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Romance Proibido

Karbeth está no auge de sua juventude, o que seria para nós o equivalente a nossa transição de adolescente á adulto. Inquieto e desafiador, na terra e nas alturas, era um líder nato como previu seu criador, Cerdoc.

            O draco era muito forte e poderoso, a labareda de fogo que expirava pela garganta alcançava até trinta, quarenta metros de distância e as exalava também pelas narinas, imponente, todos da sua espécie o respeitava, e também se aconselhavam com ele.

            Em uma tarde, o grande líder estava descansando no topo mais alto de Gerbraden, com a gigantesca cabeça praticamente pendurada no desfiladeiro, seu corpo firme no topo estava totalmente esparramado, relaxado, ele aguardava o pôr do sol, um momento mágico para ser apreciado por qualquer ser vivo. Seus olhos estavam semiabertos, sentia uma forte sonolência, a brisa batia leve em seu rosto e suas narinas soltavam uma leve fumaça enquanto respirava. O céu estava azulado, limpo, sem nuvens, o dia inteiro havia feito muito calor e agora com o entardecer um ar fresco ia tomando força avisando que a temperatura cairia durante a noite. O cenário era relaxante, o som das cachoeiras de Gerbraden, eram sinfonia para a alma.

            De repente, uma grande sombra passou sobre ele, no primeiro instante não deu atenção, era um local aberto, passagem de muitos dracos, mas a sombra voltou no sentido contrário e contra o vento, antes que Karbeth pudesse levantar a cabeça para procurar saber de quem se tratava, sentiu um aroma diferente, trazido pela brisa diretamente para suas narinas. Ele ficou extasiado com o aroma doce, chegou a fechar os olhos como se assim pudesse sentir toda a essência daquele magnífico odor, lembrava-lhe as flores do campo na primavera, por um segundo de clareza percebeu que estava com um leve sorriso no rosto e com cara de bobo, sacudiu a cabeça rapidamente para se autodespertar, a língua enorme como uma serpente balançou fora da boca, e quando parou a metade dela ficou pra fora. A criatura misteriosa retorna trazendo sua sombra, também misteriosa, e desta vez Karbeth escuta o bater de asas por entre raios do entardecer e então avista uma dracena, uma fêmea linda, é Amydelle, brevemente ele sorri, pois, se conheceram desde o início dos tempos e logo se apaixonaram. Até então nada aconteceu, pois ele tinha um trato com Cerdoc, e com muito custo tentava mantê-lo. Seu instinto lhe atentou diretamente para o lindo par de ancas que balançava como uma ode ao Sol. Ela bailava de um lado para outro e os grandes olhos verdes de Karbeth a seguia, ele realmente era fascinado por ela, nunca vira tanta beleza em uma dracena, não com tanta formosura.  A dracena, assim como Karbeth, é da raça do fogo, porém traz em sua índole a característica de ser instintiva, assim como seus descendentes, tem um focinho alongado com duas barbatanas compridas abaixo do maxilar e outra centralizada pouco antes da garganta, possui também três chifres que começam na testa e se mostram acima da cabeça de onde começa uma carreira de pequenos chifres até o final de sua calda onde há um gancho que lembra um anzol, pontiagudo e mortal. Seus olhos são vermelhos como o fogo, sua costa é da cor rubi e descendo para a parte inferior do corpo a cor vai ficando mais clara chegando ao tom de amarelo ouro. Suas asas são finas e compridas, na junção superior da articulação principal a cor é púrpura.

            Ela plaina sobre o planalto enquanto Karbeth abobado a observa, a dracena dá mais uma volta e aterrissa lentamente como uma pluma, a uns quinze metros do draco, lentamente Amydelle vai se aproximando dele. Ela se senta e fica de frente para ele, um breve silêncio toma conta do lugar, para Karbeth, o mundo parou, o tempo parou, ele está inerte, a dracena percebe que terá de tomar a iniciativa:

            _ Olá! Você está Bem? – Ela fala com um doce sorriso nos lábios, suas asas estão inquietas, dá a impressão que a qualquer momento alçará voo.

            As palavras da dracena despertam o draco de seu estado de inércia, ele pisca os olhos rapidamente e tenta responder, gaguejando:

            _Hã? O-Oi! Si-Sim! Tu-Tudo Bem! – ele dá uma rápida balançada na cabeça para despertar, limpa a garganta, se engasga, solta duas baforadas incondicionais coloca a imensa língua para dentro da boca tentando se recompor, sem disfarçar a cara de bobo, e meio sem jeito continua; _Estou apenas contemplando o pôr do Sol! E você? O que a traz por aqui?

            _ Karbeth, sempre romântico, por isso eu sou apaixonada por você, é diferente dos outros. – A dracena fala amorosamente mansa, sua voz é doce e cativante; _ Vim aqui para te ver, estava com saudades.

            O draco ainda sem jeito responde:

            _ Por favor, Amydelle, você sabe que não podemos... – Ele fica incomodado, pois é apaixonado por ela, mas não quer ter um relacionamento, afinal seria impossível se envolver com a dracena sem que houvesse a procriação, e ele tinha este compromisso com Cerdoc e faria de tudo para manter sua palavra, pelo menos tentaria.

            _Meu amor! – Amydelle é envolvente e mantém doçura na voz; _ Eu nunca vou entender isso, por que dois dracos que se amam não podem viver juntos? – Ela olha para o céu e continua; _ Eu preciso de você ao meu lado, não consigo parar de pensar em nós. – A dracena volta o olhar vermelho fogo para Karbeth e com intensidade na voz completa; _ Só consigo ter forças de continuar a viver se for com você, caso contrário nada faz sentido.

            Karbeth sente seu coração apertar, lembra-se de quando o sentiu pela primeira vez, logo após deixar de ser um Vahem Midris e se tornar um draco, seu coração bateu dentro do peito com muita força, foi o momento mais feliz de sua vida, mas agora, neste momento, ele preferia não sentir seu coração.

            _Amydelle! – Ele responde em tom de compaixão e paixão; _ Por favor, eu não posso, não faça isso comigo, sabe que a amo e sabe que não posso amá-la.

_ Eu sei, mas não entendo esse acordo que você fez com o tal criador do mundo; - Amydelle fala com tom de inconformidade; _ Afinal, nós nos amamos e você me ensinou que o amor é o sentimento mais lindo que qualquer criatura viva possa sentir, seja animal, ou, seja humano; - Ela olha no fundo dos olhos dele, sem jeito ele abaixa a cabeça, não suporta ouvir as súplicas de sua amada, no fundo ele quer amá-la, ela conclui; _ Eu jamais desistirei de seu amor. – Em seguida Amydelle dá um impulso, contudo, antes de partir, planando ela volta-se para Karbeth e diz; _E quer saber de uma coisa? Se esse tal criador do universo lhe proibiu de amar, na verdade ele lhe castigou. - Em seguida ela inicia um voo por Gerbraden, seguindo para sua caverna, próxima a uma das cachoeiras a oeste da cordilheira.

            Karbeth, com os olhos tristes acompanha sua amada dracena a se afastar, ela desaparece por entre as montanhas, porém ele continua olhando, como se houvesse a esperança de que ela surgisse por mais algum instante. O sol se põe e as três luas de Maddems, Saddamis, vão surgindo e iluminando o céu de Zamorra, o draco finalmente deixa seus olhos verdes e úmidos se despregarem do horizonte, ele respira fundo, solta uma baforada por entre as narinas, e segue para sua caverna que está a uns cinquenta metros de distância, o grandão leva consigo um coração ferido e confuso, já não compreendia mais a exigência de Cerdoc, afinal, Amydelle tinha razão, o amor era o mais importante, o amor foi essência da criação, não havia sentido negá-lo agora.

            Dentro de sua caverna ele se acomoda, ainda é cedo, acabou de anoitecer, sente que a noite será longa, seu coração está apertado, paira entre a satisfação de ser uma das criaturas mais lindas criada por Cerdoc e o arrependimento de sacrificar o mais belo sentimento existente em seu mundo, o amor. Karbeth fecha os olhos respira fundo e lembra-se de todo o processo da criação de Maddems, sim, de alguma forma Cerdoc lhe proporcionou esta possibilidade de não perder a memória de sua origem como Vahen Midris, talvez para que ele sempre se lembrasse de onde viera e de sua essência, sente um arrepio percorrer-lhe a espinha até a ponta de sua calda. Seus sentimentos vão de felicidade até maravilhado, e por fim lembra-se da última conversa que teve com seu mestre e criador, Cerdoc. Karbeth está confuso e triste, se questiona se o que fez está errado, tornar-se um draco talvez não tivesse sido uma boa escolha ou quem sabe a escolha foi certa e errado foi prometer algo tão cruel, como se abdicar de ter um relacionamento oriundo de um sentimento tão lindo, puro e de procriar uma família. O ébano da noite toma conta da caverna e o enorme draco adormece, como uma criança exausta depois de um dia inteiro de diversão.

       As três luas estão exatamente acima de Zamorra, formam um triângulo de pontas espaçadas, e suas cores azul, verde e âmbar, formam um espetáculo de luz e cores em parte do céu, o silêncio predomina, apenas alguns animais e insetos fazem algum barulho, alguns pássaros de hábitos noturnos correm atrás de sua refeição. De repente, Karbeth acorda com um estrondo que vem da entrada de sua caverna, ele dá um salto e fica de pé, sua testa franze, sua feição fecha, suas asas ficam semiabertas, sua calda estica e enverga a ponta com lança, ele está em posição de defesa. O Barulho aumenta rapidamente e pelo grunhir, trata-se de um draco, os olhos verdes de Karbeth ficam semiabertos em total tensão, de repente, antes de a criatura surgir, um deslocamento de ar chega primeiro trazendo um aroma conhecido, ele fica por um instante atordoado e antes que consiga chegar a uma conclusão a criatura surge a sua frente, é Amydelle, linda, formosa e com um arranjo de flores na cabeça, Karbeth já viu algo parecido em um ritual matrimonial entre os humanos, a noiva com um arranjo de flores na cabeça e um longo véu quase transparente da cabeça aos pés, ainda assustado ele exclama:

            _Amydelle! – Em seguida emenda uma interrogação; _ O que está acontecendo?

            A dracena responde com uma simples expressão:

            _Xiiiiu! – Ela pede silêncio e calmamente se aproxima de Karbeth.

            Assustado, o draco fica imóvel, sem reação enquanto a dracena se aproxima cada vez mais perto. Olhos nos olhos ele pergunta:

            _O que você quer? O que vai fazer?

            Ao passo que a dracena com um sorriso matreiro responde:

            _Vou apenas conquistar o que é meu, o seu amor.

            Karbeth tentou resistir, mas sem sucesso, fraquejou, o amor e o desejo são maiores e a união deles se concretizou depois tantos anos, o draco foi um herói por suportar tanto tempo a tentação, mas não resistiu aos encantos da dracena, o acasalamento dos dracos acontece e antes do amanhecer ambos saem da caverna para um voo por Edafir, a alegria era visível entre os outros dracos, todos queriam que o casal se unisse, pois era a representação física do sentimento, conhecido como amor. Karbeth tentou se controlar até o último instante, e agora, com o ato consumido, ele resolveu que a melhor coisa a ser feita é aproveitar a sensação de estar junto de alguém que ama. Eles bailam planando pelos céus de Zamorra, cruzam de Beleron á Tusida, brincam pelos campos de Tenish á Sheres, passeiam pela floresta de Goles e descansam nas dunas de Semish, os humanos percebem que algo aconteceu, Allatês observa e faz um breve comentário:

_Karbeth está muito feliz! Finalmente Amydelle o fisgou e isso merece uma festa. – E soltou uma enorme gargalhada, ele estava realmente feliz pelo draco.

        O Casal deu alguns rasantes e sumiram no horizonte sentido a Tomii.

Após quatro dias o casal retorna para Gerbraden, são recebidos com festa pelos outros dracos, assim que entram no espaço aéreo de Edafir, por onde passam os dracos locais lhes saúdam com urros comemorando a união do casal. Assim que aterrissam em Gerbraden recebem a notícia de que Allatês dará uma festa em comemoração à união ou porque não, ao casamento deles.

            Realmente a comemoração aconteceu, muita comida, bebida e dança, o casal foi tratado como Rei e Rainha, Allatês não se lembrava de quando vira os olhos de Karbeth brilhar tanto, a alegria era visível e contagiante, sua companheira esbanjava sorriso e simpatia, e como toda festa exagerada de Zamorra, esta durou dois sóis e duas luas.

            Ao passar de trinta luas o que seria inevitável aconteceu, apesar de toda a preocupação de Cerdoc, apesar de toda sua rispidez ao exigir que isso não acontecesse para o bem de todos, o inevitável acabou acontecendo, Amydelle concebeu, avisou a Karbeth que a qualquer momento botaria um ovo.

            O mestre dos dracos preparou um local da caverna com uma pilha enorme de feno para melhor acolher a dracena, já à vontade, ela se acomodou calmamente e pediu ao draco que ficasse sozinha, ele deixou a caverna realizando seu desejo. Horas se passaram e a ansiedade tomou conta do “paizão” de primeira viagem, e dos outros dracos. Finalmente Amydelle pôs um ovo, ela continuava exigindo o isolamento, descansou, dormiu, seu companheiro passou a noite em claro de plantão na porta da caverna junto com seu fiel amigo Alley, fiel escudeiro e braço direito de Karbeth, juntos e unidos como irmãos, neste momento dividiam a ansiedade do nascimento de mais um pequeno draco, sendo que desta vez era o herdeiro de Karbeth que chegava.

            O dia amanheceu, Karbeth cochilava sentado na porta da caverna quando foi acordado por Alley, este lhe trazia uma caça para o desjejum, meio que atordoado, o draco se espreguiçou, espichou seu pescoço e patas traseiras o máximo que pode, abriu e esticou as asas, deu um breve e baixo urro de despertar, em seguida agradeceu o amigo:

            _Obrigado meu amigo Alley, estou mesmo faminto. – Pegou a caça e começou a devorá-la quando escutou um urro fino e estridente, vindo de dentro da caverna; _ Alley! Escutou isso? – Karbeth nem percebeu que ainda estava com a caça na boca, metade traseira dentro e a outra metade incluindo a cabeça pendurada do lado de fora, babando tripas e restos mortais do pobre animal; _ Nasceu! Meu pequeno draquinho nasceu! – Antes que Karbeth terminasse de gritar de alegria ouviu-se outro urro, parecia levemente diferente do primeiro, Karbeth ficou paralisado sem saber o que fazer.

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