O dia passou lento, arrastado como um filme em câmera lenta. Cada minuto parecia pesar em meus ombros, como se o tempo estivesse me testando, brincando com minha ansiedade. Meu coração, inquieto, batia num ritmo que não obedecia à lógica. Eu estava nervosa, ansiosa, inquieta... só conseguia pensar no dia de amanhã.Dei graças a Deus quando Felipe chegou da escola dizendo que tinha dever de casa. Foi como um alívio, uma desculpa perfeita para ocupar minha mente com algo real, concreto, que me trouxesse de volta ao presente. Sentei ao lado dele e, por alguns momentos, consegui focar apenas em letras, números e cadernos coloridos. Era bom, quase terapêutico, cuidar dele. Queria tanto ser mais leve, mais despreocupada... Queria ser como outras mulheres que confiam cegamente. Mas eu não sou mais assim. Algo em mim se partiu — e não voltou a ser inteiro.Mais tarde, depois que Felipe adormece com seu ursinho apertado nos braços, caminho em silêncio até meu quarto. A casa está mergulhada em
Apanho os brinquedos de Felipe espalhados pelo chão da sala e devolvo-os ao baú. O silêncio pesa ao meu redor, mesmo com os sons da casa. Sinto como se estivesse andando em direção ao fim de um penhasco. Cada segundo é uma contagem regressiva até a verdade se revelar. Não vejo a hora de dar o horário de Renata chegar, me produzir, ir à festa, dar tudo certo e acabar logo com essa agonia. Quero saber. Preciso saber. Mesmo que doa. Mesmo que o que eu veja me esmague por dentro.Faltam algumas horas para o sol se pôr. Acendo as luzes da sala, tentando afastar as sombras que se acumulam dentro de mim. A claridade não alcança o que está escuro aqui dentro. Vou até o bar e abro uma garrafa de uísque. Bebo um gole dele puro, sentindo o calor descer queimando pela garganta, esperando que essa sensação me acalme, me anestesie. Ainda nervosa, puxo as cortinas e as fecho com um gesto rápido, como se isso pudesse me proteger do que está por vir.Marcello chora no carrinho. Pego ele no colo e sint
Da janela, observo os convidados se espremendo pelo cordão de segurança que contorna a entrada do Cassino. O clima lá fora é de expectativa. Cada um deles aguarda sua vez para entregar o convite e ser revistado. Aqui dentro, o contraste é gritante: luzes em excesso, música pulsando, e tentações por todos os lados. Mulheres lindas, exuberantes, com fantasias provocantes e olhares ousados. São maioria, convidadas dos Sabatines, claro, já que eles são os anfitriões desta noite. Tento ignorar a beleza que passa por mim e me concentro em algo mais mundano: o garçom com a bandeja de uísques. Estou cansado. Exausto, na verdade. Um gole não faria mal… só para relaxar. O problema é que esse lugar me sufoca. Não é onde eu gostaria de estar. Meu lugar seria ao lado de Giovanna e das crianças. Meu lar.Alguém segura meu braço, me fazendo parar. Sinto o toque firme, e quando viro, vejo o rosto sério de Vincent.— Hoje eu não quero que você beba. Quando bebe não consegue parar. Já reparou nisso? Pr
—Você é lida sabia? Vem comigo. Conheço um lugar calmo. E conversa é uma coisa que não quero ter com você. Topa? —Eu a testo.Seus olhos brilham por trás da máscara.—Tudo bem. —Ela sussurra.Ela aceitou? Dio! Tudo isso me surpreende. Confuso, caminho com meu braço em sua cintura e a levo até uma porta lateral do salão. Ali era uma sala de reunião, onde logo mais nos reuniríamos com os Sabatines. A abro e acendo a luz de um pequeno abajur. É um espaço grande, com três grandes sofás confortáveis. Mais adiante uma mesa de reunião. GiovannaQuando chego à entrada do Cassino, entrego meu convite com as mãos um pouco trêmulas. Uma segurança uniformizada me revista com um sorriso protocolar. Veste calça preta e camiseta branca com o slogan do Cassino. Os homens, por sua vez, estão em outra fila, sendo revistados por um segurança igualmente vestido.— Só seguir pelo tapete vermelho e subir aquela escada. — Ela me orienta, gentil, apontando o caminho.Respiro fundo. Detesto saltos!, reclamo
LUCASMuitas coisas passam pela minha cabeça ao vê-la ali. Questionamentos se chocam dentro de mim como ondas violentas. O que a levou a entrar nesse jogo? Ter comprado aquela fantasia sem me dizer nada, e agora estar em meus braços... Ela parecia prestes a se entregar por completo, quando o que eu esperava era um teatro, uma punição silenciosa, um castigo emocional qualquer.Uma voz sussurra em minha mente, cruel e cética:Ela veio para te vigiar.Mas outra, mais obscura, responde de imediato:Ou é só um fetiche? Fazer amor fingindo ser uma estranha?O lado perverso dentro de mim começa a borbulhar, querendo escapar. Minha respiração acelera. Era como correr sem sair do lugar. Meu corpo clamava uma verdade incômoda — eu a queria. De forma selvagem, irrefreável. Como se qualquer explicação para ela estar ali não fizesse a menor diferença.Dilato as narinas como um predador farejando sua presa. Ela cheira diferente. Até o perfume ela trocou. Ela pensou em tudo. Estratégica. Implacável.
Dio! Sinto uma poça de ácido corroendo meu estômago.Acabou a participação de Lucas na minha história. Eu irei reescrevê-la. Ela não será ditada pelos Bertizollo. Eu me recuso a repetir a vida que eu levava ao lado de Vitor.Mais um casamento falido, eu perdi a batalha novamente. Mas como diz o ditado, se te derem um limão, faça uma limonada. Se um pão duro, uma torrada.— Giovanna. Chegamos. Renata diz olhando para mim preocupada.Fiz que sim com a cabeça. Saí do carro. Ela depois que saiu me abraçou. Juntas caminhamos até a porta. Fez um gesto para que eu entrasse primeiro, mas, por um instante, hesitei. Pensando no que eu diria a Felipe amanhã quando ele acordasse.—Vem Giovanna. Tome um banho. Farei um chá para você.LUCASEu não sei o que estou sentindo, pois é uma mistura de sentimentos no meu peito. Raiva, tristeza, impotência. E o pior de tudo. O futuro parecia vazio. Oco.Sim, apesar de tudo eu a amava.Essa merda de sentimento entrou tão rápido no meu coração, como uma maldi
GIOVANNASinto um ódio intenso. Como se algo tivesse sido tirado de mim. Estou furiosa. As unhas cravadas nas palmas das mãos, as lágrimas brotando dos olhos. Tomo um banho, desejando que a água levasse minha dor, como ela fazia com a sujeira e o suor do meu corpo.Visto uma calça jeans e uma camiseta branca e um blusão preto. Tênis. Fazia tempo que eu não me vestia assim. Eu vivia bem arrumada por causa de Lucas. Idiota!Fui até a sala. Renata me aguardava com o chá e alguns biscoitos amanteigados, que eu evitava para ficar linda e esbelta para Lucas.Ela me serve. Eu pego a xícara de suas mãos e um biscoito.—Está melhor?—Estou. Eu respiro fundo e mordo o amanteigado.—Quer falar sobre isso?Mastigando, nego com a cabeça.—Tudo bem. —Renata parece avoada. Ela também não sabe muito que dizer numa hora dessas e eu nem quero que ela diga nada. Tomo um gole grande do chá. Fiz uma careta. E olho para o interior da xícara.Que chá era esse afinal?Que gosto estranho! O telefone toca
GIOVANNAMinha cabeça dói com um latejar agudo, como se martelassem meu crânio por dentro. Tento abrir os olhos, piscando furiosamente, mas há algo cobrindo minha visão.Dio… estou com uma venda.Um arrepio percorre minha espinha, e o pânico me atinge com força. Tento respirar, mas sinto um pano de seda apertado em volta da minha boca, abafando meu grito. Estou amordaçada.Meu coração dispara, martelando contra o peito preso por um cinto de segurança. Tento me mover, me sentar, mas meus pulsos estão amarrados. Sinto a tensão da corda queimando minha pele. Os tornozelos também estão presos. Não posso mover as pernas. Estou presa. Completamente imobilizada.Contorço-me no banco de couro, o ranger do material ecoando na minha cabeça como um alarme de perigo. Tento gritar, mas o som sai abafado, um gemido desesperado e patético contra a mordaça.Dio, isso é patético.E, pior… isso não é um sonho. Isto é real. Totalmente real.A gravidade da situação toma conta de mim como uma onda de gelo