Quando acordo na manhã seguinte Ethan ainda dorme profundamente. Sei que o pesadelo da noite anterior o deixou exausto – além de poder captar seu cansaço, o mesmo acontece comigo todas as vezes em que tenho esses sonhos –, portanto deixo que continue descansando.
Me levanto o mais silenciosamente possível, tomando cuidado para não acordá-lo, e fico em pé ao lado da cama por alguns instantes, o observando. Ele permanece imóvel, um braço enfiado sob o travesseiro e o outro esticado à frente do corpo, ressonando. Desde a primeira vez em que o vi, senti um desejo estranho de protege-lo, sem saber ao certo do quê, e sou novamente atingido por esse sentimento.
Sigo até o banheiro e lavo o rosto, depois vou para a cozinha, decidido a fazer um café fresco. Começo a abrir as portas dos armários, procurando pelo pó e os filtros, ainda tentando não fazer muito barulho. A cafeteira é igual à que temos em casa, então não tenho dificuldades para ma
Século XIX – Ano de 1888 Os dois estão andando lado a lado na floresta, em silêncio. Ethan já perdeu as contas de quantos passeios fizeram por ali até então, sempre terminados no lago. Agora eles trocam beijos e carinhos dentro da água, mas tudo de um modo muito inocente. Anthony é um rapaz de família, que não conhece nada do mundo da sedução, e ele procurar respeitar isso. Não é seu intuito corrompe-lo de forma alguma. Mas Ethan está incomodado com uma coisa – o segredo que esconde dele, sobre quem é de verdade, sobre a sua verdadeira natureza. A cada vez que Anthony brinca sobre as habilidades milagrosas do assistente de médico, sem fazer ideia do quanto está perto da verdade, ele sente uma pontada aguda no lado esquerdo do peito. Tudo q
Quando saio do quarto dos fundos e entro na loja encontro Elijah sentado no canto, lendo um livro distraidamente. Limpo a garganta para chamar sua atenção e então anunciou: — Estou pronto para a nossa primeira aula. Ele ergue os olhos para mim e sorri, depois coloca o livro novamente na prateleira e se levanta. — Bem, então vamos lá. – diz, caminhando até a porta. Franzo o rosto, confuso. — Espera aí, eu pensei que a gente fosse ficar aqui na loja mesmo. Elijah balança a cabeça. — Não, precisamos estar ao ar livre e em meio a outras pessoas, só assim você vai conseguir aprender a lidar com os sentimentos alheios. – explica. Sei que ele tem muita experiência no assunto e decido confiar nas suas palavras. Nós dois saímos da loja e começamos a caminhar lado a lado pela calçada. Apesar do dia nublado, muita g
Depois da aula que Anthony tem com Elijah, onde foi ensinado como controlar melhor o seu dom, passo alguns dias sem notícias dele, então suponho que os truques que aprendeu funcionaram e que ele não voltou a se sentir doente. Meus sonhos estranhos também cessam e fico feliz por voltar a levar uma vida normal, trabalhando e cuidando dos meus afazeres sem maiores problemas, até mesmo me arriscando a ir ao cinema em uma tarde ensolarada e concluindo o passeio com uma volta no parque. Porém, de repente as coisas mudam – estou na loja atendendo um rapaz quando, do nada, começo a me sentir mal, com tonturas e o corpo todo quente. Está fazendo muito calor e penso que esse é o motivo por trás do meu mal estar, por isso aumento a velocidade do ventilador de teto e vou até o quarto dos fundos para buscar uma garrafa de água na geladeira. Atendo mais algumas pessoas, mas começo a me sentir cada vez pior e logo fica cla
Desço no ponto de ônibus próximo à loja e atravesso a rua, seguindo na direção da entrada. Por sorte meus pais foram passar o fim de semana na casa de um casal de amigos e levaram minha irmã junto, portanto pude sair de casa sem dar nenhuma explicação. De todo jeito, enfiei meu celular no bolso da calça, para o caso dos dois resolverem me ligar. Chegando lá, testo a maçaneta da porta e descubro que está destrancada, então entro na loja e a fecho atrás de mim. Elijah me explicou brevemente o que estava acontecendo, porque precisavam de mim, e disse que estariam me esperando no quarto dos fundos, por isso passo pela lateral do balcão e vou até lá. Ethan está deitado na cama, um pouco pálido, de olhos fechados. Elijah e um outro homem – que deve ser o amigo ao qual ele se referiu ao telefone, o responsável por administrar uma sessão de hipnose em Ethan – estão sentados à mesa da cozinha. — Anthony
A sessão de hipnose me deixa exausto e acabo pegando no sono logo depois que Elijah vai embora. Quando acordo, horas mais tarde, Anthony está sentado no chão ao lado da cama, com as pernas cruzadas, olhando para o nada e parecendo perdido nos próprios pensamentos. — Desculpe, eu acabei pegando no sono e te deixei aqui sozinho, sem nada para fazer. – digo, esfregando os olhos. – Você poderia ter pelo menos ligado a televisão. Ele balança a cabeça e se levanta, massageando as pernas. — Não precisa se preocupar com isso, dava para perceber que você precisava descansar um pouco depois de tudo que aconteceu. Conseguiu dormir bem? Assinto e forço um sorriso. — Consegui, sim. Obrigado por perguntar. – respondo. Olho para o relógio pendurado na parede em frente à cama e me espanto ao ver que já passa das seis. – E agora acordei morrendo de fome, por isso acho melhor começar
Século XIX – Ano de 1888 Ethan corre pela floresta, aos risos e tropeços. Ele tem consciência de que está agindo como uma criança boba, mas não se sente envergonhado porque é o seu Tony que está ali e Ethan sabe que jamais precisaria ter vergonha dele. Anthony finalmente consegue alcança-lo e os dedos dele agarram as costas do seu colete. Ele tenta se soltar, mas perde o equilíbrio e cai esticado sobre o chão coberto de folhas, levando o rapaz junto na queda. — Você se machucou? – pergunta Anthony, erguendo o corpo para lhe encarar, a voz cheia de preocupação. O alívio toma
Nos sentamos em um dos poucos bancos livres no parque e Anthony me passa meu fumegante copo de café. Tomo um belo gole – quase queimando a língua – e abro o saco pardo que estou segurando para apanhar um donut recheado com geleia de morango e coberto com açúcar de confeiteiro. Começo a comer e corro os olhos ao meu redor. É um dia realmente ensolarado e quente, mas sopra uma brisa agradável que ajuda a aplacar o calor e muitas pessoas aproveitaram para passar um tempo ao ar livre, lotando o parque. Crianças correm para lá e para cá; jovens descolados tomam Sol e batem papo esticados em toalhas sobre a grama; idosos caminham de braços dados pelo calçamento que circunda o parque, junto de homens e mulheres passeando com seus cachorros. É uma cena bem típica de uma manhã de verão. Olho para Anthony, que também está admirando a agitação do parque enquanto bebe pequenos goles do seu café. Me concentro em seu rosto, em seus o
Acabo de abrir a Harris e ainda estou organizando algumas coisas atrás do balcão, quando Elijah entra na loja. — Bom dia, Barus. – cumprimenta, se aproximando. – Está se sentindo melhor? Assinto, concentrado na tarefa de separar as notas no caixa de acordo com o valor. — Sim, muito melhor. Toda aquela tontura e aquele mal estar terrível já passaram completamente. Fade dá alguns tapinhas no meu ombro, depois se afasta, me olhando com curiosidade. — Você está parecendo diferente, muito mais relaxado do que de costume. – diz. – Até mesmo feliz, eu diria. — Eu achei que você não fosse capaz de sintonizar meus sentimentos. – retruco. — Continuo não sendo, mas lhe conheço de