Prólogo

LOUISE

Oito anos atrás

Verona está ansiosa, batendo as mãos, com um sorriso enorme no rosto. Minha irmãzinha nunca esquiou antes e ficou pedindo por meses para os nossos pais realizarem o pedido dela, e como prometido, agora estávamos diante de um hotel enorme, cheio de neve por todos os cantos.

É seu aniversário de dez anos e confesso que ela se tornou uma jovenzinha muito da rebelde, assim como eu na idade dela. Papai e mamãe ficaram meses guardando o segredo da viagem e foi um sacrifício para mim e nossa irmã mais velha, Penelope, ficarmos quietas, mas no fim deu tudo certo.

Quando Verona descobriu, uma semana atrás, que finalmente ela iria realizar o seu sonho, ela foi correndo pro quarto se vestir para ir comigo e mamãe ao shopping para comprarmos algo quente e confortável para ela. No fim, Verona saiu com quase todas as sacolas lotadas de roupas cor-de-rosa.

Agora, diante do hotel rústico e com um cobertor de neve gigante no telhado, Verona sorri como se tivesse ganhado na loteria. Acho que nunca a vi tão empolgada em toda a minha vida.

— Isso vai ser demais! — diz alegremente.

Sorrio e assinto com a cabeça, concordando.

Mesmo não gostando muito da ideia de passar quase um mês longe de casa, rodeada de gelo e roupas quentes, eu saí do carro, com as mãos aveludadas entrelaçadas com as de Verona. O vento congelante corta nossas bochechas pálidas, mas antes que eu consiga protestar, mamãe saiu do carro e junto com papai, nos levaram para dentro.

A verdade era que eu queria estar com a Pen, mas ela estava em outro estado, curtindo a vida da faculdade e liberdade. Eu não a culpo, já que aturar a mamãe era uma tarefa difícil.

Donna, nossa mãe, era uma mulher pequena, assim como nós três, e com cabelos loiros e ondulados, caídos perfeitamente ao redor de seu corpo. Ela era linda, uma mulher digna de uma modelo dos anos oitenta, que nunca saia do salto alto.

Eu era a mais parecida com ela fisicamente. Com os lábios em coração, magricela, e olhos verdes. Já papai, Thomas, conseguiu transferir os fios castanho-escuro para Verona, que agora com dez anos, tinha deixado eles caírem até seus ombros pequenos.

— Mas antes eu preciso comer alguma coisa — comento enquanto subo as escadas de madeira que dão acesso ao hall de entrada.

Mamãe e papai chegam logo atrás de nós, cada um carregando uma mochila. Nossas malas grandes estão sendo transportadas até nossos quartos por homens uniformizados de preto e cheios de força. Eles passam por nós com caretas no rosto, possivelmente xingando a mamãe pela quantidade de malas. Só as dela devem ser umas oito.

Olho com pena, mas antes que eu possa me oferecer para ajudar, Donna pega minha mão e a de Verona e nos leva até a recepção.

— Estamos com uma reserva no nome de Witcaster. Nos dê logo as chaves, mocinha, vai, vai. — mamãe faz um gesto com as mãos como se estivesse expulsando-a dali.

Antes que a recepcionista possa se quer respondê-la, papai se coloca do meu outro lado e passa as mãos pelos ombros de Verona.

— Vá logo, estamos cansados da viagem e preciso dormir. — diz ele, com rispidez.

— Papai! Mamãe! — os repreendo, revirando os olhos. — Desculpe os maus modos dos dois. — Finalizo, olhando para a menina doce de olhos verdes e confusos diante de nós. No seu crachá está escrito que se chama Aimee.

— Querida, por favor, ela certamente sabe quem somos, não precisamos nos preocupar com toda a burocracia desse lugar. Viemos aqui milhares de vezes antes de... — mamãe olha para Verona com o canto de olho. — bem, não importa. Somos clientes excepcionais, não é querido? — mamãe sorri para o marido, que dá de ombros.

Reviro meus olhos.

— Como assim? — questiona V, com os olhinhos perdidos.

— Não é nada não.

Digo e faço carinho em seu cabelo loiro.

— Witcaster, né? Deixe-me verificar, só um instante — diz ela tentando não gaguejar. Donna faz cara de poucos amigos e encara da cabeça aos pés, possivelmente julgando o modo que a menina se veste. Com o uniforme levemente amassado, a saia que cai até os joelhos um pouco dobrada e a meia calça preta e felpuda, da mesma cor dos sapatos, com neve que mostra que minutos atrás ela estava fazendo alguma coisa que não era dentro do hotel. — Certo, vejo aqui estão com dois quartos reservados, correto? O do casal é número 369, no último andar. Já o das meninas, com duas camas separadas, fica ao lado, o número 368. É só subirem de elevador, virando à direita. — diz e aponta com a mão para um corredor que dá para seis elevadores.

— Obrigada, queridinha — diz mamãe e pega as chaves assim que Aimee as entrega. — Avise o serviço de quarto que não queremos que nos atrapalhem hoje, o.k?

Aimee assente em silêncio e consigo enxergar o medo em seus olhos. Para ela, somos como a família do presidente. A única diferença é que o que minha família são hotéis de luxo. Felizmente, aquele não era um dos nossos. Se fosse, mamãe já a teria despedido quando tivesse visto a sujeira em seus sapatos.

Enquanto caminhamos em direção ao elevador, Verona tagarela sobre seus planos pelos próximos dias, pulando para um lado e para o outro sem parar. Tento me concentrar nas palavras dela, mas a única coisa que consigo pensar é em comer alguma coisa quente e quem sabe ir para a sauna assim que ela descansar um pouco. Se isso for possível, é claro.

— Está me ouvindo, Lou? — Questiona ela, brava.

Pisco algumas vezes. Ela tenta cruzar os braços, mas o casaco de frio é enorme, o que faz com que ela desista depois de um tempo.

— Está falando como está ansiosa para esquiar e ver um pinguim.

Ela bufa

— Mas mamãe disse que só vamos fazer isso amanhã.

— Já está de noite, V. Está tudo fechado.

— Por que não viemos mais cedo então?

Sorrio, achando graça de sua atitude birrenta. Somos parecidas em muitas coisas, ser dramática com certeza é uma delas.

— Porque o papai tinha que trabalhar, se lembra? — Thomas diz, sorrindo como eu.

— Deveria ter marcado a reunião para ontem. — diz enquanto revira os olhos.

Ter chegado de noite no Alyeska Resort não tinha sido uma boa ideia, já que não teríamos como aproveitar nada, mas papai não tinha como mudar o horário daquela reunião semestral com os acionistas do hotel que ele é dono.

Não demorou mais do que três minutos para chegarmos em frente às portas de nossos quartos. Ambas estavam abertas, com os homens que eu avistei minutos antes, colocando nossas malas.

Quando eles saem, nossos pais nem se dão ao trabalho de nos desejar boa noite e fecham a porta do quarto. Verona abaixa a cabeça, triste, mas seus olhos brilham no instante seguinte ao notar que sua cama era maior do que a que tem em casa, em Nova York.

— AI MEU DEUS! — berra, se jogando no colchão. — ISSO AQUI É DEMAIS! Olha só isso! — diz, saindo da cama e indo para a varanda. — Tem vista pra montanha, Lou, olha, olha!

Rio alto e vou até onde ela está. Verona apoia as mãos na mureta da sacada de madeira marrom escura.

— Deixa eu ir lá — aponta para um teleférico à poucos metros do hotel.

— Amanhã, V, hoje você precisa dormir, ou se não vai ficar cansada amanhã e não vai aproveitar nada.

— Isso não é justo! — protesta.

— Nada é justo nesse mundo, sabia? Agora bora pro banho! — digo e puxo suas mãos para que caminhe comigo para dentro do quarto.

Enquanto ela se prepara para o banho, eu separo seu pijama e suas roupas de baixo, colocando-os em cima da bancada que fica no banheiro, perto do chuveiro. Faz dois anos que Verona se recusa a deixar alguém dar banho nela, pois diz ser muito grandinha. Mas de vez em quando ela me chama para lavar seus cabelos quando está cansada demais de tanto brincar. Geralmente é quando estamos em casa, com nossos pais, ou viajando.

Verona começa a cantarolar uma música de um dorama que ela começou a assistir na semana passada, e eu sorrio. Minha irmã aproveita todo segundo que tem livre para colocar seus episódios em dia, e eu não posso culpá-la, já que faço o mesmo.

Dez minutos se passam até ela sair do banheiro com seu pijama felpudo cor-de-rosa.

— É a sua vez — anuncia, jogando-se na cama.

Assinto em silêncio e começo a procurar minhas coisas para tomar banho. Minha irmã fica me observando, com as mãos apoiando a cabeça, o cabelo solto e bagunçado. Enquanto me preocupo em levar tudo que preciso para o banheiro, ela decide que eu não sou mais uma boa diversão e começa a procurar o controle da televisão.

— Será que aqui tem N*****x?

— Deve ter. Quer que eu coloque para você?

— Quero.

Eu pego meu pijama e minha nécessaire e deixo em cima da cama. Então vou até ela e, em menos de cinco minutos, lá está Verona, assistindo seu dorama favorito. E então eu finalmente me vejo debaixo da água quente caindo sobre meus ombros doloridos de tanto me posicionar de maneira errada no jatinho da família. Verona ficou dormindo em cima de mim a maior parte do tempo.

                                                                               ★

São quase três horas da manhã quando acordo com Verona em cima de mim. De novo.

Estou tão acostumada com seus braços ao redor do meu corpo que nem me incomodo quando ela me aperta de leve, como se eu fosse um urso de pelúcia. Mas não dura muito aquele gesto, pois ela se vira e começa a abraçar o edredom, me empurrando para fora da cama com os pés.

Solto uma risadinha e me levanto. Vou ao banheiro, e depois de fazer minhas necessidades e lavar as mãos, sinto minha barriga roncar.

É então que me lembro que todos comeram durante a viagem, menos eu, porque não gosto de comer no avião, já que me dá ânsia de vômito, mas para a minha sorte, o restaurante do hotel fica aberto 24h, então minutos depois me encontro colocando meu roupão mais quente e minhas pantufas e saindo do quarto.

O lugar está estranhamente quieto, mas não me importo. Seria estranho se estivesse pessoas passeando pelos corredores à essa hora da madrugada. O elevador chega no meu andar, e então, com um susto, arregalo os olhos quando um corpo tromba com o meu.

— Ai, não é esse o andar — diz a voz.

Olho para cima e fico petrificada, parada como uma estátua de pedra.

— Desculpa aí — diz o menino.

É um jovem um pouco mais velho do que eu, que tenho dezesseis. Ele está usando um conjunto de pijama americano azul marinho.

— Você sabe onde fica o restaurante? — pergunta ele.

Não digo nada. Fico em completo silêncio. Ele tem cabelo preto, olhos puxados, com certeza coreano, e dentes mais brancos do que a parede de gesso de casa.

— Você é a garota de hoje cedo, não é? Te vi com sua irmã mais nova, eu acho. Ela não parava de falar e você parecia que não estava nem um pouco a fim de escutá-la.

— Quê?

Ele ri.

— Esquece. — Ele ri. — Voltando para a minha pergunta, você sabe onde fica o restaurante?

— Ah, fica no térreo.

— Valeu, loirinha. — diz, já apertando o botão T.

— Ei, espera! — digo, entrando no elevador.

— Ah, achei que estava parada lá por diversão.

Franzo o cenho para ele.

Ele estende a mão. Quando ofereço a minha para cumprimenta-lo, nosso toque é quente, estranho. Ele ri e se afasta. — Eu sou o Nicolas.

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