Ashley
Após o final das outras aulas caminhei até o ateliê em que trabalho há quase dois anos como uma das assistentes da senhora Jones, e essa é a melhor parte do meu dia. Descobri cedo minha paixão pela expressão da arte através da criação de peças, e desde então sonho em trabalhar como estilista um dia.
O ateliê está visivelmente movimentado quando entro nele. No fim do mês haverá uma grande festa de estreia de alguma série que já está dando o que falar em Hollywood, e a Sra. Castello trabalha com alguns dos artistas que estarão presentes no evento, por isso essa correria será o estado normal do ateliê até o próximo mês.
"Boa sorte com o dragão." Meu colega de trabalho, Renan, se aproxima com uma pilha gigante de rolos de tecidos nos braços. Seu resmungo, irreconhecível para mim, saiu em português mas ainda soou como um palavrão. Com o cenho franzido eu o ajudo pegando alguns dos rolos. "O que?" Meu amigo não responde e continua andando enquanto sigo atrás dele.
"Tive o azar de cutucar a onça com vara curta."
"O que você fez?"
"Eu diria se soubesse. Aquela mulher é louca de pedra, não sei como você consegue passar horas seguidas com ela sem cometer uma asassinato." Renan solta um bufo. “Eu passo fico naquela sala por menos de dez minutos e quero enfiar os alfinetes nos meus olhos.”
Eu não sou boa em fazer amigos e Renan foi uma das poucas pessoas que se aproximaram de mim e conseguiram ir além da fachada sociável. Graças a minha família que está quase sempre sob os holofotes, saber atuar e socializar é uma obrigação para mim, isso só não quer dizer que eu seja boa nisso além da coisa toda de fingimento. Como uma tempestade alegre, Renan me deixou confortável o suficiente para que eu fosse sincera. Seja eu mesma.
Minha família não sabe sobre meu trabalho. Minha mãe não se importa, particularmente, já o meu pai exige que meus irmãos e eu devemos nos dedicar inteiramente aos estudos. Estou surpresa que ele ainda não tenha descoberto, minha chefe e toda a equipe são discretos mas o nome Campbell não é exatamente desconhecido pela cidade. Talvez seja porque não são tão pública quanto meus irmãos. Por enquanto, Brian tem acreditado nas minhas muitas aulas particulares, atividades extracurriculares e grupos de estudos, quase todos falsos.
Renan e eu assistimos enquanto uma garota sai chorando do espaço da senhora Castello e essa é a desnecessária confirmação do que Renan disse.
Suspiro.
Lá vou eu, enfrentar o dragão de saia.
Joseph
Dirijo pelas ruas de Nova Iorque admirando a cidade em que morei nos últimos sete anos, sua a agitação é tão irritante quanto instigante. A melhor parte é que dificilmente alguém se mete demais na vida dos outros, bem diferente da cidade pequena em que cresci. Aqui, a menos que seja uma grande estrela ou algo assim, você não passa de uma pequena e insignificante formiga dentro de um enorme formigueiro.
Paro em atrás de um carro, quando o semáforo fica vermelho. Batuco os dedos no volante, impaciente com trânsito desta cidade.
Hoje é um dia diferente. Senti isso desde que acordei e até o momento tudo indica que não será de um jeito bom, considerando onde e com quem irei jantar hoje à noite. Suspiro, já sentindo minha paciência no limite.
Há anos trabalho sou advogado em uma empresa de advocacia, meu avô era um dos principais sócios da empresa e quando ele morreu, como seu único descendente, herdei sua parte na diretoria. Hoje tenho um compromisso importante com um dos outros sócios, um dos que me dá mais arrepios.
De repente escuto uma voz doce de criança. "Papai, vamos logo!"
Olho para a calçada e vejo um homem com duas crianças, uma menina e um menino, em frente à uma escola. "Calma princesinha, nós já estamos indo." O homem pega em uma mão de cada criança e os leva pela entrada do edifício.
Aquele sentimento ruim surge inevitavelmente. Inveja. Poderia ser eu ali, levando meu filho à escola. Infelizmente aprendi da pior forma que avida não é justa e nem sempre as reviravoltas são para melhor.
Saio dos meus devaneios com a buzina de algum carro atrás de mim. Percebo que o semáforo está verde e volto a dirigir para a empresa.
🌻 🌻 🌻
Já acomodado no meu escritório, escuto batidas baixas na porta e permito a entrada da minha secretária. "Senhor Crawford, vim passar seus compromissos do dia."
"Claro, sente-se e comece."
A Byeol fala todos meus compromissos para o dia com sua voz delicada e formal. Em vários anos ela foi a primeira secretária que trabalhou comigo e não tentou ir para minha cama. E conseguiu acompanhar o ritmo agitado da minha rotina. Depois de terminar o que fazia, a garota se retira com um pedido de licença e retorna para sua mesa.
Ser diretor de operações de uma empresa de advocacia não era meu sonho de profissão quando criança, nem de longe, mas a prendi a gostar do meu trabalho, as condições são boas e o salário é melhor ainda. Eu comecei de baixo aqui na H&M, apesar de ter um avô no topo, com o tempo, e algumas promoções, cheguei onde estou agora. COO – Diretor de Operações – de uma empresa multimilionária renomada. Possivelmente o auge da minha vida profissional. Ou não. Com a aposentadoria do senhor Hempton, a posição de CEO na empresa ficará vaga e ele deixou claro mais de uma vez que me indicará como um candidato ao posto para o conselho. Esse sim, pode ser o auge da minha carreira.
No entanto, não é apenas ele quem decidirá. Haverá uma votação no concelho e todos os membros decidirão o novo CEO. Essa votação em questão está acirrada. Estamos concorrendo ao cargo eu e outro membro do concelho, Daniel O’Connor. A maioria dos membros do concelho são senhores mais velhos, muitos deles amigos próximos de Brian, Daniel e do senhor Hempton. Por isso, apesar do apoio do senhor H. ser favorável para mim, ele não é decisivo. Na verdade, até alguns dias atrás eu tinha certeza de que não tinha chance contra O’Connor e seu rebanho de bodes velhos. Mas então o Campbell propôs que poderíamos chegar a um acordo de benefício mútuo, esta noite após um jantar com sua família.
Ainda não consegui descobrir a necessidade da presença de todo o clã, já que ninguém além do Brian está envolvido com a empresa. De uma coisa eu tenho certeza: Brian Campbell não dá ponto sem nó. Passei os últimos dias tentando imaginar o que ele poderia propor e oque ele poderia quere de mim. Porque é disso que se trata. Brian e a família Campbell podem vender facilmente a foto de família perfeita para os outros, mas eu sempre tive uma sensação sobre eles. Agora eles querem algo e acham que podem conseguir através de mim.
O restante do dia foi estressante e cansativo, tive várias reuniões, muitas delas repletas de velhos insuportáveis e ambiciosos que já deveriam estar aposentados em algum asilo.
Ao final do dia no meu escritório, levanto da cadeira e me aproximo da enorme parede de vidro. O pôr do sol adere ao céu, normalmente azul, uma tonalidade alaranjada com toques de coral. Muitos prédios já começam a ser iluminados. A cidade que nunca dorme, afinal.
Escuto a porta se abrir e permaneço com meus olhos fixos na paisagem, já sabendo de quem se trata. Desisti de avisar para aquele ser humano a bater na porta antes de entrar.
"Vim te desejar boa sorte e ser o seu consolo antes de entrar no ninho das cobras mas acho que você está em ótima companhia." Pelo reflexo da janela, vejo-o lançar um olhar para um copo e a garrafa de whisky sobre minha mesa.
"A única forma de conseguir me consolar seira dizer que você iria comigo." Oliver abre a boca para responder. "E realmente ir." E fecha novamente.
"Sou um bom amigo mas nem tanto."
Reviro os olhos e me jogo na minha cadeira com um suspiro. "Muita coisa está em jogo aqui."
Com uma expressão relaxada, Oliver senta em uma cadeira do outro lado da minha mesa.
"Como você consegue ficar de bom humor mesmo depois de todas aquelas reuniões?"
Oliver dá de ombros. "Não vale à pena ficar me estressando, pode afetar meu trabalho e dar rugas." Reviro os olhos. "Você está pronto para enfrentar a cova do dragão?" Sua cara forma uma careta.
"Não... Mas não há para onde correr, preciso ir."
"Boa sorte."
"Em outras situações eu dispensaria essas palavras, mas desta vez vou precisar delas."
"Aquela família não cheira boa coisa." Assinto em concordância. "Em algum momento a fachada vai cair e eu pretendo assistir de camarote." Dá um sorrisinho idiota.
A família Campbell, uma das famílias mais ricas e poderosas de Nova York, tem uma ótima fama de família perfeita, mas ainda me cheira mal. Brian e Giulia Campbell sempre foram bastante simpáticos e cordiais comigo e qualquer pessoa que os vi conversar, mas sempre tive a sensação de assistir um teatro em primeira mão. Oliver também os conheceu e tem a mesma impressão.
Arrumo minhas coisas e vamos para o elevador em meio a conversas, principalmente por parte do Oliver. Aperto o botão da garagem, no subsolo.
"Fiquei sabendo que o Nicholas está vindo para Los Angeles, poderíamos sair juntos."
Meu irmão, Nicholas, e Oliver são farinha do mesmo saco – como minha mãe diz. Esses dois quando se juntam são terríveis, não passam sequer uma hora sem me tirar a paciência. Uma noitada com eles, as vezes chega a ser sinônimo de crise de enxaqueca.
"Tanto faz, sei que se eu não aceitar vocês dois irão encher minha paciência até que mude de ideia."
"Não faríamos isso se você não agisse como um velho ranzinza, que vive reclamando de tudo e se afogando no trabalho."
"Eu não reclamo de tudo e não sou velho."
Ele ergue as sobrancelhas. "Me diga antão, meu jovem, qual foi a última vez que você realmente se divertiu ?"
Abri a boca para responder, mas ele me interrompeu antes que o fizesse.
"Sexo e se embebedar sozinho não conta."
Permaneço em silêncio buscando em minhas memórias.
"Viu só, você nem se lembra." Não respondo, apenas reviro os olhos e sua mão aperta meu ombro. "Joseph, você é meu amigo, a figura mais próxima de um irmão que eu tenho, é por isso que te digo: não passe o resto de sua vida definhando enquanto se afunda no trabalho. A vida é muito curta para perder tempo assim, por isso que deve aproveitá-la."
"Eu não..."
"Você é cabeça dura demais para assumir que estou dizendo a verdade, mas lá no fundo, sabe que é."
O elevador apita e dou por finalizada essa conversa fiada.
Ashley Já é tarde quando finalmente chego em casa e preciso correr para me arrumar. Mary, a governanta, resmunga quando passo correndo por ela no corredor. No meu quarto, me apresso em um banho e visto um vestido azul claro que foi presente da vovó Campbell. A saia dele é esvoaçante, enquanto o corpete é justo. As mangas são longas e um pouco bufantes, delicadas com a transparência do tecido. A peça é linda e delicada. Uma tiara com diamantes enfeita minha cabeça, assim como meu querido colar de girassol no pescoço. Aos sete anos encontrei ele em uma caixa de coisas antigas minhas. “Uma velharia”, foi tudo que minha mãe disse quando perguntei sobre o colar. Nos pés tenho um salto baixo branco e pretendo deixar meu cabelo solto. Em meu rosto há somente um pouco de rímel e gloss de cereja. Termino de me arrumar e observo meu reflexo no espelho atentamente. Vovô, vovó, Bella, Thony e Alexa falam que sou muito bonita, mas não consigo concordar. Acho minha aparência muito... com
Joseph Ashley. Um nome bonito, exuberante e doce que combina muito bem com a dona. Ashley tem uma suavidade que não costuma me atrair nas mulheres, muito pelo contrário. A irmã mais velha dela, no entanto, é exatamente o tipo de companhia que costumo procurar. E mesmo assim não era para Beatrice que eu roubei olhares durante o jantar. Com um suspiro interno lembro a mim mesmo que independentemente do meu interesse ela é jovem e é uma Campbell. Nunca fui de pintar uma esplendorosa imagem de alguém somente pela sua aparência e não vou começar agora, especialmente com alguém com esse sobrenome. Ao contrário da filha, Brian não calou a boca nem por um minuto e quanto mais ele falava, mais vontade eu sentia de enfiar um guardanapo na garganta dele. Mas a quem quero enganar? Há muito em jogo aqui e talvez, apenas talvez, a sua proposta seja viável. Tento não me agarrar muito à esperança. Após terminarmos de comer a sobremesa Brian me convida para ir em seu escritório para
Casamentos por conveniência não são incomuns entre a elite. Pelo que sei, geralmente são realizados entre os dois envolvidos, as vezes intermediado pela família, e em geral são adultos – com mais de vinte anos – tentanto fortalecer seu patrimônio. É claro que tudo o que sei sobre isso são boatos da alta sociedade. Não sou exatamente contra casamentos por conveniência, até acho prático, desde que seja realizado por dois adultos conscientes e não-coagidos. Com o histórico da minha família não sou um descrente no amor, tampouco um romântico incurável, apenas aceitei que algumas pessoas nasceram para encontrar o amor e outras não têm a mesma sorte. Também já aceitei que estou no segundo grupo. Há muito tempo parei de me imaginar casando com alguém, a ideia de me prender assim me dá arrepios, mas... Nunca diga nunca. Talvez, no futuro, eu poderia passar a considerar um casamento por conveniência. Com alguém da minha idade. Não me orgulho de admitir que pensei um pouco demais
Joseph Mais alguns dias transcorreram sem que aquela loirinha saia de minha cabeça e isto tem me deixado cada vez mais irritado. Algumas vezes ao dia Ashley retorna aos meus pensamento quando não estou totalmente focado no trabalho, e as vezes até quando pensava estar. Me lembro de cada detalhe dela, como se sua imagem estivesse gravada em minha memória e a verdade é que está. Depois de uma reunião longa e estressante, decidi ir buscar um café na cafeteria próxima a empresa. A Srta. Jeong se ofereceu para fazer isto por mim, mas eu precisava relaxar um pouco e uma pequena caminhada ajudaria. Atravesso a rua quando o semáforo fica verde e de repente meu celular vibra dentro do bolso de meu terno. Já na calçada, atendo a ligação. "Mãe." "Oi filho, como você está? Já lembrou que tem família?" Seu tom de repreensão me faz sentir como um garotinho que aprontou e está levando bronca da mãe. As últimas semanas foram cheias de compromissos exaustivos e não tive muito t
Olá leitores, peço mil desculpas pelo atraso das atualizações deste livro mas garanto que essa semana trarei novos capítulos. Também prometo manter uma constância de atualizações e não repetir atrasos como esse. Gostaria de acrescentar que tenho total intenção de finalizar esse livro e não vou abandona-lo. Isso é tudo, agradeço pela paciência. Olá leitores, peço mil desculpas pelo atraso das atualizações deste livro mas garanto que essa semana trarei novos capítulos. Também prometo manter uma constância de atualizações e não repetir atrasos como esse. Gostaria de acrescentar que tenho total intenção de finalizar esse livro e não vou abandona-lo. Isso é tudo, agradeço pela paciência.
Joseph É surreal o quanto a vida gosta de chutar nossa bunda de vez em quando. Há dias venho tentando não pensar nos Campbell, então o universo decide brincar com minha cara, colocando-a no meu caminho mais uma vez. Ashley parece linda e adorável em um vestido florido rosa, sandálias delicadas nos pés e um laço branco no longo cabelo dourado. Seu cabelo ondulado está solto e impecável. No entanto, apesar de linda, nem sua maquiagem parece capaz de esconder as olheiras ligeiramente escuras abaixo de seus olhos e isso estranhamente toca algo dentro de mim. Não. A vida dela não é da minha conta. Na verdade, ela não é da minha conta. "Desculpe, Sr. Crawford." Retorno minha atenção para seus olhos, ao ouvir a voz doce. "Está tudo bem, Ashley, eu estava distraído." Ela esboça um leve sorriso. Pare falso, ou talvez eu esteja vendo coisas. "Não esperava encontra-la por aqui. Na verdade, eu nunca tinha visto você por aqui." "Ah... não costumo vir aqui com frequência. Ger
Ashley "Tem certeza de que não podemos fazer esse trabalho na minha casa?" Bella repete a mesma pergunta pelo que parece ser e a décima vez nos últimos vinte minutos, desde que saímos da escola. "Eu já disse que só vamos pegar alguns livros e podemos ir à biblioteca. Meus pais provavelmente nem estão em casa, então não há nada a temer." Escuto seu bufo atrás de mim enquanto abro a porta. "Não tenho medo dos seus pais, simplesmente não gosto deles e nem eles de mim. É um consenso mútuo e funciona bem para todas as partes." E realmente era. Desde que meus pais colocaram os olhos nela, imediatamente a classificaram em sua lista mental de "más companhias", sem sequer terem trocado duas palavras. Com seu cabelo ondulado rebelde, piercings no nariz e orelhas, e a costumeira jaqueta de couro, Bella já resume algumas das coisas que Giulia e Brian mais abominam. Sua personalidade desapegada e sarcástica é o bônus. Eles sempre deixaram claro seu desagrado em relação
Joseph A tempestade que cai lá fora – anormal para essa época do ano, diga-se de passagem – combina com meu péssimo humor quando saio da sala de reuniões, deixando o bando de hienas para trás. As hienas em questão são a maior parte dos sócios da empresa. Aqueles que Brian Campbell tem em suas mãos para usar contra mim. Um bando de velhos que já deveriam estar aposentados há muito tempo, mas se recusam a perder a chance de aumentar mais e mais suas contas bancárias (já muito cheias). Teoricamente. Por que na prática tudo o que fazem é sentar em seus escritórios fumando charutos enquanto tentam se aproveitar ao máximo da empresa. Essa reunião me mostrou mais uma vez como tudo isso pode ir por água a baixo. Desde que o Sr. Hempton está se afastando gradualmente da empresa, os demais investidores estão tomando parte das decisões por aqui através de reuniões e votações, como a que acabei de participar, orientadas pelo vice diretor da empresa. O grande problema é