. Estava nas ruínas do Ponto M e disso não tinha dúvidas, mas... por que tudo estava tão esquisito? Não sabia explicar o que lhe dava essa sensação. No entanto, o mais importante agora era encontrar os outros integrantes. Sabia que o acampamento estava em linha reta da posição em que se encontrava e partiu em direção a ele. Teria voltado ao tempo normal? O pesadelo teria acabado? Com certeza não. Sua missão era encontrar o paradeiro da equipe do Projeto INCA e disso ele estava convicto. Só não conseguia imaginar como os encontraria. Vivo
Willdson abriu os olhos vagarosamente. Seu rosto estava voltado para o chão. Sem levantar a cabeça, procurou primeiro analisar o cenário. Estava caído como se tivesse sido atirado ao solo por uma imensa força. Só se lembrava que, antes de tudo desaparecer dentro do túnel, agarrara o braço de Carlos tentando o caminho de retorno. Lembrava-se ainda de uma mudança brusca na luminosidade, no momento da transição. Era como se tivesse mudado de faixa, ou seja, retornado à faixa do vermelho. Levantou-se vagarosamente e bateu a poeira da roupa numa atitude habitual. Passou os olhos pelo cenário à procura de alguém, sem perceber, no entanto, que nenhuma nuvem de poeira havia levantado de suas roupas. — Droga, Carlão! O que houve com você, cara? Vamos! Levanta, homem! Carlos estava inerte. Willdson chegou até ele e procurou reanimá-lo. Respirava, portanto estava vivo. Willdson abriu o cantil e despejou um pouco de água no rosto do amigo. Carlos abriu os olh
Ramon arregalou os olhos. Difícil saber qual a diferença dos dois. — Pelo amor de Deus, Ramon! Sou eu, Henrick! Não está vendo? Ramon estava confuso. Bateu os olhos no cinto e viu a faca de Henrick do lado direito. Era ele mesmo. Pediu silêncio ao garoto e procurou um lugar ainda mais camuflado. Sem tirar os olhos do outro, cochichou ao ouvido de Henrick: — Onde você estava? Estou à sua procura há tempo... — Estava tentando achar o caminho da base quando me deparei com aquele cara. Não consegui ver o seu rosto, mas era como se estivesse vendo a mim mesmo. Alguma coisa me atraiu até ele quando me deparei com você. Afinal, Ramon! O que é que está acontecendo? Ramon, em rápidas palavras, procurou explicar ao garoto o significado de tudo aquilo. Estavam num mundo paralelo e o choque entre matéria e antimatéria poderia ser fatal para um dos lados. Henrick parecia não ouvir metade da explanação do chefe. Seus olhos estavam fixos no seu duplo
Carlos ficou estático. Fosse quem fosse era bem real. Imobilizado como estava, não tinha nada a fazer a não ser aguardar os próximos acontecimentos. De bruços e jogado ao chão, Carlos não conseguia ver quem o aprisionara. Contudo, não demorou muito para que a surpresa tomasse conta dele. — Sargento! Corre aqui! gritou o homem que o aprisionara. Carlos ficou atônito. Teria voltado ao tempo normal? Seriam homens do exército? O tal Sargento chegou e ajudou o companheiro a levantar Carlos. Carlos, por sua vez, agora em pé, encarou o homem diante de si: cabelos sujos e compridos, com uma calva na parte superior. A barba longa e as roupas esfarrapadas como se não tomasse banho há semanas. Era realmente uma imagem degradante. Na mão, apontando para o seu peito, uma automática 9 milímetros. Enquanto isso, o outro, de aparência semelhante, desarmara-o e pedia que ele andasse. Carlos mencionou dar o primeiro passo, mas teve oposição. O tal Sarge
Ramon apressou-se. Apesar do coração apertado por deixar Henrick, sabia que, pelo menos, ele estaria num tempo normal e encontraria toda a sua realidade de uma forma ou de outra. — Seja o que Deus quiser! exclamou ao penetrar no túnel. A corrida era contra o tempo, literalmente. Sem ligar a lanterna do capacete iniciou a caminhada. Os olhos bem abertos observavam cada detalhe. Olhou para o relógio, pois sabia que era a sua mais importante fonte de referência. Pela primeira vez notou que uma leve coloração invadia o ambiente a cada passo. Talvez não tivesse percebido isso na vinda por estarem sempre com as lanternas acesas. Com 11 minutos e 15 segundos de caminhada a passos constantes, percebeu um leve flash ultravioleta. Com 22 minutos e 30 segundos o fenômeno se repetiu na cor azul. Descobriu dessa forma que o tempo dobrava a cada quebra de zona da luz. Ela se decompunha em relação à rotação da Terra. Teria de chegar na zona do vermelho. Se tivesse sorte, en