03. O anúncio, parte 1

Kendra

Existem pessoas que são caras de pau, é claro, mas a minha irmã ganha de qualquer uma delas. Se não tivesse tanto dessa sem vergonhice enrustida de coragem não estaria no meio da minha sala com uma barriga gigantesca do tamanho de um bebê de quase oito meses.

— Pode me trazer um pouco de água? É difícil andar sem ver os próprios pés — declara com um sorriso que me faz querer vomitar.

Nunca tivemos o melhor dos relacionamentos, mas depois do que aconteceu, da sua aventura com o meu noivo, tudo somente piorou, pois as suas alfinetadas possuem muito fundamento agora.

Irritada, não por ela me pedir água, mas por ser uma burra gentil que fará o que ela solicitar devido às suas condições, vou até a cozinha e pego um copo o enchendo com água da geladeira para levar até a sala, antes que chegue perto ouço sua voz dizendo que não pode beber água gelada devido a sua imunidade, ainda mais brava, faço um retorno rápido para jogar o líquido na pia antes de enchê-lo com água filtrada.

— Obrigada. — Seu agradecimento, seja nesse momento ou em qualquer outro sempre soará como uma mentira sem tamanho para mim, não importa o que esteja sendo feito. — Não me ligou depois que enviei os convites, queria ter certeza de que recebeu, não vai poder entrar sem ele. — Esfregar sal na ferida deve ser uma especialidade dela, uma da qual abusa.

— Recebi — respondo rapidamente. — Apenas não tive tempo para ligar, estou enrolada com o livro novo.

— Ah. — O suspiro acompanhando a sua sentença é completamente mortal, como um tiro que te atinge em um ponto vital e te dá apenas alguns segundos para ver a cara do sujeito que tirou a sua vida.

— O que foi agora Michelle? — Inquiro, me parando quando noto que o meu tom está ficando alto, indo além do limite e não quero que diga que a fiz ter qualquer problema em sua gestação, pois esse é o medo de todos, de que um dia eu surte e acabe com a felicidade da minha irmã, quando foi ela que cometeu um erro primeiro.

— Não só... até quando vai continuar insistindo nessa vida, olhe para você, está acabada, vive em um apartamento qualquer, não tem uma vida estável, como vai poder encontrar alguém se vive desse jeito? — Mordo a parte de dentro da minha boca segurando todas as minhas palavras, porque sinto que se a abrir agora irei começar com uma discussão que vai fazer com que ela tenha seu filho no meio da minha sala.

— Você precisa decidir Michelle, veio aqui para me atormentar por conta do seu casamento ou devido ao meu emprego? — A pior parte disso é não poder ter uma discussão de verdade com ela. Com certeza.

— Acha que nossos pais ficam felizes em ver como vive? — Indaga, me aponta um dedo no meio da cara, como se eu precisasse disso para aprender o que é ter uma vida estável como ela, uma advogada muito bem formada que conseguiu bons casos antes de decidir caçar o meu noivo.

E sim, não estou sendo a vilã por ser aquela que levou um chifre, ela admite para qualquer um que o caçou, que tentou o que podia para que tivesse a sua atenção, pois segundo minha amada irmã eu não o amava, seu amor era maior que o meu, era o que ele merecia ao invés de pegar as minhas migalhas.

— Não peço dinheiro a nenhum de vocês, então, não tenho ideia de porque a minha vida tem a ver com o que querem — profiro, Michelle não tem ideia, ninguém da minha família tem conhecimento quanto aos livros que lancei com pseudônimo, são eles que enchem a minha conta e pagam meus boletos, os únicos livros que sabem que escrevi foram os que não fizeram sucesso, aqueles que foram escritos com o meu nome assinando como autora.

Eles não têm ideia da minha identidade como Ivy Morrel. Nada do que foi conquistado por ela está em conhecimento deles. Nem quero que saibam, pois sei que não mudará a forma como me veem.

O jeito como vivo é o modo que me faz sentir bem, não tem nada a ver com condições financeiras. Esse apartamento foi o primeiro lugar em que fiquei depois de sair de casa, ele tem um apreço especial em minha vida e quando consegui comprá-lo chorei por dias de felicidade.

— Nossos pais se preocupam com você, acham que vai morrer velha e gorda com o tanto de merda que come — fala, aponta para o cesto de besteiras posicionado estrategicamente perto da poltrona onde me sento para assistir minhas séries favoritas.

Realmente como muitas bobagens, mas não significa que não me cuido.

— Se for o que quero é assim que vai acontecer.

— Não haja como se fosse a dona da razão, sabe que escolheu errado ao sair de casa. — Respiro fundo, penso pela milésima vez que é uma mulher grávida, que não posso brigar como gostaria com ela ou posso ser acusada de homicídio duplo. — Esse trabalho nunca renderia, mas insistiu nisso e acabou nessa cova, aceite quando as pessoas querem ajudar.

— Igual a quando decidiu que meu noivo deveria ser o seu marido?

— Não fale desse jeito comigo, por mais que me olhe desse modo sabe que se ele te amasse nunca teria vindo atrás de mim, que as minhas tentativas não teriam dado em nada. Não tenho culpa de você não ter entregado o que ele esperava de uma noiva. — 1001 maneiras de não matar alguém, deveria ser o meu próximo livro a ser lançado, pois a cada vez que me encontro com a minha irmã tenho vários pensamentos que se encaixariam nessa temática.

— Michelle, seus comentários ficam piores a cada vez que nos encontramos, então, se puder não falar sobre o assunto te agradecerei — arrazoo ligeiro, espero que desista do que veio fazer aqui e decida que tem que ir para casa, pois o que mais quero agora é ficar sozinha para mais uma vez processar o fato de que segundo a minha irmã não fui mulher suficiente para manter o meu noivo, único motivo para Roger ter a escolhido.

— Não fuja, você sempre foge quando as coisas começam a dar errado, foi assim com o seu noivado — peço para os céus paciência, porque não sei se posso passar de hoje sem ter um troço.

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