Início / LGBT / O ALUNO PREFERIDO / 1 - O TORMENTO
1 - O TORMENTO

Atenção: asterísticos ao decorrer da história indicam passagem de tempo.

Para Erick, seu tormento começara quando o homem de vinte e seis anos se viu completamente apaixonado por um colega de trabalho: Yuri, cabelos e olhos brilhantemente escuros, porte físico típico de quem frequenta academia e um sorriso de tirar o fôlego, tudo isso para compensar sua personalidade absolutamente tosca e homofóbica. 

Yuri era do tipo que adorava pegar no pé dos alunos novatos que fossem minimamente afeminados ou tímidos demais, que virava descaradamente o rosto ao encontrar qualquer mulher com um corpo "gostosinho" - em suas próprias palavras - e que, por fim, nutria uma amizade muito próxima de Erick, o usando como confidente de seu casamento quase fracassado de quatro anos com uma garçonete de quitanda de salgadinhos.

Talvez por serem tão íntimos, houvera um momento em que Erick olhou de forma diferente para o idiota em descrição, o enxergando como além de um amigo tosco, como se...

 Vocês fossem feitos um para o outro? - escutou a voz doce de Selena, sua melhor amiga, soar seguido de uma risada  Erick, por favor! Você passou os últimos três minutos dizendo o quão horrível esse tal de Yuri é, e termina com uma conclusão dessas? - E ria.

O loiro respirou fundo, massageando o espaço entre as duas sobrancelhas, tentando manter a paciência com aquela reuniãozinha de almoço em plena faculdade – onde ele trabalhava.  Eu o conheço, ok? Sei que...apesar disso tudo, ele é um cara muito legal. Pelo menos comigo. - tentou se defender, não conseguindo sair do olhar de reprovação da morena.

Selena era alta e magra, não tinha muitas curvas e também não gostava de exibir os cachos lindos e volumosos de seus cabelos castanhos, optando por deixá-los impecavelmente lisos ou até mesmo utilizar as famosas laces – perucas caras e incrivelmente realistas. 

Sua pele era de um tom de oliva, contrastando com o olhar poderoso que continha em suas jabuticabas ao qual chamavam de irises, sempre adornado por tons marcantes de sombras, delineadores puxadíssimos e, se pudesse, um ótimo par de cílios postiços - e tudo de alta qualidade, das melhores marcas. 

Ela também amava usar roupas espalhafatosas, unhas super coloridas, batons que poderiam te matar dependendo das palavras que saíam da boca perfeitamente contornada e era dona, além disso, de uma personalidade sem igual.

  E você pretende dar em cima do seu colega de trabalho super hétero? - Perguntou a garota, para o desespero do amigo.

Erick realmente não sabia se era seguro investir em Yuri, visto suas reações exageradas ao se deparar com gays ou qualquer assunto relacionado à isso, quer dizer, ele sempre agia de uma forma pejorativa, quase saindo do controle diversas vezes de tão irritado que ficava. 

Mas tinha um porém: ele não era gay. Não mesmo. Seu pai sempre bateu no peito para dizer o quão macho seus dois filhos eram, que gastavam o dinheiro de sua fortuna com prostitutas e festinhas, e, para completar a cereja do bolo da heterossexualidade: Erick tinha uma namorada. 

Sempre sentiu atração por ela e por várias mulheres. Então não, não era viado.

 Olha, eu não sei se você já percebeu...mas não existe só hétero, lésbica e gay por aí. - A forma descontraída a qual Selena dizia aquelas coisas o incomodava profundamente, principalmente porque estavam na cafeteria de seu trabalho, um dos lugares mais conservadores e religiosos do país, e ele com certeza não queria levantar suspeitas para cima de si antes mesmo de entender o que acontecia em sua cabeça.  Você pode ser, sei lá, bissexual. Ou panssexual, ou...ah, qualquer coisa. O fato é que gostar de mulher não te impede de experimentar outras frutas. - ela deu um sorriso sacana, levando a mão até o copo de suco de morango levando os lábios em direção ao canudinho de plástico posto estrategicamente para não borrar seu batom. 

 Selena, por favor... fala mais baixo. - murmurou em seu mal humor diário com um misto de vergonha. Aí estava uma das características mais marcantes do professor de administração: a capacidade de ser rabugento. 

Erick tinha uma aparência encantadora: olhos verdes, cabelos loiros, uma pele branca porém bronzeada de sol, e um corpo razoavelmente padrão, qualquer menininha poderia pirar nele facilmente, difícil era aguentar suas caretas, más respostas e atitudes babacas. Por sempre ter sido riquinho – fato que o garantiu uma vaga de trabalho naquela instituição, já que era novo demais para “subir por merecimento” - o professor nunca teve que se preocupar em ser querido pelos outros, em medir sua personalidade e se tornar uma pessoa melhor.

 O que você acha de ir em uma boate e testar essa atração? - Sugeriu a amiga, parecendo surgir com uma solução para todos os seus problemas. 

"Como eu não pensei nisso antes?" 

Se perguntou, ao notar que o que tinha de fazer era, na verdade, bem simples: pegar um cara.

 Mas...eu não sei se posso simplesmente chegar em um cara numa boate e dar em cima dele, vai que ele não curte? - Desabafou, fazendo uma carinha triste de cão que caiu da mudança. 

Selena o olhou com as sobrancelhas grossas franzidas em uma expressão de inconformismo, facilmente lida como "eu realmente preciso te explicar tudo?"  Eu estou falando de uma boate gayfriendly, daquelas que toca Pabllo ou Anitta. - Explicou, tomando mais um gole de seu suco avermelhado. 

 Eu odeio esse tipo de música. - Resmungou, seguido de uma careta de desgosto. 

 E daí? Não estou falando pra você fazer uma performance lá, é só...ver um carinha interessante e pagar pra ver o que rola.

Por um instante, o loiro se imaginou fazendo esse tipo de coisa. 

Como ele chegaria em outro homem? Pediria um drink para eles? Falaria para eles dançarem juntos? Fazia tanto tempo que ele não dava em cima de alguém que era difícil lembrar-se como que era aquele tipo de coisa.  Eu não sei, Sel... - Murmurou, murchando com a ideia.

 Pense nisso, tenho certeza de que seria uma experiência única na sua vida.

**

"Experiência única? Ela só poderia estar louca quando disse isso." 

Tudo bem, Erick tinha mais expectativa sobre o local: algo como uma chuva de purpurina e outfits majoritariamente rosa choque, shows com direito a macho men de fundo, mas aquela boate não parecia muito distante de uma padrão.

Depois de pensar muito sobre a conversa que tivera com a morena, de pesquisar sobre tipos de sexualidades existentes - o que o surpreendeu com a quantidade de nomes novos e estranhos que nunca ouvira falar – e de fazer testes de heterossexualidade e assistir dois ou três pornôs gays, o loiro acabou se convencendo de que não seria nada demais. 

Se ele não quisesse prosseguir com aquilo, era só ir embora certo?

O interior daquele lugar, ao qual era chamado de Peccato – totalmente autoexplicativo – se dividia entre as cores vermelha e preta, com um palco no centro junto de alguns pole dances prateados e espalhados de forma estratégica, e algumas luzes típicas de balada, mas nada muito exagerado.

Já faziam cerca de vinte minutos que estava ali, sentado quase que deprimente em um dos banquinhos do bar, apenas observando a movimentação e notando que ninguém sequer se dava ao trabalho de olhar para ele. Talvez isso fosse pela mensagem gritante de "perigo, não me decidi ainda e você vai se machucar" que emanava dele. Mas o fato do rapaz ter sido praticamente desprezado pela primeira vez na vida o deixou extremamente contrariado.  Outra cerveja, por favor. - Pediu em uma carranca descomunal, suspirando alto e cruzando os braços. 

O barman, simpático com todos que chegavam ali, apenas assentiu com um sorriso amarelo, também não muito interessado em saber o que estava acontecendo. 

Junto da cerveja, ele trouxe uma outra bebida com um degradê de rosa e azul, Erick ergueu as sobrancelhas em uma expressão confusa, e quase não pôde respirar quando percebeu o banco ao lado do seu ser ocupado por alguém.

 Opa! Essa é minha! - Disse uma voz de menino. 

O tal garoto tinha um sorriso tão branco que parecia brilhar, e como se não bastasse isso, seus olhos, incrivelmente verdes - ligeiramente diferentes do verde de Erick - o encaravam em um misto de interesse e curiosidade. 

Sua pele negra tinha um tom de chocolate tão lindo que só servia para evidenciar toda a beleza que emanava de seus poros.  E aí? Tudo bem? Você não parece combinar muito com o lugar. - Disse, dando uma risada descontraída e gostosa de se ouvir. 

 Uh...eu...estou acompanhando uma amiga. - O loiro falou a primeira mentira péssima que veio em sua mente, já que não estava afim de explicar o real motivo de sua vinda e toda a historia da dúvida que sentia.

 Sério? Eu também. - Murmurou em um tom estranho de empolgação, mantendo um sorriso de lado enquanto bebericava seu drink. Ele havia entendido perfeitamente que aquele estranho em sua frente estava dentro do armário, e talvez precisasse de uma ajudinha para sair.

Ambos ficaram em um momento constrangedor de silêncio por alguns segundos e Erick se viu obrigado a tentar quebrar esse clima, já que o garoto o observava como se ele fosse um animal muito exótico. Mas...não dava. Aquilo era estranho demais!  Eu tenho que ir. - Anunciou, levantando-se logo em seguida como se fosse sair correndo.

 Qual seu nome? O meu é Ethan. - O moreno também se levantou, esticando a mão para cumprimentá-lo. 

...Erick. - Murmurou em um fio de voz, pensando se realmente deveria fazer o aperto. 

 Olha, eu acho que é muito cedo para você ir embora. A sua amiga com certeza deve estar se divertindo muito por aí, por que não fica aqui comigo e a gente se conhece melhor? 

"Se conhecer melhor" 

Não era exatamente o que Erick queria, imagina se esse cara quisesse virar seu amigo?! E se a notícia de que ele estava em uma boate gay se espalhasse e todo mundo ficasse sabendo? Isso seria catastrófico de tantas maneiras! ...Mas por outro lado, aquele garoto havia sido o único a olhá-lo naquela noite, e já que estava ali se dispondo a tirar aquela maldita questão da cabeça...  Tudo bem. - O loiro voltou a se sentar no banquinho em que estava, notando o sorriso de Ethan aumentar consideravelmente.

Este, por sua vez, puxou o seu assento na intenção de ficar mais próximo, tamborilando os dedos sobre o balcão impecavelmente preto. — Eu vou querer uma cerveja, Tonny, igual à dele. - Disse ao barman, que o olhou de uma forma maliciosa e se pôs à ir buscar o seu pedido. 

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo