Lenna nunca gostara de suspense. Fugia dos filmes do gênero, lia as duas últimas páginas de um livro antes de iniciá-lo e nunca reclamava de receber spoilers. O suspense era como uma unha encravada, incomodava e sempre machucava mais segundos antes de ser retirada, o alívio vinha depois, é claro. Enquanto segurava o telefone esperando a voz misteriosa do outro lado da linha expor seus motivos, ela controlava a respiração, sabendo que se demonstrasse que estava interessada demais, podia ficar muito exposta e suscetível aos caprichos do criminoso.O departamento que nunca parava estava tão silencioso quanto, apenas ela e um técnico enviado para conectar o celular em um aparelho feito para rastrear o sinal estavam no prédio."Quero ajudar você." Disse a voz, finalmente."Pode me ajudar começando pelo seu nome e o motivo de estar fazendo isso." Disse Lenna."Não tenho um nome.""Como seus pais o chamam?""Não tive pais.""E amigos?""Nenhum verdadeiro.""Certo, do que quer ser chamado? D
"Você tá escondendo alguma coisa." Falou Oliver, jogando uma garrafa de água para Max. Ele a pegou no ar com uma das mãos, enquanto colocava a barra no descanso com a outra mão.Max se sentou, rompeu o lacre da garrafa e bebeu. Tinha feito mais séries de exercício com a barra do que costumava fazer, perdeu a contagem várias vezes pensando em Lenna, então reiniciou.Oliver continuou esperando por uma resposta. Como Max, ele havia sido amaldiçoado na antiguidade, transformando-se em lobo durante dez horas seguidas do dia, paciência era uma virtude que havia sido obrigado a exercitar, mas que por sua escolha continuava sem praticar."Desembucha." Exigiu Oliver, tirando a bandana da cabeça para amarrá-la novamente no lugar. - Me contou sobre os caçadores militares secretos que voltaram a dar as caras, mas tem alguma coisa além disso."Sabe porque chamei você e não o seu irmão?" Questionou Max, amassando a garrafa para acerta-la no cesto do lixo."Por que sou mais charmoso que Louis?" Brin
A ideia de continuar sozinha com Max, quando ele era tão descarado, para não dizer sedutor, foi o que fez Lenna convidá-lo para tomar um café em uma lanchonete. Ela esperava que estar fora de um ambiente privado fosse reduzir as tentativas dele.Lenna tinha visto o lugar enquanto dirigia até a casa dele, um prédio antigo, mas bem cuidado em seu interior, com tintura rosada nas paredes e toalhas de mesa vermelhas.O cheiro de pães, tortas e bebidas quentas flutuavam pelo ar quando eles entraram. Lenna sentou na cadeira em frente a de Max. O assunto era sério demais para que ela se deixasse distrair novamente por ele, o que recorrentemente era o que vinha acontecendo sempre que se encontravam.Seja profissional, falou mentalmente, cruzando as pernas em baixo da mesa quando se sentou, ela aguardou Max fazer o mesmo."Precisamos conversar." Falou de modo duro."Você quer respostas." Disse Max, olhando para ela com interesse.Lenna assentiu suavemente com a cabeça."Estou com um grande pro
Lenna não desejava fugir de Max, mas o costume era convidativo e seguro. Era mais simples se afastar e pensar com cuidado sobre o que haviam conversado do que continuar a encará-lo.Max não pensava assim, por isso correu até Lenna e segurou um de seus braços. Lenna pensou que ele insistiria em dizer para ela ficar, que ele se aproximaria e a beijaria ou tomaria qualquer outra atitude que fosse surpreendê-la e bombardeara com emoções, mas tudo que Max fez foi segurar firme seu braço, seu rosto assumindo a mesma expressão séria de minutos atrás, ele falou em um tom baixo, quase inaudível, deixando claro o perigo que poderia estar os rondando."Estamos sendo seguidos."Lenna sentiu os sentidos do corpo entrarem em alerta, ela começou a virar o rosto em busca de suspeitos, mas Max se aproximou com um passo, cobrindo seu campo de visão.As pessoas que transitavam pela calçada, continuavam a passar por eles, os ignorando enquanto tinham suas próprias pendências para resolver. Quem estivesse
Vincent Carter já havia esquecido quantas vezes disseram que ele não era um herói.Mas em especifico, lembrava-se de três vezes, a primeira quando tinha onze anos e morava antes da zona rural de uma pequena cidade do interior, se bem, que não há muitas diferenças entre zonas rurais e cidades pequenas do interior, como Vincent aprendeu na escola da cidade ao lado, era tudo uma questão de onde começam as cercas e de quando os alunos nativos param de lhe chamar de caipira.Vincent morava em uma casinha de tinta amarela com goteiras no alpendre que formavam cascatas nas paredes sempre que chovia forte no inverno, deixando madeira podre p
A segunda vez que Vincent se lembrava de ouvir que não era um herói, foi cinco anos depois, quando ele tinha dezesseis. Estava no ensino médio, na época em quer ser um bom garoto significava não cheirar pó, roubar o carro do pai ou comprar bebidas com uma identidade falsa.O telhado do alpendre havia sido consertado quando o pai colocou a casa a venda e eles se mudaram para a cidade ao lado, onde Vincent estudava durante o primário e passou a fazer o ensino médio. Ele já não tinha mais sua bicicleta vermelha ou os potes com moedas em baixo da cama. Invés disso trabalhava meio período como balconista em uma lanchonete e juntava o dinheiro do salário na esperança de ir embora, talvez começar uma faculdade. O trabalho não se resumia a apenas receber o dinheiro, ele também limpava mesas, recolhia pratos e acalmava as coisas quando os rapazes do time de basquete se excediam, indo sem convite para a mesa das garotas.Seu pai tentou o convencer a entrar no time, Vincent tinha o porte atlétic
"Quer bancar a porra do herói, Carter? Então lida com isso!"Vincent mal tinha se recuperado do primeiro soco quando Pit bateu de novo, o socando na barriga, fazendo o ar sumir, Vincent caiu de joelhos."Fracote." Disse Pit, cuspindo no chão, ele iria chutar Vincent, descontando toda sua ira nele, se o último garoto do grupo, o que ainda estava sentado em das cadeiras da mesa, não tivesse o impedido."Cara já tá bom, vamos sair daqui." Falou, puxando Pit. "Se o treinador descobrir, o problema vai ser nosso.""Teve sorte, babaca." Disse Pit, indo embora com os amigos. Ele parou no sopé da porta e fez um gesto obsceno para Lisa. "Ainda vou te pegar, piranha."Quando eles saíram, Vincent esticou o braço para pegar o diário no chão, era um caderno simples com capa de couro. Lisa o recuperou antes dele, as mãos dela tremiam levemente, ela juntou as folhas que Pit havia arrancado com rapidez, depois se levantou segurando o diário perto do peito, como se fosse uma tabua de salvação em meio a
"Os seus olhos... " Disse Vincent ofegante.Lisa piscou e o efeito desapareceu, eram apenas olhos comuns de um azul claro, acinzentado e tempestuoso. Vincent pensou que o cansaço, após percorrer quase toda a escola, deveria ter feito com que ele visse coisas que não existiam. E aquilo não era tão importante no momento, sua prioridade era avisar Lisa sobre Pit."Lisa, você tem que sair da escola. Pit está aqui, ele parece pronto para arranjar confusão e eu acho...acho que ele está procurando você." Falou de forma urgente, era a maior frase que já havia trocado com Lisa e só depois de dizê-la, Vincent se deu conta de como deveria ter parecido tolo, preocupado.Ela esboçou o início de um sorriso. Uma corrente de ar passou por ele, zunindo em seus ouvidos, agitando as folhas das árvores lá embaixo. Vincent pode escutar alguém subindo ás escadas até o terraço."Ah, eu deveria ter matado ele." Disse Lisa com um suspiro, se levantando do chão. Pit abriu a porta para o terraço, parecendo ma