O balançar enjoativo do navio derrubou Mikoto assim que passou do rio para o mar. Felizmente, dessa vez ela teve com o que se concentrar: os dias que passara sem treinar com a naginata agora podiam ser compensados.
Sayuri também ficou interessada e novamente tentou manejá-la, e acabou se desequilibrando e deixando a naginata cair várias vezes comicamente, para o deleite de Takako, que se dobrava de tanto rir a cada falha da prima.
Conforme se aproximavam de Ao, no entanto, o clima tornou-se cada vez mais pesado. Sayuri não tentou mais usar a naginata e Takako mantinha o semblante sério quase o tempo inteiro, e as duas frequentemente conversavam aos sussurros. Mikoto se perguntava sobre o que elas falavam, e só tem sua resposta quando atracaram na capital.
-- É melhor você vir comigo ver Ayahito – Sayuri disse ao desembarcarem. Mikoto olhou para Takako.
-- E o que você vai fazer?
Novamente Takako conduziu a cerimônia, a expressão séria tão parecida com a de Megumi-sama, que Mikoto imaginou que a jovem com certeza seria como ela quando chegasse à sua idade.Primeiro, para purificar o ambiente maculado, ela executou uma longa oração, tocando o suzu e cantando com toda a vontade. Mikoto e Sayuri sentiram o efeito do encantamento, a sensação de uma corrente de água morna passando por dentro de seus corpos.Mal terminara e Takako recomeçou a dançar, a mesma que executara no Santuário Vermelho. Uma barreira amarela cristalina se formou ao redor da montanha e Mikoto espalhou ofuda com o kami de proteção no torii.Ao terminar, Takako caiu de joelhos, pálida como um fantasma, o rosto coberto de suor e todos os músculos tremendo, como se ela estivesse com frio. Sayuri pôs o braço direito da prima sobre seus ombros, e M
-- É um bombardeio! – Sayuri gritou. Aviões despejavam mísseis sobre os prédios do centro da cidade, que explodiam amarelo vivo antes de se desfazer como castelos de areia.Mikoto tirou o pijama e vestiu o quimono mais rápido que já se trocara na vida. Takako e Sayuri nem se deram ao trabalho de mudar de roupa, simplesmente saíram do quarto, e toda a equipe de segurança já se encontrava no corredor.-- Vamos sair daqui. Fiquem todos juntos! – Kurono gritou por cima das explosões.Aquele bairro aparentemente ainda não fora alvejado, mas dava para ver o brilho do fogo ao longe, e os estrondos que não paravam podiam ser ouvidos a quilômetros de distância, e o chão tremia como um terremoto.-- Por aqui! – Yukio apontava para uma rua para onde várias pessoas corriam.Kurono não parava de gritar para que ninguém se
O pior nem era o templo estar em chamas, mas o restante da cidade também, e naquela localização, os bombeiros nunca chegariam a tempo de salvá-lo.A naginata agora estava fora de seu alcance, mas não poderia ser mais inútil. Mikoto tirou um maço de ofuda do bolso que sempre trazia consigo desde Aka, e rezando para que o kami escrito por uma caneta esferográfica tivesse o mesmo efeito que o escrito por tinta e pincel, anotou uma palavra.Ela segurou o papel o mais alto que podia e disse:-- Chuva!Sua pérola brilhou azul. O céu continuou limpo, mas o vento esfriou, e Mikoto de repente sentiu-se cansada como se tivesse caminhado por quilômetros com pesos nos pés. Ainda assim manteve o braço erguido.-- Chuva!A pérola brilhou mais intensamente. Nuvens se reuniram acima da cidade, mas ainda não caíra uma gota de água, e agora os
A cor dos olhos do menino foi um choque para todos, e logo até Takako especulava sobre uma possível ligação entre ele e Mikoto. Mas não passava de especulação, pois não havia como provar nada. E ainda havia muito com o que se ocupar, como os enterros de todos os mortos. Os dois dias seguintes foram dedicados quase exclusivamente a isso.Na noite do terceiro dia, o Genbu chegou a Kuroi, e tanto o príncipe quanto os tripulantes não acreditaram na devastação que viam.-- Ouvir o que aconteceu pelo noticiário não é nada quando está diante de seus olhos – o rapaz comentou para Mikoto ao desembarcar – Não acredito que meu pai fez isso.-- Yasha fez isso – Sayuri corrigiu com a voz firme – O imperador está ciente dos atos dela.-- Vocês têm alguma informação sobre Ao? – Taka
Ninguém dormiu bem naquela noite, se é que conseguiram pegar no sono, e a manhã trouxe mais notícias ruins. Durante a invasão de Aka, o rei Ayahito tentou lutar quando soltados vermelhos chegaram ao palácio, e durante a batalha, foi gravemente ferido e entrou em coma.Ao ouvir isso, o rosto de Shin perdeu toda a cor, e ele precisou sentar para evitar um possível e iminente desmaio. A notícia terminou com um pronunciamento do representante de Aka, que dizia que a invasão não fora um ato de guerra, mas uma resposta ao ataque a Kuroi e uma forma de prevenir que o mesmo acontecesse ao país vermelho. O rei Sujin não desejava governar Ao, e pediu que o príncipe Sjin, onde quer que estivesse, retornasse para que pudessem resolver essa questão diplomaticamente.Kurono desligou a TV e o recinto caiu num silêncio que pesava nos ouvidos. Takako falou com suavidade para Shin:
Todos levantaram muito cedo na manhã seguinte, as primeiras luzes do amanhecer começavam a despontar no horizonte e uma fina neblina ocupava as ruas da cidade quando Takako e Sayuri lideraram o grupo para o alto do Santuário Azul, onde todos os sacerdotes já haviam sido reestabelecidos e aguardavam sua chegada.-- O que viemos fazer aqui tão cedo? – Mikoto esfregava os olhos, tonta de sono. A seu lado Haku também bocejava ruidosamente, mal conseguindo manter os olhos abertos.-- Um kami – Yukio respondeu. Ele parecia muito excitado apenas por olhar as duas primas conversarem com o sacerdote principal – É uma magia de alto nível, que serve para saber a localização exata de qualquer youkai num raio de quilômetros. Dependendo do poder da miko, pode ser de centenas de quilômetros.-- E por que não usaram antes?-- Porque é uma técnica de al
Apesar de Tamayori ter ordenado que nada fosse comentado até o assunto estar resolvido, a notícia de que a famosa e inesperada terceira miko desejava ir embora se espalhou pelo clã Kairiku como fogo na gasolina. Mesmo agora, sentada no meio da escadaria do santuário, Mikoto sabia que todos comentavam sobre ela aos sussurros.-- Quer falar sobre o que você pediu? – Takako sentou à sua direita nos degraus. Mikoto apoiou o queixo nas mãos.-- O que Tamayori-sama disse?-- Não responda a pergunta com outra pergunta para se desviar – Sayuri sentou à sua esquerda –Vamos, desabafe.Mikoto abraçou os joelhos, os lábios comprimidos e encarando os degraus. Takako percebeu seu desconforto e acariciou seu ombro e seu cabelo.-- Pode falar o que quiser, suas irmãs estão aqui para escutar.Por fim Mikoto deu um longo suspiro e começou:
Eram tantos que mesmo à distância não era possível mensurar a quantidade, em uma visão terrível da qual Mikoto não conseguia desviar o olhar. Havia toda a sorte de criaturas ali, desde os já vistos bakenekos, tanukis e mujinas, a outros totalmente novos, como onis de pele vermelha e duas vezes o tamanho de um homem adulto.Um movimento abaixo de Mikoto desviou sua atenção de volta para Yasha, que não estava mais na escadaria.-- Tchau, Mikoto. Nos veremos logo, logo – a voz dela veio de cima. Ela estava montada na mesma raposa branca de cinco caudas do Santuário Vermelho. A kuko flutuava como se ela e a mulher em suas costas não pesasse nada, e com um movimento das caudas, voou para longe.Seu corpo tremeu de raiva por vê-la ir embora de novo sem que pudesse fazer nada, mas precisou suprimir esse sentimento para descer correndo as escadarias.-- Espere, M