A luz da manhã invadia a sala de estar, pintando de dourado os móveis antigos da casa de Rosa. Malú entrou com passos firmes. Derick estava sentado no sofá, folheando um jornal com a postura descontraída. Ela parou à sua frente, engolindo a ansiedade que sentia. — Derick… — chamou, a voz mais suave do que planejara. — Preciso me desculpar pelo que aconteceu ontem. Não foi você, foi… um reflexo. Ele baixou o jornal devagar, como se temesse assustá-la de novo. Seus olhos — verdes estudaram seu rosto por um segundo longo antes de responder: — Malú, você não precisa pedir desculpas. Eu deveria ter sido mais cuidadoso. — A voz dele era morna, mas carregava um fio de curiosidade. — Só não queria que você caísse e se machucasse. Ela cruzou os braços, sentindo o peso do não dito entre eles. ”Ele quer me perguntar, quer saber por que um simples toque me fez surtar.” Mas Derick apenas sorriu, erguendo-se com elegância. — Vamos virar a página, prima. — Estendeu a mão, não para tocá-la,
A Feira de Artesanato respirava vida em cada canto. O sol da tarde dourava as bancas de miçangas, transformando colares e pulseiras em cascatas de luz. Malú parou diante de uma barraca onde brincos de cerâmica pintada pendiam como frutos exóticos. Seus dedos tocaram um par azul-turquesa, lembrando as águas do Caribe que Dmitry uma vez descrevera. Derick observou-a à distância, o sorriso dele um reflexo do encanto dela. Antes que ela percebesse, ele já pagara pelos brincos e surgiu ao seu lado, o calor do corpo dele quase tocando o dela. — Não são os brincos que brilham, Malú — sussurrou, prendendo delicadamente um deles em sua orelha. — É você que faz até o vidro parecer diamante. Malú sentiu o rosto incendiar, desviando o olhar para esconder o turbilhão de emoções. Olga e Rosa riram baixinho, trocando um olhar cúmplice. May, no colo de Olga, esticou as mãozinhas para agarrar uma boneca de pano vestida de renda — réplica perfeita das que Dmitry fazia para
Malú discou novamente, mas Ravi não atendeu. Em vez disso, uma mensagem seca apareceu: “Te ligo depois. Aproveite para conversar com seu ‘priminho querido’. Boa noite!” Ela cerrou os punhos, frustrada. — Que infantilidade, Ravi! Com ciúmes de Derick! — murmurou, mordendo o lábio para conter as lágrimas. Decidida, a pedir desculpas ao seu primo, ela abriu a porta do quarto, e no corredor, ela viu que Derick ainda estava parado, a sombra dele era alongada pela luz do abajur. Então se aproximou dele dizendo: — Desculpe por ter sido tão rude com você… Você tem razão: estou numa guerra. E não quero lutar sozinha, quero toda a minha família ao meu lado, inclusive você.Derick virou-se devagar, os olhos verdes brilhando sob a meia-luz. Então ele, observou ela ainda segurando o celular.— Tá tudo bem, agora? — perguntou, cruzando os braços. Malú apagou a mensagem com um movimento rápido, forçando um sorriso. — Sim, foi só… um mal-entendido. Ele riu, baixo, e aproximou-se até qu
Treze dias se arrastaram em um silêncio pesado.Malú estava dilacerada pela dor, sem coragem para buscar Ravi. Ele, mergulhado em culpa, mantinha distância. Seu plano com Gabriel precisava prevalecer — era a única forma de protegê-la, mesmo que isso significasse afundar seu próprio coração em gelo. A felicidade de ambos dependia de sua frieza. Dois dias depois, Viktor recebeu a notícia que aguardava: Ravi estaria em uma festa VIP em Gramado, no Rio Grande do Sul. A chance perfeita para capturá-lo. Após a proibição de Mikhail Kuznetsov de atacar a Fazenda dos Castellani, Viktor sabia que precisava agir nas sombras — sem deixar rastros da máfia russa. Mas a manhã trouxe consigo uma tempestade de caos. Uma ligação fez Viktor explodir em fúria, sua raiva ecoando como um trovão entre os homens. Sentado em sua cadeira de couro preto, ele apertava o celular com força suficiente para trincar a tela. Seus olhos, antes calculistas, incendiaram-se. — O quê?! — rugiu, erguendo-se de um
O vento cortante do inverno gaúcho chicoteou o rosto de Ravi assim que ele saiu do carro. Enfiou as mãos nos bolsos do casaco, os lábios tremendo sob o frio que parecia trespassar até os ossos. À sua frente, o Hotel Wish Serrano impunha-se como uma fortaleza de vidro e luz, suas linhas modernas contrastando com o céu cinzento e pesado de Gramado. No lobby, o calor do aquecimento central envolveu-o como um abraço, enquanto seus olhos percorriam o ambiente: lustres de cristal cintilavam sobre o mármore polido, flores exóticas exalavam um perfume doce e a música clássica ecoava suave, quase hipnótica. Ravi caminhou em direção à recepção, cada passo ecoando em meio ao silêncio elegante. — Seja bem-vindo, senhor Castellani — cumprimentou o recepcionista, com um sorriso treinado. Ravi assentiu, entregando o cartão de crédito sem perder o olhar vigilante. A chave do quarto 1005 brilhou em sua mão, fria e metálica. O elevador d
Assim que Gabriel baixou o celular ele voltou a vibrar como um alarme. Gabriel atendeu, a voz de tia Rosa explodindo em pânico: — Gabriel! Derick levou um tiro! Foi só no braço, mas… levaram a Malú! Ele quase deixou o aparelho cair. — Como assim? — rugiu, os dedos branqueando ao apertar o telefone. — Invadiram a casa… trancaram todos no quarto… Derick chegou na hora, mas… — Rosa engasgou em soluços. — Ela sumiu, Gabriel! Faz mais de uma hora! Gabriel encostou-se na parede, o coração batendo freneticamente. O mundo girava. Viktor. Só pode ser Viktor. — Merda. Merda! — golpeou a parede com o punho, mas a dor sequer chegou ao cérebro, ele precisava agir. Digitou freneticamente para Ravi, e a ligação foi atendida antes do primeiro toque: — Ravi, Viktor ele… — Já sei… — cortou Ravi, o sussurro tão gelado que quase congelou a linha. — Ele está aqui. Na festa. Com
Depois de mais alguns momentos aconchegados, Malú levantou-se ainda enrolada nos lençóis e dirigiu-se ao banheiro, anunciando: — Agora vamos logo, Ravi. Quero descer para ajudar Olga com a May. — A voz dela transbordava entusiasmo. — Ela está na fase de encharcar todo mundo com comida! Ontem, eu soube que ela cobriu a Olga de papinha e ainda achou graça! Ravi sorriu enquanto a via desaparecer no banheiro. Ambos adoravam tomar banho juntos – hábito que cultivavam desde o início da convivência. Ele especialmente se deliciava em fazer amor com Malú na banheira ou sob o chuveiro, sentindo o corpo dela deslizar contra o seu enquanto a água quente escorria sobre ambos. Aquilo superava até seus sonhos mais ousados. Mas, por ora, conteve-se. Sabia que precisaria adiar os desejos. Afinal, passaram vários dias na Rússia, e a pequena May ficara para trás – o frio intenso levara Malú a deixá-la sob os cuidados de Olga. Na noite em que retornaram ao Brasil, encontraram a menina dormindo, e M
A música ressoava pelo salão, envolvendo os convidados em uma atmosfera sedutora. Todos dançavam, riam, bebiam… menos Ravi e Malú, paralisados em seus próprios infernos. Helena, com um sorriso calculado e um vestido que parecia feito de sombras, aproximou-se dele: — Vem dançar — ordenou, os dedos fechando-se em seu braço com força disfarçada. Ele hesitou, os olhos fugindo para Malú, que observava tudo a alguns metros de distância. Mas recusar seria suspeito. Deixou-se levar, os passos mecânicos, enquanto o olhar permanecia grudado nela. Conforme os passos de ambos se sincronizavam, ela colocou as mãos suavemente em seu pescoço e inclinou-se para murmurar algo ao ouvido dele.Ravi virou-se abruptamente após as palavras de Helena e seu olhar cruzou com o de Malú novamente. Havia algo devastador na expressão dela – uma mistura de tristeza profunda e um medo que para Ravi parecia perfurar a sua alma. Seu coração apertou, e embora seus braços