Camelia levantou-se apressada, como todos os dias, e correu para a casa de banho, quando viu o sonolento Ariel aparecer à porta. Ela perguntou-lhe: — O que fazes, querido, levantado tão cedo? Ainda não nasceu o sol. — Tenho imensas coisas para fazer. Preciso ver se finalmente consigo resolver o problema da Lucrecia e esse bebé que não para de chorar... — interrompe-se ao notar como o marido a olha e, nesse momento, percebe que não vai trabalhar e que tudo o que acabou de dizer não faz sentido.Camelia congela-se e olha para Ariel com um pouco de vergonha. O que raio lhe está a acontecer? Precisa de se desintoxicar desse trabalho; é como se fosse uma droga para ela. — Desculpa, Ari, é o hábito — balbucia. — Queres que vamos nadar? — pergunta Ariel, sem dar importância — A esta hora, a água est&aa
A vida nem sempre é justa com quem acredita ter feito tudo corretamente nas suas vidas. Este é precisamente o caso do capitão reformado Lorenzo Miller. Toda a sua família se dedicou por completo ao exército e ao serviço do seu país. Uma bomba veio truncar a sua carreira e o seu futuro; não só feriu o seu corpo, que se recuperou aos poucos, como também afetou o seu cérebro, deixando-o incapacitado para servir, nem sequer num cargo administrativo no exército, e muito menos na política. Por isso, afastou-se da sua família e da sua cidade e veio à procura de Ismael.Ismael e ele tinham sido companheiros, não só no exército, mas também na escola e na universidade. Durante muito tempo, partilharam o apartamento onde viviam. Tinham sido cúmplices de noitadas e travessuras. Conheciam todos os segredos um do outro, até ao momento em que
Depois de se amarem na areia, Ariel e Camelia voltaram a entrar no mar e correram para casa. Entraram silenciosamente na casa de banho, onde voltaram a se entregar ao amor até ouvirem os seus filhos chamá-los. Tiveram o cuidado de trancar a porta da casa de banho. —Filhos! —chama Ariel—, subam para a cama que já saímos. —Sim, papá. A mamã está aqui, não foi embora? —ouve a voz de Alhelí. —Sim, querida, aqui estou. A mamã não vai para lado nenhum sem vocês— responde Camelia, com um nó na garganta ao perceber a desconfiança na voz da sua pequena. Ariel, que já saiu do duche e está a secar-se, não diz nada. Apenas continua a fazer o que está a fazer, focado em secar-se e ir ver os filhos. Vê-a derramar algumas lágrimas e pergunta: —E agora, por
Por sua parte, Miller estava surpreendido ouvindo toda a história que o seu amigo lhe contava. Confessou que não tinha se casado e que essa era a segunda coisa em que queria que ele o ajudasse, como já tinha mencionado ao chegar. Pretendia casar-se o mais rápido possível e formar uma família. —Quero encontrar aquela rapariga introvertida de quem gostei tanto e que morava em frente ao meu prédio. Lembras-te de que te falei dela? —perguntou Miller—. Talvez com alguém como ela eu possa conseguir isso. O que achas? —Claro que sim, vamos encontrá-la, vais ver! Um momento —e virou-se para a porta para chamar a esposa—. Sofi…, querida, vem aqui, quero apresentar-te ao meu melhor amigo! Agora vais ver como a minha esposa é linda e os meus dois filhos também. Nem vais acreditar, nem eu ainda acredito! Ha, ha, ha… Sofi… Sofia
Estava quase a sair do escritório sob o olhar do capitão Miller quando se virou lentamente. Não queria perder o emprego e decidiu livrar-se de Lucrecia, ao mesmo tempo que ganhava pontos com o novo diretor. Por isso disse: — Senhor diretor Miller, desculpe. Sei que é o nosso trabalho, mas ali está de novo aquela rapariga chamada Lucrecia, bêbeda, a querer falar com a senhora Camelia. Desde que foi recolhida pelo senhor Ariel, vem quase todos os dias causar problemas; era sempre a diretora quem resolvia a situação. Poderia, por favor, encarregar-se dela? Essa rapariga é mesmo um caso sério. O capitão ficou a olhar para Sonia e acenou afirmativamente. Sim, este lugar precisava mesmo de mão firme, pensou. A quem, em seu juízo perfeito, se teria ocorrido colocar uma mulher como Camelia à frente deste lugar? Tinha a certeza, e pelo que estava a testemunhar, que e
Camelia guardou silêncio ao ouvir aqueles comentários, assimilando que tinham razão. Contudo, para ela era mais confortável encarregar-se pessoalmente do cuidado das crianças. Sempre lhe parecia que as auxiliares não conseguiam fazê-lo com a mesma eficácia que ela. Ariel, atento, pegou-lhe no braço, e juntos partiram em direção ao local. Ficaram surpreendidos ao chegar e observar tudo o que o capitão Miller tinha alcançado no mês em que eles tinham estado ausentes. O edifício tinha sido remodelado e pintado; os jardineiros arranjaram o jardim, e as cercas agora eram mais altas. As crianças praticavam desporto sob a supervisão de treinadores, e as suas gargalhadas e expressões de felicidade enchiam o ambiente. Perto dali, as auxiliares relaxavam ao sol enquanto cuidavam dos mais pequenos. —É incrível o que ele conseguiu em apenas um mês —murmurou Camelia, incapaz de esconder o seu espanto. —Estás a ver que não havia razão para te preocupares? —perguntou Ariel, com um sorriso que
Ariel percebeu claramente como o capitão Miller olhava para Camelia. Embora tentasse ser discreto, havia algo na intensidade do seu olhar que não passou despercebido para ele. Sabia que sua esposa era uma mulher bonita, daquelas que chamam a atenção em qualquer lugar, mas a profundidade no olhar do capitão ativou imediatamente os seus alarmes internos. Embora Ariel não se considerasse ciumento, essa sensação levou-o a observar a situação sob uma nova perspetiva. —Bom, já que éramos vizinhos, Miller —disse Camelia com uma naturalidade que surpreendeu ligeiramente Ariel, tratando o capitão por “tu” sem qualquer hesitação—, indica-me, por favor, onde está a informação sobre os possíveis pais do bebé. Miller olhou para ela por um breve instante antes de desviar o olhar para Ariel, que permanecia em silêncio, mas atento, com uma ligeira rigidez nas suas feições. Perante a atitude amigável de Camelia, Miller dirigiu-se até à secretária, abriu uma das gavetas e tirou um envelope. Enquan
Com a inquietação instalada como um peso no peito, Ariel afastou-se um pouco junto a Félix para que ninguém mais pudesse ouvir a sua conversa. Embora os filhos que tinham aparecido tivessem sido confirmados como os legítimos herdeiros do seu irmão, Ariel não conseguia livrar-se daquela sensação de angústia. Recordava com demasiada nitidez os episódios relacionados com Mailén e o pânico de imaginar que talvez existissem embriões seus espalhados pelo mundo. Esse temor constante reforçava-se sempre que se lembrava da estranha mensagem do jovem que afirmava ser um dos filhos perdidos de Marlon, implorando ajuda para ele e para os seus supostos irmãos e primos. —Félix —sussurrou Ariel, com gravidade—, já há algum tempo que queria perguntar-te algo. Lembras-te que te contei como a Mailén levou um médico enquanto eu estava sequestrado para extrair o meu esperma? Porque eu... eu não o entregava voluntariamente. Félix assentiu, confuso; não conseguia imaginar para onde Ariel queria ir co