Alice inclinou ligeiramente a cabeça.
Mudei–me ontem e o local é longe de qualquer meio de transporte. Não voltará a acontecer.
Mudaste–te ontem?– perguntou ele, surpreendido. –Não avisaste nada.
Alicia negou. Não era como se ela estivesse a contar a sua vida privada, embora na universidade, por ser bolseira, estudar três línguas e também fazer trabalho de tradução, normalmente tivessem de a vigiar e a localizar. Além disso... ela estava em casa de um estranho. Seria bom que pelo menos alguém soubesse dela, para o caso de acontecer alguma coisa.
–Sim, a minha mãe teve de ir de viagem e deixou–me em casa de uma amiga até voltar. Como sabes, ela é a minha tutora.
O homem ficou a olhar para ela.
–Isso é algo que eu ainda não entendo. Tu és maior de idade e, embora ela seja a tua tutora com atraso mental, não vi nenhum traço significativo em todos estes anos que te tornasse incapaz de te defenderes sozinho.
Alicia só conseguiu sorrir ligeiramente. Não era ela que devia ser informada disso, mas já estava a trabalhar nisso, um deles a sair de casa, mesmo que fosse a casa de um estranho.
–E este tipo, conhece–lo? Ele fez–lhe alguma coisa?
Alicia negou.
Ele tratou–me bem e não, ele não me fez nada, não tens de te preocupar– tentou desviar o assunto o mais rapidamente possível.
Foi então que Cristian se precipitou e agarrou numa das mãos dela que estava na borda da secretária. Apertou–a entre os dedos e acariciou–lhe os nós dos dedos com o polegar.
Se precisares de ajuda ou de um lugar para ficar, eu posso ajudar–te. Não tens de ter vergonha de me pedir nada. A minha casa é grande. Se te sentires desconfortável...
Estou bem– Alice conseguiu afastar a mão e pô–la de novo no colo, um pouco desconfortável, –Se estiver em sarilhos, digo–lhe.
Cristian não parecia muito convencido, mas não insistiu mais, uma vez que Alicia não costumava ser muito aberta com ele ou com qualquer outra pessoa.
Se assim o dizes– pegou num envelope da secretária e entregou–lho: –Isto foi–me dado pelo professor de alemão, é para tradução, lá dentro estão os documentos e o que ganharias por isso. Se tiveres alguma dúvida, podes contactá–lo.
Alicia agarrou–a rapidamente e levantou–se.
–precisa de algo mais.
Cristian negou.
–Podeis retirar–vos, mas a minha oferta mantém–se.
Uma gota de suor escorreu pela têmpora da jovem mulher.
Um que mal a queria em casa e outro que a propunha insistentemente.
–Obrigado– e saiu do escritório, com o envelope junto ao peito. Pelo menos isso dava–lhe alívio. Cada trabalho seriam horas sem dormir, mas números na carteira.
E, pensando bem, muitas raparigas ficariam loucas se recebessem uma proposta dessas.
A campainha da porta tocou e ela abanou a cabeça para limpar os pensamentos. Não era a sua hora. Estava mais preocupada com o que iriam jantar nessa noite do que com o pedido pouco convencional do seu professor, com quem também não tinha muita confiança. O frigorífico não estava abastecido como o próprio diretor–geral lhe tinha dito. Apenas os ingredientes que tinha usado nessa manhã.
Devo pagar o jantar no caminho?
Lembrou–se de que não tinha dinheiro suficiente na carteira para comprar os ingredientes de que ele de certeza ia gostar e, além disso, ele tinha dito que voltava cedo, por isso de certeza que ia comer. Ahhh, como sempre, ele habituou–se rapidamente às mudanças repentinas na sua vida.
Voltou para a aula e decidiu que, quando voltasse, falaria com ele sobre o assunto.
O que ele não contava era que, ao entrar no edifício onde agora residia à tarde, a sua passagem estivesse fechada.
Desculpe, menina, mas não pode entrar– interrompeu–a um guarda diferente do da noite anterior.
Alice pestanejou em confusão.
Vivo no apartamento do diretor–geral Vincet Regal.
A expressão do homem não se alterou.
–Não fui notificado de nenhum novo residente e não a posso deixar entrar. Se for o caso, pode telefonar–lhe e depois, se ele der autorização, deixo–a entrar.
Havia um problema, ela não tinha o número dele. E tinha a certeza de que o guarda não lho daria.
O que é que ele estava a fazer agora?
Vincet levantou os olhos dos documentos que estava a analisar e quase teve vontade de dar um pontapé no homem que conduzia no banco da frente.–Estás mesmo a pedir para ser despedida. Esse sorriso na tua cara acabou de desaparecer– rosnou–lhe ele.Lukas, por seu lado, só conseguia rir mais. Tinha–o feito desde essa manhã e só se tinha contido quando estava presente outra pessoa. Mas, pelo contrário, tinha gostado muito de o fazer.–Tens mesmo de ver a tua cara, Vincet, o que te fizeram parece mesmo algo saído de um romance barato– a secretária virou o volante numa curva, –e não me podes despedir, sou a tua melhor amiga e ambas conhecemos as partes mais negras da alma uma da outra.O homem lá atrás estalou a língua.–A sério, como é que te deixas manipular assim por uma ex que só esteve contigo uns meses numa relação a meias e que agora te vem pedir para tomares conta da filha dela. Pelo menos fodeste a rapariga ontem, porque imagino que não a vais deixar ficar de graça.As mãos de Vin
Vincet sentiu–se muito estúpido, ou foi essa a sensação que teve ao ser visto pelo seu secretário e pelo guarda, por se ter simplesmente esquecido que a rapariga vivia agora com ele. Não que fosse fácil habituar–se, até o próprio Lukas estava surpreendido por o amigo deixar uma mulher viver com ele, quando mal as deixava ficar quando faziam sexo e, na manhã seguinte, já as expulsava da sua propriedade.O diretor–geral terminou as formalidades, pediu o telemóvel de Alicia e, depois de verificar que ela podia aceder a ele a partir do átrio do hotel, que a sua impressão digital estava registada na fechadura do apartamento e que ela tinha o seu número para o contactar e vice–versa, sentiu–se um pouco... menos imbecil.Tinha deixado a rapariga todas aquelas horas, literalmente, estendida na rua. Não sabia porquê, mas tinha o peito apertado, e o pior é que não tinha recebido nenhuma queixa, que ele usaria como desculpa para responder, mas não, ela estava simplesmente parada na sala como se
–Vincet deixou que a brisa da noite lhe soprasse o cabelo para trás.Os dois tinham–se mudado para a varanda enquanto Alicia preparava o jantar. O diretor executivo encostou o corpo ao corrimão, de costas para ela, enquanto Lukas se colocou ao lado dele, ao contrário.Quando disse que esta rapariga era interessante, não foi em vão– sorriu, –fiz–lhe muitas perguntas para tentar analisá–la, pelo menos os meus estudos de psicologia servem–me bem para isso.–E a que conclusão chegaste? Ela é uma ameaça? Tenho de a tirar de casa?O rosto de Lukas era um dilema.–A verdade é que... a primeira coisa que me disseste sobre ela foi que era atrasada mental, mas eu gostaria de saber um pouco mais sobre isso, porque não encontrei nenhum sintoma– viu Vincet franzir as sobrancelhas.–O que é que quer dizer?Lukas apertou a boca e baixou a voz.–Acho que ela é muito introvertida, mas a forma como reagiu a certas perguntas, é como se... algo dentro da sua cabeça lhe estivesse a dizer que não podia diz
Aquela imagem... era chocante para Vincet. Mesmo que as cicatrizes se perdessem nitidamente na pele da jovem mulher, isso não tirava o facto de que estavam lá, que tinham sido feitas vezes sem conta, fechando–se de forma irregular, como se não tivessem cicatrizado corretamente. Ela sentiu–se perder o fôlego.Que tipo de pessoa faria isso a alguém vezes sem conta?Um gemido de Alicia trouxe–o de volta aos seus sentidos e, embora as marcas nas costas dela despertassem tanto o seu espanto como a sua curiosidade, havia agora outras coisas que precisavam da sua atenção. Ele aproximou–se dela, pegou num dos roupões de pelúcia da prateleira e colocou–o sobre ela para cobrir a sua nudez. Não sem antes lhe dar um vislumbre involuntário de todo o seu corpo.Aparentemente, Alice não se tinha apercebido de que ele tinha entrado por causa do atordoamento da queda, estava tão assustada e queria afastar–se dele, mas a dor no joelho impedia–a de se mexer muito.Fica quieta– Vincet não estava com disp
Vincet não podia acreditar que estava mesmo a fazer aquilo, especialmente pela razão pela qual tinha acabado assim... com as calças a meio das coxas, a boca entreaberta enquanto os gemidos saíam dela e a mão à volta do seu membro se movia para cima e para baixo, que estava escorregadio com o seu próprio fluido pré–seminal.Ele, a ter de se masturbar para apaziguar o seu desejo sexual?Não sabia bem se estava irritado ou demasiado excitado, pois os pensamentos não lhe saíam bem da cabeça. Tinha tentado ignorar a ereção, mas tinha sido inútil. Não tinha diminuído e só lhe doía mais e mais cada vez que pensava na rapariga e nos seus pequenos seios.–Outro gemido saiu–lhe da boca e ele apertou a glande, impedindo–o de se vir completamente, e depois arrependeu–se. Tinha de ter um orgasmo rápido para tirar aquela comichão do seu corpo, mas ao mesmo tempo queria prolongá–lo um pouco mais, pois enquanto deixava a sua imaginação fugir com ele, algo o percorria e dava–lhe um estremecimento que
Alicia abriu bem os olhos e negou rapidamente.–Não é necessário. Posso ir buscar o meu...– fechou a boca quando viu a expressão dele, e lembrou–se de que Lukas lhe tinha dito que Vincet detestava que as pessoas lhe respondessem, –Obrigada.–Com uma perna assim, não vais muito longe e a lesão vai ser pior. Achas que os hospitais são baratos?Ela franziu os lábios ao ouvir o tom de voz dele.–Não são, por isso é que estou a ser cuidadoso.–Vincet deu meia volta e foi sentar–se para tomar o pequeno–almoço.Quando a cozinha ficou vazia, Alice soltou um suspiro profundo. A atmosfera era densa, especialmente naquele dia. Olhou para baixo e verificou o joelho. Não estava muito mau depois da compressa fria, mas mesmo assim, se pudessem dar–lhe uma ajuda, seria útil. Ainda lhe doía, embora fosse tolerável, ele já tinha suportado pior, só estava preocupado com o facto de, se a pancada piorasse, acabar no hospital, não queria isso, não era altura de pagar uma conta dessas.Enquanto Vincet acaba
Alicia ficou parada dentro do luxuoso carro. Tinha um aspeto elegante por fora, mas por dentro via–se que tinham sido investidos uns bons trocos para o equipar. Os bancos forrados a pele macia eram muito confortáveis, o banco da frente até tinha um ecrã. Os vidros não deixavam ver nada do exterior para o interior e vice–versa. A temperatura e o cheiro também eram agradáveis.A mãe tinha algum dinheiro, do qual ela nunca tinha visto muito, mas nunca tinha tido um carro daquele estilo... e duvidava que, se tivesse, a deixasse andar nele.A voz de Vicet chegou–lhe e ela apercebeu–se de que estava a franzir o sobrolho.Alice reagiu e sorriu ligeiramente.Não, é um carro muito confortável. É que... lembrei–me de uma coisa.Vincet não disse nada e voltou a concentrar–se no seu tablet, onde parecia estar a trabalhar.–Olha, pombo, a tua universidade é aquela que fica a cinco quarteirões de distância, certo?–Sim, o da língua– respondeu ela, com o semblante descontraído.É preciso ser muito i
Alicia estava contente por não ter sido vista a sair do carro ou estaria rapidamente na boca de toda a gente. Já tinha inveja suficiente de si própria por causa das suas notas. Não era idiota, já tinha ouvido os professores comentarem que a recomendariam para sítios diferentes... sítios que muitas pessoas queriam mas que não preenchiam todos os requisitos necessários. Isso tinha feito dela um ponto de atenção e ela sabia que quem se aproximava dela não era com boas intenções.Coxeou um pouco até ao primeiro corredor. O joelho ainda lhe doía, mas era suportável.–O seu nome soou nas suas costas e ele olhou por cima do ombro.–Bom dia, Professor.Cristian aproximou–se dela com uma ligeira careta.–Pode vir comigo por um momento?Ela baixou a cabeça. Ainda faltava meia hora para as aulas começarem e ela não podia recusar a chamada de um superior. Ela respirou fundo e seguiu–o até chegarem ao apartamento dele. Ele fechou a porta depois de ela ter entrado e viu–a ficar tensa.Não tens de r