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Dois: Parabéns, Louise, excelente começo de dia.

LOUISE

— Louise, acorda! O hotel não vai se gerenciar sozinho! — grita Verona do corredor, batendo na minha porta como se fosse o fim do mundo.

Abro os olhos com um susto, meu coração já batendo forte. O sol entra pela janela, iluminando o quarto e me lembrando que, sim, é hoje. O primeiro dia. E claro, como é que eu poderia esquecer que minha irmã tem o volume de voz de uma sirene de ambulância?

Como é que essa garota sempre acorda tão cedo e tão... barulhenta? Dou um suspiro e enterro o rosto no travesseiro por mais alguns segundos, tentando fingir que posso ficar ali para sempre, longe das responsabilidades. Mas quem eu quero enganar? A vida de herdeira não permite dias de folga, especialmente quando o hotel da família está envolvido.

Não sou a herdeira de fato. Sou a irmã do meio, o que significa que eu só assumirei algo da família caso algo aconteça com a minha irmã mais velha, mas tendo em vista que ela não pretende seguir os passos dos nossos pais e quer ir para Londres fazer sei lá o quê, cabe a mim tomar alguma iniciativa.

E talvez eu seja a única das três filhas de Thomas e Donna Witcaster que realmente se interessa por hotelaria. Minha irmã mais nova ainda não decidiu o que quer fazer. Ela está na dúvida em ser atriz ou em ser digital influencer. Qualquer que seja a sua opção, creio que nenhuma será aceita por nossos pais.

— Já ‘tô indo! — resmungo, minha voz abafada pelo travesseiro. Mas Verona, como sempre, ignora meu tom de exaustão.

— Está atrasada, irmã! — Verona grita de algum lugar no corredor, batendo na minha porta de novo.

Eu me espreguiço, os olhos se abrindo para o meu quarto imenso. Uma cama king-size com uma cabeceira acolchoada, feita de veludo bege claro, ocupa o centro do espaço. A luz suave que entra pelas janelas amplas ilumina a decoração neutra e sofisticada — um tapete macio de pelos claros cobre o chão de madeira escura, e um lustre de cristal pendurado no teto adiciona um toque de elegância clássica. Ao lado da cama, duas poltronas brancas, impecavelmente colocadas, estão viradas para a grande janela, que dá para o jardim. Eu sempre amei esse ambiente — espaçoso, mas aconchegante o suficiente para me sentir em casa.

Bomi, meu golden retriever, está deitado ao pé da cama, e se agita quando começo a me mexer. Ele já sabe que estou prestes a levantar e, inevitavelmente, ele me seguirá até o banheiro.

Ainda sentada na cama, olho para o meu closet. É um sonho. As portas de vidro revelam uma organização impecável — prateleiras perfeitamente alinhadas com roupas de todas as cores, uma fileira de sapatos em exposição, e gavetas milimetricamente planejadas. No fundo, uma luz suave emoldura os cabides de blazers e vestidos. O lugar tem mais estilo do que eu em alguns dias.

Levanto, passando as mãos pelos cabelos loiros enquanto vou até o closet. Bomi vem logo atrás, balançando o rabo como se esse fosse o momento mais emocionante do dia dele. E nem são sete horas da manhã.

— Primeiro dia de trabalho! Quem será que vai errar mais? Você ou o gerente bonitão? — ouço a voz de Verona soar pelo corredor.

Eu reviro os olhos, mas não consigo evitar um sorriso. O comentário dela me faz lembrar de ontem à noite e, principalmente, das minhas interações com o tal "gerente bonitão". Nicolas... O rosto dele surge na minha mente, seus olhos intensos, o jeito confiante de andar pelo salão como se ele fosse o dono do lugar, e não eu. Aperto minhas bochechas até ficarem vermelhas, tentando afastar a lembrança, mas é inútil.

Que vergonha! Eu não deveria ter sido tão provocadora com ele. Na hora, parecia engraçado, uma maneira de quebrar o gelo, mas agora, de manhã, tudo parece... meio bobo. O tipo de coisa que fica ecoando na sua cabeça no dia seguinte, te fazendo pensar: Por que eu disse aquilo?

Decido ali mesmo: hoje vou pedir desculpas. Melhor resolver logo isso antes que fique mais estranho do que já está. O que ele deve pensar de mim?

Filha do chefe. Subordinada dele. A situação não é nada boa do meu lado da história. Que ótimo.

Saio do closet já vestida com uma calça moletom, uma camiseta branca justa e meu cardigã bege favorito, caminho até a janela ainda meio zonza por causa do sono e olho para a praia ao longe, as ondas quebrando suavemente na areia. O mar está calmo, uma ironia considerando como estou por dentro. A nossa casa azul nos Hamptons sempre me trouxe paz, mas hoje, mesmo com o sol brilhando lá fora, só consigo pensar no que está por vir. O hotel. O trabalho. Nicolas. Preciso manter a cabeça no lugar.

Desço as escadas com passos lentos, tentando ensaiar na mente o que vou dizer para ele. Talvez eu comece com um “bom dia” casual... ou vou direto para o “desculpa por ontem”? Mas, antes que eu possa continuar o raciocínio, entro na cozinha e sou recebida por uma verdadeira cena matinal: Verona, Penelope, mamãe e papai já estão todos lá. Parece uma reunião de família para discutir o grande dia da filha prodígio.

Penelope, minha irmã mais velha, está sentada com uma xícara de café entre as mãos, as sobrancelhas ligeiramente franzidas enquanto examina cada detalhe ao redor, como se estivesse julgando o mundo ao seu redor, ou talvez só a minha aparência de quem acabou de levantar. Ela sempre foi tão... séria. Muito mais do que eu.

Verona, por outro lado, está praticamente dançando pela cozinha, cheia de energia, como se tivesse acabado de beber três cafés. É bem capaz que ela tenha tomado muito mais do que três xícaras cheias de cafeína, mas tento ignorar toda a sua empolgação. Não é como se ela não acordasse assim todo dia desde o instante em que aprendeu a sair da cama sozinha ainda quando criança.

Mamãe, claro, está impecável como sempre. Com um avental preso sobre o vestido, ajeita o colar de pérolas enquanto mexe algo no fogão. Ela nem precisa dizer nada para que a presença dela me acalme um pouco. A mulher parece ter saído de um filme dos anos sessenta.

E papai... bem, ele está lá com seu eterno jornal, absorto no mundo dos negócios, como se a responsabilidade de administrar um império de hotéis fosse tão simples quanto tomar uma xícara de café.

— Bom dia, sunshine — diz Penelope, sem levantar os olhos da xícara de café, mas com aquele tom típico dela que mistura sarcasmo e carinho.

— Vai lá, hoje é o seu grande dia. Não esquece de sorrir pra não assustar os hóspedes — Verona acrescenta, me cutucando de leve com um sorriso travesso no rosto.

Suspiro e dou um sorriso forçado, sentando à mesa com o resto da família. É sempre assim. Eles se divertem com a minha ansiedade, mas é o jeito deles de me animar, eu sei disso. Porém, não ajuda muito quando o estômago já está dando voltas.

— Bom dia pra vocês também, né? — tento responder com um pouco de humor.

Olho em volta da cozinha e sinto uma leve ausência. — Alguém viu o Bomi?

Como se tivesse escutado, Bomi aparece na porta da cozinha, abanando o rabo de forma frenética. Meu coração se aquece um pouco. Ele é o único ser nessa casa que não espera nada de mim além de carinho e, quem sabe, um pedaço de torrada. Ajoelho-me para fazer carinho nele, e ele me lambe o rosto, me arrancando uma risada. Ah, como eu queria ser tão despreocupada quanto ele.

— Nervosa, querida? — pergunta mamãe, com aquele tom suave e acolhedor que só ela tem, me observando enquanto empurra um prato de torradas na minha direção.

Levanto os ombros, tentando disfarçar o nervosismo que cresce a cada segundo.

— Um pouco. Mas na real, só quero passar por isso sem tropeçar na frente de todo mundo.

Papai, que até então estava escondido atrás do jornal, finalmente me dá atenção. Ele levanta os olhos, uma sobrancelha ligeiramente arqueada.

— Você vai se sair bem, Louise. Lembra que o hotel é da sua família. E... — ele faz uma pausa que me deixa inquieta — aproveita a oportunidade para observar o Nicolas. Ele é o gerente agora, mas quem sabe no futuro...

A garganta fecha por um segundo. Nicolas de novo. Como se eu já não estivesse pensando nele o suficiente. De repente, a torrada parece impossível de engolir. Tento não demonstrar nada, mas sei que a cor do meu rosto me trai.

— Vamos ver... — digo, tentando mudar de assunto. Mas por dentro, já estou começando a planejar mentalmente o pedido de desculpas que vou ter que fazer. Será que ele achou que eu estava flertando ontem? Meu Deus, eu não sei o que fazer.

Termino meu café e me levanto da mesa, fingindo uma confiança que eu definitivamente não sinto.

— Certo, vou me arrumar. Não posso chegar atrasada logo no primeiro dia.

Subo pro meu quarto, onde a calma finalmente me encontra. Enquanto o chuveiro despeja água quente sobre mim, fico pensando na noite anterior, nas palavras que saíram da minha boca sem filtro.

Escolho um vestido que parece simples, mas elegante. Não quero parecer que estou me esforçando demais, mas também não posso ir como se estivesse indo para uma festa qualquer. Quando me olho no espelho, me sinto bem, apesar do estômago ainda revirado.

Agora é só ir, encarar o dia. E o Nicolas.

                                                                                     ★

Eu dirijo até o hotel com as mãos firmemente no volante, o som da minha playlist favorita da Taylor Swift tentando acalmar os nervos que estão à flor da pele. É ridículo ficar tão ansiosa para o primeiro dia de trabalho no hotel da minha própria família, mas aqui estou eu, com o estômago embrulhado como se fosse o primeiro dia de escola. Quando o imponente edifício do Hotel Witcaster aparece à minha frente, sinto um nó se formar na garganta.

O hotel é uma verdadeira obra de arte, com uma fachada que mistura modernidade e tradição. Ele se ergue com orgulho entre os prédios de Nova York, e seus funcionários, impecavelmente uniformizados de vermelho — um toque clássico dos grandes hotéis da cidade —, se movem em uma coreografia cuidadosamente orquestrada.

Assim que estaciono na entrada, um valet rapidamente se aproxima, abrindo a porta do carro.

— Bom dia, senhorita Witcaster — ele diz com um sorriso formal, enquanto eu saio do carro, tentando manter minha pose confiante.

— Bom dia! — forço um sorriso, entregando as chaves. Apesar de estar familiarizada com todo esse tratamento, não consigo evitar a sensação de que todos estão me observando. Deve ser coisa da minha cabeça.

Enquanto caminho em direção ao saguão principal, meus saltos ecoam pelo chão de mármore polido. O lugar é magnífico. Lustres de cristal pendem do teto altíssimo, espalhando uma luz suave por todo o ambiente. O mármore claro contrasta com os detalhes em madeira escura, e sofás luxuosos estão dispostos em pontos estratégicos para receber os hóspedes. Flores frescas decoram os cantos, enchendo o ar com um leve perfume.

Tento focar em cada detalhe do hotel para distrair meus pensamentos de um certo alguém, mas é inútil. E, claro, no momento que atravesso a entrada, eu o vejo.

Nicolas está ali, de pé, claramente tentando controlar uma situação nada agradável. Ele conversa com dois funcionários que parecem estar completamente perdidos. O franzido de sua testa demonstra sua frustração, e ele gesticula com as mãos enquanto fala. Eu quase rio. Ele deve estar enlouquecendo, e por um momento me sinto mal por ele.

A ideia de ir até ele e pedir desculpas me vem à mente de novo, e dessa vez estou decidida. Respiro fundo, ajusto a postura e vou em sua direção.

Mas, como o universo adora pregar peças, no momento em que estou a poucos passos dele, um dos funcionários tropeça em uma mala e acaba empurrando Nicolas para o lado. Eu, distraída, não consigo desviar e, é claro, nós colidimos.

— Ai! — exclamo, sem graça, enquanto meu corpo b**e contra o dele.

— Louise... desculpe, eu... — Nicolas diz, ajeitando rapidamente o paletó e dando um passo para trás, claramente desconfortável com a proximidade. Ele passa a mão pelos cabelos pretos, tentando recuperar a compostura.

— Ah... não, tudo bem! Eu... eu só estava vindo... é... eu... — começo a gaguejar, e a cada palavra que sai da minha boca, me sinto mais ridícula. Por que estou gaguejando? O que está acontecendo comigo? Eu estava totalmente tranquila ontem à noite, provocando-o sem nem pensar, e agora não consigo formar uma frase completa.

Nicolas me observa, os olhos castanhos fixos nos meus, tentando entender o que estou dizendo. Isso só torna tudo pior. O silêncio entre nós cresce, e eu me mexo nervosamente, sentindo minhas bochechas queimarem.

— Tudo bem, eu... preciso lidar com isso agora — ele finalmente diz, quebrando o silêncio com um tom apressado, apontando para o caos ao seu redor, onde os funcionários ainda estão tentando organizar as bagagens.

— Ah, claro... claro... eu... bom trabalho! — balbucio, sem sentido, e imediatamente me arrependo da última frase. “Bom trabalho?” Quem fala isso?

Ele acena com a cabeça, e antes que eu possa me envergonhar mais, dou um passo para trás, quase tropeçando no tapete de entrada. Meu coração está acelerado, e tudo o que quero agora é desaparecer.

Parabéns, Louise, excelente começo de dia.

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