MAISIE SHEPARD TINHA apenas dezessete anos de idade quando todo o turbilhão de emoções e sensações aconteceu em sua vida, até então perfeita para qualquer adolescente.
Tinha pais maravilhosos, um irmão chato, uma melhor amiga a quem poderia confidenciar sobre qualquer assunto, chamada Hannah, um cachorro que a acompanhava desde criança em suas pequenas aventuras no quintal de sua casa e uma vida muito boa que o emprego de seu pai proporcionava a toda a sua família, ou seja, tudo o que alguém na idade dela poderia sonhar.
Maisie era o epíteto do que era a classe média americana, ia uma vez por ano à Disney World, jantava fora uma vez por semana com toda a sua família em algum restaurante, ia uma vez por semana ao shopping e não precisava fazer trabalhos extras de férias de verão ou inverno para ajudar no orçamento de casa ou até mesmo nos afazeres gerais da casa.
Ela simplesmente nunca teve qualquer problema na vida, não precisava arrumar sua cama, lavar louça, fazer comida, passar roupa ou qualquer outro trabalho doméstico, seus empregados faziam absolutamente tudo, sua única preocupação na vida era cuidar de seu cachorro, jogar conversa fora com a sua amiga e estudar, mas neste último ela não se sentia muito na obrigação de fazer.
Maisie era o mais puro exemplo de adolescente moderno que se poderia imaginar, detestava treinar a fundo quaisquer esportes (mesmo sendo uma atleta de vôlei de destaque na escola devido a sua altura), ajudar nas tarefas de casa, reclamava de tudo, estava sempre emburrada com seu irmão e achava seus pais sinônimo de atraso e cafonisse, sua única alegria naquela casa malfadada era seu cachorro, Jim, que ganhou quando tinha cinco anos de idade, agora já era um senhorzinho que só guardava suas forças para subir e descer as escadas em sua companhia, para comer e fazer suas necessidades durante seus passeios matinais e noturnos acompanhado da única pessoa a quem parecia a presença lhe alegrar.
— O que seria da minha vida sem você, não é mesmo, garotão?
Ela sentia que o cachorro a entendia perfeitamente, pois sempre que usava a palavrinha mágica garotão, recebia uma enxurrada de lambidas, o que fazia seu irmão tecer severas críticas ao animal e à sua higiene pessoal.
— Cara, isso é nojento, sabia? – Dizia o irmão com cara enojada ao ver o cachorro a enchendo de linguadas de alegria ao vê-la.
— Isso é amor... um idiota como você jamais entenderia isso.
Se é amor, é um amor nojento...
— O amor dele poderia ser mais limpo, não acha?
— Amor é amor, mas um idiota sempre vai achar idiotice o que não conhece.
Kevin, como todo irmão mais velho, e mais idiota, fazia uma careta e continuava a fazer qualquer coisa sem graça que ela achasse importante dentro de seu mundo completamente sem importância alguma.
A VIDA DE MAISIE era a mesma coisa desde que ela se conhecia por gente, quase como a história grega de Eco que foi amaldiçoado por Hera a repetir tudo o que os outros falavam por toda a eternidade.
Seu pai deu duas batidas na porta e ficou ali encostado no batente esperando a ordem para entrar no quarto da filha.
— Está tudo bem, filha? Posso entrar?
Era até estranho seu pai perguntar aquilo para ela, na verdade, era estranho qualquer interação de qualquer pessoa naquela casa, a não ser de seu irmão pentelho que insistentemente lhe enchia o saco.
— Claro, pai... por enquanto tudo certo.
— Só queria dizer que sinto muito orgulho de você, é a melhor filha que alguém poderia sonhar em ter.
Maisie abraçou o pai, ela não entendia porque estava vivendo aquilo, mas aquele momento se mostrou a última boa lembrança que tinha da família antes daquele fatídico acidente em que ela perdeu tudo e todos.
Era como sempre falavam, antes do amanhecer, é a hora mais escura do dia, e ela estava prestes a entrar numa escuridão que demorou muito tempo para sair.
MICHAEL ENTROU para o grupo de teatro na escola e se dava muito bem com todos os companheiros, principalmente com as garotas, ele tinha o dom natural de tratar com o público feminino, era um predador natural e as mulheres adoravam ser presas de Michael, o garoto mais bonito e descolado da cidade.Sua atuação era carregada de excentricidades que o professor de artes não sabia se isso era genialidade ou pura maquiagem teatral, ou os dois, mas Michael era uma metamorfose ambulante, era quase uma pessoa com TMP – Transtorno de Múltiplas Personalidade, porém, ele sempre tinha o controle de tudo, com exceção de sua vida familiar, da qual não dependia dele tal controle.Michael visivelmente tinha muitos problemas dentro de casa e o professor Clark estava ciente de todos eles.Antes de ser professor, era amigo de Michael e sempre que podia tirava-o daquele turbilhão de emoções trau
HANNAH ERA TUDO o que todas as garotas sonhavam ser na escola, a garota mais linda, descolada, bem-de-vida e desejada pelos rapazes mais interessantes e atraentes, para ela os garotos eram apenas um delicioso banquete em que poderia fazer o que bem entendia e logo descartá-los, não era um fim em si mesmo, mas sempre foi um meio para ter o que queria, e ela sempre quis ter tudo na vida, o único que parecia não cair sob seus encantos era Michael Vane.Muito pelo contrário, parecia que Michael sempre a tinha nas mãos e fazia o que bem queria com ela.Literalmente...Fazia sempre tudo o que queria...Ao contrário das pessoas na escola, Hannah sabia que Michael era um pobretão de quinta categoria que não tinha onde cair morto, ela conhecia a sua família que, coincidentemente trabalhava para seu pai, mais por consideração do que por merecimento, pois Carl Vane era um al
A PRIMEIRA PEÇA de teatro que Michael encenou foi um estrondoso sucesso em sua cidade e rodaram o Estado realizando dezenas de apresentações, inclusive no palácio do governo em que foi aplaudido em pé por todos os políticos mais importantes do Estado, incluindo o governador e três senadores da República.Em cada uma destas cidades Michael deixava corações partidos e histórias que nem se lembravam por tê-las repetido dezenas de vezes.— Você não se cansa não? – Disse Hannah, seu par na peça de teatro.— Me cansar? Está maluca? Eu quero é mais...Eu sempre quero mais...— Eu sonho fazendo isso pelo resto da vida... só há duas coisas que jamais irei me cansar nesta vida.Ela queria que pelo menos uma destas coisas fossem sempre com ela ou ela própria, mas Hannah sabia qu
O CURSO ESTAVA TERMINANDO e todos estavam se preparando para o grande baile e Maisie teve que ir acompanhada de seu irmão, pois não havia sido convidada por ninguém, afinal, ela era a garota mais alta de sua turma, a mais inteligente e só isso já estava assustando todos os garotos.— Cara, é deprimente saber que tenho uma irmã derrotada como você, sabia?Maisie fez cara de poucos amigos.— Cala a bola, seu idiota, você é uma pessoa incrível quando não está falando, respirando e nem vivendo, sabia?Eu a acertei em cheio...— Mas eu pelo menos terei companhia para o baile no ano que vem.Maisie bufou indignada enquanto via o irmão mostrar a língua.— Ainda há bastante tempo para você estragar isso, é seu maior talento.Maisie se arrependeu daquelas palavras todos os dias de su
HANNAH OBSERVAVA de longe a situação mais ridícula que já tinha visto, dando-lhe até ânsia, o pobre idiota de seu amante todo doce com a intelectualzinha e desengonçada da turma.— Está tudo bem, querida? – Disse Jeromy – você parece um pouco distraída.— Claro... – disse voltando à sua triste realidade – está uma noite incrível, não é mesmo?— Você não imagina o quanto...Claro que eu imagino...Ele a beijou e enquanto consumavam o ato ela olhava para Michael que lhe devolveu a piscadinha.ELA ESPEROU pacientemente Michael se desvencilhar da chata da Maisie e disse da forma mais gentil que já havia falado com Jeromy em toda a sua vida interrompendo a dança:—
MAISIE ESTAVA OLHANDO para a porta do banheiro onde Michael tinha entrado após colocar os óculos e não estava acreditando no que viu, Hannah tinha entrado logo em seguida... ela sabia o que aquilo queria dizer, afinal, ninguém erra o banheiro das garotas para o dos garotos sem querer, nem mesmo uma toupeira intelectual como Hannah Colleman.E eu que imaginava que ela era a minha melhor amiga... acho que sou tão burra para ver essas coisas óbvias quanto ela é para as matérias da escola...Para Maisie a noite e talvez a vida dela tinha terminado naquela noite, ela jamais conseguiria olhar para Michael novamente e enxergar um futuro ao seu lado, ele simplesmente tinha sido um cachorro da pior estirpe possível, e estragou o que já não estava bom naquela noite, mas a cada minuto que passava os dois lá dentro daquele maldito banheiro, mais Maisie perdia as
— QUEREMOS ANUNCIAR agora os grandes premiados da noite com a coroa de rei e rainha do baile anual deste ano.As pessoas começaram a aplaudir euforicamente.Hannah sabia que seria a rainha, faltava saber se seria o rei do baile naquele ano, não que para ela fizesse qualquer diferença, mas se fosse o Michael, então a despedida seria ainda melhor do que ela havia planejado.— Com vocês... Hannah Colleman... e... Michael Vane...Michael chegou até ela e disse:— Me permite? – disse para Jeromy que acenou positivamente.Michael lhe deu gentilmente o braço direito e ela engatou suavemente nele e foram à frente de todos enquanto eram ovacionados pelos colegas de turma que abria o corredor para eles passarem.— Acho que agora estamos prontos para a vida que merecemos ter no futuro.— Eu sei que vou viver, já não sei você, se
DIFERENTE DO QUE ERA a sua vida em sua casa, estar na Companhia de Teatro da escola era algo que o tirava daquele submundo em que vivia, seu pai alcoólatra, transformava sua vida num verdadeiro inferno, quando não tentava espancá-lo conseguia espancar a sua mãe, e por vezes até estuprá-la, ele sabia que por alguma sorte divina ele nunca tinha pensado nele daquela forma, mas do seu pai daria para esperar qualquer coisa.Michael também não conseguia culpar diretamente a sua mãe, já que era uma vítima de seu pai que sempre tratava a si mesmo como vítima de tudo e todos, descontando assim nele e em sua mãe suas próprias frustrações e derrotas.Mas nem sempre a vida de Michael havia sido aquele inferno, por muito tempo eles viviam numa espécie de purgatório, o